
Aos 3 anos de idade, a cabeleireira Maria da Piedade Cruz, hoje com 51, teve poliomielite. Na inf�ncia, morava no interior do Maranh�o, na cidade de Bacabal. Pela falta de informa��o e a aus�ncia de vacinas nas unidades de sa�de pr�ximas � casa onde morava, ela n�o recebeu a vacina��o. Por conta da doen�a, perdeu todos os movimentos dos membros inferiores.
Hoje, Piedade faz quest�o de alertar amigos e clientes sobre a import�ncia da vacina��o. “As pessoas costumam perguntar sobre o que aconteceu comigo e eu conto. Sou um exemplo vivo. Todos os dias, falo para as pessoas tomarem cuidado, pois as vacinas s�o muito importantes. Falta de uma me deixou sequelas e pode at� levar � morte”, alerta.
De acordo com o infectologista Leandro Machado, a falta de informa��o ainda � um dos grandes motivos da baixa procura pelas vacinas. Ele ressalta que a popula��o precisa entender que vacina n�o � uma teoria da conspira��o, pelo contr�rio, t�m um papel essencial: o de proteger. “O fato de estar vacinado n�o quer dizer que a pessoa n�o vai mais ficar doente. Nenhuma vacina tem prote��o de 100%, e isso causa estranheza na popula��o. Essas informa��es devem ser trabalhadas nas redes sociais, nas escolas, nas novelas e, principalmente, dentro de casa”, elenca.
A dona de casa Cristiane Martins, 38, faz quest�o de manter em dia o cart�o de vacinas dos filhos Gustavo,14, e Gabriela, 6. Desde o nascimento dos dois, ela identificava a vacina��o como parte essencial da sa�de das crian�as. “Para mim, � muito importante manter a caderneta em dia, porque sei que, com as vacinas, est�o protegidas de v�rias doen�as”, ressalta.
Al�m do cuidado com os filhos, Cristiane e o marido mant�m as pr�prias vacinas em dia. Al�m de cuidar da sa�de, eles querem ser exemplo para Gustavo e Gabriela. “Todos os pais e respons�veis tamb�m devem seguir o calend�rio vacinal. � importante para diminuir os riscos de qualquer doen�a. Aqui em casa, todos n�s sabemos dessa import�ncia. Estamos todos vacinados.”
Coisa de adulto tamb�m
A enfermeira e t�cnica de imuniza��o da Secretaria de Sa�de do DF Fernanda Ledes Brito afirma que n�o existe vacina mais ou menos importante, todas t�m sua relev�ncia. Por isso, � necess�rio que elas estejam em dia, independentemente da faixa et�ria. Ela ressalta ainda que, historicamente, as vacinas s�o tratadas como algo para as crian�as, mas que � necess�rio desmistificar esse pensamento.
“Os pais geralmente se preocupam com as vacinas dos filhos at� os 4 anos, na adolesc�ncia, se esquecem, e, na fase adulta, mais ainda. Temos 19 vacinas no calend�rio e todas devem ser devidamente tomadas. O fato de algumas contarem com apenas uma dose, outras mais, n�o tira a import�ncia delas”, destaca.
Fernanda lembra que o calend�rio do Minist�rio da Sa�de � um dos mais completos do mundo, deixando para tr�s diversos pa�ses desenvolvidos que n�o oferecem a mesma quantidade de vacinas gratuitas que no Brasil. “E todas s�o vacinas seguras. As pessoas daqui deveriam valorizar o quanto antes. Inclusive, v�rios postos de sa�de estenderam o hor�rio de atendimento e agora funcionam at� aos s�bados para alcan�ar as pessoas que n�o t�m tempo durante a semana”, complementa.
O sucesso do Z� Gotinha
Uma das a��es de maior sucesso da sa�de no Brasil est� na campanha de vacina��o. Ganhou at� mascote, o personagem Z� Gotinha. Criado em 1986 pelo artista, jornalista e publicit�rio Darlan Rosa, o boneco se mant�m at� hoje como s�mbolo das imuniza��es.
O artista atendeu a um convite do Minist�rio da Sa�de, com apoio do Fundo das Na��es Unidas para a Inf�ncia (Unicef), para marcar o compromisso assumido pelo Brasil de erradicar a poliomielite at� 1990. A escolha do nome do personagem foi feita por meio de um concurso com a participa��o de estudantes de todo o pa�s.
“Com a cria��o do boneco, na primeira campanha, o Brasil registrou 96% de cobertura vacinal. O resultado � sempre bastante positivo. Eu me orgulho muito de ter criado o Z� Gotinha, principalmente por ter sido em uma �poca com pouca tecnologia. Existia pouca coisa de desenho 3D, e tive de aprender tudo sozinho em tr�s meses, com a ajuda dos meus filhos, que ainda eram pequenos. Foi a coisa mais importante que fiz na minha vida”, garante Darlan Rosa.
Sem medo
Veja dicas de como ajudar os filhos a n�o temerem a hora da vacina:
- O momento da vacina deve come�ar em casa, com uma conversa sobre o que vai acontecer. Crian�as reagem bem a combinados e ao que elas conhecem;
- Explique que a vacina � importante para a prote��o dela, mas que precisa que ela seja corajosa e suporte a picadinha;
- Mostre que est� atento a seus temores e preocupa��es, al�m de refor�ar que voc� ou a pessoa que vai acompanhar estar� l� dando todo o apoio, tanto para que supere os medos como para que nada de ruim aconte�a;
- Durante a vacina, esteja junto, converse para distrair a mente e, caso seja uma inje��o, n�o deixe que ela fique olhando a agulha ser preparada;
- Incentivos, como premia��es, podem ser usados, mas com cautela. N�o se deve dar um presente quando ela cumpriu algo que era uma obriga��o ou ela poder� ficar acostumada a s� fazer coisas mediante recompensa;
- Parabenize-a quando conseguir tomar a vacina, por sua for�a e coragem, reforce que n�o doeu tanto como ela pensava;
- Em casos de crian�as que, mesmo assim, choram muito ou precisam ser seguradas, converse e tente explicar que ela � uma pessoa forte, que n�o h� problema em sentir medo e que ela vai conseguir superar;
- Tente refletir com ela que foi muito mais uma quest�o de tens�o do que da dor propriamente dita.
Quatro perguntas para Marta Carvalho, analista de sa�de e t�cnica de imuniza��o
O que faz as pessoas procurarem menos as vacinas?
Nas d�cadas de 1970 e 1980, as pessoas morriam por doen�as infectocontagiosas. Hoje, com o envelhecimento da popula��o, elas morrem mais de doen�as cr�nicas. Muitos n�o viveram naquela �poca, portanto n�o acreditam nas vacinas. Elas acreditam mais nos rem�dios. As doen�as que s�o prevenidas por vacinas hoje s�o consideradas antigas. Por isso, procuram
menos, porque acreditam que elas acabaram.
Personagens como o Z� Gotinha podem ajudar no processo de aceita��o das vacinas?
Acho que sim. O Minist�rio da Sa�de colocou agora a Xuxa nas propagandas, porque os baixinhos dela hoje s�o pais. E ela, como formadora de opini�o, vai propagar essa mensagem, que � t�o importante
Algumas doen�as infectocontagiosas deixam sequelas. Elas s�o revers�veis?
A grande maioria � irrevers�vel. A paralisia infantil, por exemplo, fica para o resto da vida. Meningite, quando n�o leva a �bito, causa cegueira e surdez. O sarampo tamb�m causa surdez. Nestes casos, todas as sequelas s�o irrevers�veis.
Se uma pessoa chega � fase adulta sem pegar nenhuma das doen�as infectocontagiosas, elas podem aparecer de forma mais agravada ou as chances s�o menores?
Ela vem de uma forma mais agravada, sim. Quem n�o teve catapora na inf�ncia e tem na fase adulta, contrai uma mais grave. Antigamente, quando um filho pegava alguma dessas doen�as consideradas da inf�ncia, os pais colocavam os outros filhos junto para que todos fossem contaminados de uma vez. Na fase adulta, a chance de vir grave � de 90%. Existe tamb�m a possibilidade de nunca pegar. Tem gente que n�o pega nem gripe.
Prepara��o sem estresse

A palavra vacina causa terror em v�rias crian�as e adolescentes. O ambiente hospitalar �, muitas vezes, assustador para eles. E � neste momento que alguns pais acabam sofrendo tamb�m com a “dor” dos filhos e falhando no calend�rio vacinal. Mas � preciso muita calma e di�logo para dar aquela for�a para a crian�ada.
A gerente administrativa J�ssica Correa, 30 anos, � m�e da Ana Clara, 11, Anne Vict�ria, 8, e Isabelle Evy, 6. As tr�s sentem medo na hora de se vacinar. De acordo com ela, o que mais assusta as meninas � a agulha e, mesmo na hora da vacina em gotas, elas acabam desconfiando e sempre esperam pela “picadinha”.
“N�s prezamos sempre pela verdade. Explicamos que haver� um inc�modo r�pido, como uma picadinha, e que logo passar�. Ressaltamos que isso � importante para a preven��o de doen�as. Durante toda a vida foi esclarecido a import�ncia da vacina��o em casa, e isso � tratado como algo de extrema necessidade para elas e para as pessoas que as rodeiam”, conta J�ssica.
Como estrat�gia e apoio �s filhas, ela e o marido d�o todo o amor e carinho no dia da vacina��o. A gerente administrativa afirma que as medidas surtem efeito positivo. “Sempre que poss�vel, agendamos
vacinas nossas ou de uma das irm�s para o mesmo dia. Assim, elas se sentem mais confiantes e, caso vier aquele desespero e choror�, abra�amos muito. O amor cura”, diz.
H� pouco tempo, a jornalista Graziela Moura, 36, passava pela mesma situa��o. No entanto, foi surpreendida quando o filho, Davi, 5, tomou a vacina contra o v�rus Influenza H1N1 este ano e n�o sentiu medo. Ela contou que, antes, ele temia todo tipo de vacina.
“Acredito que ter uma conversa franca com a crian�a, dizer que h� um certo desconforto na hora da picadinha da agulha e que � um ‘mal’ necess�rio para que ele fique imune a doen�as traz uma certa dose de aceita��o, digamos assim. Ouvir isso dos pais e vendo os pais tomarem vacina tamb�m � muito importante. Afinal, as palavras t�m for�a, mas nada como o exemplo”, frisa Graziela.
Apoio essencial
A psic�loga Lia Clerot explicou que os ambientes de sa�de costumam ser bastante austeros e frios para uma crian�a, o que acaba contribuindo para o medo. Ela ainda destaca que, por ser um espa�o com pessoas desconhecidas querendo aplicar algo nos pequenos, � uma situa��o estranha e at� mesmo assustadora.
“Esses locais, para algumas crian�as, ainda podem trazer mem�rias de dias em que elas estavam doentes, e sentindo mal. Mesmo que seja apenas tomar uma vacina de gotinha, a crian�a pode se sentir acuada, com sentimentos negativos, medo do que pode lhe acontecer, ficar temerosa do sabor — afinal de contas, os rem�dios muitas vezes t�m gosto ruim — ou mesmo de sentir dor”, observa.
O ideal � que os pais n�o supervalorizem a dor nem comparem o filho com outras crian�as. Para ela, � importante destacar que cada indiv�duo tem seus pr�prios sentimentos e emo��es e acabam reagindo de formas diferente a cada situa��o. “N�o � porque um lidou tranquilamente com a situa��o que o outro vai seguir os mesmos passos. N�o se trata de uma competi��o, e isso aumenta ainda mais a tens�o e a ansiedade”, alerta.