Biden eleito presidente: por que Donald Trump perdeu a elei��o

Que as elei��es de 2020 enterrem de uma vez por todas a no��o equivocada de que as elei��es de 2016 foram um acidente hist�rico, uma aberra��o americana.

Donald Trump conquistou mais de 70 milh�es de votos, a segunda maior vota��o da hist�ria americana (atr�s apenas de Joe Biden, que foi eleito). Nacionalmente, ele tem mais de 47% de participa��o em seus votos e parece ter vencido 24 Estados, incluindo seus preferidos Fl�rida e Texas.

Ele tem um dom�nio extraordin�rio sobre grandes �reas dos EUA — uma conex�o visceral com milhares de apoiadores que fomentou uma devo��o quase semelhante � de um culto.

Ap�s quatro anos na Casa Branca, � como se seus apoiadores tivessem lido com aten��o os termos e condi��es de sua Presid�ncia e assinado embaixo com entusiasmo.

Qualquer an�lise de sua fraqueza pol�tica em 2020 tamb�m deve reconhecer sua for�a pol�tica. No entanto, ele foi derrotado, tornando-se um dos quatro �nicos titulares da era moderna a n�o conseguir se reeleger. Al�m disso, ele se tornou o primeiro presidente a perder o voto popular em elei��es consecutivas.

'Feiti�o contra o feiticeiro'

Donald Trump ganhou a Presid�ncia em 2016 em parte porque era um outsider pol�tico que quebrava as regras e estava preparado para dizer o que antes era indiz�vel.

Mas Donald Trump tamb�m perdeu a Presid�ncia em 2020, em parte justamente porque era um outsider pol�tico que quebrava as regras e estava preparado para dizer o que antes era indiz�vel.

Embora grande parte da base Trump pudesse muito bem ter votado nele mesmo se o presidente tivesse dado um tiro de em algu�m em plena Quinta Avenida de Nova York (como o pr�prio Trump declarou em 2016), outros que o apoiaram quatro anos atr�s ficaram desanimados com o comportamento agressivo do republicano.

Isso foi especialmente verdade nos sub�rbios. Biden teve desempenho superior ao de Hillary Clinton em 373 condados suburbanos, ajudando-o a recuperar os Estados do "Cintur�o de Ferrugem" da Pensilv�nia, Michigan e Wisconsin, e permitindo-lhe ganhar a Ge�rgia e o Arizona. Trump tem um problema particular com mulheres suburbanas.

Testemunhamos novamente na elei��o presidencial de 2020 o que vimos na elei��o de meio de mandato de 2018 — republicanos com maior n�vel de escolaridade, alguns dos quais votaram em Trump quatro anos atr�s, achando que sua presid�ncia era muito n�o presidencial.

Embora eles entendessem que Trump nunca seria um presidente convencional, muitos acharam a maneira como ele desafiou tantos costumes e normas de comportamento desanimadora e frequentemente ofensiva.

Eles ficaram desconcertados com sua agressividade. Com seu acirramento das tens�es raciais. Com seu uso de linguagem racista em tu�tes que difamam pessoas de cor.

Sua falha, em algumas ocasi�es, em condenar adequadamente a supremacia branca. Sua agress�o a aliados tradicionais da Am�rica e sua admira��o por homens fortes autorit�rios, como Vladimir Putin.

Seu estranho orgulho de ser "um g�nio muito est�vel" e coisas do g�nero. Sua defesa de teorias da conspira��o. O uso de linguagem franca que �s vezes o fazia soar mais como um chef�o do crime, como quando descreveu seu ex-advogado Michael Cohen, que chegou a um acordo judicial com promotores federais, como "um rato".

Depois, houve o que os cr�ticos ridicularizaram como seu autoritarismo rastejante, algo exemplificado depois da elei��o em sua recusa em aceitar o resultado.

'As pessoas est�o cansadas'

Um momento marcante para mim durante esta campanha veio em Pittsburgh, quando conversei com Chuck Howenstein na varanda de sua casa. Apoiador de Trump em 2016, ele votou em Joe Biden agora.

"As pessoas est�o cansadas", ele me disse. "Eles querem ver a normalidade de volta neste pa�s. Eles querem ver a dec�ncia. Eles querem ver esse �dio parar. Eles querem ver este pa�s unido. E isso trar� Joe Biden � Presid�ncia."

Um problema pol�tico para Trump foi que ele falhou em expandir seu apoio al�m de sua base principal. Ele sequer se esfor�ou para fazer isso.

Em 2016, ele ganhou 30 Estados e muitas vezes governou como se fosse o presidente apenas da Am�rica conservadora e vermelha (a cor dos republicanos).

O presidente mais deliberadamente pol�mico dos �ltimos 100 anos, ele fez poucas tentativas para convencer a Am�rica azul, os 20 Estados que votaram em Hillary Clinton.

Depois de quatro anos exaustivos, muitos eleitores simplesmente queriam uma Presid�ncia que estivesse em segundo plano nas suas vidas — um ocupante da Casa Branca que se comportasse de maneira mais convencional.

Eles estavam cansados dos xingamentos infantis, da linguagem feia e do confronto incessante. Eles queriam um retorno a algum tipo de normalidade.

Mas a elei��o de 2020 n�o foi uma repeti��o da elei��o de 2016. Desta vez, ele era o titular, n�o o desafiante. Ele tinha um hist�rico a defender, incluindo o tratamento incorreto de um surto de coronav�rus que, at� o dia da elei��o, j� havia matado mais de 230 mil americanos.

Nesta �poca de partidarismo negativo, em que a pol�tica costuma ser motivada pelo �dio � oposi��o, ele n�o foi desafiado com uma figura que atrai �dio, como Hillary.

Biden era dif�cil de demonizar, o que � em parte o motivo pelo qual o establishment democrata estava t�o ansioso para t�-lo como candidato presidencial. Este centrista de 77 anos tamb�m fez o trabalho para o qual foi chamado, que era recuperar os eleitores brancos da classe trabalhadora no "Cintur�o de Ferrugem".

A quest�o de por que Trump perdeu a presid�ncia tamb�m suscita uma quest�o mais interessante e discut�vel — quando ele perdeu a Presid�ncia?

Foi logo ap�s sua vit�ria em 2016, quando as pessoas que votaram em Trump em parte como um voto de protesto contra o establishment pol�tico de Washington imediatamente tiveram receios? Afinal, muitos desses eleitores n�o esperavam que ele vencesse.

Foi nas primeiras 24 horas de sua Presid�ncia, quando fez seu discurso inaugural sobre "carnificina americana" — que retratou o pa�s como uma quase distopia de f�bricas fechadas, trabalhadores deixados para tr�s e riqueza "arrancada" das casas da classe m�dia?

Ao final de seu primeiro dia no cargo, j� estava claro que Donald Trump tentaria mudar a Presid�ncia mais do que a Presid�ncia o mudaria.

Foi algo mais cumulativo, ao longo do tempo, o efeito bola de neve de tantos esc�ndalos, tantas cal�nias, tanta rotatividade de pessoal e tanto caos?

Ou foi por causa do coronav�rus, a maior crise de sua Presid�ncia? Antes de o v�rus chegar a essas praias, os sinais vitais pol�ticos de Trump eram fortes. Ele havia sobrevivido ao julgamento de impeachment.

Seus �ndices de aprova��o correspondiam ao n�vel mais alto — 49%. Ele poderia se orgulhar de uma economia forte e da vantagem do cargo: os dois fatores que geralmente garantem um segundo mandato a um presidente em exerc�cio.

Muitas vezes as elei��es presidenciais giram em torno de uma quest�o simples: o pa�s est� melhor agora do que h� quatro anos? Depois da covid e da crise econ�mica que se seguiu, tornou-se quase imposs�vel defender esse argumento.

Mas � errado dizer que a Presid�ncia de Trump foi inevitavelmente minada pelo coronav�rus. Os presidentes frequentemente emergem de convuls�es nacionais mais fortes. As crises muitas vezes podem trazer grandeza.

Isso foi verdade para Franklin Delano Roosevelt, cujo resgate dos EUA da Grande Depress�o o tornou politicamente inatac�vel.

A resposta inicial de George W. Bush aos ataques de 11 de setembro tamb�m aumentou sua popularidade e o ajudou a conquistar um segundo mandato.

Portanto, n�o estava de forma alguma estabelecido que a covid-19 acabaria com Donald Trump. Foi a maneira desastrada de lidar com a crise que contribuiu para sua queda.

Figura dominante

Ainda assim, novamente vale lembrar que Trump permaneceu politicamente vi�vel at� o fim, apesar de o pa�s ter vivido sua pior crise de sa�de p�blica em mais de 100 anos, sua maior crise econ�mica desde os anos 1930 e tamb�m sua turbul�ncia racial mais generalizada desde o final dos anos 1960.

Grande parte da Am�rica vermelha, e grande parte de um movimento conservador que ele passou a dominar, ansiar�o por seu retorno. Ele continuar� a ser a figura dominante no movimento conservador nos pr�ximos anos. O trumpismo pode acabar tendo o mesmo efeito transformador sobre o conservadorismo americano que o reaganismo.

O presidente que est� deixando o cargo continuar� sendo uma figura profundamente polarizadora e poder� concorrer novamente em 2024.

Esses Estados desunidos n�o se uniram novamente de repente, at� porque muitos americanos nutrem emo��es t�o diferentes em rela��o a Trump, que v�o desde a devo��o ao �dio abjeto.

O pa�s certamente n�o deu adeus ao um dos presidentes mais heterodoxos de sua hist�ria.

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