
Para muitos � a primeira vez fora de casa. Sair da sombra dos pais e dividir uma moradia com pessoas jovens, da mesma idade, abre um horizonte tentador. A vida se apresenta sem limites e com possibilidades que, muitas vezes, combinam �lcool, farras, festas e experi�ncias que os mais novos consideram inesquec�veis. Esse � o cen�rio encontrado em cidades do interior de Minas onde a presen�a de universidades federais justifica a exist�ncia de rep�blicas de estudantes. Em Ouro Preto, na Regi�o Central de Minas, e S�o Jo�o del-Rei, no Campo das Vertentes, a equipe do EM testemunhou como as bebidas alco�licas fazem parte da cultura e da rotina desses alunos. Alguns bebem quase todos os dias. Basta participar de uma festa organizada por eles para perceber que o consumo � farto e o acesso, muito f�cil.
Em S�o Jo�o del-Rei o EM visitou um evento batizado de Santa Mauso, organizado pelas rep�blicas Santa Casa e a Mausol�u. Quando a reportagem adquiriu os ingressos, mais de 1 mil convites j� haviam sido vendidos. Em um espa�o consider�vel, aos poucos os estudantes iam chegando, a partir das 15h. Bebidas como vodca, rum, cerveja e Steinhaeger foram oferecidas na comemora��o. �s 18h30, os dois ambientes destinados ao evento estavam lotados.
Foi quando algumas cenas come�aram a denunciar o abuso de �lcool. Um estudante, perto da �rea destinada aos banheiros qu�micos, preferiu colocar o dedo na garganta para vomitar e se restabelecer, com o objetivo de melhorar o mais r�pido poss�vel e voltar a beber. Perto dali, outro jovem embriagado escorou em uma cerca de bambu, passando mal. A partir de ent�o, j� n�o era necess�rio muito esfor�o para encontrar homens e mulheres embriagados. “Nossa, estou muito louca”, gritava uma estudante enquanto segurava um copo de cerveja com Steinhaeger. “T� rodando bem”, dizia outro jovem. “Minha cabe�a s� gira”, completou.
Marco Ant�nio Marques Porto, de 23 anos, morador da Rep�blica Santa Casa e um dos idealizadores da festa, acredita que cada um � respons�vel pela quantidade que bebe e pelos excessos. “Ningu�m colocou bebida na boca de ningu�m durante a festa. A pessoa faz o que quer. Os abusos n�o rolam s� nas cidades universit�rias, mas em todo o pa�s”, diz ele. Por�m, em munic�pios como S�o Jo�o del-Rei, eventos do tipo se repetem. Denominada Quarta do Golo, outra comemora��o prometia muitas atra��es em cartazes pela cidade, anunciando festa organizado pela Rep�blica de L�. Cerveja, vodca e cacha�a liberadas e um recado para aqueles que n�o t�m o costume de beber em excesso: “Quem n�o ‘guenta’ bebe leite”. No mesmo cartaz, um atrativo a mais: campeonato de “golo”. Consultados sobre a festa, integrantes da rep�blica n�o se manifestaram at� o fechamento desta edi��o.
Em Ouro Preto, quando a festa � de grande porte, as rep�blicas costumam encomendar bebidas de uma distribuidora de Mariana. Parte das mercadorias � paga antecipadamente e o restante � entregue em consigna��o. Os estudantes s�o clientes t�o ass�duos que muitas vezes a empresa nem busca os refrigeradores que empresta. Algumas casas chegam a ter, em tempo integral, dois ou tr�s desses freezers.
Para alunos, faltam op��es
Estudantes da Universidade Federal de S�o Jo�o del-Rei admitem que a bebedeira � constante e muitas vezes excessiva nas rep�blicas, mas apontam a falta de op��es na cidade como determinante para a situa��o. Morador da Rep�blica da Cadeia, Rafael Dimas, de 28 anos, idealizador das Rep�blicas Universit�rias Associadas (RUA), diz que a forma de lazer para os estudantes de S�o Jo�o � a festa. “� a possibilidade de integrar essas pessoas. Al�m disso, as festas recebem tamb�m a popula��o de S�o Jo�o, carente de eventos”, afirma.
O presidente da RUA, Tadeu de Mendon�a J�nior, de 23, admite que h� muito consumo de �lcool, mas argumenta que ningu�m deixa de estudar para beber. “Rep�blica n�o � s� farra. A bebida � uma forma de lazer, mas tentamos tamb�m organizar eventos sem rela��o com �lcool.” Filipe Rodrigues, de 22, do Diret�rio Central dos Estudantes (DCE) da UFSJ, reclama de falta de atrativos. Ele afirma que as �nicas op��es de lazer est�o relacionadas ao �lcool, pois S�o Jo�o tem duas boates e cerca de 30 bares.“A universidade promove um festival que dura 20 dias no ano. Nos demais, n�o temos nada”, alega Filipe.
A reitora da UFSJ, Val�ria Kemp, diz que o consumo de �lcool preocupa e rebate afirma��es de que falta lazer. “Temos v�rios eventos culturais e incentivamos a participa��o de alunos em eventos n�o relacionados ao �lcool”, afirma. A reitora condena excessos, mas defende encontros de estudantes nas rep�blicas. “Essas reuni�es contribuem para a socializa��o”, conclui.
Tr�s perguntas para
Ricardo Newton Pinto Vieira: pai do jovem Pedro Vieira, encontrado morto na Rep�blica Saudade da Mam�e, em Ouro Preto
Como voc� tem lidado com a perda do seu filho?
A lembran�a bate a toda hora. Tenho um sentimento de perda muito grande. J� fui derrotado v�rias vezes, mas nunca tinha perdido nada. Agora sei o que � perder.
O exame j� indicou a causa da morte de Pedro?
Ainda n�o saiu. N�o sei dizer se a bebida foi a causa principal, mas com certeza ajudou no processo.
O que pode ser feito para mudar esse quadro?
Os pr�prios estudantes precisam pensar em uma forma de mudar esse ritual, que j� nos tirou duas pessoas queridas. N�o vai ser ningu�m que vai chegar e impor nada: s�o os alunos da universidade que precisam tomar uma atitude para mudar essa situa��o. Se a postura e o ritmo de bebidas e festas forem mantidos, outros estudantes podem estar na imin�ncia de ir pelo mesmo caminho.