
Em Belo Horizonte, o cr�dito j� ficou mais caro em setembro, acompanhando a decis�o do Comit� de Pol�tica Monet�ria (Copom) do Banco Central (BC) e afeta duramente a tentativa de sair do sufoco de um dono de bares e restaurantes da regi�o nobre da capital, que, sob anonimato, relatou sua ang�stia ao Estado de Minas. Ele conta que, na pr�tica, n�o teve alternativa sen�o contrair empr�stimo de R$ 400 mil para salvar seu neg�cio, impactado pelo longo isolamento social necess�rio para conter a dissemina��o do coronav�rus.
Caso n�o buscasse o dinheiro emprestado, teria sido obrigado a fechar as portas. Recentemente, ele conseguiu renegociar as condi��es de pagamento e os juros. Ficar� pelo menos tr�s anos quitando altas parcelas. Por enquanto, o faturamento � incipiente, com a retomada recente das atividades econ�micas na cidade. O dinheiro serviu para pagar impostos atrasados, fazer acerto com funcion�rios dispensados e comprar mercadorias.
Como o empreendedor do setor de bares, os endividados no pa�s representavam em setembro 74% da popula��o, ou seja, mais de dois ter�os dos brasileiros, segundo a Pesquisa de Endividamento e Inadimpl�ncia do Consumidor (Peic), realizada pela Confedera��o Nacional do Com�rcio de Bens, Servi�os e Turismo (CNC). O percentual impressionante superou a marca de agosto (72,9%) e ficou bem � frente do resultado de setembro do ano passado (67,2%), no auge da pandemia. Por sua vez, a inadimpl�ncia teve ligeiro recuo, atingindo 25,5% das fam�lias.

“� um momento muito preocupante para todos n�s. N�o sabemos o que faremos daqui para a frente”, desabafa o empreendedor de bares ouvido pelo EM. O empres�rio recorreu a empr�stimo de banco, com juros de 1,7% ao m�s, e depois aderiu ao Programa Nacional de Apoio �s Microempresas e Empresas de Pequeno Porte (Pronampe), da Caixa Econ�mica Federal, linha considerada barata, cujos encargos s�o inferiores a 4% ao ano.
“S�o raros os casos de empres�rios que n�o precisaram de financiamento. Hoje, 90% dos sobreviventes est�o endividados com um tipo de linhas de cr�dito. Muitos deles n�o tiveram sequer condi��es de acessar o Pronampe e tiveram que buscar outros meios, com taxas mais altas. E grande parte est� com d�vida pendurada para ser paga nos pr�ximos anos”, afirma.
RISCOS
De acordo com a Funda��o Ipead, vinculada � UFMG, as taxas de juros m�dias mensais apuradas para empr�stimos a pessoas f�sicas, em setembro, variaram de 5,87% a 14,24% no cart�o de cr�dito rotativo em atraso; de 5,80% a 8,32% no cheque especial e de 1,48% a 6,04% no cr�dito pessoal n�o consignado. Os encargos aumentaram nas tr�s modalidades em rela��o ao mesmo per�odo de 2020. H� um ano, as maiores taxas m�dias mensais encontradas estavam em 13,84% no cart�o de cr�dito rotativo em atraso; 7,95% no cheque especial e 5% no cr�dito pessoal n�o consignado.Com a infla��o alta ou baixa no Brasil, a taxa de juros sempre foi elevada, como observa o gerente de pesquisas da Funda��o Ipead, o economista Eduardo Antunes. “O empr�stimo do dinheiro representa o alto risco que o emprestador est� assumindo ao garantir o recurso. As taxas aumentaram justamente por esse risco e pelo medo de o dinheiro n�o voltar. O trabalhador perdeu dinheiro e poder aquisitivo e acabou pressionando as taxas de juros, porque o risco do cr�dito ficou maior”, explica.
Para as pessoas jur�dicas, o custo de desconto de duplicatas varia de 0,66% a 2,08% ao m�s e o financiamento de capital de giro pode custar de 1,47% a 2,52% mensais. Em setembro de 2020, esses encargos tinham taxas mais amplas, chegando a 2,09% e 2,98%, respectivamente. A infla��o medida pelo �ndice de Pre�os ao Consumidor Amplo (IPCA), calculado pela Funda��o Ipead/UFMG, foi de 1,31% em setembro, chegando ao patamar de 6,60% em 2021 e a 9,34% nos �ltimos 12 meses.
“Pago banco h� 6 meses, mas o com�rcio n�o voltou”
Outro empres�rio de Belo Horizonte, que tamb�m pediu anonimato, quase foi � fal�ncia antes de aderir ao Pronampe e a empr�stimos pessoais para manter o neg�cio vivo durante a pandemia. Os financiamentos n�o foram suficientes. Ele ainda precisou vender carro e lote e recorrer ao cheque especial, com taxa de 13,5% ao m�s. Ao todo, adquiriu d�vida de R$ 130 mil.
Se n�o bastasse a situa��o dram�tica, o aluguel do im�vel que abriga o neg�cio pr�prio deve passar de R$ 4,5 mil para R$ 6 mil por m�s. O empres�rio calcula que a d�vida ser� quitada em 30 meses, dependendo do faturamento de seu com�rcio. “A pior situa��o � a que eu enfrento agora. Pago empr�stimos h� seis meses, mas o com�rcio n�o voltou de fato, o delivery caiu e a coisa apertou. As mercadorias subiram de pre�o e n�o podemos repass�-las ao cliente. O ticket-m�dio por cliente caiu muito. Estou muito preocupado. Caso esse panorama n�o mude, n�o h� outro jeito sen�o fechar as portas”
O caminhoneiro aut�nomo F�bio Moreira, de 41 anos, tamb�m se envolveu num cen�rio complicado de empr�stimos. Ele renegociou o pagamento de uma d�vida que contraiu em 2019 para efetuar a compra de uma carreta. Para isso, recorreu a uma financeira para obter empr�stimo de R$ 120 mil, que ser� pago em parcelas durante cinco anos a juros menores que 2% ao m�s. “A d�vida j� existia antes da pandemia. Quando o com�rcio foi fechado, tudo se complicou. Acabei me acidentando e, como financiamento do caminh�o, fiquei endividado e sem ter como pagar. Logo, optei por um �nico cr�dito para facilitar o pagamento”, afirma.
Em Minas Gerais, os �ltimos dados de endividamento, divulgados em agosto, mostram uma ligeira queda no �ndice de endividados, segundo a empresa de servi�os financeiros Serasa. No �ltimo levantamento, pelo menos 5,7 milh�es de pessoas f�sicas tinham contas a pagar, queda de 6,47% em rela��o a agosto de 2020. Com rela��o �s pessoas jur�dicas, foram 594 mil endividadas em agosto, com redu��o de 5,19% ante o mesmo per�odo de 2020.
O gerente de pesquisas da Funda��o Ipead, Eduardo Antunes, alerta consumidores e empresas a n�o tomarem financiamentos de d�vidas muito longas, diante da possibilidade de juros ainda mais elevados: “O ideal � nunca fazer d�vida com taxas de juros t�o exorbitantes. Um cr�dito rotativo de um m�s para o outro, por exemplo, � alt�ssimo. Se n�o tiver jeito, o ideal � procurar uma negocia��o com o banco. Existem cooperativas que praticam juros bem menores do que bancos convencionais, com prazos maiores e menor poder de corros�o do seu dinheiro”. (RD)
Vacina��o reacende esperan�a do varejo
Mesmo com o recorde de endividamento no Brasil, o economista da CNC F�bio Bentes, imagina um panorama de recupera��o at� o fim do ano, impulsionado pelo aumento das vendas no com�rcio em todo o pa�s. A expectativa � que essa expans�o econ�mica gere m�o de obra a partir do m�s que vem, reduzindo a taxa de desemprego - atualmente em 14%.
“Apesar do aumento do endividamento, n�o caminhamos para uma situa��o extremamente negativa. Vamos ter uma situa��o desconfort�vel at� o fim do ano. Mas n�o � um cen�rio catastr�fico. O que ajuda a economia neste momento � o aumento na circula��o dos consumidores proporcionado pela expans�o da vacina��o. Se a imuniza��o j� era importante pela quest�o sanit�ria, est� sendo fundamental do ponto de vista econ�mico”, avalia.
Para F�bio Bentes, a expans�o desenfreada nos pre�os dos produtos de primeira necessidade � uma press�o a mais para o endividamento, mas � preciso que as fam�lias tenham consci�ncia dos gastos em dezembro. “Quem precisa tomar empr�stimo neste fim de ano tem que se preocupar com uma taxa de juros mais baixa, a fim de n�o comprometer 2022. Esse � o ponto fundamental para que o or�amento das fam�lias, que em janeiro j� � pressionado com o pagamento de impostos e material escolar, n�o se torne algo fora de controle”, alerta.
No cen�rio mais favor�vel avaliado pelo economista, est�o fatores como a restitui��o do Imposto de Renda e o pagamento da segunda parcela do 13º sal�rio. “� importante que o consumidor fa�a o gasto de suas despesas de forma respons�vel”, argumenta. Bentes diz que � fundamental as fam�lias entrarem em 2022 livres de d�vidas ou com seus d�bitos controlados: “Em 2022%, diante das incertezas, � importante que o or�amento familiar esteja equilibrado, dentro da perspectiva de recupera��o da economia”. (RD)