
H� uma semana, um dos grafites que colore os tapumes das obras na Pra�a da Liberdade, na Regi�o Centro-Sul de BH, amanheceu censurado. Mamilos e genit�lia da mulher representada na pe�a foram cobertos com tinta branca. Desta vez, a nudez que comp�e Sonho agridoce, ou imaculado, exposta no Centro Cultural S�o Geraldo, na Regi�o Leste de BH, foi questionada por parlamentares, que apontaram “apologia � erotiza��o e � masturba��o” e afirmaram que crian�as estariam “expostas a uma mostra pornogr�fica.” Ap�s a cr�tica dos vereadores, pelo menos quatro amea�as ocorreram no espa�o e guardas municipais foram solicitados para proteger permanentemente o local. Os funcion�rios est�o com medo de outras poss�veis intimida��es. Mas, na contram�o da intoler�ncia, tanto eles quanto a obra receberam apoio de visitantes e institui��es culturais. Ontem, um grupo esteve ao local para se manifestar a favor do artista e da liberdade de express�o. A Funda��o Municipal de Cultura tamb�m se pronunciou: o trabalho se encontra dentro dos padr�es sugeridos como crit�rios para a classifica��o livre, diz a institui��o que ainda “lamenta’ e “repudia o ato de desrespeito dos vereadores”.
A mostra, composta por um painel com mais de 200 fotos e um vestido de noiva, onde foram alfinetadas imagens de corpos masculinos parcialmente despidos, est� gerando pol�mica. O intuito do artista, que usa o pseud�nimo de Meshiacha, � convidar a uma reflex�o sobre como a sociedade cria os homens e mulheres para terem objetivos diferentes em rela��o ao casamento. Mas os vereadores Fernando Borja (Avante) e Jair Di Greg�rio (PP) visitaram a exposi��o no fim de semana e classificaram as imagens como uma forma de “apologia � erotiza��o e masturba��o, sem nenhuma restri��o � entrada de crian�as”. Na ocasi�o, dois v�deos foram divulgados nas redes sociais denunciando o conte�do da mostra. “Precisamos combater a erotiza��o disfar�ada de arte”, disse o vereador Fernando Borja ao Estado de Minas.
Segundo ele, crian�as n�o t�m maturidade psicol�gica para compreender temas da sexualidade adulta. “A Constitui��o Federal e o Estatuto da Crian�a e do Adolescente (ECA) s�o expressos em reconhecer a vulnerabilidade psicol�gica. A lei � expressa ao proibir a exibi��o de fotos, imagens ou desenhos er�ticos”, afirmou ele. Colega de C�mara Municipal de Belo Horizonte de Borja, o vereador Jair Di Greg�rio, l�der da bancada crist�, tamb�m foi ao centro, onde fez um v�deo “ao vivo” para mostrar a “aberra��o”. Ele � o mesmo que denunciou a exposi��o do artista mineiro Pedro Moraleida, Fa�a voc� mesmo sua Capela Sistina, que ficou em cartaz no Pal�cio das Artes. “� brincadeira o que a cultura de BH est� fazendo com as nossas crian�as.”, disse em v�deo. “Isso nunca foi arte e nunca vai ser. � pornografia”, completou.
Ao EM, Gregorio sustenta a mesma argumenta��o do colega sobre a suposta “apologia � erotiza��o”. E afirma: “Material dessa natureza n�o pode estar exposto a crian�as e adolescentes, principalmente em equipamento p�blico.” Segundo ele, o fato ser� apurado com a Secretaria Municipal de Cultura. O parlamentar garante que n�o se trata de censura: “Estamos cumprindo as leis. Os artigos 78,79 e 214 do Estatuto da Crian�a e Adolescente, bem como os artigos 218 e 233 do C�digo Penal pro�bem a exposi��o de imagens ou mensagens pornogr�ficas ou obscenas a crian�as e adolescentes.”
ATAQUES AO CENTRO Ap�s as visitas, o Centro Cultural S�o Geraldo tem recebido constantes amea�as. Ana Paula Cantagalli, gestora do espa�o e artista pl�stica disse estar assustada com a repercuss�o: “A exposi��o veio de comum acordo com a comiss�o local de cultura, j� para ter essa abertura. A gente esperava que gerasse uma pol�mica, j� que � uma exposi��o que traz um questionamento, mas n�o cont�vamos com ataques de �dio gerados por esses v�deos”, contou ela. Ela disse que pessoas estiveram ao local e tentaram entrar, mesmo com o centro cultural fechado. “Queriam que fosse aberto de qualquer jeito, amea�ando: ‘Tem que p�r fogo nisso a�’. ‘Nada que tem a� presta’”, lamentou ela. Em quatro casos de ataque, a profissional se sentiu acuada. Al�m da entrada for�ada, um homem que se identificou como agente penitenci�rio disse: “Vou arrebentar esse risinho seu. Vou rasgar esse risinho seu. S� n�o vou fazer nada enquanto voc�s (referindo-se aos guardas municipais) estiverem aqui”.
Diante dos ataques envolvendo a instala��o, o artista se manifestou para explicar o conceito em torno da obra e apontou censura nas atitudes dos vereadores. Ao EM, ele disse acreditar que os debates s�o importantes e as opini�es contr�rias merecem ser ouvidas, desde que isso seja feito de forma respeitosa: “Al�m do tom de voz desrespeitoso, podemos perceber no pr�prio v�deo uma expl�cita deturpa��o do conte�do da obra”.

Meshiacha ainda pontua que, de acordo com o Guia Pr�tico de Classifica��o Indicativa do Minist�rio P�blico Federal, seu trabalho est� dentro dos padr�es sugeridos como crit�rios para a classifica��o livre. “Observado o contexto do trabalho proposto – que est� explicitado no texto que acompanha a instala��o e ignorado pelos dois vereadores que foram at� a exposi��o –, acredito que o trabalho est� de acordo com a classifica��o livre sugerida pelo Minist�rio da Justi�a, uma vez que nenhum �rg�o genital est� exposto e as imagens n�o sugerem atos sexuais nem se apresentam em nenhum contexto er�tico”, completou.
Por meio de nota, a Funda��o Municipal de Cultura prestou apoio e solidariedade aos funcion�rios do Centro Cultural S�o Geraldo e � instala��o Sonho agridoce, ou imaculados e concordou que o trabalho n�o fere as normas sugeridas para classifica��o livre. E reafirmou “a voca��o p�blica de seus equipamentos culturais ao oferecer seus espa�os expositivos para artistas e projetos culturais, fomentando reflex�es art�sticas e prezando pela pluralidade”.
Frequ�ncia � mostra dobra
� a arte cumprindo o seu papel? A pol�mica levou centenas de pessoas ao Centro Cultural S�o Geraldo. H� quem admire e quem critique a exposi��o Sonho agridoce, ou imaculado. Mas se o n�mero de pessoas que passavam por ali n�o era muito grande at� o �ltimo fim de semana, ap�s a pol�mica, as aten��es se voltaram para a mostra e o n�mero de visitantes dobrou. E na contram�o do �dio um grupo de cerca de 30 pessoas foi ontem ao espa�o em solidariedade ao artista.
“A exposi��o j� estava acontecendo e n�o tinha gerado repercuss�o nenhuma. Agora, est� trazendo uma discuss�o, e vemos que a arte est� cumprindo seu papel. Como artista pl�stica, estou muito feliz. O n�mero de visitantes praticamente dobrou, ajudou a divulgar o centro. Entre as pessoas da comunidade, h� muito mais apoio. Quase todos apoiando”, contou Ana Paula Cantagalli, gestora do Centro Cultural.
Leandro Pereira Dias, de 38 anos, produtor cultural e m�sico foi ao local para prestar suas homagens e pedir pela liberdade de express�o. “A gente percebe que a quest�o dessas pessoas que fomentam o �dio n�o � contra a exposi��o em si, porque a obra mesmo n�o traz nada al�m do que a gente v� todos os dias na televis�o, nas bancas de revista. A posi��o dessas pessoas � contra a cultura, contra a arte, contra a liberdade de express�o”, afirmou o produtor, que levou a filha de 1 ano e nove meses para o protesto. “A gente cria nossos filhos j� com esse pensamento do que � arte e a import�ncia que ela tem”, completou.
Durante o ato, um abaixo-assinado foi repassado para os visitantes em apoio � exposi��o. At� o in�cio da tarde de ontem, pelo menos 100 pessoas j� haviam assinado o documento. Meshiacha se diz muito satisfeito e grato pelo apoio. “Fiquei muito surpreso quando vi os v�deos. Mas estou ainda mais surpreso com o apoio. Estou muito feliz”, contou.
SERVI�O
Centro Cultural S�o Geraldo – Av. Silva Alvarenga, 548, Bairro S�o Geraldo
At� 31 de agosto. Segundas, das 9h �s 17h. De ter�a a sexta, das 9h �s 18h.
Outras informa��es: (31) 3277-5648