
Em 10 de julho, a crian�a teria sido xingada por Maria, av� de outro estudante, descontente de o neto dan�ar quadrilha com uma “negra, feia e horrorosa”. A professora Denise Cristina Arag�o, de 34, pediu demiss�o e denunciou o caso aos pais da menina. Al�m da acusada, a PC ouviu ontem depoimentos da professora, da m�e da crian�a, a atendente de telemarketing F�tima Adriana Viana da Silva de Souza, de 41, e da diretora do Centro de Educa��o Infantil Em�lia, Joana Reis Belvino. A pol�cia tamb�m intimou outra testemunha, a professora Mirlene Alves de Oliveira, de 36, que dever� ser ouvida amanh�, �s 10h40, e vai pedir ajuda do conselho tutelar e de �rg�os de prote��o � inf�ncia e � juventude para ouvir a v�tima.
“At� agora, podemos concluir que ela n�o foi preterida ou barrada em algum ambiente em raz�o de sua cor. Os ind�cios nos mostram que a autora ofendeu a menina, caracterizando inj�ria com agravante de cor ou ra�a, em que a pena varia de um a tr�s anos de reclus�o e o pagamento de multa”, diz o substituto da 4ª Delegacia de Pol�cia de Contagem. No crime de racismo, a pena seria de tr�s a cinco anos de reclus�o. Durante mais de uma hora de depoimento, a acusada negou ter cometido qualquer ofensa � crian�a, a quem, diante da pol�cia, se referiu como “moreninha”, segundo o delegado. “As declara��es da suspeita n�o ajudaram em nada e foram t�picas de algu�m que comete um ato mas n�o assume e divaga muito no depoimento”, afirma Gomes.
Sem advogado, Maria chegou sozinha � delegacia, ficou irritada com a presen�a da imprensa e negava a todo momento ser ela a acusada de ter xingado a crian�a. � pol�cia, disse que era a v�tima. “Segundo ela, a professora estava usando a situa��o para tentar prejudicar a escola”, diz o delegado. A diretora da escola, Joana Belvino, estava acompanhada do advogado e tamb�m n�o quis comentar o assunto. De acordo com Gomes, Joana disse ter tomado conhecimento da den�ncia de racismo quando foi procurada por jornalistas. “A diretora falou que n�o sabia que o desentendimento com a professora teria esse pano de fundo. Para a pol�cia, a situa��o de ter denunciado ou n�o o caso � irrelevante, pois ela n�o tem por lei a obriga��o de notificar inj�ria”, afirma Gomes.
Uma equipe de advogados da Organiza��o N�o Governamental (ONG) SOS Racismo acompanhou os depoimentos e garante que o caso pode ser interpretado como racismo. “Durante a festa junina, h� ind�cios de que a av� tentou impedir seu neto de dan�ar com uma garota negra se referindo � ra�a em geral e n�o injuriando uma pessoa. Dessa forma, no momento em que ela n�o queria que uma negra tivesse o conv�vio social em uma festa de escola, se caracteriza o racismo”, diz o advogado Amadeus Carlos Pimenta. Independente da conclus�o ou do que for relatado no inqu�rito, o advogado informou que nos pr�ximos dias vai entrar com uma a��o penal por racismo al�m de mover tamb�m uma a��o c�vel por danos morais contra a agressora pelas ofensas e contra a diretora pela coniv�ncia.
O QUE DIZ A LEI
O racismo � caracterizado pela Lei Federal nº 7.716, de 5 de janeiro de 1989 que, em linhas gerais, diz que fica configurado o crime quando h� impedimento ou nega��o de acesso, emprego, matr�cula, hospedagem, entre outros, por conta de ra�a, cor, etnia, religi�o ou proced�ncia nacional. Praticar, induzir ou incitar a discrimina��o ou preconceito por conta dos mesmo fatores, da forma geral, tamb�m � considerado racismo. Segundo advogados, nesse caso a pena pode chegar a nove anos de pris�o de acordo com as combina��es de artigos. A inj�ria � tipificada pelo artigo 140 do C�digo Penal e a pena varia de um a seis meses de deten��o ou multa em caso de ofensa da dignidade ou do decoro de uma pessoa. Tamb�m h� o agravante da viol�ncia, que eleva a pena para a varia��o entre tr�s meses e um ano de deten��o, al�m da multa e puni��o pela viol�ncia. O �ltimo agravante diz respeito � inj�ria com elementos de ra�a, cor, etnia, religi�o, origem ou a condi��o de pessoa idosa ou portadora de defici�ncia. Nesse caso, a pena varia de um a tr�s anos de reclus�o, al�m da multa.
PALAVRA DE ESPECIALISTA: GUSTAVO FREIRE, ADVOGADO ESPECIALISTA EM DIREITO PENAL
Crian�a sofreu desqualifica��o
“A postura do delegado ao considerar inj�ria e n�o racismo est� corret�ssima. O racismo objetiva principalmente a segrega��o racial e n�o houve nenhuma forma de segrega��o racial nesse epis�dio. No caso, foram coment�rios que atingiram a honra subjetiva daquela pessoa (a crian�a negra), mas n�o com o objetivo de separar ra�as, grupos �tnicos ou religiosos. A inj�ria � toda forma de desqualifica��o de uma pessoa. E no caso dessa crian�a a desqualifica��o houve por meio da cor, mas n�o houve o objetivo de separar ra�as.”
Emo��o no depoimento dos pais e professora
O depoimento da professora Mirlene Alves de Oliveira, 36 anos, ser� pe�a-chave para esclarecer se as agress�es verbais dirigidas � pequena D., de 4 anos, poder�o ou n�o ser qualificadas como racismo. A funcion�ria da escola particular de Contagem ser� ouvida amanh� pela Pol�cia Civil (PC), que afirma s� poder configurar o caso como racismo se ficar comprovado que a crian�a tenha sido impedida de participar de algo em raz�o da cor. A professora, que estava presente na quadrilha, conta que durante a festa junina a acusada reclamou ao ver seu neto dan�ando com uma garota negra. “Imagin�vamos que algo poderia acontecer pelo hist�rico de coment�rios dela. Houve apenas um coment�rio dela comigo e com a diretora, mas o pior foi na ter�a-feira, quando entrou gritando na escola”, diz Mirlene.
Durante a manh� de ontem, a emo��o marcou o depoimento da professora e dos pais da pequena D., que ainda n�o conseguiu se recuperar do trauma. “Ela chora muito, sempre diz que ningu�m gosta dela e que est� passando mal. Sempre repete que n�o fez nada, achando que tem alguma culpa. Algumas palavras ditas pela av� do coleguinha est�o na cabe�a dela. O mais triste � que ela estava come�ando a entender sua identidade negra. Agora, acha que essas caracter�sticas s�o ruins”, diz a m�e. Questionado sobre o drama vivido pela filha, o pai, Ailton Cesar de Souza, perdeu o controle e come�ou a chorar, sem conseguir dizer uma palavra para expressar a indigna��o por tudo que a crian�a passou.
A professora Denise Cristina Arag�o, de 34, tamb�m dep�s � pol�cia e disse que os alunos estavam assistindo a um filme na sala de aula, quando a acusada Maria Pereira Campos da Silva, de 54, e o neto chegaram. “No port�o, ela j� come�ou a ofender a garota perguntando porque eu tinha deixado ela dan�ar com seu neto”, diz a professora. “Imediatamente a adverti, falando que a crian�a estava na sala. Ela n�o se importou, me mandou calar a boca, pois meu sal�rio era para dar aulas.” Segundo Denise, s� depois que Maria Pereira parou de xingar a menina, ela voltou a se aproximar, chorando muito. “Ela disse que n�o acreditava no motivo do meu choro”, completa Denise. A educadora diz ter conversado com a diretora e como viu que nenhuma atitude seria tomada, pediu demiss�o. “A diretora me disse que qualquer escola teria preconceito e se ela fosse reagir contra cada caso n�o teria alunos”, completa.