Quase um ano depois de a Igreja de S�o Francisco de Assis ter sido pichada, o monumento foi novamente emporcalhado, desta vez com duas inscri��es da mesma palavra, que sujaram uma �rea de oito metros lineares revestida com pastilhas, na lateral da igrejinha voltada para o Mineir�o. A fachada do coreto da pra�a onde est� o templo idealizado por Oscar Niemeyer tamb�m foi pichada. O crime, a primeira agress�o depois do t�tulo concedido pela Unesco, exp�s o fracasso do sistema de patrulhamento anunciado pela Prefeitura de BH e da dupla vigil�ncia no local – eletr�nica, com uma c�mera do Olho Vivo controlada pela Pol�cia Militar, e f�sica, com guardas municipais.
E as duas corpora��es n�o se entendem em rela��o � responsabilidade pela falha na seguran�a. A Guarda Municipal sustenta que n�o � necess�rio manter seus agentes 24 horas parados na porta da igrejinha, uma vez que existe uma c�mera capaz de monitorar o local de forma ininterrupta. As imagens das c�meras do Olho Vivo s�o visualizadas apenas pela PM, que por sua vez alega que a c�mera cobre apenas uma das laterais e o fundo do monumento, sendo a vigil�ncia do patrim�nio de responsabilidade da Guarda.
A brecha no patrulhamento que permitiu a a��o dos v�ndalos � outro mist�rio. Inicialmente, guardas municipais ouvidos pela equipe do Estado de Minas informaram que o crime foi praticado no momento em que os dois agentes que faziam a ronda no entorno da igrejinha com uma viatura sa�ram para jantar – ao mesmo tempo. Oficialmente, a Guarda Municipal n�o confirmou essa informa��o e deu outra vers�o. Por meio de sua assessoria, informou que a dupla tinha sa�do “para fazer uma ronda”, pois apenas dois guardas s�o respons�veis por esse servi�o das 18h �s 6h – ou seja, no per�odo de maior vulnerabilidade. E eles atuam, diz a corpora��o, em todo o conjunto moderno da Pampulha, que inclui a igreja e tamb�m outros monumentos, como a Casa do Baile e o Museu de Arte.
Nas horas de maior movimento, durante o dia, das 6h �s 18h, diz a assessoria da Guarda, a dupla a bordo de uma viatura ganha o refor�o de mais 10 guardas, oito em bicicletas e dois em motos. A corpora��o defendeu a necessidade de fazer as rondas noturnas apoiando-se na c�mera do Olho Vivo a cerca de 50 metros da igrejinha, que filma 24 horas o entorno do monumento.
J� a capit� Molise Zimmermann, assessora de comunica��o do Comando de Policiamento da Capital, disse que a c�mera em quest�o s� cobre uma das laterais e o fundo da igreja, e que n�o registrou o vandalismo. “As c�meras s�o voltadas para a via p�blica, que � atribui��o da Pol�cia Militar. Para o patrim�nio existe a cautela pela Guarda Municipal. N�s sempre trabalhamos em parceria com a Guarda, mas como a gest�o das imagens do Olho Vivo � nossa, temos uma responsabilidade muito grande sobre elas. O pr�prio COP (Centro de Opera��es da Prefeitura) pode instalar outras c�meras”, sugere a capit�.
Diferentemente da noite de quarta-feira, quando falhas na seguran�a permitiram que a Igreja de S�o Francisco de Assis fosse pichada, ontem autoridades se espalhavam e se revezavam no entorno do monumento. Guardas municipais e policiais militares passaram boa parte da manh� aguardando a chegada da per�cia da Pol�cia Civil, que tamb�m enviou investigadores da delegacia da �rea do crime e at� da Delegacia de Meio Ambiente.
Tamb�m compareceram militares da Companhia de Pol�cia Militar do Meio Ambiente de Belo Horizonte, respons�veis pelo registro da ocorr�ncia. O tenente Marcos Rodrigues disse que muito provavelmente o autor da picha��o j� rondava o local e esperou a sa�da dos guardas para vandalizar a igrejinha. “Mesmo se a c�mera n�o mostrar o respons�vel agindo, a Pol�cia Civil vai analisar as imagens para ver se aparece algum suspeito que possa ter liga��o com o fato”, afirma o tenente.
A per�cia constatou que oito metros de pastilhas da lateral da igreja foram emporcalhados, al�m de parte da fachada do coreto da pra�a, onde funciona uma lanchonete. Investigadores que foram at� o local recolheram um peda�o de pano sujo de tinta, que pode ter sido usado para tampar o rosto do autor. A Pol�cia Civil diz ter suspeitos, mas n�o quis adiantar informa��es.
O investigador Fernando Diniz, que tamb�m tem especializa��o em seguran�a p�blica pela UFMG e esteve colhendo ind�cios no local, defende um investimento p�blico espec�fico para o monumento em quest�o. “A igrejinha merece um sistema de filmagem pr�prio, uma vez que se trata de patrim�nio com tanta relev�ncia mundial”, afirma. A palavra pichada faz refer�ncia a um tipo de movimento que prega a organiza��o da vida em sociedade, que mant�m uma p�gina em rede social e tamb�m um site.

Apesar de o fato ter ocorrido na noite de quarta-feira, foi na manh� de ontem que o vandalismo surpreendeu e revoltou visitantes que passeavam pela orla da lagoa. “Parei aqui decepcionado, com uma sensa��o de tristeza. Fico tentando imaginar o porqu� disso em um lugar t�o importante. � nosso principal s�mbolo do patrim�nio”, desabafou o consultor comercial Severino Sales, de 41 anos, morador de BH. O empres�rio Felipe Borges, de 30, condenou a atitude. “Isso � um desrespeito. Um lugar t�o bonito, feito para a pr�tica de esportes, com essa vista maravilhosa, n�o pode ser alvo de picha��o. Os respons�veis muitas vezes se dizem revoltados, mas destroem o que � de todos”, afirma. A aposentada Ilda Braz, de 63, condenou qualquer tipo de picha��o. “Eu j� detesto essas coisas, mas em um patrim�nio desse porte, me deixa horrorizada.”
Por meio de nota, o Comit� Gestor do Conjunto Moderno da Pampulha, presidido pelo Instituto de Patrim�nio Hist�rico e Art�stico Nacional (Iphan), lamentou o epis�dio. Informou que j� est� providenciando vistoria para avaliar os danos e definir procedimentos para remover a picha��o.

Como ficou
Pris�o de pichador
H� quase uma ano, em 21 de mar�o de 2016, a igreja da Pampulha foi pichada pela primeira vez. Na ocasi�o, a Pol�cia Civil desenvolveu uma investiga��o que apontou tr�s pessoas como respons�veis pelo crime, sendo uma delas autora da picha��o e as outras envolvidas na concep��o do ato de vandalismo. M�rio Augusto Faleiro Neto, o Maru, na �poca com 25 anos e apontado como o pichador da igrejinha, continua preso. Jo�o Marcelo Ferreira Capel�o, o Goma, que tinha 33 anos na �poca, foi solto e responde ao processo em liberdade. Marcelo Augusto de Freitas, o Frek, com 20 anos na �poca, at� hoje est� foragido. Segundo a assessoria do F�rum Lafayette, um dos processos, referente a M�rio e Jo�o Marcelo, aguarda apenas senten�a do juiz. O outro, de Marcelo, foi desmembrado e tem v�rios pedidos de dilig�ncias em Ibirit�, na Grande BH, onde ele e M�rio Faleiro moravam na �poca. Os tr�s foram denunciados pelo artigo 65, inciso 4, da
Lei 9.605, de 1998 (pichar monumento tombado pelo patrim�nio) e pelos artigos 69 (quando o agente pratica dois ou mais crimes), 287 (apologia ao crime) e 288 (forma��o de quadrilha).
Nossa hist�ria
15 anos de espera
A Igreja de S�o Francisco de Assis, primeira a ser constru�da no pa�s dentro do esp�rito moderno, teve in�cio pol�mico. Em uma sociedade ent�o tradicional e religiosa, as formas n�o agradaram ao bispo. Por isso, erguido em 1944, o templo s� foi consagrado em 1959, pelas m�os do arcebispo de Belo Horizonte dom Jo�o Resende Costa (1910-2007). Na edifica��o, em que as curvas de Oscar Niemeyer s�o mais evidentes, a entrada da luz destaca a pintura de C�ndido Portinari, ao fundo.