Arte popular d� li��es de resist�ncia � crise em Minas
Of�cios antigos no estado reconhecidos pela identidade cultural, gera��o de emprego e renda driblam efeitos da pandemia e se recuperam, como mostra s�rie do EM
Patrim�nio cultural de Minas, arte em barro do Jequitinhonha teve cole��es encomendadas por redes do varejo e ganhou visibilidade na TV (foto: Leandro Couri/EM/D.A Press)
A retomada do turismo, feiras e eventos cerca de um ano e meio ap�s os primeiros diagn�sticos de COVID-19 no Brasil renova o �nimo nas oficinas do rico e diversificado artesanato em barro do Vale do Jequitinhonha, patrim�nio cultural de Minas Gerais reconhecido pelo Instituto Estadual do Patrim�nio Hist�rico e Art�stico (Iepha).
Enraizada no cotidiano das comunidades que vivem no Alto, M�dio e Baixo Jequitinhonha, a atividade conta com o talento e a criatividade de gera��es de ceramistas para enfrentar as dificuldades e o baque nas vendas.
O necess�rio isolamento social para conter o coronav�rus afetou o com�rcio dessa arte por per�odos longos de quarentena, mas artes�s de Coqueiro Campo, na cidade de Minas Novas, e Campo Alegre, em Turmalina, encontraram alternativa. Elas se dedicaram a cole��es formadas por milhares de pe�as utilit�rias e decorativas encomendadas pelas grandes redes de varejo Tok&Stok e Camicado.
N�o faltaram esperan�a e vida ao trabalho que transforma barro em bonecas, panelas, vasos, borboletas e flores, de formas e cores variadas, segundo a presidente da Rede de Artesanato do Vale do Jequitinhonha, Maria do Carmo Barbosa Sousa.
“Temos uma hist�ria bonita, de evolu��o”, define Maria do Carmo. Contribuiu ainda para manter a produ��o, – que al�m de fazer parte de uma identidade mineira gera emprego e renda –, o ganho de visibilidade das pe�as. Em plena pandemia, flores de barro modeladas no Jequitinhonha decoraram um dos ambientes da casa do “Big brother Brasil”, da TV Globo.
Atuando h� 24 anos nos teares de Resende Costa, Divonei dos Reis participa de estrat�gias renovadas, como vendas on-line e representa��o (foto: Ed�sio Ferreira/EM/D.A Press)
Na por��o meridional da Serra do Espinha�o, nos munic�pios de Diamantina, Presidente Kubitschek e Buen�polis, a coleta das flores sempre-vivas, tradi��o centen�ria, e o artesanato feito com essa planta nativa ensaiam recupera��o com iniciativas importantes para valoriza��o desses trabalhos, como destaca Maria de F�tima Alves, uma das coordenadoras da Comiss�o de Defesa dos Direitos das Comunidades Extrativistas (Codecex). “As comunidades se valeram da sua hist�rica resili�ncia em per�odos de crise”, afirma.
O design de artesanato voltado ao turismo e ao consumo regional se junta � busca de parceria com escolas para cria��o de pe�as e produtos, e o surgimento das feiras virtuais. O reconhecimento, no ano passado, do Sistema Agr�cola Tradicional de Apanhadores (as) de Flores Sempre-vivas como patrim�nio agr�cola mundial pela Organiza��o das Na��es Unidas para a Alimenta��o a e Agricultura (FAO/ONU) amenizou a crise nas vendas.
Novos modelos explorando a beleza das flores nativas, como as sempre-vivas, e as artesanais ajudam na recupera��o das vendas (foto: Leandro Couri/EM/D.A Press)
Hist�rias de supera��o e reformula��o do com�rcio de produtos artesanais sem comprometer a originalidade de of�cios antigos e ligados � cultura e ao patrim�nio em Minas s�o tamb�m relatadas em outros polos que deram fama e identidade a essa arte, ao mesmo tempo uma cadeia produtiva do estado.
� o que vai mostrar esta segunda parte da s�rie de reportagens “Reinven��o das nossas tradi��es”, do Estado de Minas. H� poucas estimativas sobre a import�ncia da arte popular para a economia. Os dados dispon�veis indicam entre 300 mil e meio milh�o de artes�os atuando numa cadeia produtiva que pode movimentar mais de R$ 2 bilh�es por ano.
Aliar o talento de novas cole��es � capacidade de manejar as vendas digitais ocupou parte da rotina das bordadeiras de Caet�, na Regi�o Metropolitana de Belo Horizonte. “Da noite para o dia, tivemos que aprender a mexer com a internet, com a plataforma Zoom, enfim, aprender as novas tecnologias”, conta, bem-humorada, L�da das Gra�as Costa Ferreira, integrante da rec�m-criada Associa��o das Bordadeiras e Artes�os de Caet�.
Dificuldades e incerteza ainda persistem na produ��o das famosas panelas e esculturas em pedra-sab�o de Outro Preto, Mariana e Congonhas (foto: Juarez Rodrigues/EM/D.A Press %u2013 21/5/21)
Em Barra Longa, na Zona da Mata mineira, os bordados de duas dezenas de mulheres dedicadas �s agulhas e linhas foram usados pelo estilista Ronaldo Fraga em desfile na badalada S�o Paulo Fashion Week. “Foi muito bom, nos ajudou muito, deu visibilidade e fortaleceu nosso trabalho, que � diferenciado”, diz Ana Maria Pereira, presidente da associa��o local de artes�s, grupo que ainda n�o se recuperou dos efeitos do rompimento da barragem da Mina do Fund�o, da Vale, em Mariana, na Regi�o Central de Minas.
H� registros da atividade do bordado em 714 munic�pios mineiros e outras 44 cidades produzem artesanato em renda. S�o of�cios que alcan�am quase 89% do estado, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estat�stica (IBGE).
Trabalhos das bordadeiras de Caet� ganharam valor em cole��o do estilista Ronaldo Fraga e buscaram clientes pelas redes sociais (foto: Ed�sio Ferreira/EM/D.A Press
)
Renova��o
Com 200 anos de hist�ria da tecelagem artesanal, Resende Costa, na regi�o do Campos das Vertentes, tamb�m experimenta novos caminhos para as vendas e amplia mercados para a produ��o que transformou a cidade, neste ano, na Capital Mineira do Artesanato T�xtil. O com�rcio on-line e a atra��o de novos clientes pelos atacadistas s�o algumas das sa�das encontradas nesses novos tempos da atividade.
Experiente na produ��o e dona de uma das 80 lojas instaladas no munic�pio, Andr�ia da Silva Resende Santos acredita ter vencido a turbul�ncia, ap�s ter recontratado os quatro trabalhadores que demitiu no ano passado e ter aberto mais tr�s vagas. “Antes da pandemia, tinha apenas um celular, agora tenho quatro, pois h� muitos pedidos. Se n�o for assim, n�o dou conta de atender todo mundo,”diz.
As vendas digitas t�m sido fundamentais na recupera��o do neg�cio do artesanato, um dos segmentos da chamada economia criativa que mais sofreram os efeitos da pandemia de COVID-19, de acordo com Amanda Guimar�es, analista do Servi�o de Apoio �s Micro e Pequenas Empresas (Se- brae) de Minas Gerais. Pesquisa realizada pela institui��o, de 27 de maio a 1º de junho �ltimo, mostrou que os pequenos neg�cios enfrentaram queda de 77% do faturamento quando comparado a um m�s de comercializa��o considerada normal.
“O com�rcio digital veio para somar, refor�ar a divulga��o dos produtos artesanais, mas n�o exclui o modelo presencial e nem o substitui”, afirma Amanda Guimar�es. O Sebrae Minas tem apoiado o setor com oferta de cursos de capacita��o digital, de marketing e vendas. As feiras virtuais t�m ajudado os artes�os, mas nunca ser�o a principal via de com�rcio do setor, como observa T�nia Machado, que comanda a organiza��o n�o governamental Instituto Centro Cape, respons�vel pela organiza��o da tradicional Feira Nacional de Artesanato (FNA).
“O consumidor tem de se identificar com o produto, conhecer a sua hist�ria e se emocionar. Isso se d� por meio das feiras, dos eventos e do turismo”, enfatiza. A 32ª edi��o da FNA ser� realizada, com protocolos sanit�rios e vers�o on-line, de 7 a 12 dezembro no Centro de Conven��es Expominas, em BH.
A for�a e o encanto do artesanato em madeira de Prados mantiveram a demanda por esculturas de artes�os como Jo�o Tiago da Silva (foto: Ed�sio Ferreira/EM/D.A Press
)
Encomendas
Conhecidos pela expressividade do artesanato em madeira de Minas Gerais, na Vila Carassa, em Prados, e no distrito Vitoriano Veloso, chamado de Bichinho, esculturas de animais, imagens de santos, orat�rios, objetos utilit�rios e pe�as decorativas voltaram a receber admiradores, com o retorno do turismo. Cerca de 3 mil pessoas, 30% dos moradores, est�o ligadas direta e indiretamente � atividade criativa.
� reportagem do EM, que recebeu em seu ateli�, o artes�o Jo�o Juli�o, sobrenome que ganhou fama nessa arte, diz ter passado pelos piores momentos da pandemia de COVID-19 sem parar de trabalhar. “N�o tive folga e tenho encomendas para os pr�ximos quatro meses. Vendi muito, principalmente, para S�o Paulo”, afirma.
Ainda enfrentando as perdas com o sumi�o dos turistas, os produtores das panelas e esculturas em pedra-sab�o dos munic�pios hist�ricos de Congonhas, Mariana e Ouro Preto vivem incerteza. Na Cidade dos Profetas, o artes�o Ant�nio Nascimento, de 72 anos, tem trabalhado para atender a encomendas, em ritmo lento, mas de recupera��o. Em assist�ncia aos artes�os de Cachoeira do Brumado, a Prefeitura de Mariana vai pagar o frete do transporte de mat�ria-prima buscada em Santa B�rbara e assumir� a limpeza dos locais de produ��o, que geram muitos res�duos.