
As matr�culas desvinculadas respondem pela maior parte desse bolo. Elas dizem respeito a estudantes desistentes e desligados, ou seja, alunos que por iniciativa da institui��o tiveram a vaga cancelada – por abandono, descumprimento de alguma condi��o ou desligamento volunt�rio (quando o aluno sai da faculdade, mas n�o formaliza o cancelamento). E, nesse cen�rio de abandono, o baque maior � nas institui��es privadas.
Embora altos, os n�meros permaneceram est�veis at� 2013. Em 2014, houve aumento consider�vel de vagas ociosas (na casa de 400 mil) e, em 2015, explodiu, ultrapassando os 3 milh�es. O per�odo coincidiu com o fim do apogeu dos programas de sustenta��o do acesso e perman�ncia no ensino superior e com o in�cio de problemas envolvendo, principalmente, o Fundo de Financiamento Estudantil (Fies).
ONDA DE PROBLEMAS No fim de 2014, ainda na gest�o Dilma Rousseff (PT), institui��es privadas ficaram sem receber o pagamento do governo federal, o que obrigou, no in�cio do ano seguinte, faculdades e universidades a se mexerem para n�o entrar em colapso, por causa de mudan�as no repasse do dinheiro devido pela Uni�o. Al�m dos problemas administrativos, milh�es de alunos que dependiam do cr�dito passaram a ficar � merc� de uma onda de financiamentos incertos, contratos n�o renovados e, mais tarde, da limita��o das vagas nos semestres seguintes devido a novas regras.
O reflexo, somado � crise econ�mica, foi a dificuldade para ades�o e cumprimento dos crit�rios de acesso por parte dos alunos, segundo o diretor-executivo da Associa��o Brasileira de Mantenedoras de Ensino Superior (Abmes), S�lon Caldas. “No que tange � perman�ncia no ensino superior, as mudan�as ocorridas tamb�m deixaram de permitir que o aluno com dificuldades financeiras pudesse recorrer ao financiamento, o que fez com que a evas�o aumentasse e esses alunos ficassem de fora do sistema”, diz.
Ele lembra tamb�m os n�meros do Censo segundo os quais houve queda tamb�m nas matr�culas de novos ingressantes de 2014 para 2015 e mais ainda de 2015 para 2016. O freio no acesso ao ensino superior brasileiro, que vinha crescendo desde 2009, foi sentido pela primeira vez em 2015. A redu��o de ingressantes foi de 6,1%. Naquele ano, o pa�s perdeu 190.626 novos alunos em rela��o ao ano anterior – a rede privada foi a mais afetada, com uma perda de 176.445 universit�rios. Nos cursos presenciais, as novas matr�culas somaram 2.142.463 no ano passado. Em 2015, eram 2.225.663 (redu��o de 3,7%). “Em 2016, tivemos um crescimento negativo no ensino presencial em decorr�ncia da falta de financiamento para os alunos que n�o t�m condi��es de arcar com o investimento em educa��o”, afirma S�lon Caldas.
Segundo ele, para 2018, o cen�rio ainda � mais pessimista. “Ao aprovar a Medida Provis�ria 785/2017, no fim de outubro, a C�mara dos Deputados acabou de sepultar o programa de financiamento e o sonho de muitos brasileiros. A MP trouxe v�rias modifica��es que dificultam sobremaneira o acesso por parte dos alunos e a oferta de vagas no programa por parte das institui��es de ensino superior.”
SONHO INTERROMPIDO O sonho de ter em m�os o diploma do curso superior foi interrompido quando o desempregado Bruno Jos� de Oliveira Canuto, de 29 anos, estava no 6º per�odo de administra��o do Centro Universit�rio de Belo Horizonte (UNI-BH), ano passado, quando perdeu uma irm� para o c�ncer. No per�odo turbulento vivido pela fam�lia, ele se esqueceu de fazer o aditamento do Fies, a renova��o semestral do contrato de financiamento que permite manter o benef�cio. “Ao procurar a faculdade, ela me virou as costas e me cobrou uma d�vida de R$ 10 mil, a qual eu informei que n�o poderia pagar por receber apenas um sal�rio m�nimo. Perguntei sobre formas de pagamento, mas ela n�o me deu brecha para tentar voltar”, conta.
Agora, sem conseguir reativar o Fies e com o nome negativado pela institui��o de ensino, ele v� os juros correndo, relativos � d�vida do que j� usou do financiamento, e aguarda uma oportunidade para negociar com a Caixa Econ�mica Federal. “Se a situa��o melhorar, pretendo voltar � faculdade ano que vem, mas em outra institui��o e para outro curso: educa��o f�sica. Vou ter que come�ar do zero e devendo o que n�o conclu�”, relata. “Estou desempregado e fa�o bico de segunda a segunda � noite como entregador de sandu�che para ajudar minha m�e, que recebe pens�o de R$ 900, e cuidar da filha de 12 anos que minha irm� deixou. A d�vida vai correr, pois n�o vou tirar da minha fam�lia para pagar.”
Bruno ficou desmotivado, mas n�o pretende abandonar seus objetivos: “A gradua��o � meu sonho. Quero me formar e fazer aquilo que gosto, mas faculdade � para poucos. Se eu matar ou roubar tenho direito de fazer faculdade de gra�a na cadeia, como o Fernandinho Beira-Mar”. “A UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais) � p�blica, mas para quem tem tempo e consegue estudar, n�o para quem precisa comer livro at� as quatro da manh� para dar conta de um trabalho de faculdade. Capacidade de entrar todos temos, mas, nesses casos, a facilidade de entrar � muito menor.”
Novas faixas no Fies
Depois de aprovadas no Senado na quarta-feira passada, as mudan�as no Fies agora dependem apenas da canetada do presidente Michel Temer. Entre as principais altera��es est�o as formas de pagamento da d�vida e das taxas de juros do financiamento. O novo Fies vai gerar 310 mil vagas e ser� composto por tr�s faixas. Na primeira, ser�o oferecidas 100 mil vagas a juro real zero para estudantes com renda familiar per capita mensal de at� tr�s sal�rios m�nimos. Os recursos deste financiamento ser�o provenientes da Uni�o. J� as modalidades dois e tr�s est�o destinadas a estudantes com renda per capita mensal de at� cinco sal�rios m�nimos. Ter�o como fonte de financiamento recursos de fundos regionais no Nordeste, Centro-Oeste e Norte, no caso da modalidade dois, e do Banco Nacional de Desenvolvimento Econ�mico e Social (BNDES), na modalidade tr�s. Pelas regras atuais, depois de formado, o estudante tem prazo de at� 18 meses para come�ar a pagar as parcelas. As normas que entrar�o em vigor no in�cio do ano que vem acabam com o per�odo de car�ncia e exigem que o pagamento seja feito no primeiro m�s depois da conclus�o do curso. Agora, o estudante poder� consignar a d�vida � folha de pagamento, caso esteja empregado.

Exerc�cios para ocupar cadeiras
Cadeiras vazias nas faculdades Brasil afora se tornam sin�nimo de desperd�cio. De um lado, nas institui��es p�blicas, representam milh�es de estudantes que ficaram de fora do Sistema de Sele��o Unificada (Sisu) e outros processos seletivos. De outro, nas particulares, um rombo em vagas de programas essenciais para a perman�ncia de quem n�o tem condi��es de pagar mensalidade – as bolsas do Programa Universidade para Todos (Prouni) e o Fundo de Financiamento Estudantil (Fies).
De acordo com o Minist�rio da Educa��o (MEC), a ocupa��o das bolsas na fase de inscri��o dos candidatos chega a 100%. Mas, durante o processo que envolve o aluno e a institui��o privada, o jogo vira por diversas raz�es, ainda segundo a pasta: alunos que passaram em alguma institui��o p�blica, mudaram de cidade, diverg�ncia na comprova��o documental, simples desist�ncia, entre outros. Este ano, foram ofertadas 361.925 vagas e ocupadas 239.386. Ou seja, um ter�o delas se esvaiu. Para diminuir essa lacuna, o MEC anunciou m�s passado, dentro da Pol�tica Nacional de Forma��o de Professores, a inten��o de permitir a professores j� graduados serem beneficiados com bolsas do Prouni para fazer novos cursos de licenciatura. As bolsas ofertadas seriam justamente as que n�o foram preenchidas do processo aberto aos alunos.
No Fies, segundo o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educa��o (FNDE), gestor do programa, no primeiro semestre do ano passado foram 250 mil vagas ofertadas e preenchimento de pouco mais da metade (148.051) – 41% das vagas n�o foram preenchidas. Para diminuir o preju�zo, optou-se por abrir processos de vagas remanescentes. No primeiro deles, no segundo semestre, houve 75 mil vagas e 55.570 contratos firmados. O percentual de ociosidade foi reduzido para 26%. No primeiro semestre deste ano, foram 150 mil vagas ofertadas e 117.970 contratos firmados – 21,4% n�o foram ocupadas. O MEC informou que os n�meros do segundo semestre ainda n�o est�o conclu�dos, pois o processo de vagas remanescentes ainda est� em andamento.
As vagas n�o preenchidas no Fies nas primeiras chamadas tamb�m s�o redistribu�das e podem ir para outros estados, por isso o minist�rio n�o divulga os n�meros por estado. No Prouni, que tem dois processos seletivos durante o ano, tamb�m � previsto um cronograma para o processo de ocupa��o para as vagas remanescentes. As vagas n�o preenchidas n�o s�o ofertadas novamente no semestre seguinte.
O diretor-executivo da Associa��o Brasileira de Mantenedoras de Ensino Superior (Abmes), S�lon Caldas, ressalta que, para driblar a crise, v�rias institui��es de ensino superior fizeram parcerias com institui��es financeiras privadas para subsidiar juros e tornar mais acess�vel o financiamento aos alunos. Tamb�m ofertaram credito pr�prio, onde o aluno pagava parte da mensalidade enquanto estudava e outra parte, sem juros, depois de formado. O problema, diz ele, � que essa medida n�o atinge todos os alunos que precisam de uma pol�tica de governo: “De um lado, n�o conseguem atender a todas as exig�ncias dos bancos, e de outro, n�o conseguem arcar com parte da mensalidade enquanto estudam”.