
O novo coronav�rus abalou v�rios setores da economia, com a paralisa��o da produ��o, interrup��o das vendas e portas fechadas. Mas tem um segmento que passa longe da crise e, em vez de derrocada, anda a todo vapor em meio � pandemia: o com�rcio de materiais de constru��o, que, considerado como essencial, foi mantido mesmo com as medidas de isolamento social. As vendas no setor aumentaram tanto que, agora, est� sendo enfrentada a escassez de v�rios produtos, como tijolo, telha, cimento, piso e ferro.
O “boom” do segmento em plena pandemia se sustenta nas vendas a pessoas f�sicas, que adquirem os produtos para reformas em suas casas ou amplia��o das moradias, o “puxadinho”. � o chamado “consumo formiguinha”, que teve um aumento da ordem de 35% a 45% na pandemia, conforme Theodomiro Diniz, presidente da C�mara da Ind�stria da Constru��o da Federa��o das Ind�strias do Estado de Minas Gerais (Fiemg).
Diniz lembra que esse tipo de consumo � respons�vel por cerca de 60% a 70% das vendas totais do mercado da constru��o civil. Com isso, a expectativa � que, em plena pandemia, o setor tenha um crescimento geral da ordem de 10% a 15%. Mas tamb�m h� donos de bares e restaurantes que aproveitaram o per�odo de “fechamento for�ado” para reformarseus estabelecimentos, aquecendo ainda mais a constru��o.
A curva ascendente do setor � confirmada pelo presidente do Sindicato da Ind�stria da Constru��o Civil no Estado de Minas Gerais (Sinduscon-MG), Geraldo Linhares. “Apesar da pandemia, tivemos um crescimento nas vendas, principalmente nos meses de junho e julho em rela��o ao ano de 2019. Estimamos um crescimento entre 10% e 15% para este ano e acreditamos em um quarto trimestre bem ativo”, informa Linhares.
Enquanto bares, restaurantes, lojas de roupas, shoppings centers e outros estabelecimentos do com�rcio n�o essencial amargaram s�rios preju�zos – ou at� foram � fal�ncia, por serem obrigados a permanecer com portas fechadas durante o isolamento social, o mercado da constru��o civil, de uma certa forma, acabou sendo favorecido pelo “fique em casa”.
“Ao ficar em casa por causa do coronavirus, as pessoas pararam de gastar com o transporte. Deixaram de comer fora e de ir a shoppings centers. Sobrou mais dinheiro no bolso. E as pessoas passaram a investir em reformas ou amplia��es das resid�ncias”, analisa Theodomiro Diniz.
O professor Aloysio Afonso Rocha Vieira, do departamento de Economia da Universidade Estadual de Montes Claros (Unimontes), assinala que o setor de constru��o civil foi favorecido por uma quest�o do comportamento dos consumidores, que, segundo ele, tendem a gastar com aquisi��o de alguns bens ou servi�os quando n�o podem consumir outras coisas. “Al�m disso, devemos observar que, ao ficar em casa, as pessoas percebem que est�o em lugar inadequado, que falta algum conforto, e decidem pelas reformas e amplia��es”, pontua.
Coronavoucher
O presidente da C�mara da Constru��o da Fiemg ressalta que as reformas e amplia��es das moradias tamb�m foram incrementadas com o pagamento do aux�lio emergencial (no valor inicial de R$ 600) do governo federal. “O 'coronavoucher' aumentou o poder de compra das pessoas, com o lan�amento de mais de R$ 40 bilh�es na economia”, contabiliza Diniz. Ele ressalta que o impacto dos recursos“foi exponencial” em regi�es de baixo poder aquisitivo, como o Norte de Minas e o Vale do Jequitinhonha.
Esse impulso tamb�m � reconhecido pelo presidente do Sinduscon-MG. “O aumento do consumo de materiais (tamb�m) se deve ao ‘coronavoucher’. Foram injetados bilh�es na economia e as pessoas, aproveitando a quarentena, fizeram pequenas reformas, o que gerou a procura por materiais de constru��o, em especial cimento e tijolo”, diz Geraldo Linhares.
A combina��o desse aumento de consumo com a paralisa��o de algumas ind�strias, como de cimento, cer�mica e siderurgia, sobretudo na fase inicial da pandemia no Brasil, provocou um outro efeito: a escassez de produtos, observa Theodomiro Diniz. Como consequ�ncia, o segmento encara a eleva��o de pre�os de alguns itens, como o cimento, que j� teve uma alta de 30% a 40% nos �ltimos quatro meses.
"Atitude inoportuna"
O presidente do Sinduscon-MG, Geraldo Linhares, condena a alta de pre�os de insumos para o setor. “A atitude dos fornecedores � injustificada e inoportuna, especialmente se considerarmos os baixos �ndices de infla��o e o cen�rio de pandemia”. A entidade entrou com uma representa��o no Procon - MG contra os fabricantes de cimento devido aos aumentos de pre�os e atrasos na entrega do produto. A entidade aponta eleva��o no custo das obras, que n�o pode ser repassado para os clientes dos construtores que j� t�m contratos assinados. Procurado, o Sindicato Nacional da Ind�stria do Cimento (SNIC) informou “que n�o se manifesta sobre rela��es comerciais entre fabricantes de cimento e clientes, especialmente no tocante a pre�os”. De acordo com a entidade, somente em julho, foram vendidas 5,9 milhoes de toneladas de cimento no pa�s, mais de 10% da produ��o anual (de 55 milhoes de toneladas).
Bons neg�cios
- 35% a 45%
Aumento do consumo de materiais de constru��o por pessoas f�sicas durante a pandemia
- 10% a 15%
Crescimento das vendas em geral da constru��o desde mar�o
- 2 milh�es
Empregos gerados pela constru��o civil no Brasil
- 100 mil
Vagas de trabalho pelo setor em Minas Gerais
Fontes: Fiemg e Sinduscon-MG
Faltam tijolos no Norte do estado

Logo ap�s in�cio da pandemia do coronav�rus no Brasil, receosas de que n�o haveria mais consumo, por causa das medidas de isolamento social, muitas cer�micas reduziram a produ��o de tijolos ou foram totalmente fechadas, dispensando os funcion�rios. Mas o consumo n�o parou. Pelo contr�rio, aumentou. Isso resultou na escassez do tijolo.
O problema ocorre em regi�es como o Norte de Minas, onde as revendas de materiais de constru��o est�o com os dep�sitos completamente vazios. A escassez do produto se agravou porque o setor j� vinha enfrentando uma crise desde 2018 na regi�o. “Houve a diminui��o da produ��o e o fechamento de cer�micas na regi�o devido �s dificuldades de gest�o e � falta de capital de giro”, analisa o professor Aloysio Rocha Vieira, do Departamento de Economia da Universidade Estadual de Montes Claros (Unimontes), que fez estudo sobre o setor no Norte do estado.
Revendedores de materiais de constru��o de Montes Claros, que tem 409,34 mil habitantes, passaram a receber o tijolo de outras regi�es, como Papagaios, na Regi�o Central do estado. Mas agora, com a falta do produto, est�o perdendo vendas. “J� deixamos de vender em torno de 300 mil tijolos”, calcula Jos� de Jesus Fel�cio, do Grupo Fel�cio, uma das maiores revendas de materiais de constru��o da cidade-polo do Norte de Minas. O p�tio usado pela empresa para armazenar o produto est� vazio.
“A falta de tijolo impacta praticamente todas as vendas. Muitos clientes adiam as obras por causa da escassez do produto”, reclama Fel�cio.
Outro empres�rio do setor de materiais de constru��o de Montes Claros, do Dep�sito Premoc, Rog�rio Soares Rocha, assegura a escassez de produtos e aumento de pre�os s�o verificados em rela��o a v�rios tipos de materiais do setor, por conta da lei da oferta e da procura.
“Ap�s o surgimento da pandemia, algumas ind�strias reduziram a produ��o em 80%. Mas as vendas de alguns produtos aumentaram 50%”, relata Rog�rio. Ele lembra que nos �ltimos meses o cimento teve eleva��o de pre�os de mais de 40%, mas que outros itens tamb�m tiveram majora��o, como ferragens (24%), vidros (17%) e resina de PVC, usada para fabrica��o de tubos e conex�es (35%).
Dono de uma pequena firma de constru��o de casas em Montes Claros, Felipe David Luiz afirma que est� com servi�os atrasados por causa da falta de tijolos, de materiais el�tricos de outros produtos, encarando tamb�m o aumento de pre�os. “Muitos fornecedores aproveitarem (a demanda) e elevaram os seus pre�os”, reclama o construtor.
Escassez de materiais freia ritmo de obras

O professor de hist�ria Sebasti�o Abiceu aproveitou o “fique em casa’ para fazer “pequena reforma” na sua resid�ncia, no Bairro Ibituruna, �rea de classe m�dia, de Montes Claros, no Norte de Minas. “Estou trabalhando em casa, aproveito para acompanhar os servi�os”, diz o professor, que ministra aulas pelo sistema remoto. Abiceu conta que at� iniciou a troca da rede de esgoto e da cer�mica de alguns c�modos da moradia. Por�m, enfrentou dificuldades com a falta dos produtos no mercado. “Tive que rodar muito para comprar as caixas de esgoto de que estava precisando. Tamb�m foi dif�cil encontrar o piso.”

A mesma dificuldade � enfrentada pelo eletricit�rio aposentado Francisco Bicalho, de 66 anos, que vive no Bairro Morada do Sol, tamb�m de classe m�dia, em Montes Claros. “Falta op��o para comprar cer�mica e acabei adquirindo o piso que n�o era exatamente o que eu queria”, afirma o aposentado. Bicalho disse que a reforma de sua casa j� estava programada e que, por ser aposentado, independentemente do isolamento social, j� permanece em casa quase sempre. “Mas a reforma ajuda a passar o tempo durante a pandemia. Gosto de constru��o”, disse.

“Nunca trabalhamos tanto como nesta pandemia”, comemora o arquiteto �lvaro Silva Cardoso, dono da uma pequena empresa que faz reformas na cidade do Norte de Minas. Al�m dos trabalhos em resid�ncias, ele registra tamb�m mais demanda por reformas de bares e restaurantes durante o fechamento for�ado.
Thiago Santana Rocha, propriet�rio de um restaurante em Montes Claros, est� entre os que investiram em melhorias durante o isolamento social. “Aproveitei o momento para fazer a reforma e modernizar o restaurante”, conta. Ele esperava que as obras durassem 60 dias, mas a escassez de materiais prolongaram o prazo. “J� se passaram quase 100 dias e a reforma ainda n�o terminou”, lamenta o empres�rio. Bares e restaurantes ficaram fechados em Montes Claros por cerca de 60 dias, entre 22 de mar�o e 18 de junho. Atualmente, funcionam com restri��es.