
Perigo cont�nuo, com causas identificadas, mas sem controle eficaz para evitar enchentes na Avenida Vilarinho, faz parte da rotina dos moradores de Venda Nova durante �pocas de chuva forte em Belo Horizonte. A via � alimentada por 86 acessos de ruas ao longo de seus 6,5 quil�metros de extens�o.
Desde 2009, quando foi lan�ada a primeira carta de inunda��es da capital mineira, a regi�o de 16 acessos da Vilarinho entre a Avenida Cristiano Machado e a Rua Bernardo Ferreira da Cruz figura como uma armadilha. Ali se localiza a maior – mas n�o a �nica (veja mapa abaixo) – mancha de inunda��es da avenida, devido � satura��o da galeria subterr�nea que comporta o curso do C�rrego Vilarinho e o encontro de cinco cursos d’�gua.

E foi justamente nesse local que as vias se tornaram rios e tr�s pessoas morreram: duas dentro do carro e uma ao descer do ve�culo e cair em duto da galeria de um c�rrego, em 2018. A quarta v�tima mergulhou em outro trecho inundado. A �rea tem aproximadamente 100 mil metros quadrados e engloba a Esta��o Venda Nova.
Alerta dado em 2009
Na carta de 2009 j� constava que essa regi�o tem risco cr�tico de inunda��es quando as precipita��es atingem 40 mil�metros em cerca de 30 minutos. Na noite das mortes de 2018, Venda Nova experimentou entre as 19h20 e as 20h20 uma chuva de 83,4 mil�metros, mais que o dobro do volume considerado cr�tico e equivalente a 34,7% do esperado para o m�s.Segundo a PBH, a indica��o de �reas de inunda��o que constam na carta n�o � o �nico fator para levar ao fechamento de uma via. “As pessoas podem acessar a via por outras secund�rias, ficando expostas aos riscos. Todas as vias sujeitas a alagamento na cidade t�m placas (mais de mil) de aviso e advert�ncia orientando rotas de fuga e medidas de autoprote��o”, informou a administra��o municipal, por meio de nota na �poca.
“Al�m disso, s�o emitidos alertas preventivos para que as pessoas possam adotar medidas de seguran�a, prote��o e retirar seus ve�culos de �reas inund�veis. Os locais apontados s�o fechados em a��es previamente estabelecidas e de acordo com o monitoramento meteorol�gico e do n�vel dos c�rregos”.
Armadilhas e medo
Trafegar pela Avenida Vilarinho sob chuva pesada n�o � uma boa ideia e isso fica ainda mais claro quando se levam em conta as proje��es de enchentes da Carta de Inunda��es de Belo Horizonte. Dos 6,5 quil�metros de pistas triplas em m�o e contram�o, apenas os 1.200 metros que ficam entre as ruas Padre Pedro Pinto e Luzia Salom�o n�o apresentam propens�o a serem invadidos pelas �guas das chuvas e se transformar num rio.O segmento representa apenas 18% da extens�o total da avenida. Nos demais trechos, o risco de ter o seu carro levado pelas enxurradas ou ser pego de surpresa a p� � grande.
O estudo da Superintend�ncia de Desenvolvimento da Capital (Sudecap) indica que as �guas podem abranger at� 160 metros de largura, entrando nos quarteir�es da vizinhan�a, invadindo casas, com�rcios e galp�es. O gargalo que esse levantamento identificou na �rea de 100 mil metros quadrados da Vilarinho entre a Avenida Cristiano Machado e Rua Bernardo Ferreira da Cruz, onde tr�s pessoas morreram no �ltimo dia 15, aparece em outros dois grandes trechos.

Um dos locais cr�ticos para inunda��es se situa bem na �rea onde o C�rrego Vilarinho � formado, no Bairro Piratininga, Regi�o de Venda Nova. O Vilarinho n�o tem uma nascente, se forma pela jun��o dos c�rregos Piratininga, que passa pela Rua Barra Bonita, com o da Rua dos Navegantes e o Olga Pimenta Guimar�es – o nome s� passa a constar ap�s a Rua Padre Pedro Pinto.
E o Vilarinho j� surge numa �rea de grande probabilidade de enchentes. Os cursos de �guas polu�das por esgoto e lixo se unem e correm cercados por casas muito pr�ximas, praticamente debru�adas sobre o Vilarinho. Quando a chuva engrossa e as �guas vencem as v�rzeas, chegam a se estender por uma �rea de 37 mil metros quadrados. Uma mancha alagadi�a que se alarga por 150 metros al�m do leito normal, de cerca de 5 metros, ou seja, ganha 30 vezes a sua largura normal.
Isso traz in�meros transtornos para a popula��o, pois a �rea � densamente povoada e conta com um hospital (S�o Francisco), uma escola municipal (C�nego Trindade) e quatro igrejas.

"Muitas vezes a gente fica ilhada, sem ter como ir a uma farm�cia, ao posto de sa�de ou mesmo � padaria, porque o rio (c�rrego) sobe muito r�pido e fecha a nossa passagem"
Est�fane Cristina Ribeiro da Silva, de 24 anos
A vi�va Altelina Alves Santos, de 86 anos, j� enfrentou muitas enchentes na sua casa. Mas nem por isso quando chove forte ela deixa de se preocupar muito e rezar. “Moro sozinha aqui, s� eu e Deus. H� mais de 20 anos que a Prefeitura de Belo Horizonte (PBH) fala que vai arrumar os c�rregos, mas quando chove eles carregam tudo que tem pela frente. Desce de tudo aqui: lixo, animais mortos... Quando a �gua entra na minha casa � um desespero, tenho medo de um dia faltar for�as para lutar”, disse Altelina.
Os alagamentos no ber�o do Vilarinho tamb�m atrapalham a mobilidade da popula��o. “Muitas vezes a gente fica ilhada, sem ter como ir a uma farm�cia, ao posto de sa�de ou � padaria, porque o rio (c�rrego) sobe muito r�pido e fecha a nossa passagem”, disse Est�fane Ribeiro da Silva, de 24. Ela � m�e de tr�s crian�as, a mais nova de 1 m�s. “Morro de medo de ter de andar perto dessa �gua, no meio da chuva, carregando minha filha”, afirma.
O segundo grande ponto de inunda��es fica entre as ruas Maria Helena Felipe e Elias Ant�nio Issa, em Venda Nova. Nesse local, o C�rrego Candel�ria � canalizado e corre pelo subterr�neo. Suas �guas s�o despejadas no Vilarinho a poucos metros de outra foz, a do C�rrego da Avenida Baleares. Quando h� tempestades mais fortes, o ac�mulo de �guas ingressando no Vilarinho pode provocar uma mancha de alagamentos de cerca de 30 mil metros quadrados, avan�ando 500 metros pela Avenida Elias Ant�nio Issa, onde o C�rrego Candel�ria � canalizado.
Invariavelmente, o que � arrastado pelo C�rrego Vilarinho e seus afluentes acaba despejado no Bairro Xod� Marise, do outro lado da Avenida Cristiano Machado, onde o corpo d’�gua segue seu caminho at� desaguar no Ribeir�o do On�a. “A gente morre de medo de ver a for�a da �gua. E vem de tudo boiando: fog�o, geladeira, televis�o, colch�o, poltrona, pneus, cavalos, cachorros e tudo quanto h�”, conta a dona de casa Juvita de Lucena Lopes, de 58, que mora no local.
Segundo ela, quando a estudante Anna Lu�sa Fernandes de Paiva, de 16, foi sugada pela galeria no dia 15, os moradores da vila onde o Vilarinho desemboca ficaram consternados e chegaram a vasculhar as margens � procura da jovem. “Mas n�o tinha chance de ela se salvar. S� quem mora aqui � que v� como a �gua sai, como se fosse uma cachoeira, num jorro muito forte”, descreve.

"Moro sozinha aqui, s� eu e Deus. Desce de tudo aqui: lixo, animais mortos... Quando a �gua entra na minha casa � um desespero, tenho medo de um dia faltar for�as para lutar"
Altelina Alves Santos, de 86 anos