O Minist�rio P�blico de Minas Gerais quer ver atr�s das grades 300 condenados pelo Tribunal de Justi�a de Minas Gerais (TJMG) que est�o hoje em liberdade. Para isso, o MP embargou a an�lise de tr�s centenas de decis�es judiciais de segunda inst�ncia – em tramita��o na Procuradoria de Justi�a de Recursos Especiais e Extraordin�rios Criminais – e j� solicitou ao Judici�rio estadual que seja aplicado novo entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre o assunto. H� uma semana, a corte decidiu mudar a jurisprud�ncia sobre a pris�o para o cumprimento da pena, autorizando que ela ocorra antes do tr�nsito em julgado da condena��o – quando n�o h� mais possibilidade de recursos. A decis�o n�o � vinculante e, portanto, sua aplica��o n�o � obrigat�ria. Mas, no entendimento de promotores, desembargadores e advogados, pode resultar em uma enxurrada de pris�es de condenados que lan�am m�o de todas as possibilidades de recursos e agravos na tentativa de se manter soltos.
O desembargador explica que aqueles que decidirem acompanhar a decis�o do STF ter�o como base o artigo 5º da Constitui��o Federal, defendendo que o tr�nsito e julgado seria a decis�o de segunda inst�ncia. A partir da�, recursos podem ser interpostos, mas sem efeito suspensivo sobre a decis�o do TJ. “Esses recursos nos tribunais superiores n�o versam sobre o fato ou a autoria. Se o crime aconteceu, se foi o r�u o criminoso, isso j� est� esgotado na segunda inst�ncia. Aos demais tribunais cabe analisar se a lei foi devidamente cumprida, se os prazos foram respeitados, se as partes foram tratadas com igualdade ou se as normas constitucionais foram seguidas”, explica Alexandre Victor de Carvalho. Com a mudan�a, os desembargadores, que antes s� poderiam determinar a pris�o preventiva quando entendiam ser necess�ria, agora j� podem determinar a execu��o da pena.
Os contr�rios � postura do STF podem se apoiar no entendimento, tamb�m embasado na Constitui��o, de que o tr�nsito em julgado significa n�o ser mais poss�vel a interposi��o de recursos. “Com isso, o r�u pode aguardar o recurso em liberdade”, acrescenta o desembargador, a n�o ser que exista a necessidade de pris�o preventiva.
Contr�rio � decis�o do STF, o criminalista S�rgio Leonardo, diretor da Ordem dos Advogados do Brasil, se��o Minas Gerais (OAB-MG) destaca tr�s problemas no novo entendimento do Supremo. Ele entende que, do ponto de vista jur�dico, foi ferida uma garantia constitucional. “Somente o Congresso Nacional poderia alterar a garantia da presun��o de inoc�ncia, que na Constitui��o atual vai at� o tr�nsito em julgado, ou seja, quando n�o cabem mais recursos”, afirma. Do ponto de vista pr�tico, ele defende que o sistema carcer�rio j� n�o suporta o excesso de presos provis�rios e, com mais deten��es, chegaria ao completo caos. O advogado ainda questiona o fundamento classificado como central pelos ministros, que foi o de atender aos anseios da sociedade. “Isso � inadimiss�vel para um tribunal constitucional, que tem que respeitar a Constitui��o e as leis, sejam elas favor�veis ou n�o aos anseios da sociedade”, critica.
GIL RUGAI Apesar da controv�rsia, o fato � que, com base na decis�o STF, um caso emblem�tico no pa�s j� mudou de rumo. O ex-seminarista Gil Grego Rugai voltou a ser detido na noite de segunda-feira, horas depois ter a sua pris�o decretada pela Justi�a de S�o Paulo. Em 2013, ele foi condenado a 33 anos e nove meses de pris�o pelo assassinato de seu pai, Luiz Carlos Rugai, e de sua madrasta, Alessandra de F�tima Troitino. O crime ocorreu em 2004, dentro da resid�ncia do casal em Perdizes, na Zona Oeste da capital paulista.
Em Belo Horizonte, um caso de homic�dio escapou � nova regra. No �ltimo dia 4, o ex-empres�rio Leonardo Coutinho Rodrigues Cipriano, de 39, foi preso preventivamente depois de a Justi�a manter, em segunda inst�ncia, sua condena��o pelo assassinato do s�cio Gustavo Fel�cio da Silva, dentro da Boate Pantai Lounge, na Avenida Prudente de Morais, no Bairro Cidade Jardim, Regi�o Centro-Sul. Preso preventivamente – e n�o para j� iniciar o cumprimento da pena – ele foi colocado em liberdade no dia seguinte, beneficiado por um recurso ao Superior Tribunal de Justi�a. Se o julgamento fosse ap�s o novo entendimento do Supremo, o TJ poderia ter determinado que fosse iniciado o cumprimento da pena, ainda que houvesse apela��o.
MAIS RIGOR Na avalia��o do coordenador do Centro de Apoio Operacional Criminal do MP, Marcelo Mattar Diniz, a decis�o do STF foi uma das mais acertadas dos �ltimos tempos. “Vai ajudar a reduzir a sensa��o de impunidade. O Brasil estava na contram�o da hist�ria. A maioria dos pa�ses no mundo n�o permite a liberdade depois da segunda inst�ncia. O r�u pode at� recorrer em liberdade na primeira inst�ncia, mas depois de condenado, fica preso. Nos Estados Unidos o rigor � ainda maior, j� que a pessoa fica presa j� quando condenada pelo primeiro tribunal”, disse.
Desembargado e promotor concordam sobre o impacto das mudan�as no sistema prisional diante da enxurrada de decis�es de pris�o por parte do TJ. “Isso vai ter interfer�ncia direta no sistema carcer�rio, que j� enfrenta o desafio da superlota��o. A situa��o vai ficar ainda pior. E a Secretaria de Estado de Defesa Social (Seds) vai ter que fazer uma reavalia��o do seu planejamento carcer�rio dia a dia, diante da falta de vagas”, concluiu Alexandre Victor de Carvalho.
Em nota, a Seds informou que n�o tem uma avalia��o sobre o impacto do novo entendimento sobre o sistema carcer�rio. Atualmente, a popula��o carcer�ria de Minas Gerais � de 68.810 presos, sendo 59.747 encarcerados em unidades da Subsecret�ria de Administra��o Prisional (Suapi); 4.399 em unidades da Pol�cia Civil; 2.661 nas associa��es de Prote��o e Assist�ncia aos Condenados (Apacs); 89 em depend�ncias da Pol�cia Militar; e 1.914 monitorados por tornozeleira eletr�nica. Do total de presos no estado, 65.401 s�o homens e 3.409 s�o mulheres.