Mariana – Metido numa po�a com lama at� as canelas, o desempregado Alcides Roberto Silva, de 44 anos, tenta ganhar o sustento da fam�lia revolvendo pilhas de rochas trituradas por escravos h� mais de 200 anos, � procura de ouro. Os montes de pedra escura onde ele busca pelo metal precioso ficam � beira das centenas de acessos a minas subterr�neas abertas desde o s�culo 18, no Morro de Santana ou Morro da Gogo, em Mariana. O recurso � extra��o artesanal de ouro se deu depois que a mineradora Samarco fechou v�rios postos de trabalho, incluindo o de prestadores de servi�o como Alcides, desde 2015, quando a Barragem do Fund�o, que era operada pela empresa, se rompeu matando 19 pessoas e devastando a Bacia Hidrogr�fica do Rio Doce. “Quando a Samarco fechou, ficou muito ruim de servi�o por aqui. Como moro no Bairro da Gogo e minha fam�lia sempre mexeu com minera��o, minha mulher e eu resolvemos tentar tirar o ouro que ainda tiver por aqui para sobreviver”, afirma. Assim como ele, v�rias pessoas recorrem a essa atividade clandestina sobre os despojos do que um dia foi uma das mais movimentadas montanhas com minera��o da primeira capital de Minas Gerais. O Morro da Gogo � tema da segunda parte da reportagem do Estado de Minas sobre a Cordilheira do Espinha�o, que abre a s�rie Montanhas de Hist�rias, sobre a forma��o da identidade do povo mineiro.
As minas da Gogo impressionam ainda hoje e s�o repletas de perigos para quem n�o conhece bem aqueles caminhos. H� t�neis abertos por escravos com picaretas, p�s e ferramentas primitivas que chegam a ter centenas de metros de extens�o e dezenas de ramifica��es no subsolo dessa montanha, sendo muito f�cil uma pessoa se perder. O monte se ergue a 1.050 metros, tendo um desn�vel de mais de 800 metros completamente salpicado de barramentos rudimentares de �gua das chuvas ou de pequenas nascentes, entradas de minas escavadas na rocha e buracos profundos que serviam de respiradouros para os t�neis, os chamados buracos de sari ou sarilho, com dezenas de metros de profundidade. Duas �reas de Mariana margeiam o complexo de minera��o centen�ria, o Bairro do Ros�rio e o Morro de Santana. Tal como Alcides e sua esposa, muitos habitantes dessas comunidades se aventuram no monte, na busca por fragmentos de ouro como faziam escravos nos s�culos passados.

'SUVENIR'
O grande interesse hist�rico fez com que o morro fosse tombado e declarado parque arqueol�gico, mas nada al�m disso foi feito e os acessos s�o completamente abertos � �rea. O meio de coletar ouro de Alcides � muito pr�ximo da forma usada pelos antigos. Ele instalou tapetes sobre uma plataforma inclinada, que serve para agarrar o ouro. Sobre essa plataforma, derrama �gua de um caneco cheio com os detritos dos montes, formados h� s�culos. “D� para pegar alguma coisa, para tirar o sustento. N�o sai muito ouro assim n�o. Mas � melhor do que ficar parado. A gente tem de sobreviver, n�o �? Queria mesmo era conseguir um bom servi�o”, justifica Alcides. Entre as pedras, objetos antigos tamb�m s�o encontrados e coletados pelos garimpeiros, que os guardam como suvenir em vez de repassar para museus. “A gente acha muitos cachimbos que os escravos usavam para fumar, correntes e argolas que prendiam os p�s e bra�os deles. Peda�os de pratos, de copos, aparece muita coisa no meio das pilhas de pedras”, conta Alcides.
A Mina da Gogo foi aberta no s�culo 18 com o nome de Vai Vai, que acabou sendo traduzido depois que ingleses assumiram a produ��o aur�fera, para Go Go, se tornando, por fim, Gogo. Ainda reserva v�rias ru�nas das habita��es dos mineradores e escravos que viviam no morro e de estruturas de suporte, como uma enfermaria e a Capela de Santana. As constru��es foram erguidas com o empilhamento e encaixe de grandes blocos de rochas, que foram extra�dos do pr�prio morro. Muitas pessoas sonham, ainda, com a reconstru��o da capela, sendo que as imagens e material para cultos foram estocados pela Igreja cat�lica. Mesmo depois do fim das atividades mineradoras na Gogo, a comunidade local continuou a trabalhar artesanalmente, usando a capela para seus cultos e o cemit�rio para enterrar seus mortos. Desta forma, muitos ainda v�o �s ru�nas para prestar seu respeito aos entes que est�o enterrados no alto da Gogo. Uma outra testemunha dos tempos do ouro e que ainda resiste na regi�o � um p� de manga, que fornecia frutas e era usado como poste para castigar os escravos que desobedeciam as regras da mina. (A LOJA ROTA PERDIDA/ROTA EXTREMA - www.rotaperdida.com.br - forneceu parte dos equipamentos usados nas expedi��es)