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'Minha filha � a primeira da fam�lia, ap�s quatro gera��es de prostitutas, a ir para a faculdade e o orgulho n�o cabe no meu peito'

Sua m�e, av� e bisav� foram prostitutas, mas Karina N��ez come�ou a romper o ciclo atuando pelos direitos das mulheres e profissionais do sexo.


23/12/2020 07:55 - atualizado 23/12/2020 12:43


Karina Núñez fala em uma 'enorme' satisfação em ver Valeska na universidade(foto: Karina Núñez)
Karina N��ez fala em uma 'enorme' satisfa��o em ver Valeska na universidade (foto: Karina N��ez)

"Quando crian�a, sempre quis ser professora. Mas acabei me prostituindo, como minha m�e, minha av� e minha bisav�."

O relato � de Karina N��ez, 47, uma mulher que representa a quarta de gera��o de uma fam�lia de trabalhadoras do sexo no Uruguai — e que transformou essa hist�ria em ativismo.

Ela � hoje uma l�der sindical conhecida em seu pa�s, tendo em sua agenda n�o s� os direitos das mulheres e das trabalhadoras do sexo, mas tamb�m o combate � explora��o sexual de crian�as e adolescentes.

E foi justamente "com a ajuda de outras mulheres" que Karina conseguiu propiciar aquilo que talvez seja o maior orgulho de sua vida turbulenta, sobre a qual ela conversou com a BBC News Mundo (servi�o em espanhol da BBC).

"Minha filha � a primeira ap�s quatro gera��es de prostitutas a ir para a faculdade e o orgulho n�o cabe no meu peito", contou, falando de sua filha Valeska.

Mas antes de chegar neste cap�tulo, � preciso falar da pr�pria inf�ncia de Karina — que ela define como um misto de pobreza, incertezas e muita prostitui��o.

Um caminho conhecido

Por um tempo, a m�e dela chegou a deixar de se prostituir, pois um homem que ela conhecia quis tir�-la da subordina��o a um cafet�o e criar Karina como filha.

Mas eram tempos de ditadura civil-militar no Uruguai, como em muitos outros pa�ses da Am�rica Latina.

"Ele virou ent�o um preso pol�tico e nossa vida mudou completamente: minha m�e teve que voltar ao trabalho sexual."

Crescendo neste ambiente, o caminho dela logo se tornou o mesmo que de sua m�e, av� e bisav�.

"Quando voc� nasce no ambiente da prostitui��o, � muito dif�cil sair dele."

"O grau de estigmatiza��o em torno da minha forma de ganhar a vida gerou c�rculos n�o muito prop�cios para eu me desenvolver. Em um momento da minha vida, a t�nica dos meus dias era a apatia em rela��o � sociedade."

"Sempre achei que era preciso defender-se e, bem, se algo aconteceu com voc�, foi porque fez algo de errado — e voc� precisa aguentar. Eu n�o percebia que as coisas que me aconteciam eram produto de toda a vulnerabilidade que eu carregava na quarta gera��o de uma fam�lia de trabalhadoras do sexo."

O in�cio do sindicalismo


Karina Núñez se define como 'feminista popular'(foto: Karina Núñez)
Karina N��ez se define como 'feminista popular' (foto: Karina N��ez)

Com a quinta gera��o � sua frente, representada por suas filhas pequenas, Karina entendeu que queria romper este ciclo. E, para isso, percebeu que teria que lutar.

"� medida que fui derrubando barreiras e exigindo direitos para mim e minhas colegas, fui sendo reconhecida por elas como uma voz confi�vel."

"Foram elas que me deram o t�tulo de sindicalista e tudo mais. Mas eu realmente queria ser a melhor vers�o da Karina."

"Em 1999, denunciei uma rede de tr�fico que levou duas gurias para a It�lia e por isso fui espancada por nove cafet�es. Fiquei internada na UTI por 11 dias e demorei tr�s meses para caminhar novamente."

"Tive que esperar sete anos para ser ouvida e para ver processado o guarda que me entregou para a rede (dos cafet�es)."

"Mas hoje posso dizer que tudo isso valeu � pena."

Apesar de desejar desde o in�cio um caminho diferente para as filhas, Karina diz que a entrada na universidade n�o estava nos seus planos.

"N�o � esse o tipo de coisa que voc� pode escolher quando � pobre", conta a ativista.

"Na verdade, fui orientada por outras mulheres que, carinhosamente, me mostraram outra perspectiva. Elas me ajudaram a ver que eu poderia deixar de naturalizar o exerc�cio do trabalho sexual para as meninas."

Entretanto, Karina tira seu m�rito na chegada de Valeska � faculdade de recursos humanos, atribuindo isso � capacidade da filha de "desenvolver e explorar sua intelig�ncia".

Ainda assim, ela fala em uma satisfa��o "enorme" em ver a quinta gera��o de sua fam�lia chegando � universidade.

'O homem sempre p�de usar a mulher a troca de nada'


'A América Latina precisa de um debate aberto sobre o trabalho sexual e sobre a autonomia dos corpos', defende a sindicalista(foto: Getty Images)
'A Am�rica Latina precisa de um debate aberto sobre o trabalho sexual e sobre a autonomia dos corpos', defende a sindicalista (foto: Getty Images)

A prostitui��o � uma atividade regulamentada desde 2002 no Uruguai, um dos pa�ses mais liberais a esse respeito na regi�o.

"Acho que a Am�rica Latina precisa de um debate aberto sobre o trabalho sexual e sobre a autonomia dos corpos", diz Karina, que apesar de se denominar uma "feminista popular", admite que demorou a se reconhecer como tal.

"Se � real o preceito de que todos os corpos femininos s�o delas, por que ent�o os corpos das mulheres que consciente e livremente decidem oferecer servi�os sexuais n�o o s�o? Por que elas t�m que ser tuteladas por outras mulheres ou pelo Estado?", questiona, defendendo a regulamenta��o da atividade em outros cantos do mundo.

"O homem sempre p�de usar a mulher a troco de nada, e o fato das trabalhadoras cobrarem pelo que fazem me parece um importante s�mbolo de luta", afirma, mencionando o trabalho n�o pago das esposas na limpeza da casa e no cuidado dos maridos e seus familiares.

Novo livro

Hoje, a principal pauta que move Karina � a aprova��o de uma renda b�sica para trabalhadoras do sexo devido � pandemia de coronav�rus.

"Podemos conseguir pelo menos que elas possam pagar pela moradia. H� muitas colegas que infelizmente ficaram sem-teto porque n�o conseguem pagar aluguel."

Karina, autora de El ser detr�s de una vagina productiva ("O ser atr�s de uma vagina produtiva"), j� em sua terceira edi��o, est� escrevendo um novo livro previsto para 2021, com uma s�rie de contos sobre suas experi�ncias reais.

"Por que voc� acha que eu luto? Por que sou paga para fazer isso? Por que gosto de estar na frente das c�meras?", provoca a escritora em seu novo trabalho.

"Na verdade, voc� sabe por que eu luto? Porque se eu n�o lutar, outra pessoa o far�. Mas n�o com base nas minhas necessidades, mas nas deles. N�o com as minhas perspectivas, mas com as deles. N�o por causa da minha dignidade, mas sim por causa de seus privil�gios", responde a si mesma.


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