Mariana – A umidade aos poucos deforma e faz desabar os t�neis das minas do Morro da Gogo, em Mariana. Explorar essas passagens abertas pelos escravos no s�culo 18 para a extra��o de ouro � algo extremamente perigoso. Poucos conhecem t�o bem as ru�nas quanto o laboratorista Manoel Ribeiro, de 52 anos, que quando crian�a chegou a morar dentro da �rea de ru�nas com seus familiares. Com as m�os, ele destaca um grande peda�o de rocha, que se esfacela entre seus dedos, demonstrando a instabilidade estrutural do t�nel. “� muito comum os t�neis desabarem um pouco ou at� mesmo a ponto de bloquear a passagem. Nesse caso � muito azar da pessoa ficar presa dentro e seria quase imposs�vel sair ou encontrar uma outra sa�da”, afirma. E Manoel tem propriedade para falar, pois quando era crian�a ele e o irm�os se perderam na intrincada rede subterr�nea. “Fomos passando de corredor para corredor e de repente a gente n�o sabia mais como voltar. N�o encontrava mais a sa�da. Foram muitas horas. Para a gente n�o ficar sem luz, rasgamos nossas roupas e fomos botando fogo para iluminar nosso caminho, foi um grande sufoco”, se recorda.
Em praticamente todos os t�neis ainda abertos atualmente na Gogo d� para se sentir a forte umidade, quando n�o se v� nitidamente a �gua vertendo dos tetos e paredes de rocha. Ali dentro, realmente, parece ser muito f�cil uma pessoa se perder, uma vez que todo o local � muito parecido, com a textura das estruturas, com riscos alongados de picaretas e de outras ferramentas utilizadas na �poca de sua escava��o, n�o permitindo diferenciar um trecho de outro. O perigo de gases tamb�m � uma constante nesse ambiente claustrof�bico. “Os escravos vinham com uma gaiola com um passarinho dentro. Sempre que iam entrar em algum lugar, a gaiola ia na frente. Se o passarinho morresse � porque tinha g�s no t�nel. A� eles fugiam dali para n�o morrerem tamb�m”, conta Manoel.
Uma das formas de impedir a prolifera��o de gases nocivos e de permitir que oxig�nio entrasse nas minas subterr�neas era abrindo dutos respiradouros que foram denominados buracos de sari ou sarilho. Atualmente, a disposi��o de centenas desses orif�cios na superf�cie da montanha fizeram da caminhada pela Gogo uma jornada perigosa, uma vez que alguns chegam a ter 80 metros de profundidade. Como o local est� praticamente abandonado, o mato rasteiro cresceu e se alastrou, encobrindo esses orif�cios e disfar�ando sua presen�a dos olhos de pessoas desatentas, como se fossem armadilhas. “Antigamente, era muito comum o gado que ficava solto, pastando, acabar caindo num buraco maior. A� n�o tinha jeito, o animal morria mesmo, porque o buraco vai se afunilando e o animal ficava preso a muitos metros para dentro da terra”, conta Manoel.
TRAG�DIA
Em 2015, a v�tima foi uma crian�a que morava no bairro vizinho, de Morro de Santana. Alberto dos Santos, de 9 anos, soltava pipa no alto do morro, bem ao lado de um buraco de sari. Ao correr de costas, n�o viu a abertura e caiu de uma altura de 30 metros, morrendo instantaneamente. “Foi um desespero para a fam�lia. Todo mundo procurando nos t�neis pelo menino, os bombeiros vieram, at� que um dos amigos dele mostrou onde estava soltando pipa naquele dia. Entraram no t�nel da mina e encontraram a crian�a ca�da no ch�o, toda quebrada”, lembra Manoel. No local onde o acidente ocorreu, uma cruz foi pregada com o nome de Alberto, a �nica demarca��o que alerta para a exist�ncia de um buraco de sari em todo o morro da Gogo. “� um grande perigo da regi�o das minas a presen�a dos buracos de sari. Ningu�m sabe quantos s�o nem onde est�o localizados. N�o custava a administra��o municipal instalar avisos em cada um desses locais para evitar os acidentes”, pondera o professor de Hist�ria da Arte e Iconografia do Instituto Federal de Minas Gerais (IFMG), Alex Bhorer. De acordo com ele, em Ouro Preto tamb�m ocorre a mesma situa��o em locais como o Morro da Queimada.
Depois que a extra��o de ouro cessou e a Gogo foi desativada, ficando quase completamente deserta, os buracos de sari e as passagens das minas se tornaram os esconderijos preferidos de alguns animais, sobretudo de aves. Andorinhas se aproveitam do abrigo fornecido e tecem nos pared�es centen�rios os ninhos para seus filhotes. Casais de urubus fazem o mesmo, n�o sendo raro ver esses grandes p�ssaros surgirem numa revoada de um buraco aberto no ch�o da montanha da Gogo. (A LOJA ROTA PERDIDA/ROTA EXTREMA - www.rotaperdida.com.br - forneceu parte dos equipamentos usados nas expedi��es)