
O fornecimento de diesel tornou-se uma preocupa��o global desde que as san��es contra a R�ssia levaram a uma redu��o dos estoques no mundo.
A informa��o divulgada pela ag�ncia Reuters de que o agora ex-presidente da Petrobras, Jos� Mauro Ferreira Coelho, teria alertado o Minist�rio de Minas e Energia sobre a possibilidade de falta de diesel no Brasil pouco antes de ser demitido ampliou ainda mais os temores no pa�s.
Segundo a ag�ncia de not�cias, na semana passada a estatal teria apresentado um documento ao governo em que previa um cen�rio de desabastecimento em pleno auge da colheita da soja no segundo semestre, caso a empresa n�o venda combust�vel a pre�os de mercado.
Segundo fontes ouvidas pela reportagem, a Petrobras disse que a empresa e outros importadores podem ter dificuldades para garantir o diesel em meio � redu��o dos estoques mundiais.
Ap�s a demiss�o de Ferreira Coelho da estatal — empossado h� pouco mais de um m�s —, o governo indicou Caio Paes de Andrade para substitu�-lo.
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A Federa��o �nica dos Petroleiros (FUP) expressou a mesma preocupa��o na ter�a-feira (24/05).
Em nota, os petroleiros afirmaram que "o Brasil corre o risco de desabastecimento de �leo diesel no in�cio do segundo semestre deste ano, em fun��o da prevista escassez de oferta no mercado internacional e do baixo n�vel dos estoques mundiais".
Analistas consultados pela BBC News Brasil concordam com a avalia��o da Petrobras e da FUP, mas afirmam que a defici�ncia deve ser pontual e s� se concretizar� se os fatores causadores da crise permanecerem ativos.
"Pode faltar diesel pontualmente no Brasil", afirma Pedro Shinzato, analista de derivados da consultoria Stonex. "N�o devemos ver um desabastecimento generalizado, mas em postos espec�ficos, de bandeira branca, ou em regi�es do pa�s mais afastadas, � bem poss�vel falar em faltas espor�dicas."
Para Maur�cio Can�do, professor da Escola Brasileira de Economia e Finan�as da Funda��o Getulio Vargas (FGV-EPGE) e da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), existe a possibilidade de car�ncia pontual caso a pr�pria Petrobras n�o aumente seu ritmo de importa��o.
"Uma escassez pontual � mais prov�vel do que uma falta generalizada de diesel nos postos ou no transporte de carga. Pode haver atrasos no despacho ou faltas espor�dicas por conta de problemas de log�stica de mudan�a de fornecedor diante do problema global", diz.
Entre os principais fatores apontados pelos especialistas para a concretiza��o do cen�rio futuro est� a defasagem do pre�o do diesel em rela��o ao mercado internacional, que pode desencorajar a compra do combust�vel no exterior por importadores privados.
As san��es e bloqueios impostos � R�ssia por conta da guerra na Ucr�nia, que levaram os estoques internacionais para m�nimos hist�ricos, tamb�m s�o um grande fator de peso.

O que est� por tr�s dos temores de escassez?
A preocupa��o com um desabastecimento de diesel n�o � exclusiva do Brasil.
Desde que a R�ssia invadiu a Ucr�nia, Estados Unidos e Uni�o Europeia impuseram san��es contra o pa�s, que � o segundo maior produtor e exportador de petr�leo do mundo.
Com isso, a oferta da commodity diminuiu globalmente e os seus pre�os dispararam.
"V�rios pa�ses est�o com os estoques de diesel e outros combust�veis bastante baixos para os padr�es usuais. Se essa situa��o continuar por muito tempo, o mundo inteiro corre o risco de sofrer com algum tipo de problema de oferta", diz o economista Maur�cio Can�do.
"A grande quest�o que definir� se vai haver desabastecimento ou aumento ainda maior do pre�o do diesel no mercado internacional � a velocidade e a escala com que a Europa vai cortar seu fornecimento da R�ssia", afirma Felipe Perez, estrategista de downstream para a Am�rica Latina da S&P global.
Mas segundo os especialistas consultados pela BBC News Brasil, o Brasil pode ainda enfrentar um componente adicional de risco, que � a queda nas importa��es por conta da defasagem do pre�o do diesel em rela��o ao mercado internacional.
O Brasil produz mais petr�leo do que consome e se declara "autossuficiente". Por�m, devido ao tipo de petr�leo extra�do e � insufici�ncia na capacidade de refino, ainda precisa importar tanto petr�leo cru quanto derivados como a gasolina e o diesel.

Segundo a ANP (Ag�ncia Nacional de Petr�leo, G�s Natural e Biocombust�veis), o Brasil bateu recorde de importa��o de diesel em 2021 — foram 14,4 milh�es de metros c�bicos de diesel A (puro, sem biodiesel), volume 20,4% maior do que no ano anterior.
Ainda de acordo com a ANP, a participa��o do diesel vendido no pa�s com origem estrangeira passou de 20,9% em 2020 para 23,2% em 2021.
A Petrobras adotou o chamado pre�o de paridade de importa��o (PPI) em 2016, durante o governo de Michel Temer. O PPI vincula o valor dos derivados de petr�leo ao comportamento dos pre�os dos produtos em d�lares no mercado internacional.
Recentemente, por�m, os reajustes para acompanhar o valor internacional se tornaram mais espa�ados. Segundo o G1, em reuni�es internas do governo, o presidente Jair Bolsonaro (PL) tamb�m teria dito a auxiliares que n�o quer novos reajustes no diesel, gasolina e g�s de cozinha at� a elei��o, em outubro.
"No momento o pre�o do diesel no Brasil est� at� bem alinhado com o internacional, mas porque o mercado caiu nas �ltimas duas semanas e o valor global tamb�m caiu um pouco", diz Pedro Shinzato.
"Mas sabemos que o atual presidente est� buscando a reelei��o e que o aumento nos pre�os de combust�vel pode ser uma pol�tica impopular."
Diante da defasagem do pre�o do diesel, importadores particulares, n�o vinculados � Petrobras, podem deixar de comprar o combust�vel no exterior para evitar preju�zo ao revend�-lo internamente.
"Ningu�m vai importar o diesel caro para vender mais barato no Brasil", resume Can�do.
Essa foi exatamente a preocupa��o que teria sido exposta pela Petrobras na apresenta��o ao governo.
Segundo as informa��es da Reuters, o documento afirma que "sem sinaliza��o de que os pre�os de mercado ser�o mantidos adiante, h� um risco concreto de escassez de diesel no auge da demanda, durante a temporada de colheita, afetando o PIB do Brasil".
Os especialistas afirmam ainda que a temporada de furac�es no Atl�ntico, que se estender� nesse ano de junho a novembro, tamb�m pode representar problemas para o fornecimento de diesel brasileiro.
"As refinarias americanas s�o a principal origem das importa��es do Brasil e boa parte delas est� concentrada na regi�o da Costa do Golfo dos EUA, que costuma ser uma das mais atingidas pela temporada de furac�es", diz Pedro Shinzato, da Stonex.
"Com as refinarias dos EUA em capacidade alta, um furac�o ou condi��es clim�ticas mais dif�ceis podem parar o refino ou a produ��o de petr�leo e fazer com que o mercado fique ainda mais justo", afirma Perez.

Vai faltar diesel mesmo?
Para os analistas consultados pela BBC News Brasil, uma falta pontual pode ser observada caso os fatores de risco se mantenham e n�o se encontrem alternativas vi�veis para o fornecimento.
Para Maur�cio Can�do, a possibilidade pode ser contornada caso a Petrobras decida buscar alternativas para a importa��o do diesel no mercado global e supra a demanda n�o atendida pelas importadoras privadas.
"Temos levantado que a Petrobras j� est� procurando fontes alternativas de oferta na �sia e �frica para driblar a diminui��o da oferta nos Estados Unidos", diz.
O especialista explica que esse processo seria mais custoso e demorado. Tamb�m significaria que a estatal precisaria arcar com os poss�veis preju�zos de vender o diesel no Brasil a pre�os mais baixos do que os praticados no mercado internacional.
"Mas acho improv�vel que a Petrobras decida n�o fazer isso diante de um risco de escassez, pois o maior acionista da empresa ainda � a Uni�o", afirma Can�do.
J� Felipe Perez acredita que a defasagem dos pre�os far� com que os estoques das refinarias nacionais acabem primeiro, mas n�o afetar� de imediato o ritmo de importa��es.
"As empresas que t�m a vantagem log�stica, competitiva, contratual e estrutural devem negociar primeiro com os refinadores brasileiros. Mas no final das contas o balan�o tem que ser fechado com as importa��es e esse pre�o vai ser o pre�o de mercado", diz.
Problemas de falta de suprimento foram relatados em Minas Gerais e no Distrito Federal entre mar�o e abril deste ano, mas os sindicatos que representam os revendedores de combust�veis nas duas regi�es afirmam que a situa��o j� se normalizou.
Ainda assim, Paulo Tavares, presidente Sindicombust�veis-DF, teme problemas no segundo semestre caso o consumo mundial de petr�leo russo permane�a abalado e a Petrobras mantenha sua pol�tica de pre�os.
"A manuten��o do pre�o do diesel em n�veis mais baixos do que os do mercado internacional pode fazer com que falte produto para as distribuidoras, porque elas n�o v�o importar o produto mais caro", diz.
"N�o creio que vai haver escassez geral, mas podemos ter novos relatos de falta em algumas regi�es e o pre�o certamente vai subir muito."

O presidente-executivo da Associa��o Brasileira dos Importadores de Combust�veis (Abicom), S�rgio Ara�jo, afirma que qualquer falta deve ser pontual.
"Em alguns munic�pios pode haver descontinuidade no suprimento por alguns dias, porque com a defasagem do pre�o, os importadores e as distribuidoras regionais n�o est�o importando tanto", diz.
"Nesse cen�rio, redes de postos de bandeira branca e outros consumidores menores ficam mais vulner�veis a eventual falta de produto."
Em resposta aos rumores, a ANP afirmou em nota que monitora o abastecimento nacional de combust�veis de forma sistem�tica, por meio do acompanhamento dos fluxos log�sticos em todo o territ�rio brasileiro.
"Na presente data, o abastecimento com diesel aos consumidores se mant�m regular", diz a ag�ncia.
Procurados, a Petrobras e o Minist�rio de Minas e Energia n�o responderam aos pedidos de coment�rio.
E o pre�o?
Os especialistas concordam que, com a continuidade nos problemas com a oferta mundial de diesel, o pre�o do produto nas bombas do Brasil pode continuar subindo.
"O pre�o pode aumentar sim na bomba em algumas regi�es. � o que acontece toda vez que a demanda corre por cima da oferta", explica Maur�cio Can�do.
"A primeira resposta a tudo que tem acontecido s�o os pre�os mais altos — algo que j� estamos vendo desde outubro, na verdade", pontua Pedro Shinzato.
Segundo analistas, o aumento afeta mais os consumidores finais principais do diesel — como caminhoneiros, operadores de servi�os de log�stica e transportadores de passageiros em coletivos.
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