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Estado de Minas

Doutorandos, mestrandos, professores e funcion�rios na mira da tesoura federal

Um dos s�mbolos da produ��o cient�fica na universidade, ICB tem a cada laborat�rio um pesquisador ou trabalho de ponta amea�ado pelo bloqueio anunciado pelo MEC


postado em 13/05/2019 06:00 / atualizado em 13/05/2019 08:36

Laboratórios do ICB que sofrem com falta de recursos abrigam pesquisas que estão ameaçadas em caso do corte de 30% de verba das federais anunciado pelo MEC (foto: Gladyston Rodrigues/EM/D.A Press)
Laborat�rios do ICB que sofrem com falta de recursos abrigam pesquisas que est�o amea�adas em caso do corte de 30% de verba das federais anunciado pelo MEC (foto: Gladyston Rodrigues/EM/D.A Press)

O laborat�rio de Gen�tica Celular e Molecular do Instituto de Ci�ncias Biol�gicas (ICB) da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) deveria ter excel�ncia garantida n�o apenas pelos trabalhos de alunos e professores, mas tamb�m pela estrutura f�sica. Mas basta uma conversa r�pida para, em pouco tempo, se inteirar dos problemas. O professor Vasco Azevedo, chefe do laborat�rio, cita o trabalho de colabora��o com a Fran�a e a quantidade de equipamentos de alto custo quebrados e, logo, parados. Apenas para consertar uma centr�fuga e dar a ela vida �til de mais uns cinco anos, o instituto precisa de R$ 18 mil. Cinquenta pessoas trabalham no laborat�rio, que conta tamb�m com filtros que precisam de cuidados especiais. “�gua � tudo para a gente. Se n�o tivermos �gua de boa qualidade, perdemos tudo”, diz.

Na entrada do laborat�rio, avistamos o doutorando Lu�s Cl�udio Lima, de 28 anos. Natural de Serrano, no interior do Maranh�o, ele passou em segundo lugar para o doutorado de gen�tica e, agora, se prepara para fazer uma parte do curso na Fran�a, no Instituto Agron�mico de Rennes. Mas a  conclus�o da p�s-gradua��o est� amea�ada pelo corte de 30% anunciado pelo Minist�rio da Educa��o (MEC), o mesmo que o faz temer ficar sem a bolsa. “Tenho uma responsabilidade social com esses alunos. Temos uma assimetria de doutores em rela��o ao Nordeste do pa�s. Imagina interromper o sonho de uma pessoa dessa?”, afirma o professor Vasco Azevedo.

(foto: Gladyston Rodrigues/EM/D.A Press)
(foto: Gladyston Rodrigues/EM/D.A Press)

A vida em jogo: 'Entrei na UFMG em julho de 2016, quando fiz o mestrado. Entrei no doutorado em 2018, e minha bolsa vai at� 2022. Hoje, tenho medo de perd�-la. Para as pessoas que v�m de outro lugar, a forma de se manter em Belo Horizonte � por meio da bolsa. Quando fiz gradua��o, morei em rep�blica, em S�o Lu�s (MA). Minha fam�lia n�o tem condi��es de bancar meus estudos. Minha pesquisa consiste em caracterizar o efeito anti-inflamat�rio de uma bact�ria que veio da Argentina, contra os danos inflamat�rios intestinais de um f�rmaco usado no tratamento de c�ncer. A vontade de ser pesquisador foi despertada ainda na gradua��o. Todo mundo aqui pensa em fazer um p�s-doutorado e ser professor universit�rio. � minha vida em jogo.'

Lu�s Cl�udio Lima, doutorando em gen�tica pelo ICB

 

ALTERNATIVAS O Instituto de Ci�ncias Biol�gicas (ICB) da UFMG trabalha uma diversidade de temas que o tornam refer�ncia em ci�ncias m�dicas e na parte ambiental. Leishmaniose, dengue e zika est�o no rol das pesquisas. L�, uma porta chama a aten��o. O professor Vasco Azevedo faz quest�o de entrar. “Aqui tem um geniozinho”, avisa. � uma refer�ncia ao pesquisador Gustavo Menezes, professor do Departamento de Morfologia e chefe do Centro de Biologia Gastrointestinal. Em seu laborat�rio, ele tem milh�es de reais em equipamentos.

Diante da situa��o cada vez mais cr�tica da universidade, Menezes optou por arrega�ar as mangas e procurar outras fontes de financiamento, para n�o interromper seus trabalhos nem os sonhos de seus alunos. Fechou parceria com o setor privado para fazer para empresas testes em troca de reagentes e promove eventos nos quais as marcas das companhias aparecem em troca de doa��o de insumos e equipamentos. Em seu espa�o, o �nico centro de excel�ncia da Nikon do Sul no mundo, s�o estudadas doen�as hep�ticas e o desenvolvimento de rec�m-nascidos. “Se a ideia � mudar para o financiamento privado, tem que ter planejamento estrat�gico. N�o se pode cortar assim. Duvido que haja uma pessoa que, se bem informada sobre o que � ci�ncia, n�o a valorize”, afirma Menezes.

(foto: Gladyston Rodrigues/EM/D.A Press)
(foto: Gladyston Rodrigues/EM/D.A Press)

Produzir ou comprar: 'Trabalho com temas que t�m impacto direto em todos os pa�ses do mundo. Sem recursos, outros pa�ses que n�o tiveram a ideia r�pido como eu v�o publicar na minha frente, por causa da velocidade de execu��o que ter�o. Estou vivendo um del�rio de que n�o existe crise e fazendo parcerias. H� cinco anos estou tentando reagir. Isso me atrasa um pouco, mas me prepara para uma realidade que parece irrevers�vel. A pesquisa no Brasil � extremamente dependente do financiamento p�blico. Pesquisa, enquanto investimento, � algo novo, tem apenas 80 anos. O primeiro mestre se formou h� 50. N�o temos mecanismos para p�r a iniciativa privada para resolver o corte governamental. Pode ser que no futuro sejamos mais dependentes do capital privado, mas leva anos. Tem gente indo para a rua (protestar contra os cortes), outros postando na internet e tem quem busque alternativas. Nenhuma a��o � mais importante que a outra e todas s�o v�lidas. A Alemanha anunciou 2 bilh�es de euros para a pesquisa at� 2030 esta semana. Vender commoditie, boi e farinha n�o vai p�r o pa�s na ponta. Em 2030, o Brasil estar� tentando, talvez, se recuperar, enquanto a Alemanha estar� muito na frente. Uma hora a conta vai vir. Se n�o produzir tecnologia agora, vai ter que comprar.'

Gustavo Menezes, professor do Departamento de Mrofologia e chefe do Centro de Biologia Gastrointestinal

 

Adiamentos e cortes que se multiplicam

A caminhada pelo ICB continua. As dificuldades, tamb�m. Na �rea chamada P3, de laborat�rios que exigem n�vel de seguran�a ainda maior, h� portas fechadas por falta de insumos e equipamentos adequados. No andar de baixo, em outro laborat�rio de gen�tica celular e molecular de responsabilidade do professor Vasco Azevedo, o aluno Wylerson Guimar�es Nogueira, de 26 anos, que veio de Bel�m (PA) para fazer mestrado em bioinform�tica, � mais uma v�tima do arrocho or�ament�rio na educa��o. Desde agosto ele estuda sem bolsa e o novo corte anunciado pelo MEC enterrou de vez a possibilidade do benef�cio. Em julho, ele faz as malas de volta para casa sem ter terminado o que come�ou.

(foto: Gladyston Rodrigues/EM/D.A Press)
(foto: Gladyston Rodrigues/EM/D.A Press)

Sobreviver no limite: 'Recebi o resultado da sele��o em meados de julho, para in�cio das aulas em agosto do ano passado. Havia 15 vagas, mas s� sete pessoas foram aprovadas. Passei em sexto. N�o sabia se ficaria, pois n�o haveria bolsa. Meu orientador no Par� conseguiu uma bolsa de projeto para tr�s meses e � com esse dinheiro que vivo at� hoje. Naquela �poca, informaram que s� voltaria a ter bolsa em fevereiro ou mar�o deste ano. Mas houve mudan�a de prioridade: as bolsas s� seriam concedidas aos aprovados em primeiro lugar nos processos de sele��o seguintes. Assim, a data para minha bolsa mudou para julho. Eu me programei para isso, mas, agora, houve nova mudan�a de prioridade e a bolsa ficou para fevereiro de 2020. J� n�o adianta mais nada, pois defendo a disserta��o no fim do ano. Meus pais me ajudam no aluguel e com as contas fixas, mas n�o tem sido f�cil. Fico no limite. Sabendo que essa situa��o era poss�vel, me esforcei para cumprir todas as obriga��es presenciais. S� preciso defender e participar de uma apresenta��o obrigat�ria de semin�rio. Escolhi vir para c� n�o s� pelo programa, mas pelo networking, o ambiente de trabalho e pesquisa. Mas terei de voltar em julho. N�o tenho condi��es de ficar.'

Wylerson Guimar�es Nogueira, mestrando em bioinform�tica

 

CORDA BAMBA Assim como pesquisas, laborat�rios e projetos de estudantes e professores, os funcion�rios terceirizados est�o na corda bamba caso o bloqueio or�ament�rio das universidades se mantenha. A pr�pria Reitoria da UFMG j� anunciou que, al�m de n�o conseguir pagar contas de consumo, n�o conseguir� tamb�m honrar contratos de presta��o de servi�o. A not�cia � uma volta a um passado triste e recente para um funcion�rio que pediu para n�o ser identificado, por n�o ter autoriza��o da empresa prestadora para dar entrevista. O ano era 2016 e as universidades enfrentavam mais um corte em suas finan�as, depois de uma queda de recursos de 33% no ano anterior. Os rumos que 2019 desenha n�o s�o muito diferentes.

'Arrebenta pra gente' - Servidor terceirizado


“A empresa perdeu o contrato numa universidade privada e veio para c�. Em julho, saiu a not�cia das demiss�es. Todo mundo assinou aviso pr�vio. Entre os porteiros, dos 80, ficaram quatro. Agora, � a volta da inseguran�a. H� boatos de que v�o cortar novamente e tudo arrebenta para o lado da gente. No CAD 3 (Centro de Atividades Did�ticas), s� tr�s faxineiras t�m de dar conta do pr�dio daquele tamanho. O Icex (Instituto de Ci�ncias Exatas) tamb�m cortou. Sou casado e tenho um filho de 9 anos. Minha mulher trabalha, mas n�o � com carteira assinada. Todo mundo tem seus sonhos, mas n�o pode correr atr�s deles, porque a qualquer momento pode ser mandado embora. N�o tenho mais internet e diminu� a compra de supermercado. Ia trocar o carro, ano 2000, por um mais novo. Agora n�o tenho coragem. O corte � inevit�vel. Nosso contrato vai at� 2021 e podemos ser mandados embora da terceirizada a partir do ano que vem. Mas, se precisar, ela corta assim mesmo. Estava achando que tudo ia melhorar. Parece que est� pior.”

 

 


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