
"Nosso dinheiro est� valendo muito menos. A gente tem menos combust�vel pagando mais"
Pedro Henrique dos Santos Sousa, auxiliar administrativo
Em seus escrit�rios ventilados, como recomendam os infectologistas, ou no isolamento com tecnologia para acompanhar a rentabilidade dos investimentos dos clientes, os analistas de bancos e corretoras t�m sido prudentes o suficiente para rebaixar as proje��es de crescimento da economia brasileira e elevar as estimativas da infla��o de 2021. Sem a mesma condi��o, as fam�lias tentam cortar as despesas para encarar nova leva de aumentos de pre�os que fez mar�o terminar com a maior alta do custo de vida para esse m�s desde 2015 na Regi�o Metropolitana de Belo Horizonte, como na m�dia do Brasil.
Transportados �s manchetes e ao discurso pol�tico, os combust�veis representam apenas a parte mais vis�vel da infla��o de 1,09% medida em mar�o na Grande BH pelo �ndice Nacional de Pre�os ao Consumidor Amplo - 15 (IPCA-15), pr�via da infla��o oficial do pa�s, o IPCA, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estat�stica (IBGE). Em 6 anos, foi a varia��o mais alta para mar�o. Na s�rie hist�rica do indicador, o custo de vida subiu um pouco mais em mar�o de 2015 (1,16%).
Comparada � varia��o de 0,23% de mar�o de 2020, quando Minas Gerais registrou o primeiro caso de contamina��o pelo coronav�rus, o IPCA-15 do m�s passado foi 4,7 vezes maior. Dos nove grupos de produtos e servi�os pesquisados pelo IBGE na composi��o do �ndice, cinco tiveram reajuste de pre�os. Significa que houve companhia para a gasolina, etanol e diesel nas remarca��es. Elas alcan�aram de despesas com aplicativos de transporte a gastos com sa�de, g�s de cozinha, alugu�is, energia, algumas roupas, cortes de carne e hortifr�tis. Na m�dia do Brasil, o IPCA-15 subiu 0,93%.
Toda essa press�o em cadeia deve se refletir no IPCA que o IBGE divulga nesta sexta-feira. Dif�cil imaginar que os pre�os v�o ceder, pelo menos, em abril, embora tenha ocorrido al�vio em gasto geral com os alimentos, por exemplo, como avalia o economista F�bio Bentes, que monitora os indicadores da economia na Confedera��o Nacional do Com�rcio de Bens, Servi�os e Turismo (CNC). “Se houvesse redu��es nos pre�os dos combust�veis nas refinarias, poder�amos ter infla��o menor, mas as redu��es demoram a chegar ao consumidor e a desvaloriza��o cambial (do real frente ao d�lar) tamb�m afeta muito os pre�os”, afirma.
Junto � pol�tica de alinhamento aos pre�os do petr�leo no mercado internacional, que implica reajustes da Petrobras, os combust�veis, assim como produtos exportados e importados pelo pa�s, sofrem influ�ncia do c�mbio. Quando encarecem, os combust�veis t�m grande capacidade de contaminar uma s�rie de pre�os de outros setores, elevando o frete das mercadorias.

Contudo, nos momentos de baixa nas refinarias, nem sempre a queda chega ao varejo, e �s vezes, nem parte dela alcan�a as bombas nos postos revendedores. O reajuste de 5,08% no grupo de despesas com transporte na Grande BH, em mar�o, refletiu intensas varia��es do etanol (20,58%), �leo diesel (13,14%), gasolina (12,66%), seguro volunt�rio de ve�culo (6,39%) e do transporte por aplicativo (5,73%). Antes das duas redu��es de pre�os da gasolina nas refinarias que a Petrobras anunciou na segunda quinzena do m�s passado, o combust�vel vinha encarecendo h� nove meses.
Fora do campo de influ�ncia dos chamados pre�os administrados pelo governo, que incluem a energia, a infla��o de mar�o foi tamb�m pressionada pelo reajuste de 0,69% dos planos de sa�de e de 1,38% dos exames de laborat�rio. O IPCA-15 s� n�o subiu mais na Grande BH porque foi contido pela queda da m�dia de reajustes de pre�os dos produtos dos grupos de alimenta��o e bebidas (-0,43%), de comunica��o (-0,11%) e despesas pessoais (-0,03%). Ainda assim, h� carnes com pre�os em eleva��o, a exemplo do patinho; frutas, como manga; outras prote�nas, a exemplo do ovo de galinha (7,06%), e hortali�as, como a alface (4,78%).
Coronav�rus
O avan�o da COVID-19, por sua vez, enfraquece a economia, torna nebuloso o cen�rio do pa�s nos pr�ximos meses, e ter� implica��es sobre os rumos dos pre�os, como destaca Thaize Martins, coordenadora de pesquisas da Funda��o Ipead, vinculada � UFMG, respons�vel pela apura��o do �ndice de Pre�os ao Consumidor Amplo (IPCA) na capital. “A tend�ncia para os pr�ximos meses vai depender muito de como a economia vai girar diante dessas outras situa��es impostas pela pandemia”, afirma.
Enquanto a economia perde ritmo diante dos efeitos do agravamento das contamina��es e mortes provocadas pelo coronav�rus – dois deles s�o a manuten��o do desemprego elevado e a queda de renda –, o controle da infla��o tende a exigir medidas de aperto monet�rio e o principal instrumento � o da eleva��o da taxa b�sica de juros, a Selic, aquela taxa que remunera os t�tulos do governo no mercado financeiro e serve de refer�ncia para as opera��es nos bancos e no com�rcio.
Pressup�e tamb�m ajuste nas contas p�blicas num momento em que os gastos dos governos s�o dif�ceis de ser contidos com a necessidade de combate � pandemia. O economista F�bio Bentes lembra que junto ao desemprego alto no pa�s, dados do Banco Central indicam que 30% da renda das fam�lias est�o comprometidos com o pagamento de d�vidas, maior n�vel desde 2005, o que torna mais dif�cil a recupera��o da economia.
Esse cen�rio delicado e complexo levou o Instituto de Pesquisa Econ�mica Aplicada (Ipea) a reduzir, na semana passada, a sua proje��o de crescimento da economia em 2021 de 4% para 3%. A previs�o para a infla��o oficial do pa�s passou de 3,70% para 4,60%. A �ltima pesquisa feita com uma centena de economistas ouvidos pelo Banco Central para o Boletim Focus divulgado na semana passada mostrou aumento da proje��o de infla��o para 4,81% neste ano e baixa a 3,81% da taxa estimada de crescimento da economia em 2021.
BAIXO F�LEGO
A pr�pria crise econ�mica deve se incumbir de conter a for�a de alguns reajustes que as fam�lias enfrentaram em mar�o, como os de vestu�rio e servi�os de sa�de, na avalia��o do economista F�bio Bentes, da CNC. Itens que encareceram, como agasalho feminino (4,72%), no m�s passado s�o resultado de remarca��es pontuais, de acordo com Bentes.
A infla��o do grupo de despesas com vestu�rio alcan�ou 0,4% em m�dia ao ano, a menor desde 1999. No caso das despesas com sa�de, o economista espera acomoda��o de pre�os, � exce��o dos reajustes que j� eram esperados dos planos de sa�de, com a perda de espa�o para remarca��es.
Bicicleta e pesquisa contra os reajustes
Com pouco margem de manobra no or�amento, a solu��o do consumidor para driblar os pre�os altos passa por privar-se do consumo ou definir meta r�gida de gasto, combinada a uma boa pesquisa de ofertas. O auxiliar administrativo Pedro Henrique dos Santos Sousa, de 25 anos, tomou medida radical contra o aumento das despesas com gasolina e j� lan�ou m�o da bicicleta para ir de casa � empresa na qual trabalha.
“S� saio de carro em caso de extrema necessidade, quando preciso ir a um lugar com urg�ncia. At� mesmo um Uber a gente tenta para n�o ter que passar na bomba (posto de gasolina) e pagar. O nosso dinheiro est� valendo muito menos. A gente tem muito menos combust�vel pagando muito mais. Esse � nosso principal meio de transporte e a gente acaba sendo ref�m desses aumentos”, reclama.
Ao fazer as contas, Pedro Henrique Santos percebeu que com o desembolso de R$ 30, por exemplo, coloca 8 litros de gasolina no tanque do carro, quando no ano passado, antes da pandemia de coronav�rus, o mesmo valor era suficiente para adquirir at� 12 litros do combust�vel. “O impacto � direto e seco no nosso bolso. Com os aumentos, acabo optando por outros tipos de transporte. Cheguei a ir para o trabalho de bicicleta. Alguns destinos que antes eu fazia de carro passei a fazer de �nibus”, conta.
Indignada com as remarca��es dos pre�os nos supermercados, a dona de casa L�dia Aparecida de Carvalho, de 57, n�o faz compras mais sem antes pesquisar os pre�os atr�s da melhor oferta. “� impressionante como as coisas est�o caras. Um absurdo. Hoje, vou ao supermercado e pago um valor, quando eu vou no m�s seguinte est� o dobro. Veja que evito comprar bobagem. Compro mais o essencial. Infelizmente, uma compra boa do m�s n�o sai por menos de R$ 300”, afirma.
Com a pesquisa de pre�os, a dona de casa consegue alguma economia e reduz o impacto da infla��o alta nos gastos da fam�lia. Para L�dia Carvalho, a pandemia foi a principal causa da disparada da infla��o dos alimentos no ano passado. “Antes da pandemia at� dava para pagar, mas agora � desumano. J� comprei pacote de arroz por R$ 30. Voc� sai com tr�s sacolinhas do supermercado pagando R$ 100 a R$ 150.”
A terceira pr�via da infla��o de mar�o medida em Belo Horizonte pelo �ndice de Pre�os ao Consumidor Amplo (IPCA), da Funda��o Ipead, alcan�ou 1,14%. Em fevereiro, o indicador subiu 0,32%. Entre os cinco produtos ou servi�os que mais contrib�ram para o aumento do custo de vida, estavam a gasolina, com reajuste de 13,10%, autom�vel novo (3,50%) e condom�nio residencial (1,42%). No per�odo acumulado dos �ltimos 12 meses at� a terceira semana de mar�o, o IPCA j� acumula 6,40%. Para dar uma ideia do que essa taxa significa, o centro da meta oficial para a infla��o de 2021 � de 3,75%, com margem de toler�ncia de 1,5 ponto para cima ou para baixo.
A coordenadora de pesquisas da Funda��o Ipead, Thaize Martins, observa que alguns alimentos t�m mostrado redu��o de pre�os, o que n�o ocorreu com os chamados pre�os administrados, aqueles dos servi�os p�blicos, incluindo a energia el�trica. “Temos alguns produtos que apresentam per�odo entressafra (quando a oferta cai e os pre�os costumam subir), mas quanto � interfer�ncia da infla��o estamos observando mais peso nos produtos administrados do que nos alimentares neste momento.”
*Estagi�rio sob supervis�o da subeditora Marta Vieira