Daniel em passeio pelo bairro: foram sete anos de pesquisa para a produ��o de ''Nossas ruas, nosso patrim�nio (in)vis�vel: Dicion�rio topon�mico da regi�o da Lagoinha''
(foto: Ramon Lisboa/EM/D.A Press)
Uma rua vai muito al�m do seu nome, um beco tem sa�das para a mem�ria, enquanto a pra�a chama ao conv�vio e as travessas cruzam tempo, espa�o, vidas. A reflex�o serve ao mundo inteiro, mais ainda � regi�o de Belo Horizonte que se tornou universo de cultura, hist�ria, altos e baixos geogr�ficos e urban�sticos, bem como refer�ncia da capital que completar� 124 anos no pr�ximo dia 12.
Ap�s sete anos de pesquisas para decifrar a Lagoinha, o professor e advogado Daniel Silva Queiroga lan�a o livro "Nossas ruas, nosso patrim�nio (in)vis�vel: Dicion�rio topon�mico da regi�o da Lagoinha". Nas 468 p�ginas, encontra-se um raio-x de corpo inteiro de 308 vias p�blicas, o significado das denomina��es e, claro, descobertas, informa��es t�cnicas e o toque particular de quem conhece bem o lugar onde nasceu e se criou.
Pertencente � quarta gera��o de imigrantes italianos que chegaram a Minas no fim do s�culo 19 para trabalhar na constru��o da nova capital – a fam�lia Boscato –, Daniel explica, de in�cio, o t�tulo.
"Topon�mia significa o nome pr�prio de um lugar. J� (in)vis�vel � para mostrar a Lagoinha que se tem diante dos olhos e a regi�o ainda encoberta para muitos. Os moradores mais antigos guardam uma mem�ria que n�o pode se perder, conheceram lugares que sumiram do mapa, e ainda falam os nomes de ruas, a exemplo da Rutilo, alterados pelas autoridades", afirma o especialista em direito urban�stico e patrim�nio cultural.
Vista do Bairro Lagoinha em 1969, durante a constru��o da rodovi�ria de Belo Horizonte
(foto: Evandro Santiago/EM - 1969)
A fim de entender melhor a regi�o que se tornou, � primeira vista, um grande complexo vi�rio, mas � considerada pelo autor o "ber�o de BH", a equipe do Estado de Minas visitou pontos importantes da Lagoinha, tendo como guia o professor Daniel acompanhado do seu livro.
No caminho, a conversa com moradores, pausa para o p�o de queijo na padaria e a parada em �cones da regi�o, a exemplo do Santu�rio Arquidiocesano Nossa Senhora da Concei��o dos Pobres, o Cemit�rio do Bonfim, anterior � constru��o da capital, e as estrelas da pesquisa: ruas, pra�as, becos, travessas e avenidas dos bairros Bonfim, Lagoinha, S�o Crist�v�o (parte), Santo Andr� (parte), Pedreira Prado Lopes, Senhor dos Passos, Col�gio Batista (parte), Carlos Prates (parte) e Centro (parte).
Ponto de partida
Sempre curioso a respeito da hist�ria de BH, Daniel revela o ponto de partida para escrever o dicion�rio topon�mico, composto tamb�m por mapas, fotos, plantas cadastrais e outros documentos. Para come�ar, explica, Lagoinha se refere �s sete lagoas formadas pelo remanso de dois c�rregos e desaparecidas com a constru��o das avenidas Ant�nio Carlos e Dom Pedro II.
"Meu ponto de partida foi entender a data Quinze de Junho, que d� nome � pra�a na conflu�ncia das ruas Guap�, Lambari, Sete Lagoas e Al�m Para�ba. A data homenageia o 15 de junho de 1891, quando foi promulgada a primeira Constitui��o de Minas Gerais, cuja principal determina��o estava na mudan�a da capital", conta o autor.
Ver galeria . 10 FotosO bairro recebeu o nome gra�as a essa concentra��o de �gua nos fossos de onde as rochas eram retiradas
(foto: Arquivo Publico da Cidade de Belo Horizonte )
A data vai trazendo � tona outras, como a 17 de dezembro. E Daniel Queiroga fez descobertas que, certamente, interessam aos belo-horizontinos.
"A Avenida do Contorno come�a e termina na Rodovi�ria. O nome oficial da avenida � Dezessete de Dezembro, referente a 17/12/1893, quando Belo Horizonte foi escolhida pelo Congresso Mineiro, reunido em Barbacena, para ser a terceira capital do estado, ap�s Mariana e Ouro Preto."
O esritor conversa com a aposentada Suely Fria�a, que mora em casa centen�ria na Pra�a Doze de Dezembro (foto: Ramon Lisboa/EM/D.A Press)
Moradora da Pra�a Doze de Dezembro, mais conhecida como Pra�a Doze, referente � inaugura��o de BH em 1897, a aposentada Suely Fria�a Gl�ria ouviu as explica��es de Daniel e ainda ganhou um livro de presente, com aut�grafo.
"Moro nesta casa de mais de 100 anos, nasci e me criei aqui no bairro (Bonfim, na conflu�ncia das ruas Baependi, Lambari e Mira�)".
No passeio pela regi�o da Lagoinha, Daniel explica que, conforme a planta original do projeto do arquiteto construtor de BH, Aar�o Reis (1853-1936), muitas ruas homenagearam munic�pios mineiros, escritores brasileiros, �rvores e minerais. "No nome dos logradouros, temos o DNA da regi�o, e n�o podemos perder essa mem�ria pertencente a toda a capital".
Descobertas e curiosidades
Para muitos moradores, a Rua Comendador Nohme Salom�o, que come�a na Itapecerica, termina na Diamantina e homenageia o s�rio que chegou a BH e desenvolveu trabalhos filantr�picos e beneficentes, ainda se chama Rutilo, conforme o original.
"Meus pais sempre chamaram de Rutilo", diz o advogado e dono de uma cinquenten�ria vidra�aria na Rua Diamantina, Cristiano Duarte. Apaixonado pela Lagoinha, ele v� do Mirante Lagoinha, na Diamantina, grande parte da regi�o e "cultiva" o afeto: em terreno p�blico, entre a Diamantina e a Avenida Ant�nio Carlos, Cristiano cuida de uma horta com mandioca, milho e verduras.
"Tenho minhas ra�zes aqui, minha hist�ria e da minha fam�lia", afirma, certo de que seguran�a p�blica � fundamental para nortear qualquer iniciativa na regi�o.
Daniel na Pra�a 15 de junho: nome homenageia o 15 de junho de 1891, data da promulga��o da primeira Constitui��o de Minas (foto: Ramon Lisboa/EM/D.A Press)
No bate-papo com Daniel, Cristiano quer saber um pouco sobre Francisco Soucasseaux, tamb�m nome de rua. E ele responde: "Foi um artista e construtor portugu�s (1856-1904), trabalhou na Comiss�o Construtora da Nova Capital, sendo encarregado da serraria, carpintaria e marcenaria.
Construiu o primeiro teatro de BH, em funcionamento na Rua da Bahia entre 1899 e 1906".
Para cada rua citada no livro, s�o apresentados 18 itens, como a situa��o (se ainda existe), mapa, nome popular, localiza��o, raz�o da topon�mia e outros.
A partir das conversas com moradores e seguindo o cora��o, Daniel chama a antiga Rua Rutilo de "Tit�nio da Lagoinha", a Paquequer, de "Pra quem quer", conforme o passado da zona bo�mia, e a Itapecerica, de "Pedra que rolam", na qual fica a famosa Casa da Loba, tombada pelo munic�pio.
�cone do bairro, a Rua Bonfim mereceu toda a aten��o do autor do dicion�rio.
"A rua n�o d� nome ao cemit�rio nem vice-versa. A via p�blica, que come�a na Pra�a Elifas Levi e termina na Rua Fortaleza, homenageia a cidade mineira de Bonfim. J� o cemit�rio se relaciona ao Senhor do Bonfim", explica.
No caso da Pra�a Elifas Levi, que recebeu o nome em vota��o da C�mara Municipal de BH em 2009, a tradi��o popular fala mais alto. O espa�o � conhecido como Pra�a do Peixe, formada pela conflu�ncia das ruas Bonfim e Paquequer e das avenidas Nossa Senhora de F�tima (antiga Rua Mau�) e Dom Pedro II.
Num trajeto curto, a Paquequer se mant�m testemunha de �pocas memor�veis e da contemporaneidade. "O grande objetivo � entender uma regi�o de import�ncia hist�rica para BH, com interesse para estudantes e profissionais de arquitetura e urbanismo, hist�ria, turismo, cultura, direito e o p�blico em geral", ressalta o advogado.
(foto: Arte/EM)
Futuro do bairro
Para Daniel Queiroga, de 41 anos, o estudo detalhado dos caminhos p�blicos, com suas formas e arquitetura pr�prias, ser� fundamental para se planejar a requalifica��o de uma regi�o que pode ser considerada o centro hist�rico de BH.
"Uma cidade � um conjunto de vias, bairros, ruas e ruelas que se completam e interagem. E tudo isso se faz com a apropria��o das pessoas pelos espa�os urbanos. O entendimento dos significados dos nomes e da hist�ria das ruas � essencial nesse processo".
E mais: "O estudo ajuda a contar como foi o passado e enxergar o invis�vel al�m dos marcos arquitet�nicos e dos locais de manifesta��es socioecon�micas e culturais, que resistiram �s interven��es urbanas, mutilaram e remodelaram a regi�o ao longo do tempo."
Realizado com recursos da Lei Municipal de Incentivo a` Cultura de BH, o dicion�rio tem pref�cio do ge�grafo e pesquisador da hist�ria da capital, Alessandro Borsagli e projeto gr�fico assinado por Gabriela Rezende, La�s Grossi e Priscila Musa. Publicado pela Editora IEDS - Instituto de Estudos de Desenvolvimento Sustent�vel, est� � venda por R$ 50, podendo ser encontrado na Made in Beag�, por meio do site www.madeinbeaga.com.br ou na loja f�sica na Avenida Oleg�rio Maciel, nº 742, Loja 2117, Centro de BH.
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