Plano de defesa tenta blindar o Rio das Velhas da amea�a de barragens
Sistema criado por TAC promete impedir que torneiras sequem em caso de rompimento de uma das 67 barragens pr�ximas a trecho do rio que abastece a Grande BH
O plano de conting�ncia contra rompimento de barragens no Rio das Velhas prev� capta��es em novos pontos, como o da Ponte de Arame, em Itabirito (foto: Leandro Couri/EM/D.A.Press)
Itabirito, Nova Lima, Raposos e Rio Acima – Acima das �guas do Rio das Velhas, em seu trecho alto, que � respons�vel pelo abastecimento de 45% dos 5 milh�es de habitantes da Grande Belo Horizonte, 67 barragens e diques de v�rias mineradoras s�o amea�a. Mas, ao contr�rio do Rio Paraopeba, que teve sua capta��o suspensa em 2019, ap�s o rompimento da barragem da Mina do C�rrego do Feij�o, em Brumadinho, o Rio Velhas tem em implanta��o um plano de conting�ncia acordado pelo Minist�rio P�blico de Minas Gerais (MPMG), Copasa e a mineradora Vale. Se uma das barragens se romper, o plano pode ser posto em a��o, com possibilidade de racionamento e rod�zio at� que a capacidade de abastecimento seja restabelecida.
O plano, como mostra a reportagem do Estado de Minas, � fruto do Termo de Ajustamento de Condutas (TAC) que prev� sistemas de prote��o na capta��o da Copasa, uma adutora, duas interliga��es dos sistemas Velhas e Paraopeba, reativa��o e perfura��o de po�os para quatro munic�pios, bombeamento de �gua de barramentos existentes, tr�s novas capta��es em mananciais, po�os e reservat�rios para 32 servi�os essenciais, como hospitais, institui��es de ensino e penitenci�rias (veja o mapa).
“Foi preciso encontrar uma solu��o, pois, na �poca (2019), o abastecimento de 65% de Belo Horizonte e de quase a metade da Grande BH estava amea�ado por tr�s barragens que estavam em risco. Foi uma forma de garantir que a Grande BH n�o passasse novamente por desabastecimento”, afirma o promotor Carlos Eduardo Ferreira Pinto, coordenador do Centro de Apoio �s Promotorias de Meio Ambiente (Caoma) do MPMG, mencionando o desabastecimento ocorrido em 2016 e que levou a Grande BH a racionamentos e rod�zio. A Copasa vem acompanhando e assessorando as interven��es.
O TAC foi assinado em 2019 e j� recebeu quatro termos aditivos e h� um quinto previsto para ser celebrado nos pr�ximos dias. Todo o esfor�o feito inclui tamb�m a nova capta��o de 5 mil litros/segundo (l/s) no Rio Paraopeba, em Brumadinho, antes do ponto do rompimento, que foi constru�da pela Vale e que deveria ter sido transferida para a opera��o da Copasa, em fevereiro de 2021.
Para abastecer 21 munic�pios da Grande BH, a Copasa capta 15 mil l/s dos sistemas Rio das Velhas (6.750l/s) e Rio Paraopeba (8.250l/s). O volume total � suficiente para encher uma piscina ol�mpica em menos de tr�s minutos. Dados da Ag�ncia Nacional de Minera��o (ANM), mostram que h� 67 barramentos de mineradoras inclu�dos ou n�o na pol�tica Nacional de Seguran�a de Barragens em cursos d’�gua que desembocam no alto Rio das Velhas, antes da capta��o da Copasa para a Grande BH, a Esta��o de Tratamento de �gua (ETA) Bela Fama, em Nova Lima. Um rompimento poderia afetar o abastecimento.
Por esse motivo, a primeira medida executada no plano de conting�ncia foi a instala��o de comportas ensecadeiras (muralhas em torno das estruturas com port�es de a�o vedados para barrar fisicamente inunda��es e rejeitos) para prote��o do maquin�rio de capta��o da Elevat�ria de �gua Bruta na ETA Bela Fama, no distrito de Hon�rio Bicalho, bem como no entorno das subesta��es, al�m de melhorias no sistema de capta��o.
No caso de um rompimento grave que injetasse acima de 10 vezes mais sedimentos que o limite previsto pelo Conselho Nacional de Meio Ambiente (Conama), o plano prev� que nos primeiros 36 dias a ETA Bela Fama s� trataria 315l/s da represa de Cambimbe, operada pela mineradora AngloGold Ashanti, em Raposos. Essa etapa abasteceria Raposos e Nova Lima e j� est� pronta, com tr�s motobombas, sendo uma delas em reserva.
Pela previs�o do plano de conting�ncia, a partir do 36º dia do rompimento, se os sedimentos chegarem ao limite de opera��o de tr�s vezes acima do limite Conama para turbidez (concentra��o de sedimentos e s�lidos na �gua que podem a tornar mais turva), a capta��o de �gua no Rio das Velhas poderia ser retomada de forma provis�ria, com uma etapa de pr�-tratamento (unidade de sedimenta��o) e capacidade de 500l/s. Quando inferior a isso, “em tese”, com menos de 100 dias, poderia ser retomada a capta��o em ritmo regular.
Iinterliga��o com o sistema Paraopeba
Em paralelo a essas a��es, j� foram implementadas interliga��es entre o sistema Paraopeba e Velhas na Vila Kennedy, no Bairro Xangri-la e uma adutora de dois quil�metros. O plano de conting�ncia prev� que o Sistema Paraopeba entre em racionamento para que o Sistema Rio das Velhas possa ser abastecido em rod�zio. Foram tamb�m perfurados e reativados po�os de capta��o no Vetor Norte da Grande BH para o abastecimento dos munic�pios de Lagoa Santa, Vespasiano e S�o Jos� da Lapa. Outros 10 po�os para atender a Sabar� foram perfurados e devem ter sua infraestrutura de funcionamento conclu�da at� o primeiro semestre de 2024, com vaz�o total de 200l/s, de acordo como a Vale.
Estudos de viabilidade e os projetos de engenharia para novas capta��es de �gua tamb�m est�o em andamento. “A maior parte das a��es encontra-se em estado avan�ado e pr�ximas � conclus�o, com 80% de cumprimento do Termo de Compromisso (com o TAC). Al�m disso, j� foram investidos R$ 63 milh�es e novos aportes est�o previstos at� a conclus�o dos projetos de engenharia. A realiza��o das obras foi prevista no acordo judicial celebrado pela Vale, Estado de Minas Gerais e MPMG (Repara��o Integral), de R$ 2,05 bilh�es para a realiza��o das obras pelo estado”, informou a mineradora.
Na Bacia do Rio Paraopeba, o plano prev� nova capta��o de 2.500l/s no Rio Maca�bas, no munic�pio de Bonfim e 19km de adutora de �gua bruta, al�m da amplia��o do Sistema Manso, com aumento da capacidade de tratamento de 6 mil para 9 mil l/s e a implanta��o de 17,5km de adutoras, reservat�rios e esta��es elevat�rias.
J� na Bacia do Rio das Velhas, esse plano prev� nova capta��o de 600l/s e 8km de adutoras no Ribeir�o da Prata, que vem da Serra do Gandarela e chega a Rio Acima. Outra capta��o seria feita no pr�prio Rio das Velhas, em Itabirito, na Regi�o da Ponte de Arame, com capacidade de 2 mil l/s e 26km de adutora de �gua bruta; as interven��es no local sofreram atraso desde que se depararam com fragmentos de cer�mica que precisam ser avaliadas arqueologicamente pelos institutos do Patrim�nio Estadual (Iepha) e Nacional (Iphan).
Outra interliga��o dos sistemas Velhas e Paraopeba, de 29km, tamb�m � necess�ria para permitir que as capta��es de uma bacia possam socorrer aquela que se encontrar em risco, o que serviria, ainda, como mais uma conting�ncia para ambos os sistemas.
Por fim, h� a previs�o de perfura��o de po�os e constru��o de reservat�rios para o atendimento a 32 consumidores essenciais (institui��es de pesquisa e ensino, hospitais, postos de sa�de e institui��es penais) que utilizam mais de 80 mil litros di�rios.
Para especialista, rompimento seria “cat�strofe sem tamanho”
Um rompimento de barragem atingindo o Alto Rio das Velhas � classificado como “cat�strofe sem tamanho” pelo vice-presidente do Comit� da Bacia Hidrogr�fica do Rio S�o Francisco e diretor do Instituto Guaicuy, professor Marcus Vin�cius Polignano. “Al�m de uma trag�dia para o abastecimento da Grande BH, significaria uma contamina��o absurda para o Rio S�o Francisco (do qual o Rio das Velhas � um dos principais afluentes). Uma trag�dia de n�vel nacional, pois comprometeria o rio em toda a sua extens�o”, destaca o ambientalista.
Para Polignano, o n�mero de pelo menos 67 barramentos acima da �rea de capta��o do Rio das Velhas em Nova Lima mostra um descaso com um bem t�o necess�rio para a popula��o. “Mostra a falta de ordenamento do Estado e da minera��o ao se construir tantas estruturas e em grande parte delas fr�geis na dire��o de uma zona de abastecimento da capital do estado”, afirma.
Sobre o plano de conting�ncia para o Rio das Velhas, o professor afirma se tratar de uma ideia tardia e que n�o tem muitas op��es. “N�o se t�m alternativas muito grandes, pois a Grande BH est� entre os vales do Rio Paraopeba e Rio das Velhas. N�o h� outro rio com capacidade, e os esfor�os t�m de ser para manter a vitalidade dessas bacias hidrogr�ficas. Por�m, � tamb�m urgente que se discutam as �reas de recarga dessas bacias, pois, sem isso, mesmo antes de uma conting�ncia, n�o se ter� �gua suficiente” alerta.
Ap�s as interven��es serem feitas, a Grande BH passa a ter maior flexibilidade de abastecimento, al�m de seguran�a contra rompimentos, destaca o gerente de engenharia da Vale, Luciano Alvarenga. “A integra��o dos sistemas de abastecimento Rio das Velhas com o Rio Paraopeba vai garantir a oferta de �gua, caso um dos dois apresente algum tipo de problema”, afirma. “Os estudos e as obras trazem v�rias possibilidades de abastecimento, considerando cen�rios diversos e uma popula��o expressiva com realidades distintas. J� realizamos entregas fundamentais e vamos deixar um trabalho para gera��es futuras”, afirma a gerente de saneamento da Vale, Roberta Guimar�es.
O ambientalista Marcus Polignano criticou tamb�m a escolha de uma das novas capta��es, a que fica pr�ximo � Ponte de Arame, em Itabirito. “Ali temos um problema muito grande. N�o foram feitos levantamentos de impactos ambientais, a quest�o n�o foi debatida nem chegou ao comit� da bacia. Um barramento ali mudaria toda din�mica do rio. Sem falar que ali perto tem a barragem de Acurui que j� est� muito assoreada, pela caracter�stica do pr�prio rio naquela altura. Isso afetaria uma nova capta��o”, afirma.