
De um lado, a precariedade do sistema de transporte coletivo, a insatisfa��o com �nibus cheios e demorados e com o valor das tarifas. De outro, os riscos do transporte clandestino, n�o apenas pela concorr�ncia desigual com o servi�o formal, mas tamb�m para os passageiros.
Em meio a esses dois cen�rios, come�ou a vigorar ontem um arrocho na fiscaliza��o e nas puni��es para quem transporta passageiros sem permiss�o do poder p�blico. Medida que divide usu�rios e revolta pessoas que sobrevivem desse servi�o – “pirata” para os encarregados da fiscaliza��o, “alternativo” para os motoristas.
Nova lei federal determina que o transporte n�o regulamentado, incluindo o escolar, passa a ser considerado infra��o grav�ssima ao C�digo de Tr�nsito Brasileiro. Como rea��o, est� prevista para hoje manifesta��o em Belo Horizonte de representantes do setor.
Publicada no Di�rio Oficial da Uni�o de 8 de julho, a lei tornou mais rigorosas as penalidades aplicadas aos motoristas flagrados transportando passageiros sem autoriza��o oficial. Ao ser classificado como infra��o grav�ssima, o transporte irregular de estudantes passa a ser punido com multa de R$ 293,47 multiplicada pelo fator 5, totalizando R$ 1.467,35, al�m da remo��o do ve�culo a um dep�sito.
J� o transporte remunerado de pessoas ou bens, quando n�o licenciado, passa de infra��o m�dia a grav�ssima, punida com multa e remo��o do ve�culo. Nos dois casos, os motoristas ainda perdem 7 pontos na carteira de habilita��o, conforme estabelece o artigo 259 do C�digo de Tr�nsito Brasileiro. O motorista s� n�o ser� punido em “casos de for�a maior ou com permiss�o da autoridade competente”.
J� o transporte remunerado de pessoas ou bens, quando n�o licenciado, passa de infra��o m�dia a grav�ssima, punida com multa e remo��o do ve�culo. Nos dois casos, os motoristas ainda perdem 7 pontos na carteira de habilita��o, conforme estabelece o artigo 259 do C�digo de Tr�nsito Brasileiro. O motorista s� n�o ser� punido em “casos de for�a maior ou com permiss�o da autoridade competente”.
A quest�o torna-se um desafio a mais para o setor de mobilidade urbana, cujas empresas j� lidam com a fuga de passageiros impulsionada pelo desemprego e com a concorr�ncia de aplicativos de transporte. “Na situa��o em que o pa�s se encontra, milhares de pessoas trabalham na clandestinidade. Isso porque o n�mero de desempregados � gigantesco. Ent�o, encontramos nossa forma de ganhar o p�o de cada dia, j� que o pr�prio governo n�o nos permite. Com essa nova lei, s� vai aumentar a pobreza. Trabalhamos de forma honesta”, disse Daniel Silva, um dos representantes da Associa��o dos Motoristas Aut�nomos em Transportes de Passageiros (Amatrans).
Ele afirma que tem uma van e oferece viagens em cidades da Regi�o Metropolitana de BH. Segundo ele, mais de 6 mil pessoas trabalham no setor em Minas Gerais. “Queremos conquistar nosso direito sem ultrapassar o direito do outro. Queremos ser regulamentados. E, para isso acontecer, queremos ser recebidos pelo governador”, disse. Ele garante que as manifesta��es ser�o realizadas com “ordem” e que ocorrer�o a partir das 4h. Parte dos motoristas deve protestar na Cidade Administrativa, no Bairro Serra Verde, na Regi�o de Venda Nova.
Ser� uma reedi��o de manifesta��o feita por perueiros, motoristas de fretamento e de escolares no in�cio de setembro, que teve como alvo a mesma lei. Eles protestaram pela legaliza��o do servi�o e contra o arrocho na legisla��o, que, segundo os transportadores, amea�a inviabilizar o sustento de milhares de fam�lias. Eles foram em carreata at� a Cidade Administrativa, na MG-010. Os condutores se concentraram durante a madrugada e partiram de tr�s pontos em dire��o � sede do governo do estado, em Venda Nova: da BR-040, em Ribeir�o das Neves; da Refinaria Gabriel Passos (Regap), na BR-381, em Betim; e da Avenida Ant�nio Abrah�o Caram, ao lado do Mineir�o, na Pampulha.
Contraponto
Em Minas, de janeiro a setembro, 1.110 infra��es foram registradas e 580 ve�culos apreendidos. O diretor de Fiscaliza��o do Departamento de Edifica��es e Estradas de Rodagem de Minas Gerais (DEER-MG), Anderson Tavares, rebate os argumentos dos representantes do setor e defende a nova legisla��o. “� importante educar o usu�rio para usar transporte legalizado e seguro. N�o conseguimos verificar esses ve�culos (clandestinos) quanto � manuten��o, � exist�ncia de seguro para eventuais acidentes e se o motorista que oferece o servi�o est� de fato apto para dirigir aquele ve�culo”, informou.

Quanto ao desemprego, ele acredita que o transporte clandestino acaba por atrapalhar quem opera dentro da lei. “� uma situa��o muito curiosa. O clandestino compete com a linha regular, o que causa o esvaziamento da linha. Em alguns munic�pios, o transporte clandestino foi t�o intenso que tivemos que acabar com a linha regular. Isso � que gera desemprego”, argumentou. Segundo ele, quem n�o quiser sofrer as san��es previstas em lei pode procurar o �rg�o para se regularizar. Uma das op��es � o cadastro de uma empresa para fretamento de viagens.
Na semana passada, uma batida vitimou o motorista de uma van de transporte de passageiros na Avenida Delta, na altura do Bairro Jo�o Pinheiro, Regi�o Noroeste de Belo Horizonte. Por volta das 6h de dia 30 de setembro, quando o movimento era intenso, testemunhas relataram � pol�cia que o ve�culo de transporte de passageiros com tr�s pessoas avan�ou o sinal vermelho pr�ximo ao cruzamento com a Rua Marqu�s de Lavradio, e bateu num caminh�o frigor�fico carregado com carnes e que tamb�m tinha tr�s pessoas a bordo. O impacto foi t�o forte que os dois ve�culos seguiram prensados at� colidir contra o muro de uma casa. Com a batida, o motorista da van, Fernando de Oliveira, de 25 anos, morreu preso �s ferragens. Outros dois passageiros tiveram ferimentos leves.
Usu�rios divididos
Enquanto isso, os usu�rios se dividem. A comodidade e conforto s�o os principais motivos que fazem com que a professora M�rcia Aparecida, de 40, busque pelo transporte alternativo. Segundo ela, a van permite que o usu�rio embarque na porta de casa e desembarque no local do compromisso. “Eu moro em Mariana (na Regi�o Central), mas preciso vir para Belo Horizonte aos s�bados. Para mim, � mais barato e mais c�modo ter um motorista que me busque. Mas, embarco em vans de pessoas que eu conhe�o”, disse.
A cozinheira Andr�a Rodrigues, de 43, mora em Santa Luzia, na Grande BH, e concorda com o aspecto da comodidade. Para ela, os clandestinos podem oferecer tarifa menor e mais op��es de hor�rios aos usu�rios. “Preciso pegar dois �nibus at� chegar aqui. E eles v�m sempre muito lotados”, disse. Por outro lado, h� quem prefira n�o se arriscar em ve�culos que n�o passam por vistoria peri�dica e que portanto n�o t�m garantia de que itens como pneus e freios estejam com manuten��o adequada. A assistente financeira Ingrid Ahl, de 46, � uma das que n�o encaram o risco: “Prefiro pagar mais caro. N�o estamos livres de irregularidades e acidentes, mas me sinto mais segura”, disse.
A quest�o do transporte alternativo faz parte do cotidiano de Belo Horizonte h� d�cadas. Tanto que o Centro da cidade se transformou em pra�a de guerra na tarde de 19 de julho de 2001.
Pr�s e contras
Confira cinco argumentos favor�veis e cinco contr�rios ao transporte n�o regulamentado, segundo apontamentos do movimento do transporte alternativo e de especialistas do setor
Por que o transporte alternativo � positivo
» D� direito de escolha ao passageiro, que pode optar pelo servi�o por querer viajar sentado
» Comodidade e conforto: permite que o usu�rio embarque na porta de casa e desembarque no local do compromisso
» � fonte de gera��o de renda para fam�lias em momento de crise
» � uma forma de press�o indireta para que gestores e operadores do transporte p�blico regular revejam a qualidade do servi�o
» Pode oferecer tarifa menor e mais op��es de hor�rios aos usu�rios
Por que o transporte alternativo � negativo
» Os ve�culos n�o passam por vistoria peri�dica. N�o h� nada que garanta que itens como pneus e freios estejam com manuten��o adequada
» N�o � poss�vel saber se o condutor tem habilita��o, se est� em boas condi��es de sa�de para trabalhar e h� quanto tempo est� conduzindo
» N�o contribuem para a gera��o de impostos, ao contr�rio de empresas e prestadores regulares
» N�o h� prote��o trabalhista e para usu�rio: motoristas trabalham sem salvaguarda de direitos e passageiros n�o contam com seguro
» Concorr�ncia desleal com o sistema regular de transporte p�blico, sujeito a uma s�rie de normas e encargos que encarecem o servi�o
A batalha da Pra�a Sete
A quest�o do transporte alternativo faz parte do cotidiano de Belo Horizonte h� d�cadas. Tanto que o Centro da cidade se transformou em pra�a de guerra na tarde de 19 de julho de 2001.
Bombas de g�s, tiros, explos�es, pancadaria, agress�es e quebradeira tomaram conta da Pra�a Sete durante conflito entre a Pol�cia Militar e perueiros que protestavam contra a intensifica��o das a��es fiscais.
Conforme mostrou na �poca o Estado de Minas, o saldo foi de 69 pris�es e 35 pessoas feridas. Na �poca, o comandante-geral da PM, coronel �lvaro Nicolau, garantiu que seria pedida a pris�o preventiva dos l�deres dos manifestantes que colocaram os ve�culos em torno do famoso Pirulito, na conflu�ncia das avenidas Amazonas e Afonso Pena.
O fechamento de 150 quarteir�es na regi�o central foi o ponto alto e a mais violenta de uma escalada de manifesta��es e enfrentamentos entre autoridades e transportadores. Na v�spera, o ent�o prefeito, o m�dico C�lio de Castro (1932-2008), havia deixado claro que n�o haveria mais di�logo com os donos de vans. Desde a batalha, o servi�o foi reprimido at� ser quase banido na Grande BH. Agora, lentamente, o desafio volta a se instalar.
Conforme mostrou na �poca o Estado de Minas, o saldo foi de 69 pris�es e 35 pessoas feridas. Na �poca, o comandante-geral da PM, coronel �lvaro Nicolau, garantiu que seria pedida a pris�o preventiva dos l�deres dos manifestantes que colocaram os ve�culos em torno do famoso Pirulito, na conflu�ncia das avenidas Amazonas e Afonso Pena.
O fechamento de 150 quarteir�es na regi�o central foi o ponto alto e a mais violenta de uma escalada de manifesta��es e enfrentamentos entre autoridades e transportadores. Na v�spera, o ent�o prefeito, o m�dico C�lio de Castro (1932-2008), havia deixado claro que n�o haveria mais di�logo com os donos de vans. Desde a batalha, o servi�o foi reprimido at� ser quase banido na Grande BH. Agora, lentamente, o desafio volta a se instalar.