
O m�s em que se celebra o Dia Internacional da Mulher, lembrado a cada 8 de mar�o, concentra campanhas e debates contra a viol�ncia de g�nero, mas neste ano vem sendo marcado exatamente por agress�es e abusos de diversas naturezas contra v�timas do sexo feminino. Um dos casos de maior repercuss�o culminou ontem com a pris�o de um pastor evang�lico acusado de cometer viol�ncia sexual contra mais de 10 fi�is. H� ind�cios de que ele praticasse os ataques h� pelo menos uma d�cada.
Casos desse tipo, em que o autor do crime � do conv�vio dom�stico ou familiar da v�tima, est�o em lenta redu��o em Minas, mas aumentaram ligeiramente em BH na compara��o entre os �ltimos tr�s anos, conforme dados da Secretaria de Estado de Seguran�a P�blica (Sesp). No estado, apesar da queda, esse tipo de ocorr�ncia representa um crime a cada intervalo de tr�s minutos e 37 segundos. Em 2017 foram mais de 145 mil ocorr�ncias em Minas, somente levando em considera��o criminosos que s�o do relacionamento das v�timas, como c�njuges ou namorados, parentes como filhos ou netos, pais, av�s ou ex-companheiros.
Entre os casos registrados pelo diagn�stico de viol�ncia dom�stica e familiar em Minas Gerais, dispon�vel no site da Sesp, h� divis�o entre viol�ncia f�sica, psicol�gica, sexual, patrimonial e moral. Segundo a advogada Renata Werneck, presidente da Comiss�o Jovem da Ordem dos Advogados do Brasil em Minas Gerais (OAB/MG), que trabalha diariamente com direito de fam�lia, a maioria dos casos come�a com uma ocorr�ncia menos grave, com aumento progressivo do grau do desrespeito. “Primeiro, muitas mulheres acabam n�o identificando que est�o sendo violentadas e em muitas vezes elas se sentem dependentes daquela situa��o, de forma financeira ou emocional. Outra coisa � o medo da repress�o social, que ainda impede que denunciem os crimes”, afirma a advogada.
Renata Werneck conta que recebe de uma a duas mulheres em seu escrit�rio toda semana, dizendo n�o aguentar mais a rela��o violenta com os maridos, e por isso pedem div�rcio ou a dissolu��o da uni�o est�vel. “O homem sente que tem uma posse daquela rela��o e a�, para exercer essa posse que ele pensa ter, come�a com agress�o verbal, depois segura o bra�o com mais for�a, passa a for�ar uma rela��o sexual... Por isso � importante que a den�ncia seja feita o mais r�pido poss�vel”, recomenda.
Se apenas os casos de conviv�ncia familiar ou dom�stica somam centenas de milhares em Minas a cada ano, os demais crimes praticados por outras pessoas indicam que o tamanho da viol�ncia contra a mulher � bem maior. Casos como o que, segundo a Pol�cia Civil, envolve um pastor de 51 anos, acusado de abusar sexualmente de mais de 10 mulheres, em a��es que ocorriam havia pelo menos 10 anos. Wilson Jorge Ferreira atua como l�der religioso durante 25 anos, e atualmente pregava na Igreja do Evangelho Quadrangular do Bairro Salgado Filho, Oeste de Belo Horizonte.
Suas investidas o tornaram conhecido como o “man�aco da orelha”, por ter o h�bito de lamber a orelha de suas v�timas no in�cio dos abusos. A delegada Larissa Mascotte ainda investiga se houve conjun��o carnal contra alguma das fi�is atacadas pelo pastor. Uma delas era menor de idade na �poca das investidas do l�der religioso, que a teria molestado dos 12 aos 16 anos. � pol�cia, Wilson disse que a rela��o que tinha com as fi�is era de pai para filha e de pastor para ovelhas. “Com certeza ele aproveitava do cargo religioso para cometer os delitos. Ele falava que tinha muitos amigos que eram policiais, autoridades, pol�ticos e por isso ele ficaria impune”, afirma a delegada.
O advogado Ademir de Souza Lataliza, que representa o pastor no caso, afirma que as den�ncias fazem parte de uma “conspira��o” contra o religioso. Segundo ele, as mulheres se uniram para prejudicar Wilson, por terem problemas particulares com ele. “Essas mulheres est�o dizendo que foram abusadas e ter�o que provar se isso realmente aconteceu. At� o momento, n�o havia nenhum boletim de ocorr�ncia, nenhuma certid�o, nada contra o pastor”, diz o defensor, que acusa a ex-mulher de seu cliente de estar envolvida na campanha. Ele afirma ter aberto processo contra as v�timas por cal�nia e difama��o. De acordo com a Pol�cia Civil, v�timas registraram boletim de ocorr�ncia, o que deu origem ao mandato de pris�o contra o acusado. (Com Jo�o Henrique do Vale e S�lvia Pires, estagi�ria sob supervis�o do editor Roney Garcia)
Os Casos mais recentes
» 13/3
Pol�cia Civil prende pastor evang�lico que atuava na Igreja do Evangelho Quadrangular, no Bairro Salgado Filho, Oeste de BH, em investiga��o que apura viol�ncia sexual praticada contra mais de 10 mulheres. Conhecido como “man�aco da orelha”, por lamber a orelha das v�timas, h� ind�cios de que ele violentava mulheres havia 10 anos
» 13/3
A Pol�cia Civil apresenta M�rio Ferraz Soares, de 28 anos, acusado de assassinar a ex-companheira, de 17, e o filho deles, de 7 meses. Os corpos foram encontrados na noite da �ltima segunda-feira, em um lix�o de Nova Lima, na Grande BH. Segundo a pol�cia, uma bra�adeira teria sido usada para estrangular a m�e e a crian�a, que desapareceram em 15 de janeiro. De acordo com o delegado Rog�rio Franco, M�rio confessou o assassinato. Ele alegou que ficou fora de si ao levar um tapa no rosto, dado pela jovem.
» 12/3
Homem de 26 anos atira tr�s vezes contra ex-namorada de 15, sendo um dos tiros na cabe�a da jovem. Crime aconteceu em Sabar�, na Grande BH, e, segundo familiares da garota, o motivo seria a insatisfa��o com o fim do relacionamento entre os dois. Enquanto tentava fugir, autor foi preso pela pol�cia e v�tima, encaminhada ao Hospital Jo�o XXIII em estado grave
» 12/3
Homem invade casa da ex-mulher em Juiz de Fora, na Zona da Mata, e agride a v�tima, insatisfeito com o fim do relacionamento de 13 anos. Em seguida, ele sequestra a mulher e a leva para o antigo apartamento do casal, onde a v�tima � amea�ada e agredida novamente pelo ex, que agiu com apoio de dois comparsas armados. A Pol�cia Militar prendeu o autor e um dos amigos em flagrante
» 11/3
Homem se senta ao lado de uma mulher em um voo da Avianca Brasil entre BH e S�o Paulo e come�a a se masturbar. Segundo a passageira, que filmou a a��o, funcion�rios da companhia n�o fizeram nada e ainda sugeriram que um dos dois trocasse de lugar
» Casos de viol�ncia dom�stica e familiar contra a mulher em Minas Gerais
2015 148.320
2016 145.645
2017 145.029
» Casos de viol�ncia dom�stica e familiar contra a mulher em Belo Horizonte
2015 18.015
2016 17.962
2017 18.169
Fonte: Sesp

Palavra de especialista
Larissa Mascotte, delegada da Pol�cia Civil, lotada na Delegacia Especializada de Combate � Viol�ncia Sexual
Conscientiza��o em alta
“O aparecimento de casos recentes de viol�ncia contra a mulher pode ser explicado pelo maior encorajamento das v�timas. A cultura machista vem de muito tempo, mas agora os casos t�m sido mais notificados. O assunto tem sido muito abordado pela m�dia, e isso acaba incentivando as mulheres a denunciar. Acho que a sociedade est� mais consciente, que est� havendo uma mudan�a de cultura. � importante que as v�timas denunciem e notifiquem esses casos de abuso e estupro, porque o sil�ncio � o maior inimigo da v�tima e tamb�m dificulta a apura��o e o combate ao delito.”
Entrevista
Maria(*), de 25 anos, uma das mulheres que acusam o pastor Wilson Jorge Ferreira de abusos
Abusos em igreja
Quando as investidas come�aram?
Eu frequentava a igreja havia muitos anos, e sempre ouvia coment�rios do tipo “Como voc� est� bonita!” ou “E essa cal�a legging?”. Sempre ignorei, mas em 2011 o ass�dio passou a ser mais s�rio. Eu estava gr�vida e passava por problemas familiares. Estava muito abalada fisicamente e emocionalmente. Um dia cheguei ao culto com o rosto inchado de tanto chorar e ele me chamou para ir ao escrit�rio dele, dentro da igreja. L�, me disse que “Deus estava no controle” e me consolou. Ap�s as palavras, ele me abra�ou. Mas o abra�o foi muito forte e ele passou a alisar os meus ombros at� a minha cintura. Da�, eu entendi o que aquilo significava.
O ass�dio era recorrente?
Depois desse epis�dio, ele deu um tempo, mas continuava fazendo isso com outras v�timas. Ele voltava a conquistar a nossa confian�a e ajudava com caronas e conselhos. Isso fazia com que n�s pens�ssemos: “Ele � um pastor. Deve ter se arrependido”. Depois de alguns meses, aconteceu de novo comigo. Eu estava jantando com minha fam�lia em frente � igreja e ele se sentou conosco. Foi ent�o que passou a alisar minha perna com o p�. A gosta d’�gua foi quando, mais uma vez, eu passava por problemas e estava longe da igreja, por cuidar da minha av�. Ele me ligou e ofereceu uma carona para o culto. Como fazia um tempo que eu n�o ia, aceitei. Na volta, ele parou em frente da casa, puxou o meu pesco�o e tentou me beijar � for�a. Eu me esquivei e sa� correndo do carro. Nunca mais voltei � igreja.
Quando decidiu denunciar?
H� tr�s anos n�s descobrimos que minha irm� sofreu diversos abusos entre os 12 e 16 anos. Ela me disse que tinha “nojo de homem”. Sofreu calada, tinha muito medo dele. Ele dizia que ningu�m acreditaria nela, amea�ava a fam�lia e comprava presentes para convenc�-la. Em um dos epis�dios, ele chegou a entrar na nossa casa quando minha irm� estava sozinha e tentou estupr�-la. Ela s� escapou porque meu pai estava chegando e o pastor desistiu. Depois disso, ela decidiu contar para n�s. Uma segunda v�tima fez um post no Facebook acusando-o de ass�dio e n�s compartilhamos. A partir da�, outras sete mulheres conversaram conosco para contar que teriam sofrido abuso do pastor. No ano passado n�s fomos � pol�cia.
Qual mensagem voc� deixa para outras mulheres que sofrem com isso?
H� muita gente julgando, questionando por que n�o denunciamos antes. � importante frisar que � muito dif�cil para uma v�tima falar sobre o abuso. O medo � muito grande de ser julgada. �s vezes, nem a pr�pria mulher entende que aquilo � um ass�dio. Como ele � uma pessoa que trabalha na igreja, as mulheres tendem a confiar ainda mais. Mas � muito importante que as v�timas procurem a pol�cia.
* Nome fict�cio