
Na �poca, ele mal conseguia imaginar que um dia poderia viver com um parceiro sendo assumidamente gay — que dir� com dois.
Mas hoje ele divide a casa em San Diego com seus dois companheiros, Alan, de 43 anos, e Jeremy, de 37 (que preferem usar apenas seus primeiros nomes por quest�o de privacidade) e seus dois filhos, que est�o com 3 e 1 ano.
Todos os tr�s s�o legalmente pais das crian�as, seus nomes constam nas duas certid�es de nascimento.
Jenkins e seu primeiro parceiro, Alan, ambos m�dicos, haviam discutido a possibilidade de um relacionamento mais aberto durante anos, antes de conhecer Jeremy em 2012.
Embora Jeremy, um tratador de zool�gico que trabalha para salvar esp�cies amea�adas de extin��o, n�o se interessasse inicialmente por poliamor, ele conheceu o casal como amigo e "todos ficaram � vontade com a ideia — simplesmente rolou uma qu�mica boa", diz Jenkins.
Eles formaram uma fam�lia, mas quando tomaram a decis�o de ter filhos, apareceram os obst�culos.
Al�m do fato de que cada um tinha que ter seu pr�prio advogado envolvido nos contratos de barriga de aluguel e de doa��o de �vulos para gerar o primeiro filho (uma mulher serviu de barriga de aluguel, e outra doou os �vulos), eles ainda tinham que convencer o juiz de que todos os tr�s deveriam ser legalmente reconhecidos como pais da crian�a.
Jenkins conta que a ju�za que recebeu o caso "entendeu a situa��o e queria nos ajudar", mas como era de primeira inst�ncia " n�o tinha permiss�o para abrir precedentes".
At� ent�o, homens em relacionamentos a tr�s jamais haviam obtido direitos conjuntos de paternidade de uma crian�a na Calif�rnia, ou possivelmente em qualquer lugar dos Estados Unidos.
Mas os tr�s defenderam sua posi��o, cada um explicando "por que era t�o importante e necess�rio que tiv�ssemos [nossos nomes] na certid�o de nascimento", relembra Jenkins.
A justi�a acabou concedendo aos tr�s os direitos parentais em rela��o ao primeiro filho, nascido em 2017, e Jenkins acabou escrevendo um livro sobre a jornada deles chamado Three Dads and a Baby: Adventures in Modern Parenting, publicado em 9 de mar�o nos Estados Unidos.
Embora ainda seja raro para pessoas em relacionamentos poliamorosos compartilharem legalmente a paternidade dos filhos, v�rias formas de 'rela��es �ticas n�o-monog�micas' — que envolvem mais de dois adultos de forma consensual — t�m se tornado cada vez mais comuns na �ltima d�cada.
Diversos fatores contribuem para isso, desde o surgimento de aplicativos de relacionamento para m�ltiplos parceiros at� a maior representatividade na m�dia e nas redes sociais, al�m do acesso mais f�cil para os interessados %u200B%u200Bnesse estilo de vida.
"Acho que um fator importante � a vontade das pessoas de serem abertas (a essa possibilidade)", diz Jenkins. "Precisa haver visibilidade."
Essas mudan�as culturais, no entanto, remetem aos defensores do amor livre na d�cada de 1960, que trabalharam duro para ampliar nossas fronteiras sexuais ao redor do mundo.
E as mudan�as continuam a acontecer por causa de pessoas como Jenkins e seus companheiros, cujas hist�rias ajudam a quebrar tabus de longa data sobre ter m�ltiplos parceiros.
'N�o � algo novo': a hist�ria da n�o-monogamia
Em 2016, uma pesquisa feita com quase 9 mil adultos solteiros nos Estados Unidos mostrou que um em cada cinco j� havia tido um relacionamento consensualmente n�o-monog�mico.
Um estudo canadense apresentou basicamente os mesmos n�meros um ano depois.
"Outra coisa que vimos na �ltima d�cada � que as buscas no Google pelos termos 'poliamor' e 'rela��es abertas' aumentaram, o que demonstra que h� mais interesse neste t�pico", diz Justin Lehmiller, psic�logo social e pesquisador do Instituto Kinsey para Pesquisa em Sexo, G�nero e Reprodu��o da Universidade de Indiana, nos Estados Unidos.
Mas as pessoas t�m se envolvido nesse tipo de relacionamento "h� muito tempo", ele acrescenta. "N�o � algo novo."
Era uma novidade em 1969, no entanto, quando Dossie Easton, coautora do livro The Ethical Slut (1977) em parceria com Janet Hardy, tomou a decis�o ent�o "bastante incomum" de que "nunca seria monog�mica novamente" depois de ter sa�do de um relacionamento ruim.
Em 1973, ela se juntou a um grupo chamado San Francisco Sex Information (que ainda existe) e se viu em meio a uma comunidade de pessoas que exploravam estilos de vida sexuais abertos. "Eu precisava fazer parte do avan�o desse mundo", diz ela.
Easton, agora com 77 anos, vinha falando sobre a n�o-monogamia �tica h� anos, at� que ela e Hardy ministraram uma oficina de BDSM (sigla em ingl�s para submiss�o, domina��o, sadismo e masoquismo) durante uma confer�ncia em 1994 nos arredores de San Francisco.
Embora o p�blico n�o tenha ficado escandalizado com o BDSM, ficou chocado que Easton e Hardy, que namoravam na �poca, tivessem apresentado a oficina bem na frente do parceiro masculino de Easton.
Isso levou a dupla a escrever o livro, que aborda como manter relacionamentos saud�veis %u200B%u200Bn�o-monog�micos. Ainda � uma leitura um tanto obrigat�ria para pessoas interessadas nesse estilo de vida. "A cada ano, vende mais", diz Easton.
Nas �ltimas d�cadas, ela viajou para "encontros de poliamor" no Reino Unido, Alemanha, Holanda e Austr�lia. Em Berlim, conheceu Claudia Zinser, de 57 anos, que come�ou a "viver o poliamor abertamente h� cerca de 25 anos", revela a pr�pria.
Zinser aconselha pessoas em relacionamentos poliamorosos h� uma d�cada — e testemunhou a abertura em rela��o a esse estilo de vida crescer, sobretudo entre jovens urbanos.

"A m�dia, incluindo as redes sociais, promoveu o assunto... ent�o n�o � mais algo desconhecido ou tabu", diz ela. "Talvez at� esteja na moda."
O 'empurr�o' dos aplicativos
Os relacionamentos �ticos n�o-monog�micos n�o tiveram uma trajet�ria puramente ascendente.
Lehmiller lembra que a epidemia de HIV, v�rus causador da Aids, das d�cadas de 1980 e 1990 fez com que as pesquisas sobre n�o-monogamia consensual diminu�ssem, uma vez que fazer sexo com v�rios parceiros passou a ser visto como menos seguro.
"O renascimento da pesquisa nessa �rea come�ou por volta de 2010", explica Lehmiller. "Na �ltima d�cada, realmente vimos uma explos�o."
A atual quase inclus�o da n�o-monogamia �tica, diz ele, aconteceu tanto por causa da pesquisa acad�mica que chegou at� o p�blico, por meio de centros de educa��o e m�dia, quanto pela representa��o dessas rela��es na TV.
As representa��es mais recentes v�o al�m da s�rie Amor Imenso, da HBO, ou Sister Wives, do TLC, que mostram fam�lias m�rmons com um marido e v�rias esposas, para retratar a diversidade de rela��es m�ltiplas existentes.
Unicornland, de Lucy Gillespie, em que uma mulher que acaba de ficar solteira sai com v�rios casais diferentes; e You Me Her, em que um casal se apaixona junto por outra mulher, s�o exemplos fortes.
"A internet e os aplicativos de relacionamento mais inclusivos tamb�m desempenharam um papel nessa mudan�a de atitude", afirma Lehmiller.
V�rios aplicativos voltados para a n�o-monogamia tornam mais f�cil encontrar outras pessoas que buscam relacionamentos com v�rios parceiros ou experi�ncias sexuais.
No Feeld, um aplicativo voltado para relacionamentos m�ltiplos, 60% dos casais est�o � procura de uma terceira pessoa, diz um porta-voz da empresa.
E n�o � apenas sexo que eles buscam. Uma pesquisa que ouviu 640 usu�rios dos EUA e do Reino Unido do aplicativo 3Fun, voltado para aventuras a tr�s, mostrou que cerca de 43% das pessoas que procuram sexo a tr�s tamb�m buscam relacionamentos a tr�s.
Com esses aplicativos, "h� mais op��es para se conhecer e se conectar", afirma Lehmiller, "n�o � mais tanto uma cena underground como era no passado".
Foi por meio do Feeld que Janie Frank, de 25 anos, conheceu seus dois parceiros, Maggie Odell, de 27, e Cody Coppola, de 31, em 2016.
Ela come�ou a usar o aplicativo no in�cio daquele ano porque, embora s� tivesse sa�do com homens anteriormente, tinha percebido que tamb�m gostava de mulheres.
"Eu estava muito nervosa em rela��o a namorar uma mulher pela primeira vez", conta Frank.
"Decidi que a maneira que eu iria contornar isso seria namorando casais, para ir me acostumando, ent�o eu sairia com um homem e uma mulher ao mesmo tempo."
Olhando para tr�s, Frank acha essa l�gica "estranha e engra�ada", mas fez com que ela sa�sse com v�rios casais antes de conhecer Odell e Coppola. "E (me apresentou a) todo esse estilo de vida que eu n�o sabia que existia", diz ela
"Conversando com as pessoas no aplicativo... comecei a perceber que existe toda uma comunidade de pessoas que s�o eticamente n�o-monog�micas."
Hoje, Frank e Odell t�m perfis no TikTok com algumas centenas de milhares de seguidores. "N�s usamos para tentar falar sobre poliamor, conscientizar as pessoas sobre isso, para normalizar e educar as pessoas sobre... como pode ser", explica Frank.

Algumas pessoas eticamente n�o-monog�micas entram em contato com elas para agradecer pela representatividade.
Outras, menos familiarizadas com o estilo de vida, comentam que est�o contentes por aprender sobre poliamor com os v�deos que elas postam.
"Nunca tinha ouvido falar disso antes", escrevem algumas.
A lei est� sendo atualizada?
O aumento de relacionamentos �ticos n�o-monog�micos est� levando ao reconhecimento jur�dico — al�m do reconhecimento � paternidade obtido por Jenkins e seus companheiros.
Em julho de 2020, o conselho municipal de Somerville, no Estado americano de Massachusetts, votou unanimemente pelo reconhecimento de parcerias dom�sticas poliamorosas. A cidade de Cambridge, que faz fronteira com Somerville, fez o mesmo recentemente.
E isso n�o est� acontecendo apenas nos Estados Unidos. Em 2018, dois homens e uma mulher em um relacionamento poliamoroso foram reconhecidos legalmente como pais do filho em Newfoundland, no Canad�.
No ano anterior, tr�s homens em um relacionamento em Medell�n, na Col�mbia, se casaram legalmente.
Esses movimentos geograficamente dispersos em dire��o � normaliza��o da n�o-monogamia �tica podem ajudar a desencadear um movimento mais global.
Zinser, em Berlim, acredita que o est�mulo a encontros e comunidades online, provocado pela pandemia de covid-19, vai refor�ar as "redes globais" para aqueles que praticam a n�o-monogamia �tica.
A dissemina��o de informa��es sobre a n�o-monogamia, por sua vez, "dar� �s pessoas mais op��es para criar o tipo de relacionamento certo para elas", avalia Lehmiller.
Mas, apesar dessas mudan�as, as pessoas em relacionamentos n�o-monog�micos e queer ainda lutam contra o estigma.
Frank diz que ela e seus parceiros j� receberam uma correspond�ncia an�nima de �dio. E, h� um ano, Jenkins conta que os alunos da faculdade que frequentou ainda entoavam um canto homof�bico em partidas de futebol.
Em San Diego, no entanto, Jenkins afirma que ele e seus companheiros n�o enfrentam discrimina��o — foi principalmente por isso que ele e Alan decidiram se mudar para l�.
Depois que o livro de Jenkins foi lan�ado, os colegas do hospital em que ele trabalha, incluindo todos os administradores mais velhos, escreveram para parabeniza-lo.
"Eles at� sugeriram que poder�amos fazer uma sess�o de aut�grafos no futuro", diz Jenkins. "Temos muita sorte de estar nesse ambiente."
Leia a vers�o original desta reportagem (em ingl�s) no site BBC Work Life.
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