(none) || (none)
UAI
Publicidade

Estado de Minas INTERNACIONAL

Tratamento contra Alzheimer: ag�ncia altera indica��o; entenda o que muda

A aprova��o de um novo rem�dio contra esse tipo de dem�ncia foi cercada de pol�micas e cr�ticas. �rg�o regulador dos Estados Unidos diminuiu um pouco mais o p�blico que poder� se beneficiar de seu uso.


08/07/2021 22:52 - atualizado 08/07/2021 22:52

Demências como o Alzheimer já atingem 45 milhões de pessoas no mundo e não há tratamentos que atuem diretamente na doença(foto: Getty Images)
Dem�ncias como o Alzheimer j� atingem 45 milh�es de pessoas no mundo e n�o h� tratamentos que atuem diretamente na doen�a (foto: Getty Images)
Ap�s 18 anos sem avan�os na �rea de tratamentos, a doen�a de Alzheimer finalmente teve um novo rem�dio aprovado pelo Food and Drug Administration (FDA), a ag�ncia regulat�ria dos Estados Unidos.

 

O aducanumabe, desenvolvido pelas farmac�uticas Biogen e Eisai, foi liberado em terras americanas no in�cio de junho de 2021, mas uma nova decis�o divulgada na quinta-feira (08/07) indica que o n�mero de pessoas que poder� se beneficiar dessa terapia ser� bastante reduzido.

Inicialmente, o FDA havia sinalizado que o medicamento poderia ser usado para qualquer pessoa que tivesse o diagn�stico desse tipo de dem�ncia.

 

Mas uma mudan�a na bula feita em julho reduz significativamente o p�blico-alvo dessa nova op��o terap�utica: a ag�ncia americana agora determina que o aducanumabe est� indicado apenas para os pacientes com os sintomas mais leves, que afetam a mem�ria e a capacidade de racioc�nio.

 

Segundo um levantamento feito pelo The New York Times, em termos num�ricos, o p�blico-alvo em potencial anteriormente era de 6 milh�es de americanos. Agora, fica em cerca de 2 milh�es.

 

O FDA alega que, desde a aprova��o em junho, seguradoras de sa�de e os pr�prios cidad�os tinham muitas d�vidas sobre quem deveria pagar pelo tratamento e quando ele seria realmente v�lido. A altera��o serviu justamente para esclarecer essas quest�es, apontam os representantes.

 

O aducanumabe tem como alvo a beta-amiloide, uma prote�na que forma aglomerados anormais no c�rebro de pessoas com Alzheimer. Essas forma��es podem danificar as c�lulas e desencadear dem�ncia, incluindo problemas de mem�ria e comunica��o, al�m de confus�o mental.

Marasmo total

O aducanumabe estava cercado de grande expectativa — afinal, a �ltima aprova��o de um tratamento contra o Alzheimer aconteceu em 2003, h� 17 anos, quando um f�rmaco chamado memantina chegou ao mercado.

 

De l� para c�, mais de 240 mol�culas diferentes foram testadas, mas nenhuma se mostrou segura e eficaz. A taxa de fracasso supera os 99% e � a maior de todas as especialidades m�dicas — a t�tulo de compara��o, na �rea da oncologia, cerca de 80% das terapias falham durante os testes cl�nicos.

 

Para completar o cen�rio, estima-se que 45 milh�es de pessoas tenham algum tipo de dem�ncia no mundo (2 milh�es delas no Brasil). Com o envelhecimento da popula��o em v�rios pa�ses, esse n�mero deve duplicar a cada 20 anos.

 

Os tratamentos atuais ajudam a controlar alguns sintomas e at� atrasam um pouco a progress�o da doen�a, mas eles se tornam ineficazes nos casos mais graves e avan�ados.

 

Mas, afinal, por que � t�o dif�cil criar novos tratamentos contra o Alzheimer?

H� uma s�rie de obst�culos e entraves nessa hist�ria. E o pr�prio aducanumabe � um exemplo para ilustrar essa busca infrut�fera dos �ltimos anos.

Esperan�as e frustra��es

Em meados de 2015, o aducanumabe apareceu como uma das grandes promessas contra o Alzheimer. Os estudos de fase 1 chamaram tanta aten��o que foram destaque de capa da revista Nature em 2016.

 

A droga, desenvolvida a partir de c�lulas de defesa de idosos que n�o tinham dem�ncia, se mostrou capaz de eliminar uma prote�na chamada beta-amiloide no c�rebro.

 

Pelo que se sabe at� o momento, essa subst�ncia est� relacionada de alguma maneira ao in�cio da doen�a. Com o tempo, ela se acumula do lado de fora dos neur�nios e d� in�cio ao processo de perda das mem�rias e da cogni��o.

 

O aducanumabe foi apenas um entre mais de uma dezena de anticorpos monoclonais feitos para frear esse tipo de dem�ncia. Nos testes iniciais, v�rios deles se mostravam capazes de retirar o excesso dessa tal de beta-amiloide da massa cinzenta.

 

Por�m, quando os estudos progrediam para as fases finais, essa "faxina" cerebral n�o repercutia nos sintomas da doen�a: os pacientes continuavam a ter preju�zos nas recorda��es e na capacidade de raciocinar.

 

Os cientistas suspeitaram, ent�o, que o problema n�o estava no mecanismo das drogas em si, mas no momento em que elas eram aplicadas.

 

Talvez os volunt�rios recrutados para os estudos estivessem numa fase muito adiantada da doen�a, em que os danos aos neur�nios j� eram irrevers�veis.

 

Hoje em dia, se sabe que o Alzheimer come�a a corroer o c�rebro at� duas ou tr�s d�cadas antes de os primeiros sintomas darem as caras. "A beta-amiloide se acumula com grande anteced�ncia aos inc�modos de mem�ria", conta o neurologista F�bio Porto, do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Cl�nicas de S�o Paulo.

 

Portanto, um indiv�duo que come�a a ter falhas nas lembran�as aos 80 anos pode estar num longo processo degenerativo, que come�ou l� quando ele tinha apenas 50 ou 60 anos.

 

Seguindo essa l�gica, ser� que usar os anticorpos monoclonais antecipadamente, nessa fase assintom�tica, ou quando os primeir�ssimos sintomas aparecerem, poderia fazer alguma diferen�a?


Pelo que se sabe até o momento, a doença se inicia com a deposição da proteína beta-amiloide (representada na cor laranja na ilustração) do lado de fora dos neurônios(foto: Getty Images)
Pelo que se sabe at� o momento, a doen�a se inicia com a deposi��o da prote�na beta-amiloide (representada na cor laranja na ilustra��o) do lado de fora dos neur�nios (foto: Getty Images)

Reviravolta surpreendente

Foi justamente para responder a essa pergunta que o aducanumabe foi testado em dois ensaios cl�nicos de fase 3 (os �ltimos antes da aprova��o) a partir de 2016.

 

Esses estudos ganharam nomes em ingl�s: ENGAGE e EMERGE. O primeiro teve a participa��o de 1.647 volunt�rios, enquanto o segundo recrutou 1.638 pessoas.

 

Em mar�o de 2019, os respons�veis pelos trabalhos resolveram fazer uma an�lise preliminar do progresso at� aquele momento, para ver como as coisas estavam evoluindo.

 

Foi um verdadeiro banho de �gua fria: os resultados n�o estavam dentro das expectativas e os estudos foram encerrados antes do prazo.

 

Sete meses depois, veio a not�cia que ningu�m esperava: Biogen e Eisai anunciaram que haviam reavaliado as duas pesquisas e encontrado em uma delas evid�ncias de que o aducanumabe poderia, sim, funcionar num determinado grupo de pacientes.

 

As empresas foram al�m e disseram que, a partir dos dados, pediriam a libera��o do medicamento para uso cl�nico nos EUA.

E essa trajet�ria foi conclu�da em junho de 2021, quando o FDA deu a aprova��o, apesar de todas as pol�micas envolvidas nessa hist�ria.

As controv�rsias

A mudan�a de rumos, o pedido e a aprova��o pegaram a comunidade cient�fica de surpresa. Afinal, n�o � comum que pesquisas como as que estavam em andamento sejam paralisadas ou reanalisadas no meio do caminho.

 

A surpresa ficou ainda maior agora, com essa mudan�a incomum na bula logo em menos de um m�s ap�s o ok regulat�rio.

 

"Geralmente, todo o desenho do estudo cl�nico � definido antes do in�cio. Fazer modifica��es assim � uma coisa muito complexa, que leva a problemas estat�sticos", diz o neurocientista Eduardo Zimmer, professor do Departamento de Farmacologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.

 

O qu�mico americano Derek Lowe n�o poupou cr�ticas aos movimentos feitos por Biogen e Eisai. Numa s�rie de textos publicados em seu blog In The Pipeline, no site da revista Science, no final de 2020 ele demonstrou desconfian�a com os resultados do aducanumabe:

 

"Eu n�o acredito que as empresas demonstraram a efic�cia [do medicamento]. Eu acho que eles t�m capacidade suficiente para fazer um estudo melhor se assim quisessem. Mas eles n�o querem. Eles desejam ir logo at� o FDA para ter a droga aprovada e come�arem a imprimir dinheiro".

 

Os especialistas dizem que, antes de buscar a aprova��o nas ag�ncias regulat�rias, os respons�veis pelo f�rmaco deveriam fazer um novo estudo de fase 3, que focasse justamente nessas doses mais altas e nesse perfil de pacientes que parece se beneficiar mais do rem�dio.

 

O problema � o tempo. "Esses novos testes exigiriam um investimento econ�mico gigantesco e demorariam mais quatro ou cinco anos para darem os resultados", estima Zimmer, que tamb�m � membro da Academia Brasileira de Ci�ncias.

E no Brasil?

Em mar�o, a Biogen anunciou que tamb�m pediu a aprova��o do aducanumabe para a Ag�ncia Nacional de Vigil�ncia Sanit�ria (Anvisa).

 

Em uma nota, a empresa disse que "o medicamento teria o potencial de alterar a fisiopatologia da doen�a, desacelerar o decl�nio cognitivo e manter a capacidade dos pacientes em realizar certas atividades di�rias por um per�odo, incluindo a gest�o de finan�as pessoais, a realiza��o de tarefas dom�sticas, como limpeza e atividades relacionadas � lavanderia, compras e viajar independentemente".

 

Num comunicado para a imprensa, Tatiane Rivas Marante, gerente geral da farmac�utica no Brasil, afirmou que, se aprovado, o aducanumabe poderia "se tornar um vetor de esperan�a para aqueles impactados por essa doen�a devastadora".

 

At� o momento, ainda n�o houve nenhuma resposta oficial da Anvisa sobre o caso e se a medica��o tamb�m ser� liberada em nosso pa�s.


O tratamento atual do Alzheimer envolve a prescrição de medicamentos que aliviam os sintomas nas fases iniciais, mas se tornam inefetivos com a progressão da doença(foto: Getty Images)
O tratamento atual do Alzheimer envolve a prescri��o de medicamentos que aliviam os sintomas nas fases iniciais, mas se tornam inefetivos com a progress�o da doen�a (foto: Getty Images)

Mais pedras no caminho

A dificuldade em demonstrar o benef�cio pr�tico de uma nova mol�cula � apenas a ponta do iceberg desse drama que aflige milh�es de pacientes e seus familiares.

 

Pesquisadores da �rea enfrentam uma s�rie de outras barreiras para entender o Alzheimer e seus desdobramentos.

 

Para come�o de conversa, n�o existe um modelo animal que permita replicar as caracter�sticas do c�rebro humano e da doen�a de Alzheimer com fidelidade.

 

Isso dificulta bastante na hora de fazer trabalhos experimentais, ou mesmo entender a a��o de novas drogas em cobaias. Esse est�gio de pesquisa � essencial antes de que as formula��es sejam encaminhadas para testes com seres humanos.

 

Outra barreira importante est� no diagn�stico: atualmente, a detec��o do Alzheimer depende de testes muito invasivos ou muito caros.

 

� o caso, por exemplo, da an�lise do l�quor, uma subst�ncia encontrada na medula �ssea, ou do PET-CT, um exame de imagem bastante espec�fico. "Esses s�o m�todos ainda pouco acess�veis, por raz�es t�cnicas e financeiras", pontua Porto.

 

Na hora de realizar estudos cl�nicos, por exemplo, os laborat�rios gastam milh�es de d�lares para garantir que os volunt�rios fa�am exames do tipo e conferir se eles realmente t�m Alzheimer. Esse investimento maci�o � algo que poucos laborat�rios conseguem fazer.

 

Por fim, h� muitas d�vidas sobre o mecanismo que est� envolvido neste tipo de dem�ncia. Ainda existe controv�rsia sobre o papel da prote�na beta-amiloide na doen�a e como ela interage com v�rias subst�ncias que se alteram no c�rebro durante o processo de degenera��o, como uma outra prote�na conhecida como TAU.

 

Enquanto esses mist�rios permanecerem, � dif�cil desenvolver tratamentos espec�ficos capazes de atuar em alguma etapa da enfermidade.

Promessas futuras

Vale destacar, por fim, que o aducanumabe n�o � a �nica op��o que chama a aten��o de pesquisadores e da comunidade de pacientes e familiares: de acordo com o site ClinicalTrials.Gov, mantido pelo governo americano, outros 2.623 testes cl�nicos com candidatos a rem�dios contra o Alzheimer est�o em andamento neste exato momento.

 

Um que � acompanhado de perto � o solanezumabe, da Eli Lilly. Ele tamb�m atua na prote�na beta-amiloide e est� sendo avaliado em pacientes com sintomas bem iniciais da enfermidade. Se tudo der certo, seus resultados s�o esperados para 2023.

 

Em paralelo, outros grupos de cientistas procuram caminhos criativos para frear a progress�o do Alzheimer. Alguns miram na prote�na TAU, que aparece no c�rebro nas fases mais avan�adas da condi��o.

 

Outros v�o al�m e testam terapias � base de luzes ou maneiras de modificar a microbiota intestinal, um conjunto de bact�rias que vive no nosso sistema digestivo e parece influenciar at� na sa�de do c�rebro.

 

Num cen�rio sem grandes novidades e algumas pol�micas recentes, o alento � que o futuro promete trazer not�cias um pouco mais animadoras.

J� assistiu aos nossos novos v�deos no YouTube? Inscreva-se no nosso canal!


receba nossa newsletter

Comece o dia com as not�cias selecionadas pelo nosso editor

Cadastro realizado com sucesso!

*Para comentar, fa�a seu login ou assine

Publicidade

(none) || (none)