
Congonhas e Conselheiro Lafaiete – Os rastros de pneus impressos no mato mostram que a carreta carregada de sucata compactada n�o conseguiu fazer a curva fechada e passou reto. S� parou depois de destruir dois carros e bater num barranco, matando oito pessoas e ferindo seis, na tarde do domingo passado. Os ve�culos pegaram fogo e at� o solo ficou calcinado. Um cen�rio de destrui��o t�o extenso que lembra um desastre a�reo, mas que n�o serviu de alerta para os motoristas que trafegam pela BR-040, em Congonhas do Campo, cidade da Regi�o Central a 89 quil�metros de BH. O limite de velocidade � de 80 km/h, mas muitos ve�culos de carga aceleram nessa descida seguida de curva fechada acima de 90 km/h, como constatou o Estado de Minas ao usar um radar. Somada � imprud�ncia, a falta de conserva��o tamb�m � comum nesse trecho da BR que est� entre os cinco indicados pela Pol�cia Rodovi�ria Federal (PRF) como os mais perigosos da malha federal mineira.

SUSTO NA BORRACHARIA
Muita gente pode n�o saber do perigo que corre ao passar pelo segmento entre o km 601 e o km 615 da BR-040, em Congonhas, mas o borracheiro Romeu Alves da Silva, de 56 anos, tomou conhecimento disso no dia em que abriu sua borracharia na beira da estrada, h� 2 anos. “Foi no meu primeiro dia. Escutei um barulh�o. Era uma carreta desgovernada. O motorista e o ajudante pularam fora e o caminh�o veio na minha dire��o, bateu numa Blazer que estava parada aqui e saiu arrastando tudo, quase passou por cima da borracharia. Corri para n�o morrer”, lembra.
“O morro � muito forte. A� o carreteiro vai freando demais, o freio esquenta e depois n�o pega”, afirmou o caminhoneiro S�rgio Andrade, de 44. “Quem n�o conhece a estrada chega � reta depois da primeira descida e acha que acabou o risco. A� acelera e n�o consegue mais parar”, disse o caminhoneiro Wanildo Rezende, de 39.
Daquele ponto at� Conselheiro Lafaiete a falta de conserva��o agrava o perigo. O asfalto est� cheio de buracos grandes e profundos, obrigando os motoristas a fazer desvios. Na �rea urbana os conflitos entre o tr�fego de viagem e a circula��o de Lafaiete geram acidentes, de acordo com a PRF. “No trecho de Juiz de Fora o problema � a chuva. A pista fica escorregadia, a visibilidade diminui e os condutores n�o trafegam em velocidade compat�vel”, afirma o inspetor Aristides J�nior.
De carona com dem�nio
Fervedouro, Muria� e S�o Francisco do Gl�ria – A literatura, o cinema e a m�sica criaram mitos como a Rota 66, uma via que atravessa os Estados Unidos passando por vastid�es �ridas da California ao Illinois, e mesclou ao trajeto, que seria “infernal”, a numera��o que remete ao n�mero 666, do armagedom b�blico. Pois um dos cinco trechos mais perigosos das rodovias mineiras, segundo a Pol�cia Rodovi�ria Federal (PRF), � justamente o km 666 da BR-116 (Rio-Bahia), em S�o Francisco do Gl�ria, na Zona da Mata. E por causa disso est� ganhando fama de via infernal entre os caminhoneiros e moradores pr�ximos devido � grande quantidade de acidentes que ocorrem por l�. No caso da estrada mineira, as armadilhas encontradas pelos motoristas n�o s�o parte de uma batalha do Apocalipse, mas resultado da falta de conserva��o pelo Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit).
� logo ap�s uma das curvas da via, de pista �nica, que o motorista se assusta ao encontrar uma nuvem de poeira atrapalhando sua visibilidade. De repente, sem qualquer aviso ou sinaliza��o, a pista acaba, virando um segmento de 350 metros, largo, de terra e p� que levanta com o tr�fego de carretas e �nibus. Nesse espa�o n�o se distinguem faixas de separa��o ou acostamentos. Perigos ampliados pela imprud�ncia dos motoristas de carros de passeio e motociclistas que perdem a paci�ncia com a redu��o de velocidade que as carretas precisam fazer e se arriscam na contram�o.
Passada a poeira, em dois locais neste quil�metro, as conten��es de barrancos instaladas depois das chuvas de 2011 est�o rompendo. Feitas com linhas de gaiolas de metal preenchidas com pedras (gabi�es), algumas delas foram empurradas pelos barrancos e j� se romperam.
A parte mais perigosa � formada por duas rampas causadas pelo afundamento da pista. O desn�vel chega a mais de um metro e quem passa em velocidade mais alta quase decola. Muitos se assustam, freiam bruscamente e correm o risco de perder o controle. “Faz dois anos que a estrada ficou largada. E isso � ainda pior com a imprud�ncia dos motoristas. A gente est� esquecido. A estrada � do inferno mesmo”, afirma o produtor rural Sebasti�o Pereira Leite, de 80 anos, que mora em frente a uma dessas rampas e de casa escuta o barulho das batidas e sa�das da pista.
Em Fervedouro, 15 quil�metros � frente, os acidentes na BR-116 marcam muitas fam�lias, como a do frentista Anderson Franchini Ricardo, de 34. “Quando era pequeno, meu irm�o morreu ao descer de uma bicicleta e um carro bater com o retrovisor no rosto dele”, lembra. No domingo passado, dois primos de Anderson quase morreram na estrada. “Estava chovendo e o carro em que viajavam saiu da pista e bateu num caminh�o. Um deles pode ficar parapl�gico. O outro quebrou a bacia, um f�mur e um p�. N�o tem uma pessoa aqui que n�o conte uma trag�dia dessa estrada, que para mim � do inferno mesmo”, afirma.
Medo no Norte de Minas
Moradores de Francisco S� (Norte de Minas), o caminhoneiro Carlito Dias de Freitas, de 59 anos, e o trabalhador bra�al Wesley Silva Gon�alves, de 27, vivem em clima de tens�o. Eles enfrentam o pavor de ter que viajar pela BR-251, que tem um dos trechos rodovi�rios mais perigosos de Minas. Os riscos na rodovia, que liga Montes Claros � BR-116, numa extens�o de 300 quil�metros, s�o simbolizados pelo grande n�mero de cruzes em diversos pontos, retratando acidentes que ocorreram na regi�o.
As causas de tantas trag�dias s�o conhecidas: tr�fego intenso de ve�culos pesados, pista estreita, falta de acostamento, defeitos e m� conserva��o da pavimenta��o, al�m da imprud�ncia dos motoristas. Segundo levantamento da Pol�cia Rodovi�ria Federal, de janeiro a setembro de 2012 foram registradas na rodovia 33 mortes em 347 acidentes, com 244 feridos. No mesmo per�odo deste ano, os n�meros tiveram crescimento significativo: 48 mortes (aumento de 45%) e 313 feridos (eleva��o de 28%), em 313 acidentes.
“Quando pego essa estrada, meu sentimento � de terror por causa da falta de acostamento e da m� conserva��o”, afirma Carlito Dias. “Precisamos que esta estrada seja duplicada”, completa o caminhoneiro, lembrando que a popula��o de Francisco S� cansou de pedir a instala��o de quebra-molas na rodovia, nas proximidades da �rea urbana, e nunca foi atendida. Ele conta que nos �ltimos seis anos perdeu dois sobrinhos, v�timas de acidentes na rodovia. “Sempre que passo pela estrada tenho medo e fico muito tenso. Ela � muito perigosa”, afirma Wesley Gon�alves, que tem que viajar pela BR-251 toda semana para trabalhar numa carvoeira, perto de Barroc�o, distrito de Gr�o Mogol. Para se deslocar at� o servi�o, ele percorre em torno de 40 quil�metros da perigosa estrada.
A tens�o de Wesley � maior porque, para trabalhar, ele � obrigado a passar pela Serra de Francisco S�, o trecho mais perigoso da BR-251. O percurso, tamb�m conhecido como Curva da Morte, se estende por 15 quil�metros, onde os riscos s�o agravados por uma sequ�ncia de curvas em uma regi�o �ngreme. “Os acidentes s�o corriqueiros. No per�odo chuvoso, o perigo aumenta. � s� formar uma nuvem no c�u que pode ser chamada a ambul�ncia do Corpo de Bombeiros ou do Samu para atender as vitimas na estrada”, refor�a o caminhoneiro Carlito Dias.
Os dados da PRF confirmam o perigo. Neste ano, at� 31 de outubro, foram registrados no trecho 54 acidentes, que provocaram sete mortes e deixaram 78 feridos. Os n�meros s�o superiores �s ocorr�ncias no local ao longo de 2012, quando foram registrados ali 47 acidentes, sete mortes e 78 feridos.