
Data marcada e sacramentada: a Igreja S�o Francisco de Assis, mais conhecida como Igrejinha da Pampulha e considerada �cone do patrim�nio moderno mundial, ser� reinaugurada em 4 de outubro, dia consagrado ao padroeiro do templo, projetado por Oscar Niemeyer (1907-2012). A informa��o foi divulgada pela superintendente do Instituto do Patrim�nio Hist�rico e Art�stico Nacional (Iphan) em Minas, C�lia Corsino, que adiantou a complementa��o de recursos, pela autarquia federal, para recupera��o dos jardins do entorno, de autoria do paisagista Burle Marx (1909-1994). A not�cia chega como um presente para os moradores de Belo Horizonte e visitantes, pois, na pr�xima quarta-feira, ser�o lembrados os tr�s anos de reconhecimento do conjunto moderno da Pampulha como patrim�nio da humanidade, pela Organiza��o das Na��es Unidas para a Educa��o, a Ci�ncia e a Cultura (Unesco).
A boa-nova, no entanto, n�o tira do foco uma s�rie de problemas enfrentados pela Pampulha, alguns considerados de dif�cil solu��o. � o caso do fantasma que, desde a conquista do t�tulo da Unesco, assombra moradores, intriga visitantes e ganhou forma na vis�o de muita gente, inclusive autoridades: ao fim do prazo de tr�s anos, se n�o fossem resolvidas pend�ncias, como a demoli��o de um anexo do Iate Clube, o conjunto moderno da Pampulha poderia perder o t�tulo de patrim�nio da humanidade conquistado em 17 de julho de 2016. Segundo a ag�ncia da ONU no Brasil, o complexo arquitet�nico em torno da lagoa, incluindo a S�o Francisco de Assis, a Casa do Baile, o Museu de Arte da Pampulha (antigo cassino), o Iate Clube, duas pra�as e o espelho d'�gua, n�o corre tal risco, pois nem h� uma lista sobre bens nessa situa��o, no mundo. O resumo � que n�o h� “a��es punitivas, mas colaborativas”.
Na �poca que antecedeu a conquista do t�tulo, ocorrida durante a 40ª reuni�o do Comit� de Patrim�nio Mundial da Unesco, em Istambul, na Turquia, houve determina��o das autoridades internacionais e compromisso das autoridades municipais para resolver todas as quest�es pendentes. A recomenda��o constava do relat�rio final da Unesco enviado, via Itamaraty, � Prefeitura de Belo Horizonte (PBH) e � Funda��o Municipal de Cultura (FMC). O tempo passou, a regi�o conheceu avan�os, como o restauro da Igrejinha da Pampulha, e retrocessos, entre eles a qualidade da �gua, que continua recebendo esgoto, e a situa��o do Iate, j� que a demoli��o do anexo do Iate se encontra em compasso de espera.
Grandes desafios na orla
A gerente do conjunto moderno da Pampulha/FMC, Jana�na Fran�a Costa, est� tranquila sobre a manuten��o do t�tulo e garante que h� muito para comemorar. “Tem havido muito empenho, de ambas as partes (prefeitura e clube), principalmente nas negocia��es para resolver a situa��o do Iate. Se n�o houve um ponto final, h� evolu��o no entendimento.” O caso tem acompanhamento do Minist�rio P�blico de Minas Gerais (MPMG) e proposta de desapropria��o pela PBH. “Resolver essa situa��o ainda � um dos grandes desafios”, explica.
Jana�na, que atuou desde 2012 como secret�ria-executiva no processo de candidatura da Pampulha ao t�tulo da Unesco – a primeira iniciativa nesse sentido se deu em 1996 – destaca que a conquista aumentou o turismo na regi�o, com registro de 30% a mais nos per�odos de f�rias: “Ser patrim�nio da humanidade se torna um cart�o de visitas”. Al�m da rela��o com os visitantes, afirma, a Pampulha tem conex�o muito forte com pessoas que fazem caminhada e correm na orla da Lagoa ou pedalam e andam de patinete, a novidade deste ano. “Essa apropria��o, por parte da popula��o, � din�mica, jamais est�tica”, observa Jana�na, que cita o fortalecimento de programas educativos como avan�o no per�odo.
Lembrando que o t�tulo da Unesco para a Pampulha ocorreu na categoria Paisagem cultural, Jana�na explica que, al�m dos “jardins maravilhosos” de Burle Marx (1909-1994), o projeto do arquiteto Oscar Niemeyer (1907-2012), no in�cio da d�cada de 1940, uniu a m�o do homem � natureza. “A Pampulha est� dentro do conceito de arte total, com v�rias linguagens, incluindo arquitetura, paisagismo, artes pl�sticas, azulejaria, mosaicos, pintura e outros. Portanto, n�o � s� Niemeyer, mas o conjunto da obra”, afirma a gerente.
Visitantes cobram melhorias
Em julho de 2016, os patinetes por aplicativo eram ilustres desconhecidos em Belo Horizonte, mas, agora, muitos turistas j� percorrem a orla da lagoa da Pampulha para conhecer os monumentos. Residentes em Franca, no interior de S�o Paulo, os amigos �tila Luiz Misael, propagandista farmac�utico, e Paulo C�sar da Silva, coordenador de sistemas, ambos de 32 anos, e Yuri Miranda, de 31, arquiteto, curtiram o passeio na tarde de quarta-feira no cart�o-postal da capital mineira. “As pessoas que moram aqui podem estar acostumadas, mas, para quem vem de fora, � muito legal e importante”, contou Yuri. �tila ressaltou o trabalho do “famoso Niemeyer”, enquanto Paulo C�sar, tamb�m de olho nos monumentos, falou que o trio percorreu os 18 quil�metros da orla.
Para Dulcina Figueiredo, vinculada � Associa��o Pro-Civitas (bairros S�o Luiz e S�o Jos�), h� gargalos a serem resolvidos tendo em vista um patrim�nio da humanidade. Ela cita como urgentes o tratamento da �gua da lagoa, “que nunca � finalizado”, a ilumina��o p�blica e outros “grav�ssimos” somente sentidos por quem habita na regi�o. “A restaura��o da igreja j� � um progresso”, afirma. Moradora da regi�o desde 1993, Juliana Renault Vaz acredita que h� muito por fazer e pouco para comemorar. “N�o resolvem o problema do Iate e os da lagoa. O pior ainda � o mau cheio que a lagoa continua exalando, algo insuport�vel”.
Se h� aumento do turismo, s�o necess�rios banheiros permanentes, e n�o qu�micos, defende a arquiteta e urbanista Rose Guedes integrante do Conselho de Arquitetura e Urbanismo (CAU) e atuante no processo de candidatura da Pampulha. “Trata-se de um problema urgente e n�o h� iniciativas para resolv�-lo”, critica Rose Guedes, que conduz o programa de visita��o e educa��o patrimonial Arquitetando roteiros em BH. “N�o � poss�vel as pessoas participarem de um circuito de quatro horas na Pampulha e n�o ter um banheiro � disposi��o”, destaca a conselheira, que faz quest�o de destacar o empenho, no sucesso da conquista do t�tulo, do ex-presidente da FMC, Le�nidas Oliveira, e da ex-presidente do Iphan Jurema Machado.
Aberta para o mundo
Para o coordenador t�cnico do dossi� de candidatura, arquiteto e professor Fl�vio Carsalade, o t�tulo e os �ltimos tr�s anos de a��es puseram “r�deas” na Pampulha, principalmente com a forma��o do comit� gestor, determina��o da Organiza��o das Na��es Unidas para a Educa��o, a Ci�ncia e a Cultura (Unesco), para integrar todas as obras p�blicas na regi�o. “Temos muitas conquistas, principalmente com o fato de, hoje, a Pampulha ser mais Pampulha, o que se traduz por estar mais aberta para o mundo”.
Se os melhoramentos s�o gradativos, conforme assinala o ex-diretor da Faculdade de Arquitetura da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), onde atualmente comanda a editora, e ex-administrador regional Pampulha, Carsalade alerta que ainda falta fiscaliza��o eficaz para coibir obras irregulares que continuam surgindo a olhos vistos.
A campanha pelo t�tulo da Unesco
1996
Conjunto moderno da Pampulha entra na lista indicativa do pa�s de candidatos ao t�tulo de patrim�nio cultural da humanidade, mas o governo brasileiro n�o apresenta a proposta � Unesco devido ao estado de degrada��o da lagoa e dos monumentos
2012
Em dezembro, candidatura � retomada pela Prefeitura de Belo Horizonte (PBH), via Funda��o Municipal de Cultura (FMC). � formada uma comiss�o de especialistas – representantes do poder p�blico nas esferas federal, estadual e municipal, bem como da sociedade civil – que fica respons�vel por concretizar a proposta, como elabora��o do dossi� de candidatura a ser entregue � Unesco
2013
Em abril, comiss�o executiva respons�vel pela implementa��o do projeto Pampulha Patrim�nio da Humanidade recebe t�cnicos do Instituto do Patrim�nio Hist�rico e Art�stico Nacional (Iphan), de Bras�lia (DF), que visitam a orla da lagoa da Pampulha e im�veis do conjunto arquitet�nico da Pampulha
2014
Em setembro, o arquiteto uruguaio Ruben Garc�a Miranda, consultor do Conselho Internacional de Monumentos e S�tios (Icomos), �rg�o que auxilia a Unesco na avalia��o dos bens candidatos � Lista do Patrim�nio Mundial, faz a primeira visita oficial a BH para tratar da candidatura da Pampulha. A visita � consultiva e preparat�ria no processo de avalia��o
2014
Em 12 de dezembro, PBH, via FMC, entrega o dossi�, com mais de 500 p�ginas, ao Iphan, que, por sua vez, o entrega � Unesco
2015
Em mar�o, Unesco comunica ao Itamaraty e � PBH sobre o aceite da candidatura da Pampulha. No mesmo m�s, � criada a comiss�o de gest�o, envolvendo v�rias secretarias municipais, para coordenar e articular a��es, projetos e interven��es dos diversos �rg�os p�blicos, al�m de iniciativas do setor privado, na Regi�o da Pampulha.
2015
Em setembro, a PBH d� posse ao comit� gestor do conjunto moderno da Pampulha, grupo respons�vel por promover a gest�o compartilhada e articula��o entre as pol�ticas municipal, estadual e federal e monitorar as a��es governamentais de prote��o ao patrim�nio
2015
Em setembro, BH recebe a miss�o de avalia��o do Icomos. Durante quatro dias, a arquiteta venezuelana Maria Eug�nia Bacci cumpre uma agenda na cidade para conhecer detalhes da candidatura. � solicitada a revis�o do dossi� e do plano de interven��o, conforme suas observa��es in loco
2016
Em maio, a Unesco envia ao Itamaraty parecer sobre a candidatura, sinalizando favoravelmente sobre a conquista do t�tulo
2016
Em 17 de julho, em Istambul, na Turquia, durante a 40ª reuni�o do Comit� de Patrim�nio Mundial da Unesco, o conjunto moderno da Pampulha � reconhecido como patrim�nio cultural da humanidade