
O vigor da economia no primeiro ano de mandato do pr�ximo presidente eleito ao Pal�cio do Planalto � visto de forma divergente pelo mercado financeiro e pelo governo. Esse descolamento das proje��es sobre o PIB (Produto Interno Bruto) de 2023 - superior a 2 pontos percentuais - ocorre de forma precoce quando se olha para todo o per�odo do governo Jair Bolsonaro (PL).
Em 2019, ambos oscilaram na mesma toada em dire��o ao PIB efetivo. J� o ano de 2020 foi marcado pelas incertezas decorrentes da pandemia de Covid e teve uma margem mais el�stica em julho, com mercado e governo prevendo um tombo maior do que o recuo que se concretizou. Em 2021, as perspectivas destoaram pouco ao longo do tempo, mas ficaram aqu�m do realizado.
Quanto ao PIB de 2022, o distanciamento das estimativas atingiu seu �pice no intervalo de novembro de 2021 a mar�o deste ano (1,5% do governo, ante 0,5% do mercado). Desde ent�o, as proje��es dos economistas da iniciativa privada convergiram em dire��o ao esperado pelo Minist�rio da Economia. Agora, ambos se encontram no patamar de 2%.
O pessimismo dos analistas vem sendo criticado abertamente pelo ministro Paulo Guedes (Economia), que repetiu em diversas ocasi�es que "o Brasil est� condenado a crescer" e que os economistas passariam o ano revendo seus n�meros para cima.
Chico Pessoa, economista da LCA Consultores, reconhece que o mercado errou ao ter subestimado a for�a do impacto da reabertura da economia, especialmente sobre o setor de servi�os.
Mas ele tamb�m cita o pacote de medidas tribut�rias e a libera��o de benef�cios sociais turbinados com a aprova��o de uma emenda constitucional �s v�speras da corrida eleitoral como motivos para um desvio inesperado das proje��es iniciais e, consequentemente, da revis�o de cen�rio.
Para o futuro, Pessoa olha com desconfian�a. "A gente tem uma situa��o fiscal ser�ssima para o ano que vem. Tem uma bomba fiscal armada", disse. "A taxa de juros muito alta combinada a um endividamento das fam�lias � um grande entrave para o PIB de 2023", acrescentou.
O Minist�rio da Economia prev� crescimento de 2,5% no pr�ximo ano, mas Guedes afirmou na �ltima sexta-feira (26) que o pa�s vai crescer "mais ainda" e a eleva��o do PIB pode ser de 3% ou de 3,5% em 2023. Os analistas do mercado, por sua vez, estimam alta de 0,39%, de acordo com o �ltimo boletim Focus, ap�s uma s�rie de revis�es para baixo nos �ltimos meses.
Em meados de julho, o secret�rio de Pol�tica Econ�mica do Minist�rio da Economia, Pedro Calhman, defendeu a estimativa do governo para o PIB do pr�ximo ano. "Desde maio, os indicadores de atividade est�o vindo mais fortes que o esperado. Vemos uma tend�ncia de crescimento forte da economia", disse. "N�o vemos motivos para reduzir nossa proje��o e estamos bastante convictos dela", completou.
Segundo a equipe econ�mica, o governo observa com mais �nfase o lado da oferta e incorpora em sua an�lise, entre outras informa��es, dados do volume de investimentos j� contratado para 2023 e de reformas microecon�micas realizadas nos �ltimos anos.
Para Guedes, os economistas est�o com os modelos de an�lise "errados". "Eles est�o com os modelos antigos, que dependiam de investimento p�blico. N�s j� mudamos o Brasil", disse o ministro em evento no Rio Grande do Sul.
De acordo com o subsecret�rio de Pol�tica Macroecon�mica do Minist�rio da Economia, Fausto Vieira, o potencial de crescimento do pa�s � maior do que os analistas estimam em seus modelos. "H� ind�cios de uma melhora do PIB potencial nos �ltimos anos e, por isso, a gente acaba tendo essa vis�o mais otimista que o mercado", afirmou.
Essa conclus�o foi tirada de um estudo feito pela SPE (Secretaria de Pol�tica Econ�mica), ao qual a Folha teve acesso, que comparou as proje��es do mercado financeiro na pesquisa Focus com o PIB efetivo de cada ano, no per�odo de 2000 em diante.
Entre 2011 e 2016, os analistas se mostraram menos conservadores e acabaram surpreendidos com dados mais negativos do que o previsto. De 2020 para c�, a tend�ncia se inverteu, com estimativas menos otimistas do que os dados efetivos divulgados pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estat�stica).
"� o terceiro ano seguido em que os dados realizados indicam que, no fim, h� dois desvios [desvio padr�o � um conceito estat�stico que expressa o grau de dispers�o de um conjunto de dados] acima do que o mercado projetava. Isso, para mim, � uma clara indica��o do PIB potencial maior", disse Vieira, sem quantificar o valor.
O economista da LCA Consultores diz que efetivamente o conservadorismo em rela��o �s proje��es tem a ver com frustra��es que foram vistas nos �ltimos anos, mas acrescenta a dificuldade de mensurar os impactos reais da pandemia e da inesperada pol�tica fiscal.
Para Juliana Inhasz, professora de economia do Insper, a vis�o mais positiva do governo tamb�m � uma forma de tentar transmitir confian�a aos agentes.
"O governo diz que est� tudo bem porque naturalmente precisa passar essa ideia de que est� sendo efetivo, at� para segurar um pouco esse balanceamento de riscos, mas n�o tem dado muito certo".
O subsecret�rio da equipe econ�mica nega que o governo seja otimista quanto aos n�meros. "Apesar das nossas proje��es superarem as de mercado, n�o fomos otimistas. Fomos conservadores, pois nos �ltimos tr�s anos, erramos o resultado final, o valor realizado do PIB ficou acima do que projet�vamos" disse Vieira.
Para 2023, o Santander prev� uma recess�o de 0,6%. Segundo Maur�cio Oreng, superintendente de pesquisa macroecon�mica do banco, o aperto monet�rio promovido pelo Banco Central � o principal fator para a contra��o do PIB no pr�ximo ano, al�m do arrefecimento dos pre�os das commodities. Atualmente, a taxa b�sica de juros (Selic) est� fixada em 13,75% ao ano.
"Para controlar a infla��o, infelizmente a gente precisa passar por uma desacelera��o da economia. A gente est� estimando que a taxa de juros vai atingir, no segundo trimestre do ano que vem, o n�vel mais contracionista desde 2003", disse.
O BNP Paribas cita, al�m dos efeitos do choque de juros, as potenciais restri��es fiscais e a desacelera��o global em 2023 para ter zero como proje��o para o PIB do pr�ximo ano.
"Independentemente de quem ganhar as elei��es, as contas p�blicas estar�o numa situa��o muito mais complicada", disse Gustavo Arruda, chefe de pesquisa econ�mica para Am�rica Latina do banco franc�s.
O economista ressalta que parte da receita extraordin�ria que o governo tem usado para manter a economia aquecida em 2022 se deve a imposto inflacion�rio, mas lembra que a infla��o vai desacelerar. Ele menciona ainda como obst�culo a retomada da discuss�o sobre reajuste salarial para o funcionalismo p�blico.
"Quando tento colocar os fatores que importam, n�o consigo imaginar de onde pode vir esse crescimento para o ano que vem. Fico mais na conta conservadora", resumiu.