
O rompimento da Barragem 1 da Mina do C�rrego do Feij�o, em Brumadinho, na Grande BH, que completa um m�s segunda-feira e deixou 177 mortos e 134 desaparecidos, dever� ser um divisor de �guas na hist�ria da minera��o no Brasil. E, principalmente, na quest�o da seguran�a. Para o secret�rio de estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustent�vel, Germano Luiz Gomes Vieira, tamb�m presidente da Associa��o Brasileira dos Secret�rios de Estado de Meio Ambiente (Abema), � preciso rever conceitos de engenharia das estruturas de conten��o de rejeitos de min�rio e adotar mais rigor quanto aos atestados de estabilidade apresentados pelos empreendedores. No caso da Vale, dona da mina de Brumadinho, Germano � enf�tico: “Sentimos que fomos ludibriados. Estamos t�o indignados e revoltados quanto todos os �rg�os a quem s�o destinados os laudos”.
Na tarde de ontem, o secret�rio adiantou que a mineradora Vale se comprometeu a pagar � Secretaria de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustent�vel (Semad), nos pr�ximos 10 dias, multa no valor de R$ 100 milh�es, referente aos danos ambientais causados pela companhia na regi�o de Brumadinho, que degradou a Bacia do Rio Paraopeba – onde alguns ribeir�es, como o C�rrego Ferro-Carv�o, ficaram completamente soterrados. O dinheiro ser� aplicado em projetos ambientais, a partir de um chamamento p�blico em outras regi�es do estado, j� que, em Brumadinho, a responsabilidade pela repara��o dos danos � integralmente da Vale. Ser� a primeira vez que esse tipo de multa ser� paga integralmente.
"Sentimos que fomos ludibriados. Estamos t�o indignados e revoltados quanto todos os �rg�os a quem s�o destinados os laudos"
Germano Luiz Gomes Vieira, secret�rio de estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustent�vel
O acordo para pagamento foi definido em audi�ncia com o Minist�rio P�blico de Minas Gerais e a empresa, anteontem, na 6ª Vara de Fazenda Estadual e Autarquias, no f�rum de Belo Horizonte. Logo, a empresa n�o vai recorrer. Durante a entrevista, o secret�rio se emocionou ao se lembrar das v�timas e da terra arrasada na qual se transformou parte de Brumadinho, e disse ter consci�ncia tranquila de que n�o tem responsabilidade sobre o epis�dio que comoveu o Brasil e ganhou destaque internacional. Uma das ideias de Germano � que a regi�o atingida pelo rompimento da barragem se torne um memorial em forma de parque – “Um lugar de paz, onde as pessoas possam ir, rezar, enfim, reverenciar a mem�ria dos mortos e desaparecidos. E, assim, nunca deixar que a trag�dia seja esquecida”.

‘LUDIBRIADOS’ Incisivo ao afirmar ter a sensa��o de que o �rg�o ambiental de Minas foi “ludibriado” pela Vale, embora prefira aguardar o fim das investiga��es antes de acusar a empresa, inclusive de crime, Germano lembrou que em setembro a Semad tinha recebido manifesta��o favor�vel em rela��o � estabilidade da barragem. “As investiga��es mostram ind�cios graves de erro nas informa��es que foram passadas �s autoridades. � crime apresentar documentos falsos ou tecnicamente falsos a �rg�o ambiental”, afirmou Germano, certo de que a trag�dia de Brumadinho est� levando auditores a ter nova postura em suas avalia��es de estruturas. “Na metologia atual, o empreendedor contrata uma auditoria independente, que faz a an�lise de laudos e a encaminha para a ANM”, afirma.
A quest�o de seguran�a mereceu destaque especial do secret�rio, de 37 anos, que � advogado e p�s-graduado em meio ambiente. Para ele, � necess�rio definir as atribui��es de cada �rg�o fiscalizador – no caso espec�fico, a Semad e a ANM –, a fim de se evitarem fraudes e conflitos de compet�ncia. Regras claras sobre o assunto s�o essenciais, pois muitas leis ambientais dependem de complemento t�cnico. “Vamos fazer autocr�tica em rela��o ao modelo vigente e estabelecer zonas de exclus�o. O aspecto econ�mico � importante, mas ningu�m est� disposto a ter esse tipo de barragem, a montante, em Minas Gerais. N�o admitimos mais essa forma de constru��o”, afirmou, ao se referir � t�cnica com que foram erguidas as represas de rejeitos que se romperam em Mariana e, tr�s anos depois, em Brumadinho, mais baratas e mais vulner�veis."Nenhuma licen�a e nenhum alvar� d� direito a algu�m de cometer crime. Temos que saber lidar com os protocolos para proteger a vida"
O secret�rio sustentou que a nova lei ambiental em discuss�o na Assembleia Legislativa de Minas Gerais prop�e que as empresas adotem tecnologia de ponta para disposi��o de rejeitos e uso de formas mais seguras e menos impactantes nos empreendimentos, al�m de exig�ncia de audi�ncias p�blicas em todas as comunidades atingidas. “Seria importante ter um f�rum de quest�es sociais com a popula��o do entorno. Mais importante do que a licen�a ambiental � a licen�a social, para os moradores aprenderem a conviver com os empreendimentos e esses a respeitarem as comunidades”, afirmou, defendendo tamb�m a cria��o de regras que desestimulem economicamente o uso de barragens de rejeitos.
SENSO DE DEVER O Brasil, na avalia��o do titular da Semad, tem que saber lidar com o “senso de dever”. “Nenhuma licen�a e nenhum alvar� d� direito a algu�m de cometer crime. Temos que saber lidar com protocolos para proteger a vida”, disse Germano. Segundo ele, essa postura se traduz em medidas eficazes de seguran�a para a opera��o das mineradoras e, em casos cr�ticos, de evacua��o dos moradores nas �reas afetadas e entorno – cuja necessidade foi defendida por ele –, al�m de outras provid�ncias. Cauteloso e sempre garantindo que prefere aguardar o desenrolar das apura��es para emitir opini�es sobre responsabilidades, o secret�rio afirmou que as investiga��es v�o mostrar se h� mesmo risco de rompimento de outras barragens do Quadril�tero Ferr�fero, preocupa��o que j� motivou evacua��o de quase 1,2 mil pessoas de suas casas em cinco cidades. “Seria algo muito perverso se a empresa estiver usando isso como estrat�gia para afastar o foco da trag�dia em Brumadinho”, disse, ao ser questionado sobre as sucessivas desocupa��es nas proximidades de minas da Vale ap�s a cat�strofe.
"Seria algo muito perverso se a empresa estiver usando evacua��es como estrat�gia para afastar o foco da trag�dia de Brumadinho"
O secret�rio disse que ainda � cedo para fazer uma autocr�tica, mas, mesmo assim, pensa o que poderia ter sido feito no licenciamento ambiental para evitar a trag�dia ocorrida em 25 de janeiro. Germano assegura que o processo de licenciamento conclu�do em meados de dezembro no Conselho Estadual de Pol�tica Ambiental (Copam) n�o era de amplia��o, mas de retirada de rejeito (descomissionamento) da barragem da Mina C�rrego do Feij�o, recaracterizar a topografia e reaproveitar o min�rio de ferro. “O licenciamento n�o � a causa (do desastre em Brumadinho). Mas � preciso avaliar o que o �rg�o ambiental poderia fazer de diferente num processo que n�o era para aumentar nem construir barragem, cujo certificado n�o tinha sido entregue e que seria submetido a outra inspe��o da ANM”, disse.
Para o secret�rio, � preciso ser “cir�rgico” nas provas e “talvez nunca mais se possa considerar um laudo ou que o documento seja referendado por outras institui��es ou que haja outro modelo de par�metros de seguran�a”.