
“H� pouco clamor popular para reivindicar a humanidade dessas vidas”. A afirma��o � do professor-adjunto do Departamento de Ci�ncia Pol�tica da Universidade Federal de Minas Gerais (DCP/UFMG) Cristiano Rodrigues, que tra�a um paralelo entre os protestos nos Estados Unidos pela morte de George Floyd e os assassinatos de jovens negros no Brasil.
Autor do livro Afro-latinos em movimento: protesto negro e ativismo institucional no Brasil e na Col�mbia (Appris Editora, 2020), nesta entrevista, Cristiano analisa o contexto racial dos Estados Unidos, pa�s onde foi pesquisador visitante do Departamento de Sociologia e do Centro de Educa��o em G�nero e Sexualidade da San Francisco State University.
Coordenador da �rea tem�tica de ra�a, etnicidade e pol�tica da Associa��o Brasileira de Ci�ncia Pol�tica (ABCP), Cristiano diz o que os protestos do movimento negro americano, que j� duram uma semana, revelam sobre a luta pela igualdade racial naquele pa�s. Tamb�m analisa o que representa o assassinato do menino Jo�o Pedro, de 14 anos, por policiais no Rio de Janeiro, para a discuss�o sobre o tema no Brasil. Nesta entrevista, o pesquisador tra�a as diferen�as e semelhan�as entre os movimentos negros dos dois pa�ses e como fazem o enfrentamento ao racismo.
O que o assassinato de George Floyd revela sobre os EUA e a quest�o racial?
O principal elemento para pensar � a rela��o, deste momento, com um per�odo de otimismo, no governo Obama. V�rios analistas chegaram a dizer que era o qu� eles chamam de era “p�s-racial”, em que a quest�o racial se tornaria menos relevante para as pessoas e para o cen�rio pol�tico norte-americano. Esse cen�rio pol�tico de relativo otimismo foi acompanhado, logo em seguida, por uma esp�cie de backlash da direita nacionalista, supremacista branca. Tamb�m tem uma rela��o com a elei��o do Trump, em 2016.
A partir da�, come�am a acontecer fen�menos que s�o importantes: menor aten��o aos casos comuns e recorrentes de brutalidade policial, voltada para negros e minorias raciais nos Estados Unidos. No governo Obama, apesar de as pol�ticas voltadas para essas quest�es n�o ter acontecido, voc� tinha um reconhecimento p�blico de que o racismo era uma dimens�o central nos Estados Unidos, que estes crimes tinham conota��o racial e de que alguma coisa precisaria ser feita. Quando o Trump � eleito, voc� perde um pouco desse debate p�blico sobre essa quest�o. E ela, muitas vezes, � trabalhada numa simetria entre dois grupos em disputa, em que ambos s�o igualmente errados, igualmente bons. Um desses exemplos seriam os protestos, em 2017, em Charlottesville de supremacistas brancos.
Logo depois, fez-se acompanhar de um contraprotesto. Foi uma grande confus�o. Trump foi a p�blico e disse: ‘h� pessoas boas em ambos os lados’. N�o tomou uma posi��o en�rgica em rela��o a isso. Do ponto de vista da pol�tica institucional, da lideran�a do pa�s, voc� tem uma passagem do otimismo da era ‘p�s-racial’ para uma certa neglig�ncia e, eu diria, de certo confronto com a ideia de otimismo, que � de negar a import�ncia do racismo e tentar deslegitimar a��es dessa natureza.
A partir da�, come�am a acontecer fen�menos que s�o importantes: menor aten��o aos casos comuns e recorrentes de brutalidade policial, voltada para negros e minorias raciais nos Estados Unidos. No governo Obama, apesar de as pol�ticas voltadas para essas quest�es n�o ter acontecido, voc� tinha um reconhecimento p�blico de que o racismo era uma dimens�o central nos Estados Unidos, que estes crimes tinham conota��o racial e de que alguma coisa precisaria ser feita. Quando o Trump � eleito, voc� perde um pouco desse debate p�blico sobre essa quest�o. E ela, muitas vezes, � trabalhada numa simetria entre dois grupos em disputa, em que ambos s�o igualmente errados, igualmente bons. Um desses exemplos seriam os protestos, em 2017, em Charlottesville de supremacistas brancos.
Logo depois, fez-se acompanhar de um contraprotesto. Foi uma grande confus�o. Trump foi a p�blico e disse: ‘h� pessoas boas em ambos os lados’. N�o tomou uma posi��o en�rgica em rela��o a isso. Do ponto de vista da pol�tica institucional, da lideran�a do pa�s, voc� tem uma passagem do otimismo da era ‘p�s-racial’ para uma certa neglig�ncia e, eu diria, de certo confronto com a ideia de otimismo, que � de negar a import�ncia do racismo e tentar deslegitimar a��es dessa natureza.
Podemos tra�ar um paralelo sobre o que acontece l� com o momento que passamos no Brasil?
Poderia dizer que h� uma percep��o, em ambos os pa�ses, de que os casos de racismo n�o recebem o devido reconhecimento popular, o devido reconhecimento das autoridades pol�ticas do pa�s. O outro �: em ambos os pa�ses, tivemos uma passagem de momento de certo otimismo na sociedade, de certa esperan�a em mudan�a, para um desencanto. Esse desencanto refletiu tanto na elei��o do Trump como na elei��o do Bolsonaro.
Desencanto com o sistema de representa��o pol�tica, mas � tamb�m uma esp�cie de revanchismo. S�o dois presidentes que foram eleitos por uma esp�cie de revanchismo branco, por assim dizer, de pessoas que n�o queriam dividir o espa�o democr�tico com outros grupos que antigamente estavam fora desse sistema. Junta-se a isso o fato de que, no Brasil, alguns autores chamam de “genoc�dio da juventude negra”, nos Estados Unidos � a quest�o da brutalidade policial. S�o casos muito recorrentes, muito comuns e com alto grau de impunidade.
Al�m disso, estamos em momento de pandemia em que as pessoas est�o mais desencantadas, mais desesperan�osas e pessimistas em rela��o ao mundo. Isso vira um grande caldo de cultura, em que a insatisfa��o popular com a pol�tica, a insatisfa��o popular com a situa��o da pandemia e a percep��o de que as quest�es do racismo n�o s�o devidamente tratadas na esfera p�blica crescem, de tal forma, que fazem com que esses protestos ganhem propor��es gigantescas.
Desencanto com o sistema de representa��o pol�tica, mas � tamb�m uma esp�cie de revanchismo. S�o dois presidentes que foram eleitos por uma esp�cie de revanchismo branco, por assim dizer, de pessoas que n�o queriam dividir o espa�o democr�tico com outros grupos que antigamente estavam fora desse sistema. Junta-se a isso o fato de que, no Brasil, alguns autores chamam de “genoc�dio da juventude negra”, nos Estados Unidos � a quest�o da brutalidade policial. S�o casos muito recorrentes, muito comuns e com alto grau de impunidade.
Al�m disso, estamos em momento de pandemia em que as pessoas est�o mais desencantadas, mais desesperan�osas e pessimistas em rela��o ao mundo. Isso vira um grande caldo de cultura, em que a insatisfa��o popular com a pol�tica, a insatisfa��o popular com a situa��o da pandemia e a percep��o de que as quest�es do racismo n�o s�o devidamente tratadas na esfera p�blica crescem, de tal forma, que fazem com que esses protestos ganhem propor��es gigantescas.
Quais as semelhan�as e principais diferen�as entre os movimentos negros no Brasil e nos EUA?
Os movimentos negros no Brasil e nos Estados Unidos s�o muito diferentes. Em primeiro lugar, porque respondem a sistemas de opress�o racial muito diferente. Nos Estados Unidos, a popula��o negra � da ordem de 15%, e quando houve a Guerra da Secess�o, que tem muito a ver com o fim do sistema de escravid�o, logo depois no Sul dos Estados Unidos, foram criadas as Leis de Jim Crow, que promoveram v�rias formas de segrega��o – espacial, no transporte p�blico, nas escolas.
Uma forma muito grande de organiza��o da sociedade, em que os negros tinham acessos limitados: a quest�o dos iguais, mas separados. H� um peso muito grande nas comunidades norte-americanas da religi�o. As igrejas negras no Sul dos Estados Unidos acabaram sendo um espa�o de concentra��o e espa�o de desenvolvimento da consci�ncia pol�tica muito importante para a popula��o negra naqueles per�odos. Logo depois, voc� tem, durante os anos 1960, os movimentos de desobedi�ncia civil liderados por Martin Luther King, os boicotes de dois e tr�s anos, e tudo isso gera uma a��o do movimento muito voltada para a pr�tica comunit�ria e o entendimento de que as pessoas negras s�o oprimidas enquanto coletivos.
Mesmo nos EUA, no per�odo da segrega��o, havia classe m�dia negra, universidades negras, voc� tinha sistema social negro diferente dos brancos, mas que, apesar de as pessoas acenderem na classe social, ainda assim sofriam com racismo quando iam para fora de suas comunidades. Percep��o de que o fato de elas serem negras era o que limitava a participa��o como membros integrais da sociedade. A partir dos anos 1960, surgem os movimentos pelos direitos civis, a entrada de mais negros na universidade, cria��o de classe m�dia, econ�mica e pol�tica negra. Mesmo com essa ascens�o econ�mica e pol�tica de uma parte da popula��o negra, os casos de racismo continuam acontecendo frequentemente.
Caso muito discutido, atualmente, � o direito � moradia em Chicago. H� empreiteiras e agiotas que cobravam mais caro de pessoas negras para comprarem casas do que de pessoas brancas. Por essa raz�o, atualmente, se discute muito como o sistema de financiamento habitacional dos EUA foi corrompido para impedir que negros tivessem acesso a empr�stimos banc�rios subsidiados pelo governo.
Uma forma muito grande de organiza��o da sociedade, em que os negros tinham acessos limitados: a quest�o dos iguais, mas separados. H� um peso muito grande nas comunidades norte-americanas da religi�o. As igrejas negras no Sul dos Estados Unidos acabaram sendo um espa�o de concentra��o e espa�o de desenvolvimento da consci�ncia pol�tica muito importante para a popula��o negra naqueles per�odos. Logo depois, voc� tem, durante os anos 1960, os movimentos de desobedi�ncia civil liderados por Martin Luther King, os boicotes de dois e tr�s anos, e tudo isso gera uma a��o do movimento muito voltada para a pr�tica comunit�ria e o entendimento de que as pessoas negras s�o oprimidas enquanto coletivos.
Mesmo nos EUA, no per�odo da segrega��o, havia classe m�dia negra, universidades negras, voc� tinha sistema social negro diferente dos brancos, mas que, apesar de as pessoas acenderem na classe social, ainda assim sofriam com racismo quando iam para fora de suas comunidades. Percep��o de que o fato de elas serem negras era o que limitava a participa��o como membros integrais da sociedade. A partir dos anos 1960, surgem os movimentos pelos direitos civis, a entrada de mais negros na universidade, cria��o de classe m�dia, econ�mica e pol�tica negra. Mesmo com essa ascens�o econ�mica e pol�tica de uma parte da popula��o negra, os casos de racismo continuam acontecendo frequentemente.
Caso muito discutido, atualmente, � o direito � moradia em Chicago. H� empreiteiras e agiotas que cobravam mais caro de pessoas negras para comprarem casas do que de pessoas brancas. Por essa raz�o, atualmente, se discute muito como o sistema de financiamento habitacional dos EUA foi corrompido para impedir que negros tivessem acesso a empr�stimos banc�rios subsidiados pelo governo.
No caso do Brasil...
A partir do fim da escravid�o, n�s n�o tivemos sistema legal de segrega��o semelhante ao que ocorreu nos Estados Unidos. Esse sistema legal de segrega��o l�, de certa forma, permitiu que os negros avan�assem do ponto de vista da consci�ncia racial de maneira distinta da brasileira. Era percept�vel que os limites de acesso pol�tico, econ�mico e social dos negros nos EUA eram em decorr�ncia da cor da pele.
Da� o fortalecimento da comunidade negra era central para garantir que aquelas pessoas tivessem acesso e tamb�m fizessem a luta dentro sistema pol�tico-jur�dico para revers�o de leis segregacionistas. Da� a ‘Brown versus Board of Education’, que � uma decis�o da Suprema Corte Americana em 1954, que vai propor a dessegrega��o das escolas. Mas h� revanche dos brancos, e essa dessegrega��o n�o acontece. As escolas p�blicas s�o mais segregadas do que eram no per�odo anterior a essa decis�o judicial. Quando os negros avan�am nos EUA, os brancos se retiram daqueles espa�os sociais. No Brasil tem movimento duplo, de duas naturezas por assim dizer. N�o tem leis oficiais de segrega��o e discrimina��o social, mas voc� tem discrimina��o e segrega��o racial de fato.
Uma jun��o do padr�o econ�mico e cor da pele. Se voc� vai em determinados bairros da cidade, eles s�o mais negros do que outros, as escolas s�o mais negras do que outras. Os acessos s�o diferenciados. Uma grande miscigena��o meio que n�o permite que n�s saibamos quem s�o aqueles afetados. O nosso caldo de cultura, a nossa hist�ria, � diferente dos EUA. Se nos EUA tinha a percep��o que a cor da pele era limitador para o acesso, no caso do Brasil, por muito tempo, ficamos na discuss�o se era classe ou cor da pele. � mais dif�cil identificar quem s�o as pessoas negras no Brasil.
O movimento negro passou por momento de tentar conscientizar as pessoas que elas s�o negras e � por isso a falta de acesso que elas tem. Foi necess�ria a constru��o de consci�ncia. Essa consci�ncia, a meu ver, s� nos �ltimos anos, come�ou a ficar mais difundida em todas as classes sociais. Antes, me parece, as pessoas negras das classes m�dias eram aquelas que percebiam mais facilmente o racismo, porque eram elas que disputavam o acesso com as pessoas brancas, disputavam o mercado de trabalho, iam nos mesmos espa�os de lazer, iam para os mesmos lugares de cultura. Os negros mais pobres dividiam espa�o com pessoas mais pobres e muitas das experi�ncias de racismo delas se passam por experi�ncia de preconceito de classe.
Quando houve maior democratiza��o do acesso ao ensino superior, a partir dos anos 2000, grande luta do movimento negro no Brasil nas �ltimas d�cadas, passamos a ter maior participa��o de classes diferentes em espa�os considerados brancos. Houve maior disputa por acesso e por direitos. No nosso caso, a constru��o da consci�ncia racial � mais ao fim do debate, enquanto nos Estados Unidos ela � mais no in�cio do debate. Ambos s�o pa�ses que exercem formas de segrega��o impl�cita e expl�cita que s�o muito r�gidas.
Da� o fortalecimento da comunidade negra era central para garantir que aquelas pessoas tivessem acesso e tamb�m fizessem a luta dentro sistema pol�tico-jur�dico para revers�o de leis segregacionistas. Da� a ‘Brown versus Board of Education’, que � uma decis�o da Suprema Corte Americana em 1954, que vai propor a dessegrega��o das escolas. Mas h� revanche dos brancos, e essa dessegrega��o n�o acontece. As escolas p�blicas s�o mais segregadas do que eram no per�odo anterior a essa decis�o judicial. Quando os negros avan�am nos EUA, os brancos se retiram daqueles espa�os sociais. No Brasil tem movimento duplo, de duas naturezas por assim dizer. N�o tem leis oficiais de segrega��o e discrimina��o social, mas voc� tem discrimina��o e segrega��o racial de fato.
Uma jun��o do padr�o econ�mico e cor da pele. Se voc� vai em determinados bairros da cidade, eles s�o mais negros do que outros, as escolas s�o mais negras do que outras. Os acessos s�o diferenciados. Uma grande miscigena��o meio que n�o permite que n�s saibamos quem s�o aqueles afetados. O nosso caldo de cultura, a nossa hist�ria, � diferente dos EUA. Se nos EUA tinha a percep��o que a cor da pele era limitador para o acesso, no caso do Brasil, por muito tempo, ficamos na discuss�o se era classe ou cor da pele. � mais dif�cil identificar quem s�o as pessoas negras no Brasil.
O movimento negro passou por momento de tentar conscientizar as pessoas que elas s�o negras e � por isso a falta de acesso que elas tem. Foi necess�ria a constru��o de consci�ncia. Essa consci�ncia, a meu ver, s� nos �ltimos anos, come�ou a ficar mais difundida em todas as classes sociais. Antes, me parece, as pessoas negras das classes m�dias eram aquelas que percebiam mais facilmente o racismo, porque eram elas que disputavam o acesso com as pessoas brancas, disputavam o mercado de trabalho, iam nos mesmos espa�os de lazer, iam para os mesmos lugares de cultura. Os negros mais pobres dividiam espa�o com pessoas mais pobres e muitas das experi�ncias de racismo delas se passam por experi�ncia de preconceito de classe.
Quando houve maior democratiza��o do acesso ao ensino superior, a partir dos anos 2000, grande luta do movimento negro no Brasil nas �ltimas d�cadas, passamos a ter maior participa��o de classes diferentes em espa�os considerados brancos. Houve maior disputa por acesso e por direitos. No nosso caso, a constru��o da consci�ncia racial � mais ao fim do debate, enquanto nos Estados Unidos ela � mais no in�cio do debate. Ambos s�o pa�ses que exercem formas de segrega��o impl�cita e expl�cita que s�o muito r�gidas.
O que o assassinato de Jo�o Pedro, um menino de 14 anos, no Rio de Janeiro, revela sobre a quest�o racial no Brasil?
O assassinato do Jo�o Pedro n�o foi o �nico. Se fossemos enumerar os assassinatos de jovens negros no Brasil, ficar�amos horas falando os nomes. Tivemos �gatha alguns meses atr�s. Esses fatos revelam que nossa indigna��o ao assassinato de jovens negros n�o �, nem de longe, t�o grande como estamos vendo esse caso dos EUA. Isso revela muito sobre o Brasil, porque como diz uma frase de Florestan Fernandes, soci�logo muito importante dos estudos da quest�o racial no Brasil: ‘o brasileiro tem preconceito de ter preconceito’. O que ele queria dizer com isso? A gente faz um acordo t�cito.
Tanto aquele que � a pessoa que age preconceituosamente tanto a que sofre o preconceito fazem acordo t�cito de n�o falar sobre aquilo. � vergonhoso para o indiv�duo que � preconceituoso e tamb�m � vergonhoso para aquele que passa pelo preconceito, fica parecendo que ele est� sendo vitimado. No Brasil, temos problema com esse debate. Por tr�s da nossa baixa indigna��o com a morte da �gatha e do Jo�o Pedro e tantos outros jovens negros, vem a culpabiliza��o da pobreza, criminaliza��o da pobreza. Toda vez que um indiv�duo pobre e negro � v�tima de uma a��o violenta policial, a gente se pergunta: ‘o que ele fez de errado?' Em vez de dizer que aquela a��o policial � indevida, fere direitos humanos fundamentais, de antem�o a gente diz ‘o que aquele sujeito fez de errado.’
Depois a gente tenta negar, por mais que demonstre que a recorr�ncia daqueles casos indica o racismo estrutural. Seguindo o que Florestan disse: as pessoas n�o querem ver a sociedade brasileira como racista. Elas n�o querem se ver enquanto pessoas que perpetuam o racismo, elas n�o querem ver o racismo como a causa dessas mortes. E elas se calam diante disso. � uma forma de transformar os indiv�duos que s�o mais vulner�veis socialmente em inimigos do pa�s. H� pouco clamor popular para reivindicar a humanidade dessas vidas. Isso revela muito sobre o racismo no Brasil, colocar embaixo do tapete as experi�ncias de racismo
Tanto aquele que � a pessoa que age preconceituosamente tanto a que sofre o preconceito fazem acordo t�cito de n�o falar sobre aquilo. � vergonhoso para o indiv�duo que � preconceituoso e tamb�m � vergonhoso para aquele que passa pelo preconceito, fica parecendo que ele est� sendo vitimado. No Brasil, temos problema com esse debate. Por tr�s da nossa baixa indigna��o com a morte da �gatha e do Jo�o Pedro e tantos outros jovens negros, vem a culpabiliza��o da pobreza, criminaliza��o da pobreza. Toda vez que um indiv�duo pobre e negro � v�tima de uma a��o violenta policial, a gente se pergunta: ‘o que ele fez de errado?' Em vez de dizer que aquela a��o policial � indevida, fere direitos humanos fundamentais, de antem�o a gente diz ‘o que aquele sujeito fez de errado.’
Depois a gente tenta negar, por mais que demonstre que a recorr�ncia daqueles casos indica o racismo estrutural. Seguindo o que Florestan disse: as pessoas n�o querem ver a sociedade brasileira como racista. Elas n�o querem se ver enquanto pessoas que perpetuam o racismo, elas n�o querem ver o racismo como a causa dessas mortes. E elas se calam diante disso. � uma forma de transformar os indiv�duos que s�o mais vulner�veis socialmente em inimigos do pa�s. H� pouco clamor popular para reivindicar a humanidade dessas vidas. Isso revela muito sobre o racismo no Brasil, colocar embaixo do tapete as experi�ncias de racismo
H� diferen�a entre o racismo no Brasil e nos Estados Unidos?
O racismo � brasileira � velado. Desde o fim da escravid�o, raramente tivemos legisla��es que eram explicitamente racistas, mas ele ocorre, as atitudes s�o racistas e podem ser confundidas como n�o-racistas. Em um desses exemplos, uma boate em Belo Horizonte impediu uma mo�a de entrar. Ela tinha chamado alguns amigos para comemorar o anivers�rio. Os amigos entraram e ela foi impedida de entrar.
Quando foi impedida, em nenhum momento disseram que era porque ela era negra. Voc� n�o tem boa apar�ncia, voc� n�o pertence a este lugar. O modo que o Brasil se expressa, velado, cria barreiras para que os negros percebam que o limitador social, pol�tico e economicamente � a cor da pele. Nos Estados Unidos come�ou diferente. Come�ou com legisla��o explicitamente racistas e a segrega��o dos negros em guetos, espa�os exclusivamente negros, fez com que a consci�ncia racial fosse imediata.
As limita��es pol�ticas, econ�micas e sociais eram decorrentes da cor da pele. Come�am a criar legisla��es que s�o indiretamente racistas, que continuam afetando as liberdades sociais, pol�ticas e econ�micas das pessoas negras. Um exemplo � como o Sistema de Justi�a Criminal � composto por leis que aumentam desproporcionalmente o encarceramento de negros.
Quando foi impedida, em nenhum momento disseram que era porque ela era negra. Voc� n�o tem boa apar�ncia, voc� n�o pertence a este lugar. O modo que o Brasil se expressa, velado, cria barreiras para que os negros percebam que o limitador social, pol�tico e economicamente � a cor da pele. Nos Estados Unidos come�ou diferente. Come�ou com legisla��o explicitamente racistas e a segrega��o dos negros em guetos, espa�os exclusivamente negros, fez com que a consci�ncia racial fosse imediata.
As limita��es pol�ticas, econ�micas e sociais eram decorrentes da cor da pele. Come�am a criar legisla��es que s�o indiretamente racistas, que continuam afetando as liberdades sociais, pol�ticas e econ�micas das pessoas negras. Um exemplo � como o Sistema de Justi�a Criminal � composto por leis que aumentam desproporcionalmente o encarceramento de negros.