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Estado de Minas

Prescri��o por lentid�o do judici�rio garante impunidade a franc�s

Estrangeiro dirigia alcoolizado quando bateu em carro com cinco amigos na Savassi. Uma das v�timas continua em estado vegetativo


postado em 20/06/2012 06:00 / atualizado em 20/06/2012 06:54

 "Estou no Brasil. Aqui nada acontece", Olivier Rebellato, franc�s que causou acidente em Belo Horizonte, na �poca, ao duvidar que seria punido

 

Carro em que estavam as vítimas ficou destruído com a colisão.(foto: Sidney Lopes/EM/D.A Press - 17/4/09)
Carro em que estavam as v�timas ficou destru�do com a colis�o. (foto: Sidney Lopes/EM/D.A Press - 17/4/09)


Madrugada de sexta-feira. Em clima de festa, cinco amigos voltam de uma boate pela Rua Alagoas, na Savassi, Zona Sul de Belo Horizonte, em um Mercedes Classe A, sem saber que seus destinos mudar�o em fra��o de segundos. Ao passar pelo cruzamento com a Avenida Crist�v�o Colombo, por volta das 3h50, o carro em que est�o � destru�do por um Chevrolet Captiva, dirigido pelo franc�s Olivier Rebellato. Quem v� o acidente conta que o estrangeiro, sem habilita��o regular no Brasil, passou direto pelo sinal vermelho, em alta velocidade. Todos os ocupantes do Classe A se feriram e, desde ent�o, uma jovem, hoje com 29 anos, est� presa � cama, em estado vegetativo. Naquele 17 de abril de 2009 come�ava um enredo de irresponsabilidade, impunidade, injusti�a, dor e revolta que teve um dos principais cap�tulos encerrado ontem. Beneficiado pela mesma Justi�a da qual zombou, o franc�s, que dirigia alcoolizado, n�o pode mais ser responsabilizado criminalmente. Mais de tr�s anos ap�s o acidente, as v�timas foram ontem notificadas de que a demora em julgar o caso fez com que o processo prescrevesse. “� um absurdo, d� raiva, mas eu j� esperava. A gente sabe que a impunidade � regra no Brasil”, revolta-se Andr� Eduardo Magalh�es, de 29 anos, que ficou em coma por 30 dias ap�s o desastre.

Teste do bafômetro constatou que Olivier Rebellato dirigia sob efeito de álcool (foto: Sidney Lopes/EM/D.A Press - 17/4/09)
Teste do baf�metro constatou que Olivier Rebellato dirigia sob efeito de �lcool (foto: Sidney Lopes/EM/D.A Press - 17/4/09)
O franc�s tamb�m sabia da regra. Tanto que, mesmo sabendo da gravidade do acidente que provocou, debochou da situa��o, dizendo que, por estar no Brasil, nada aconteceria. E foi al�m: acrescentou que o caso s� teve repercuss�o por que ele dirigia “um carro caro”, e n�o “um Fusca”. A situa��o de desamparo das v�timas – que assistiram impotentes ao causador do sofrimento ser solto, ter o passaporte devolvido por decis�o judicial, fugir e agora ser livrado devido � demora da Justi�a – n�o � um caso isolado. S� neste ano prescreveram 11 processos relativos a crimes de tr�nsito em Minas Gerais. Acidentes em que condutores alcoolizados mataram, feriram ou conduziram seus ve�culos de forma irrespons�vel. Em todos os autos os magistrados deixam claro sua insatisfa��o com a lentid�o do Judici�rio, que culminou na extin��o da puni��o. No ano passado foram 30 processos de tr�nsito nessa situa��o, 33 em 2010 e 16 em 2009.

O franc�s Olivier Rebellato, ent�o com 20 anos, foi preso em flagrante no dia do acidente e denunciado pelo Minist�rio P�blico por tr�s crimes de tr�nsito: conduzir ve�culo sob efeito de �lcool, dirigir sem habilita��o e por causar les�o corporal culposa nas v�timas do acidente. Seis meses depois, a Justi�a concedeu a ele liberdade provis�ria, condicionada ao pagamento de R$ 5.935,57 de fian�a. Tamb�m devolveu-lhe o passaporte. Assim que recebeu o documento, o estrangeiro deixou o Brasil e se refugiou na Fran�a, onde est� “a salvo”, j� que o pa�s n�o extradita seus cidad�os. Como o acusado desapareceu, a Justi�a ordenou sua pris�o preventiva, medida que acabou cassada com a prescri��o do crime.

As falhas que garantiram a impunidade ao franc�s indignaram o pr�prio desembargador que constatou a prescri��o, Renato Martins Jacob. Ele n�o quis comentar o processo, mas suas palavras no texto jur�dico soam como um desabafo envergonhado. Na decis�o, o magistrado considera que Olivier “praticou grav�ssimo delito de tr�nsito”. Ele vai al�m, admitindo n�o ter perspectivas de que a Justi�a prevale�a sobre a impunidade nos crimes de tr�nsito: “O quadro � de impot�ncia e de desalento. Triste pa�s. �s v�timas – cujas sequelas psicol�gicas agora s�o agravadas pela impunidade – resta-me pedir perd�o, porque sou pe�a de um Judici�rio moroso e que n�o se sensibiliza com trag�dias como a descrita nos presentes autos”, escreveu.

As linhas da decis�o seguem tecendo cr�ticas � legisla��o brasileira e � in�pcia do sistema judici�rio. “O paciente foi responsabilizado pelo cometimento de crime culposo, cuja pena, como todos sabem, n�o se mostra suficiente para cumprir a sua finalidade de preven��o e repress�o do crime”, diz o texto da decis�o. Jacob completa, destacando que o que j� n�o era rigoroso, se torna ainda pior e incentiva os comportamentos criminosos. “A insufici�ncia da pena ainda produz efeito mais nefasto no seio da comunidade, na medida em que propicia a prescri��o da pretens�o punitiva do Estado, causa, essa, de mais descren�a e certeza da impunidade.”

O advogado e diretor do Instituto de Defesa do Direito de Defesa (IDDD) F�bio Tofic considera a prescri��o um importante instrumento para impedir que a inefici�ncia do Estado culmine em puni��o antes do julgamento. Contudo, essa mesma incompet�ncia, na sua vis�o, traz impunidade. “O que era uma garantia para que o acusado n�o ficasse indefinidamente sujeito ao processo e um limite para que sua culpa fosse provada se tornou um alento para quem comete crimes”, disse. Para o especialista em direito criminal, as mesas abarrotadas de processos dos desembargadores � que emperram o sistema. “A segunda inst�ncia � onde a morosidade mais ocorre. Dessa forma, penas pequenas acabam em prescri��o. Isso porque o tempo de extin��o do processo depende do tempo m�ximo de pena”, afirma. O especialista argumenta ainda que os prazos da defesa e do Minist�rio P�blico s�o curtos demais para causar tantas prescri��es. “Os ju�zes n�o t�m prazos. Por isso levam meses para despachar decis�es simples”, diz Tofic.

Advogado das v�timas, Marcos Egg, que assistiu a promotoria no processo criminal contra Olivier, garante ter cobrado diariamente para que a Justi�a n�o perdesse o prazo de julgamento. “Fomos todos os dias ao f�rum. Mas os ju�zes levavam tr�s meses para liberar um despacho de uma p�gina. A secretaria (do tribunal) precisou de um m�s para juntar o processo. Agora, resta apenas o processo c�vel. Pedimos R$ 2 milh�es para os feridos”, disse o advogado, que tentar� executar os bens do franc�s. “Mesmo ele estando em seu pa�s, podemos conseguir isso por meio de tratados internacionais”, espera.

 

 

O que diz a lei

O C�digo Penal brasileiro define dois tipos de prescri��o para crimes: para condenados e n�o condenados. Em todos os casos, o prazo depende do tempo m�ximo de pena e da idade do autor, que quando � menor de 21 anos precisa esperar apenas metade do tempo. Se a pena � superior a 12 anos, o crime prescreve com 20 anos. Se o delito prev� pena maior de quatro anos e menor do que oito anos, a extin��o se d� em 12 anos. Penas com menos de um ano prescrevem em dois anos. O acusado que n�o for denunciado pelo Minist�rio P�blico em menos de quatro anos tamb�m tem seu processo criminal extinto. Depois que a pessoa � julgada, passa a valer para a prescri��o n�o mais o m�ximo da pena aplic�vel, mas o tempo determinado pelo juiz na condena��o.


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