Gabriela Freire Valente

Bras�lia – Passados 20 anos ap�s o fim do apartheid, em 1994, os sul-africanos voltam �s urnas para elei��es gerais que devem desenhar o futuro pol�tico do pa�s. � a primeira disputa realizada sem a presen�a f�sica do ex-presidente Nelson Mandela, her�i da luta contra o regime racista e patriarca da democracia racial, morto em dezembro. O desempenho do Congresso Nacional Africano (CNA), que Mandela personificou por v�rias d�cadas, ser� observado com aten��o. Embora a legenda governe o pa�s desde 1994 e continue favorita, uma s�rie de esc�ndalos de corrup��o, somados aos problemas socioecon�micos, vem derrubado os �ndices de aprova��o do presidente Jacob Zuma e, consequentemente, de confian�a no partido. Para analistas, a elei��o de quarta-feira representa o in�cio de um novo cen�rio pol�tico na �frica do Sul.
De acordo com estudo divulgado pelo instituto Ipsos, em novembro, apenas 46% dos sul-africanos aprovavam o trabalho de Zuma. Em teoria, a insatisfa��o com o governo deve se refletir nas urnas, mas sondagens eleitorais indicam que os partidos opositores carecem de for�a em n�vel nacional, propiciando que o CNA ultrapasse os 60% dos votos. Cleomar Souza, professor de rela��es internacionais da Universidade Cat�lica de Bras�lia, acredita que o passado de segrega��o alimente uma resist�ncia a propostas distintas. “No inconsciente coletivo daquela maioria negra n�o existe ainda, de forma competitiva, outro elemento pol�tico que possa ser mais confi�vel que o CNA. Por mais que Mandela tenha pacificado a �frica do Sul, institucionalmente, ainda h�, de maneira �bvia, alguns ran�os que contaminam a tomada de decis�o”, sustenta Souza.

A aus�ncia da figura conciliadora de Madiba, nome tribal de Mandela, pode evidenciar as defici�ncias do partido e abrir nova perspectiva para o pa�s. James Mittelman, professor de rela��es internacionais da American University, em Washington, avalia que os votos dos sul-africados devem tentar colocar em pr�tica os ideias da longa batalha por liberdade que precedeu a democratiza��o. “O desafio pol�tico � preservar os ganhos do per�odo p�s-apartheid e atender �s quest�es de justi�a social. Enquanto o governo do CNA avan�ou na constru��o de uma sociedade multicultural, a desigualdade entre as classes se tornou cada vez mais um divisor”, observa.
Embora a legenda tenha arrebatado a heran�a pol�tica de Mandela, Andr� Duvenhage, especialista em cen�rios pol�ticos da Universidade North-West, na �frica do Sul, disse � reportagem que a imagem do �cone da luta antirracista tem sido explorada de forma sutil – a figura do presidente Zuma � predominante no material eleitoral. “Acredito que eles queiram evitar compara��es, pois isso teria reflexos negativos para o partido”, indicou. “Essa �, definitivamente, a elei��o mais dif�cil para a CNA desde 1994”, considera.
Desde meados de 2012, a �frica do Sul enfrenta uma s�rie de violentos protestos e greves em setores importantes da economia. De acordo com dados oficiais, o desemprego atinge 25% da popula��o e chega a 40% entre os jovens. “Alguns avan�os foram feitos, mas ainda h� problemas com a cria��o de empregos, o que implica mudan�as na pol�tica macroecon�mica, e com a corrup��o, que destr�i a capacidade do Estado para atacar quest�es do desenvolvimento”, indica Alexander Beresford, especialista em pol�tica africana da Universidade de Leeds, no Reino Unido.
DIFICULDADES Embora a Alian�a democr�tica (AD, centrista), principal partido opositor, tente convencer os eleitores – especialmente os de classe m�dia – de que uma agenda mais liberal trar� mais prosperidade � �frica do Sul, a legenda opositora enfrentou problemas de articula��o danosos � sua imagem. A AD, que � liderada por Helen Zille, uma mulher branca, tentou se coligar com Mamphela Ramphele, negra e fundadora do partido AgangSA. A uni�o, por�m, durou poucos meses. “Isso deixou uma impress�o de fraqueza no partido, e tais problemas de publicidade afetam as esperan�as de conquistarem uma parcela maior dos votos”, avalia Beresford.
O CNA ainda tem o apoio dos poderosos sindicatos e associa��es trabalhistas, mas vem perdendo a sustenta��o desse importante eleitorado. A Uni�o Nacional de Metal�rgicos, uma das principais representa��es de trabalhadores do pa�s, desligou-se do partido governista logo ap�s a morte de Mandela. “Se mais sindicatos seguirem esse caminho, isso pode ser muito significativo. Eles t�m um discurso mais socialista, que pode atrair grande parte dos sul-africanos”, pondera Beresford.