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Estado de Minas

Dano moral gera diverg�ncia em indeniza��o por trag�dia em Mariana

Exatos quatro anos ap�s o rompimento da barragem da Samarco, quest�o tem gerado dificuldades para fazer avan�ar as negocia��es entre os atingidos


postado em 05/11/2019 10:10

Distrito de Bento Rodrigues foi completamente destruído pela lama da barragem da Samarco(foto: Antonio Cruz/ Agência Brasil )
Distrito de Bento Rodrigues foi completamente destru�do pela lama da barragem da Samarco (foto: Antonio Cruz/ Ag�ncia Brasil )


Qual o valor do dano moral causado �s pessoas que tiveram seus modos de vida completamente alterados ap�s a devasta��o causada pela lama que vazou na trag�dia de Mariana, Regi�o Central de Minas?

Exatos quatro anos ap�s o rompimento da barragem da Samarco, essa � uma pergunta que tem gerado dificuldades para fazer avan�ar as negocia��es entre os atingidos e a Funda��o Renova, entidade criada para reparar os preju�zos causados, conforme acordo firmado em mar�o de 2016 entre a mineradora, suas acionistas Vale e BHP Billiton, o governo federal e os governos de Minas Gerais e do Esp�rito Santo.

"A quest�o do dano geral � a que est� gerando mais indigna��o por parte das fam�lias", disse Fl�via Maria, coordenadora da assessoria jur�dica da C�ritas, organiza��o que d� suporte aos atingidos.

"N�o est�o levando em considera��o diversos danos que foram levantados. Eles colocam um valor fechado e afirmam que n�o existe possibilidade de majorar o que apresentam. N�o deixam muito claro quais os crit�rios usados e n�o fazem tamb�m men��o ao dossi� [elaborado pelas assessorias t�cnicas dos atingidos] que traz os danos de cada um. N�o explicam como chegaram naquele valor. Na proposta que eles apresentam a cada atingido, o dano moral aparece de maneira bem gen�rica", acrescentou.

Acordos fechados


H� pessoas atingidas, no entanto, que aceitaram os valores oferecidos. No dia 24 de julho de 2019, foram homologados pela Justi�a os primeiros acordos de indeniza��es com 83 fam�lias. Segundo a Funda��o Renova, de 882 fam�lias atingidas em Mariana, duzentas j� finalizaram as negocia��es. Significa que 77% ainda n�o chegaram a um acordo.

Entretanto, estes dados s�o diferentes dos apresentados pelo Minist�rio P�blico de Minas Gerais (MPMG), que trazem um quadro ainda pior: apenas 151 de um total aproximado de 3,5 mil pessoas atingidas na cidade de Mariana j� teriam recebido a indeniza��o.

"H� negocia��es em andamento. Mas tamb�m h� atraso da Funda��o Renova apara apresentar as propostas", disse o promotor Guilherme Meneghin.

A Renova sustenta, em nota, que a negocia��o tem sido voltada para compreender cada caso e indenizar o atingido de forma justa conforme crit�rios pr�-estabelecidos no ordenamento jur�dico brasileiro.

Segundo dados da entidade referentes a toda a bacia do Rio Doce e n�o apenas a Mariana, at� agosto �ltimo, recursos j� foram repassados a 319 mil pessoas, sendo R$ 813 milh�es referente a indeniza��es e R$ 1,02 bilh�o de aux�lio emergencial mensal. Assegurado a todos os atingidos que perderam suas rendas, esse aux�lio n�o tem natureza indenizat�ria e equivale a um sal�rio m�nimo, acrescido de 20% para cada dependente, al�m do valor de uma cesta b�sica.

Dano moral


No caso do dano moral, a Funda��o Renova afirma que h� equipara��o entre todos os que compartilham de uma mesma situa��o. "O dano moral tem por objetivo compensar todos os sentimentos experimentados pelos atingidos em decorr�ncia da situa��o de deslocamento f�sico permanente de suas resid�ncias. O modo como cada atingido absorve o que aconteceu varia de pessoa a pessoa e isso faz com que seja imposs�vel chegar a um valor individual ideal de compensa��o desses danos", esclarece a nota.

Para poder reclamar seus direitos, os atingidos em toda a bacia do Rio Doce puderam selecionar assessorias t�cnicas que lhes deram suporte com profissionais de �reas variadas como Direito, Sociologia, Arquitetura, Engenharia, etc.

Essa prerrogativa foi assegurada em diferentes acordos que a Samarco firmou com o Minist�rio P�blico Federal (MPF) e com o Minist�rio P�blico de Minas Gerais (MPMG). Uma vez escolhida a entidade pelas pr�prias v�timas, a contrata��o � feita com recursos da mineradora e operacionalizada pela Funda��o Renova.

A C�ritas foi selecionada para o caso dos moradores de Mariana e, por determina��o da Justi�a mineira, assumiu ainda a responsabilidade do cadastramento dos atingidos da cidade. Essa � uma diferen�a no processo de repara��o na cidade de Mariana, j� que nos demais munic�pios da bacia do Rio Doce � a  Renova que organiza esse registro.

"Foram levantadas as perdas materiais como as casas, os bens m�veis e a interrup��o dos rendimentos profissionais. Mas, al�m disso, foram tamb�m evidenciados os danos morais, a partir do relato dos atingidos sobre o que eles sofreram. E este sempre � o dano que eles mais enfatizam. Envolve, por exemplo, a perda dos modos de vida e a sa�de f�sica e ps�quica. Eles citam muito as rela��es de vizinhan�a que perderam, a rotina que tinham nas antigas comunidades e que foi completamente alterada", explicou Fl�via Maria.

Dossi�s


A partir do cadastramento, a C�ritas elabora os dossi�s destacando os danos causados a cada n�cleo familiar. O documento serve de base para a negocia��o com a Renova. Al�m disso, a entidade elaborou uma matriz de danos, isto �, uma tabela com a valora��o de cada preju�zo causado.

Para estipular cada valor, foram firmados acordos com institui��es de pesquisa como o Instituto de Pesquisas Econ�micas e Administrativas (Ipead) e o Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional (Cedeplar), ambos vinculados � Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).

O MPMG defendia que as negocia��es fossem conduzidas a partir dessa matriz de danos. "A Funda��o Renova e a Samarco recusaram. N�s entramos com um pedido judicial que foi deferido, fixando os valores estipulados por essas institui��es de pesquisa como refer�ncia para a indeniza��o. Entretanto, a Samarco recorreu e conseguiu suspender a decis�o. Ent�o, at� que esse recurso seja julgado, n�s n�o vamos conseguir utilizar essa matriz de danos que estabelece valores justos e tecnicamente fundamentados pelas assessorias dos atingidos", disse o promotor Guilherme Meneghin.

As diretrizes para o pagamento das indeniza��es em Mariana est�o definidas em um acordo firmado em outubro de 2018 entre o MPMG e a Renova. Nele, ficou estabelecido que a repara��o deve levar em conta todos os preju�zos sofridos. Dessa forma, a proposta apresentada aos atingidos tem de considerar danos materiais e morais.

Caso a pessoa discorde dos valores propostos, o acordo estabelece que ele poder� recorrer a um processo de liquida��o e cumprimento de senten�a, no qual indicar� a quantia que acredite ser justa. Nesse caso, o processo vai diretamente para a fase de execu��o e caber� a um juiz fixar a indeniza��o que ter� de ser paga de imediato, pois eventuais recursos n�o ter�o efeito suspensivo. "� uma tramita��o mais r�pida do que uma a��o comum", afirmou o promotor do MPMG, Guilherme Meneghin.

Na vis�o da C�ritas, mesmo quem tiver assinado acordo tem possibilidade de recorrer ao Judici�rio. "N�s entendemos que as propostas que est�o sendo apresentadas n�o quitam todos os danos que os atingidos sofreram e que foram levantados no cadastramento. Ent�o, consideramos que � pass�vel de contesta��o na esfera judicial, apontando inclusive a viola��o, j� que o indiv�duo n�o tem como de fato negociar", argumentou Fl�via Maria.

Proje��o n�o concretizada


Em outubro de 2018, a Funda��o Renova anunciou que pagaria todas as indeniza��es em Mariana at� a primeira metade de 2019, o que n�o ocorreu. Essa proje��o foi feita ao se anunciar o primeiro acordo de indeniza��o. Ele foi fechado enquanto a C�ritas ainda elaborava os dossi�s.

A Renova n�o esperou pelo documento e gerou uma insatisfa��o da assessoria t�cnica dos atingidos. De acordo com C�ritas, esta n�o foi a �nica negocia��o conduzida sem que o atingido estivesse amparado pelo seu dossi�. Al�m disso, a entidade afirmou que, mesmo nos casos com o dossi� pronto, h� apontamentos do documento que n�o est�o servindo de base.

Fam�lias que ainda n�o chegaram a um acordo final receberam, at� agora, apenas adiantamentos referentes ao dano material associado � perda de moradias e carros. Foram pagos, por exemplo, R$ 20 mil para quem perdeu casa. Tamb�m receberam indeniza��o os familiares de alguns dos 19 mortos na trag�dia. Entretanto, todos estes valores s�o parciais e ser�o descontados da indeniza��o final.

Atingidos acreditam que a dificuldade para se obter uma indeniza��o requerida est� associada ao modelo adotado para reparar os danos, a partir da cria��o da Funda��o Renova.

"Na pr�tica, quem toma as decis�es mais importantes � a Samarco", disse Jos� do Nascimento de Jesus, que viu sua casa no distrito de Bento Rodrigues ser devastada pela lama e hoje integra a Comiss�o de Atingidos.

Termo de Ajustamento de Conduta


O Minist�rio P�blico Federal tamb�m j� manifestou avalia��es cr�ticas � falta de independ�ncia da entidade diante da mineradora e de suas acionistas Vale e BHP Billiton.

Em junho de 2018, foi assinado um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) para alterar a governan�a da Renova. O TAC Governan�a, como ficou conhecido, foi negociado entre o MPF e as mineradora para aumentar a participa��o dos atingidos no processo de repara��o. Entre as medidas estabelecidas, estava a mudan�a no Conselho Curador da Funda��o Renova, que passou a ter dois membros indicados pelos atingidos com direito a voto.

Ao todo, s�o nove membros e seis deles indicados pelas mineradoras. A �ltima cadeira � ocupada por um escolhido pelo Comit� Interfederativo, composto por �rg�os p�blicos, cuja fun��o � fiscalizar os programas de repara��o dos danos.

Para a C�ritas, as mudan�as no Conselho Curador foram insuficientes para alterar a forma como o processo tem sido conduzido, j� que os representantes das empresas continuam sendo majorit�rios. "N�o teve nenhum efeito", sustentou Fl�via Maria.

Outras cidades


O acordo firmado em mar�o de 2016 entre as mineradoras e o poder p�blico considerou inicialmente 39 munic�pios impactados ao longo de toda a bacia do Rio Doce, mas, posteriormente, foram delimitadas novas �reas de abrang�ncia, o que aumentou esse n�mero para 44.

Considerando todas as cidades, o processo indenizat�rio mais avan�ado diz respeito a pessoas que moravam em locais onde o abastecimento de �gua precisou ser interrompido por mais de 24 horas: 98% j� aceitaram as propostas apresentadas.

Entre os pescadores, 8,6 mil j� tiveram seu direito � indeniza��o reconhecido pela Renova. Nos �ltimos meses, teve in�cio uma nova metodologia criada para atender os que n�o possu�am registro profissional e atuavam de maneira informal. Mas, mesmo entre quem foi registrado e est� recebendo o aux�lio emergencial mensal, h� pessoas que n�o possuem informa��es sobre indeniza��o.

"Por enquanto, n�o trataram disso comigo", disse Ademar Paulino Sampaio, pescador de Reg�ncia, distrito da cidade de Linhares (ES) onde o Rio Doce des�gua no oceano.

Nos casos em que fechou acordo com pescadores, a Funda��o Renova fixou dano moral em R$ 10 mil. J� o dano material varia de acordo com cada caso. Em algumas situa��es, os barcos e equipamentos sofreram danos. Al�m disso, a maior parte do dano material diz respeito aos lucros cessantes, relacionados � renda que o pescador tinha e deixou de ter.

No m�s passado, a C�mara dos Deputados divulgou os resultados da visita de uma comitiva da Comiss�o de Direitos Humanos e Minorias (CDHM) a �reas atingidas. Queixas ouvidas em cidades do Esp�rito Santo envolviam a aus�ncia de reconhecimento para al�m dos pescadores. "E como ficam os comerciantes, os donos de pousada, de restaurantes, os moradores que s�o impactados pela lama?", questionou Fabr�cio Fiorot, dono de uma pousada que relatou falta de clientes e queda brusca no seu rendimento.


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