
No quadro de hoje, o “verde a verde” das �guas que alimentam o rio (foto acima) se esmaece. “Infelizmente, a maior parte das veredas da regi�o est� assoreada”, testemunha o t�cnico em meio ambiente Carlos Aparecido Ferroni, do escrit�rio do Instituto Estadual de Florestas (IEF) em Urucuia, que come�ou a trabalhar em 1998 no �rg�o, quando as condi��es das nascentes da regi�o “ainda eram muito boas”.
De l� para c�, conta, foi s� degrada��o: desmatamento e movimento do solo para a forma��o de pastagens sem nenhuma medida protetiva, produ��o de carv�o e danos provocados pela abertura de estradas, al�m do fator mais perverso de todos, o fogo, seguido pela forma��o de pasto e pisoteio do gado.
Um exemplo da destrui��o est� na vereda da Mutuca, a tr�s quil�metros da sede de Urucuia. H� tr�s anos, um inc�ndio atingiu a �rea, transformando a maior parte da paisagem num cen�rio de buritis queimados ou mortos, sem uma gota d’ �gua acumulada. “Este � um dano dif�cil de ser revertido”, disse Carlos Ferroni, que acompanhou o Estado de Minas at� o local.
Em outro ponto do munic�pio de Urucuia, na comunidade de Barroca��o, a vereda do Pulvarim era um verdadeiro reservat�rio de �gua, abrangendo uma �rea de 10 hectares. Tamb�m h� tr�s anos, a �rea foi atingida por um inc�ndio. Trabalhadores da fazenda e vizinhos se esfor�aram para controlar as chamas, mas n�o conseguiram evitar os danos, cujas consequ�ncias se sentem at� hoje.
O fogo se prolongou por cerca de 15 dias. As chamas provocaram estragos por cerca de quatro dos oito quil�metros de extens�o da vereda e devastaram cerca de 10 hectares, atingindo a sua cabeceira, onde est�o vis�veis os rastros de destrui��o, com restos de troncos de buritis queimados no ch�o. Uma parte dela ainda conta com buritis e outras esp�cies nativas de p�, mas o terreno perdeu a umidade. A lagoa que havia no local secou.

EROS�O O ambientalista Eduardo Gomes, diretor do Instituto Grande Sert�o (IGS), de Montes Claros, salienta que quando o inc�ndio atinge a cabeceira de uma vereda os danos s�o maiores porque tanto a parte superficial quanto o subsolo s�o afetados. O resultado � que a vereda perde sua capacidade de absorver e reter �gua. “Assim, mesmo chovendo, ela n�o ret�m a �gua, que passa a provocar um processo de eros�o”, explica Gomes.
O empres�rio Frederico Assis, dono da fazenda onde fica situada a vereda Pulvarim, conta que quando adquiriu a propriedade, h� dois anos, o inc�ndio na �rea j� tinha ocorrido. Ele disse que agora se esfor�a num trabalho de preserva��o e, para isso, cercou toda a �rea, onde instalou c�meras para monitorar a entrada de ca�adores e de outras pessoas que possam causar danos ao meio ambiente. “Minha expectativa � de que a vereda volte a ser como antes”, diz o empres�rio, que guarda fotos do terreno cheio d’�gua.
Esses n�o s�o casos isolados. Ainda na regi�o, a reportagem encontrou v�rias outras �reas de antigas nascentes que hoje est�o completamente secas. Na Vereda das Bananeiras, perto do povoado de Bom Jesus (antiga “Igrejinha”), no munic�pio de Arinos, a degrada��o foi tanta que at� os buritis que existiam no local desapareceram. Onde era nascente, o solo ficou exposto, sem nenhuma cobertura vegetal, o que contribui mais ainda para o assoreamento.
“At� 10 anos atr�s, este lugar tinha muita �gua. Agora, est� esta tristeza, sem nada”, lamenta o aposentado Ad�o Gon�alves Machado, de 77, saudoso dos tempos em que c�rregos e rios da regi�o corriam caudalosos o inteiro, garantiam os plantios de feij�o, arroz e hortas mesmo durante os per�odos de estiagem e matavam a sede das fam�lias e dos animais.
“Acho que est� chovendo menos e desmataram muito a regi�o para fazer carv�o”, diz o experiente morador. “Mas tenho esperan�a de que um dia as veredas v�o se recuperar”, acrescenta ele, lembrando que por volta de 1963 ocorreu uma grande seca, mas os danos da estiagem daquela �poca foram superados.
Na mesma regi�o de Bananeiras, a reportagem flagrou outro quadro de destrui��o provocado pelo fogo na cabeceira de uma vereda, que ajuda a formar o C�rrego da On�a. No local est�o as marcas deixadas pelo fogo, com buritis queimados ou mortos e o terreno seco. O C�rrego da On�a tamb�m secou.
MENOS VAZ�O No caminho dos personagens de Rosa, a reportagem do EM atravessou outros rios e c�rregos que tiveram a vaz�o drasticamente reduzida ao longo dos anos, tornaram-se intermitentes ou pararam de correr. S�o Judas, Campo Grande e Gameleiras s�o alguns dos nomes.
“Esses rios eram volumosos e corriam o ano inteiro. De uns tempos pr� c�, s� correm na �poca das chuvas”, diz Carlos Ferroni. Tamburil, Cuia, Palmeiras e Sab�o, c�rregos que alimentavam o Urucuia, agora est�o secos. No Ribeir�o de Areia, no Rio Tabocas, e no pr�prio Rio Urucuia, o assoreamento reduziu o volume de �gua.
Reportagens em s�rie
Em comemora��o aos 60 anos de Grande sert�o: veredas, de Guimar�es Rosa (1908-1967), o Estado de Minas vem publicando, desde mar�o, reportagens especiais tendo a obra do escritor mineiro como fio condutor.
A primeira foi o caderno especial Travessia, dos rep�rteres Gustavo Werneck, Alexandre Guzanshe e Fred Bottrel, que visitaram v�rios munic�pios ao longo do Rio S�o Francisco para contar a hist�ria dos “diadorins” do s�culo 21.
Homens e mulheres, do meio urbano e rural e idades variadas, mostrando coragem e sensibilidade para tocar a vida e revelar suas trajet�rias.
Em agosto, foi a vez de Guzanshe participar – e depois apresentar aos leitores – o projeto Caminho do Sert�o. Em sua terceira edi��o, trata-se de uma viagem cultural, liter�ria, socioambiental e com um qu� de aventura.
Na verdade, um mergulho no universo de Rosa e no cerrado sertanejo, percorrendo parte dos passos trilhados pelo personagem Riobaldo, protagonista do livro ao lado de Diadorim, rumo � regi�o do Liso do Sussuar�o, na margem esquerda do S�o Francisco, em territ�rio mineiro.
J� no caderno Pensar, o jornalista Eduardo Murta publicou, em maio, a reportagem “Rosa: met�fora plural, seguindo os passos do escritor em Belo Horizonte e Minas e relatando sua import�ncia para a literatura brasileira e universal.