
Ele est� mudo, virou pe�a de museu e fica na estante ao lado de outros objetos que contam a hist�ria da fam�lia e da cidade. Mas, no cora��o e na mem�ria, traz lembran�as que ainda ecoam em Caet�, na Regi�o Metropolitana de Belo Horizonte. Esse personagem t�o importante � o r�dio da marca Zenith com caixa de madeira com 65cm de largura por 33,5cm de altura, pertencente ao farmac�utico Ant�nio Maria Claret Chagas, de 68 anos. Especialmente agora, o aparelho de v�lvulas e tr�s faixas ganha mais destaque. Afinal, foi comprado para que parentes e amigos pudessem ouvir os jogos da Copa de 1950, realizada no Brasil.
“A recorda��o que tenho de 1950 � ver muita gente triste”, conta o farmac�utico de Caet�. Entre as duas Copas do Mundo no Brasil – em 1950 e 2014 –, ouviram-se novos gritos das torcidas e a tecnologia conheceu avan�os estratosf�ricos. Se em meados do s�culo passado era um luxo ter r�dio em casa, hoje, os televisores de tela plana, em alta defini��o e com muitas polegadas est�o em todos os cantos – sem distin��o de classe social.
A primeira transmiss�o ao vivo para o pa�s do torneio mundial de futebol ocorreu em 1970, ainda em preto e branco. De norte a sul, os brasileiros formaram a “corrente pra frente”, conforme a can��o-hino que empolgou a na��o: “Noventa milh�es em a��o/ pra frente, Brasil/ do meu cora��o/ Todos juntos, vamos/ pra frente Brasil/ Salve a Sele��o…”.
H� exatos 40 anos, os uniformes das sele��es, o verde-amarelo da bandeira nacional e a farra das torcidas foram exibidos em cores para o Brasil. O muro de Berlim ainda estava de p� e os jogos tiveram como palco a antiga Alemanha Ocidental. Duas d�cadas depois, entraram em cena as antenas parab�licas: as imagens das partidas nos Estados Unidos, onde o Brasil conquistou o tetra, chegaram a todos os rinc�es do pa�s.
A TV a cabo ganhou as casas em 1998. Na Copa seguinte, no Jap�o e Coreia do Sul, as imagens j� chegavam em alta defini��o ao pa�s. Hoje, comenta-se de tudo nas redes sociais, a internet mostra os bastidores em tempo real e a Fifa inaugura o recurso tecnol�gico hawk-eye, que permite saber, com precis�o, se a bola passou a linha do gol. E mais: transmiss�o � feita para alguns pa�ses no sistema 4K, superior ao de alta defini��o. Certamente, vem muito mais por a�. Quem viver ver�.
Direto da farm�cia
Ant�nio Jos� Tib�rcio de Oliveira, residente em Santa Luzia, na Grande BH, � fan�tico por Copa do Mundo. “Nessa �poca, a emo��o mexe com a gente”, diz o advogado, que sabe tudo sobre os torneios e acompanha os jogos numa TV gigantesca. “Lembro-me bem de 1950. Ouv�amos os jogos na farm�cia do seu Castrinho, aqui na Rua Direita. Nasci em 1933 e me lembro vagamente dos jogos de 1938, quando o artilheiro foi um brasileiro, Le�nidas da Silva, o Diamante Negro”, conta.
Naquele ano, tentou-se transmitir os jogos pelo r�dio, mas a precariedade tecnol�gica fazia com que a voz do locutor falhasse muito, deixando os nervos do torcedor � flor da pele. “As transmiss�es se sofisticaram, mas a paix�o de torcer n�o muda”, diz Ant�nio Jos�.
Ao lado da mulher, Suely, o farmac�utico Ant�nio Maria Claret Chagas, de Caet�, conta que o velho r�dio Zenith foi comprado pelo tio, Jo�o Geraldo Chagas, em Jo�o Monlevade, no Vale do A�o. “Na �poca, havia apenas mais dois aqui na cidade: um na esta��o (ferrovi�ria) da Central do Brasil e outro na Cer�mica Jo�o Pinheiro, do pai de Israel Pinheiro”, explica, referindo-se ao conterr�neo que governou Minas de 1966 a 1971.
Goleiro F� de futebol e atuante na preserva��o do patrim�nio cultural local, o farmac�utico foi goleiro do time do Vasquinho. Para ele, a narra��o radiof�nica das partidas era mais emocionante. Depois de acompanhar a sele��o canarinho por muitas copas, ele agora assiste aos confrontos em uma tela plana de 46 polegadas junto de dona Suely, dos dois filhos e dois netos. “O Mundial ganhou muita conota��o pol�tica, mas deve prevalecer o esp�rito esportivo. No fim das contas, a emo��o sempre se sobrep�e � raz�o. Na TV de hoje, � tudo certinho. Perdeu a gra�a”, diz.
Em 1954, quando a Copa ocorreu na Su��a, ele j� era maiorzinho. Junto do pai, Ant�nio Feliciano Chagas, acompanhou a derrota do Brasil para a Hungria por 4 a 2. Dona Suely tamb�m se lembra daquele dia. Seu pai, Orlando de Castro, criou um sistema solid�rio para que os funcion�rios do escrit�rio da Companhia Ferro Brasileiro pudessem acompanhar a Sele��o Brasileira. Ele conectou um alto-falante a um toca-discos e todos puderam torcer, sem interromper as atividades.
Quatro anos depois, na Su�cia, o time de Garrincha, Pel�, Vav� e Zagallo conquistou o primeiro t�tulo mundial para o Brasil. “Eu ficava ouvindo a partida e imaginando as jogadas. Tia J�lia deixava uma vela acesa sobre o r�dio para o Brasil n�o perder”, relembra Ant�nio Maria. Na Pra�a Jo�o Pinheiro, os torcedores de Caet� tomavam cerveja ouvindo os jogos pelo alto-falante ligado � radiola, sistema j� batizado de corneta.
“A nossa vit�ria sobre a Su�cia, por 5 a 2, gerou uma festa. Copa do Mundo � sempre fuzu�”, lembra o farmac�utico, apontando, no �lbum, a foto da “corrente pra frente” em 29 de junho de 1958. Em preto e branco, v�-se uma carreata, no Bairro Jos� Brand�o, com torcedores empurrando o caminh�o que havia engui�ado.