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Estado de Minas ITABIRITO

Cavernas com os mais altos n�veis de radia��o do Brasil est�o em MG

Estudo mostra que grutas da Serra do Gandarela t�m at� 829 vezes mais emiss�es potencialmente cancer�genas do que ao ar livre


11/01/2023 04:00 - atualizado 12/01/2023 12:57
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Parque Nacional da Serra do Gandarela
Expedi��o at� caverna com alta concentra��o de rad�nio e radioatividade, no Parque Nacional da Serra do Gandarela, a 40 quil�metros de Belo Horizonte (foto: Fotos: MATEUS PARREIRAS/EM/D.A PRESS)

Itabirito - Nas profundezas da caverna Gruta da Surpresa, em Itabirito, no Colar Metropolitano de Belo Horizonte, a atmosfera � t�o carregada de radia��o que uma pessoa em certas partes do seu interior chega a ser exposta a 829 vezes mais emiss�es potencialmente cancer�genas do que ao ar livre (Veja quadro abaixo). Em m�dia, no Parque Nacional da Serra do Gandarela, a 40 quil�metros de Belo Horizonte, as cavidades em rocha quartz�tica como essa s�o 476 vezes mais radioativas do que o ambiente aberto, configurando o espa�o natural com maiores emiss�es potencialmente nocivas de Minas Gerais e o segundo mais alto do Brasil, atr�s da Caverna Santana, no Parque Estadual Tur�stico do Alto Ribeira (SP), com �ndice 945 vezes acima da m�dia ao ar livre.

Ainda que n�o deixe rastro, gosto, cheiro ou temperatura, os altos �ndices de radia��o provenientes do g�s rad�nio (Rn) do decaimento de ur�nio (U) nas rochas das cavernas do Parque Nacional da Serra do Gandarela ampliam a claustrofobia nos subterr�neos da unidade de conserva��o. Essa � a sensa��o que a reportagem do Estado de Minas constatou ao se aprofundar pelas galerias das grutas mais radioativas de Minas Gerais e que foram alvo de medi��es realizadas por pesquisa que embasa uma tese de mestrado do Centro de Desenvolvimento da Tecnologia Nuclear (CDTN).

As medi��es nas cavernas mineiras foram feitas para o trabalho cient�fico do engenheiro ambiental Nathan Vin�cius Martins da Silva com o intuito de checar qual o n�vel de radia��o proveniente do g�s rad�nio contido em diferentes rochas das cavernas, no caso, as ferr�feras (cangas de min�rios de ferro), carbon�ticas (como as calc�reas) e quartz�ticas (rochas compostas por pelo menos 75% de quartzo).

“Isso seria um bom indicativo para estudos sobre perigos para pessoas que passam muito tempo nesses ambientes, como espele�logos, pesquisadores e at� para que a ventila��o em minas subterr�neas proteja melhor os mineiros”, alerta o cientista. Foi a primeira vez na hist�ria que medi��es de rad�nio foram feitas fora de cavernas carbon�ticas.

E o perigo pode ser muito grande para quem passa muito tempo nessas profundidades radioativas. De acordo com as pol�ticas sanit�rias do Iowa Department of Public Health, �rg�o que funciona como uma secretaria estadual de sa�de no estado norte-americano de Iowa, a exposi��o de mil pessoas n�o fumantes ao longo da vida a n�veis como os picos de medi��es da caverna mineira poderiam levar 403 delas a desenvolver c�ncer de pulm�o. Nos Estados Unidos e na Europa, por exemplo, onde o frio e outros costumes levam � constru��o de por�es, as concentra��es de rad�nio s�o casos de sa�de p�blica e campanhas para monitoramento. O perigo tamb�m vem do solo, por meio do decaimento do rad�nio.

Mas, antes de gerar p�nico, o engenheiro ambiental Nathan Silva afirma que para a ocorr�ncia de danos � sa�de humana seria necess�ria uma prolongada e frequente exposi��o aos ambientes fechados das cavernas. “Para quem for esporadicamente a um ambiente desses a radia��o � insignificante. Mas � preciso de estudos para saber se pesquisadores, espele�logos e guias tur�sticos, por exemplo, desenvolvem mais doen�as relacionadas a essa exposi��o, como o c�ncer. N�o �, tamb�m, uma ci�ncia exata: inalou rad�nio vai ter c�ncer”, salienta Silva.

No final da pesquisa, o engenheiro ambiental coloca v�rias sugest�es de estudos posteriores que podem responder a perguntas que n�o puderam ainda ser elucidadas. “Esse estudo mostra como o mundo subterr�neo pode ser surpreendente. As cavernas passam despercebidas, n�o h� tantos movimentos para a sua preserva��o. Talvez pelas pessoas n�o terem um turismo de cavernas. S�o ambientes carentes de estudos. Ainda engatinhamos no Brasil. Precisamos de mais pesquisas e pol�ticas p�blicas”, afirma Nathan Silva.

“A presen�a de pesquisadores de institui��es e departamentos respeitados como o CDTN da UFMG � muito importante para que se conhe�am mais aspectos do parque da Serra do Gandarela, gerando maior interesse em sua conserva��o. A maior parte dos estudos realizados na unidade s�o de aspectos biol�gicos, como fauna e flora. Ter uma pesquisa como essa envolvendo gases nobres como o rad�nio e colaborando com a ci�ncia para outras aplica��es � muito importante”, considera o chefe do Parque Nacional da Serra do Gandarela, Tarc�sio Nunes.

Professor Luciano Faria, dentro de caverna com alta concentração de radônio e radioatividade
Professor Luciano Faria, dentro de caverna com alta concentra��o de rad�nio e radioatividade, no Parque Nacional da Serra do Gandarela

"Para n�o espantar as pessoas: a radioatividade � um fen�meno natural. H� elementos qu�micos nas rochas, na �gua e at� no ar que s�o radioativos. A gente dentro da caverna corre perigo? N�o. Porque fazemos visitas r�pidas. Mais de 12 horas por dia � que poderia trazer algum tipo de risco"

Professor Luciano Faria, dentro de caverna com alta concentra��o de rad�nio e radioatividade, no Parque Nacional da Serra do Gandarela


Exuber�ncia e perigo na Serra do Gandarela

Intensas cores de musgos moldados a montes pedregosos e globos brancos de sempre-vivas recobrem os campos de altitudes, entre c�rregos que asseguram o abastecimento de cidades da Regi�o Metropolitana de Belo Horizonte, das bacias do Rio das Velhas e do Rio Doce. A exuber�ncia das paisagens do Parque Nacional da Serra do Gandarela encanta, mas tanta vida em estado presente esconde rinc�es perigosos, onde a pr�pria natureza pode envenenar aqueles que nela se abrigam. Sob esse santu�rio natural est�o as mais radioativas cavidades rochosas mineiras. Profundezas misteriosas, escondidas nas reentr�ncias petrificadas conhecidas pelo Opili�o – Grupo de Estudos Espeleol�gicos (OGrEE), um time de estudiosos formado por especialistas interdisciplinares mineiros que guiou a reportagem do Estado de Minas.

As grutas submetidas a medi��es e que emitem energia radioativa acima da m�dia nacional s�o a da Surpresa, dos Ecos e a Luna (essa descrita pela primeira vez pelo OgrEE). S�o cavidades de bocas escuras, mantidas camufladas pela vegeta��o. Desdobram-se em galerias apertadas, recobertas por p� e pedras arredondadas, permitindo a passagem engatinhando ou rastejando. A escurid�o engole a luz a cada metro, rasgada pelos feixes luminosos das lanternas nos capacetes. Ali o clima � agrad�vel, mais apraz�vel que sob o sol quente do exterior. Mas a ilumina��o faz brilhar uma cortina de fina poeira em suspens�o por toda a caverna. O aperto, o sil�ncio, o mergulho no ar particulado e a sua inala��o trazem uma dose de ang�stia claustrof�bica, ampliada por se saber ser aquele um ambiente de alta radioatividade.

“Fizemos as medi��es das cavernas em v�rias partes. Nas bocas das cavernas, a radia��o do g�s rad�nio captada pelos instrumentos passivos era menor, porque ali ainda ocorre ventila��o. Quanto mais para o interior, maiores as emiss�es”, afirma o engenheiro Nathan Silva, respons�vel pela pesquisa nas grutas. Para se ter uma ideia, a radia��o por rad�nio ao ar livre � de at� 10 becquerel por metro c�bico de ar (Bq/m3). Em cavernas carbon�ticas da regi�o de Lagoa Santa, a m�dia encontrada foi de 884Bq/m3, subindo para 945Bq/m3 nas ferr�feras da Serra da Piedade e saltando para 4.759Bq/m3 nas cavidades quartz�ticas do Gandarela.

Fen�meno natural

Chernobyl, Hiroshima, Nagasaki, Fukushima, c�sio 137, em Goi�nia. Mem�rias de devasta��es, doen�as e deformidades causadas por radia��o nuclear injetam tens�o a cada minuto que se passa no interior do t�nel, com cada aspira��o trazendo para dentro dos pulm�es o rad�nio agregado a part�culas de poeira e em forma de g�s. Um nervosismo compreens�vel, mas infundado, de acordo com o qu�mico e doutor em hist�ria da ci�ncia Luciano Faria, um dos orientadores da pesquisa e membro do OgrEE.

“Para n�o espantar as pessoas: a radioatividade � um fen�meno natural. H� elementos qu�micos nas rochas, na �gua e at� no ar que s�o radioativos. A gente dentro da caverna corre perigo? N�o. Porque fazemos visitas r�pidas. Mais de 12 horas por dia � que poderia trazer algum tipo de risco”, avalia.

Uma das buscas realizadas no interior das grutas radioativas � por trogl�bios, os animais que habitam cavernas. A fauna encontrada pelo grupo foi pequena, se restringindo a grilos, opili�es (pequenos aracn�deos), dipl�podes (piolho-de-cobra) e morcegos. “� importante saber como esses animais conseguem sobreviver sob elevados n�veis de radia��o. T�m algum tipo de adapta��o ou resist�ncia? � caracter�stica do DNA ou alguma prote�na? Replicar pode ajudar a produzir medicamentos, melhorar vegetais que consigam captar a radia��o para mitigar algum tipo de impacto? S�o possibilidades diversas”, afirma Faria.

Saiba Mais

O que � o rad�nio e os seus perigos

O rad�nio (Rn) � um g�s nobre radioativo que n�o tem cor, odor ou sabor. � formado naturalmente como parte de tr�s cadeias de decaimento que come�a com o ur�nio (U) e o t�rio (Th), elementos encontrados em pequenas quantidades na maioria das rochas, solos e �gua. Sua radioatividade � a segunda maior causa de morte por c�ncer de pulm�o nos Estados Unidos, atr�s apenas do cigarro, segundo a Ag�ncia de Prote��o Ambiental norte-americana (Environmental Protection Agency). Cerca de 21 mil pessoas morrem por ano por causa desse elemento qu�mico, sendo 2.900 das quais n�o fumantes. As part�culas de radia��o alfa emitidas pelo rad�nio s�o altamente ionizantes, mas t�m pouco poder de penetra��o, n�o passando nem sequer da pele. Os riscos se depositam nas altas concentra��es inaladas pelos pulm�es. As part�culas n�o conseguem escapar do corpo e dispersam toda a sua radioatividade internamente, podendo ocasionar les�es ou patologias de gravidade diversa, de acordo com a quantidade de rad�nio inalado, ainda segundo a ag�ncia.


Contamina��o radioativa

Veja as possibilidades de danos � sa�de por exposi��o a rad�nio

N�vel de radia��o (Bq/m3)/Favorecimento ao c�ncer de pulm�o*1/ Compara��o de risco ou local


9.456/46%/Pico de medi��o na Gruta Santana (PETAR)

8.289/40,3%/Pico de medi��o na Gruta da Surpresa (Gandarela)

6.165/30%/Valor m�dio na Gruta da Surpresa (Gandarela)

4.759/23,2%/M�dia das cavernas quartz�ticas do Gandarela*2

1.000/4,9%/Maior valor j� medido em ambiente fechado dom�stico

945/4,6%/M�dia das cavernas ferr�feras da Serra da Piedade*2

884/4,3%/M�dia das cavernas calc�reas de Lagoa Santa*2

740/3,6%/35x a chance de morte por afogamento

370/1,8%/20x o risco de se morrer ap�s inc�ndio dom�stico

296/1,5%/4x a possibilidade de morrer ap�s uma queda

148/0,7%/Chance de morrer em um acidente de carro

74/0,4%/Risco normal de morte por envenenamento

48,1/0,2%/Locais fechados como por�es

15/0/Ar livre


*1 Em caso de exposi��o ao longo da vida

*2 Tr�s grutas foram estudadas nesse local


Fontes: Iowa Department of Public Health e CDTN


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