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Estado de Minas ABUSO DE CONFIAN�A

O 'guru financeiro' que usou r�dios crist�s para roubar milh�es de d�lares de fi�is

William Neil Gallagher, que escreveu um livro unindo Jesus Cristo e dicas sobre economia pessoal, explorou a confian�a de idosos em fraude financeira.


14/12/2021 06:16 - atualizado 12/01/2022 15:30

William Gallagher
William Gallagher acumulou US$ 32 milh�es em um esquema que tirou dinheiro de idosos (foto: Ilustra��o de Angelica Casas)

Para seus ouvintes, William Neil "Doc" Gallagher era conhecido como o "Doutor Dinheiro" — um guru financeiro que promovia seus servi�os numa r�dio crist�, transmitida por todo o conservador "Cintur�o da B�blia", nos Estados Unidos, que se espalha pelo norte do Estado do Texas.

Seus an�ncios frequentemente terminavam com um slogan familiar: "Vejo voc�s domingo na igreja". "O Doutor Neil Gallagher � um verdadeiro americano, com integridade em tudo o que faz", diz um narrador num v�deo corporativo postado no YouTube. "Sua paix�o na vida � ajudar as pessoas a se aposentarem de forma segura, cedo e felizes."

O v�deo de tr�s minutos elogia de forma entusiasmada os benef�cios do "estilo vision�rio" do octogen�rio, alegando que ele havia conduzido mais de 1 mil pessoas � independ�ncia financeira por meio de sua empresa, a Gallagher Financial Group, enquanto tamb�m publicava um livro, Jesus Christ, Money Master (Jesus Cristo, Mestre do Dinheiro).

Na realidade, Gallagher, de 80 anos, n�o era nada disso. Pelo contr�rio, ele era um golpista que acumulou US$ 32 milh�es (mais de R$ 150 milh�es) num esquema de pir�mide que visou, em sua maioria, v�timas aposentadas de idades entre 62 e 91 anos.

Nos esquemas Ponzi, investidores que entraram no in�cio obtiveram "lucros" ao retirar dinheiro de investidores que chegaram depois, que geralmente recebem a promessa de lucros consider�veis com risco muito pequeno.

Para que continuem, esses esquemas dependem num fluxo constante de novos integrantes dando dinheiro �queles que j� investiram. Quando isso n�o acontece, o esquema desmorona.

Segundo documentos judiciais, Gallagher vinha enganando pessoas por meio desse esquema Ponzi desde pelo menos 2013.

Suas duas empresas, Gallagher Financial Group, Inc. e a W. Neil Gallagher, Ph.D. Agency, Inc. foram fechadas pela Securities and Exchange Commission (Comiss�o de Valores Mobili�rios) dos Estados Unidos em mar�o de 2019. No m�s passado, ele recebeu tr�s senten�as de pris�o perp�tua de um juiz do condado de Tarrant, no Texas, al�m da senten�a de 25 anos de pris�o que j� recebera em Dallas, em mar�o de 2020.


Igreja
Gallagher usou sua conex�o com comunidades crist�s para expandir seu esquema fraudulento (foto: Ilustra��o de Angelica Casas)

Gallagher prometeu a sua v�timas lucros entre 5% e 8% de seu investimento, anualmente. Em vez disso, eles n�o receberam nada, com Gallagher usando a maioria de seus fundos em gastos pessoas e corporativos e para fazer pagamentos a investidores iniciais.

Para esconder a fraude, ele ainda apresentou extratos banc�rios falsos, mostrando saldos falsificados. A BBC n�o conseguiu contatar o advogado de Gallagher para algum coment�rio.

Apesar de o esquema de Gallagher ter atra�do aten��o da imprensa americana, seus m�todos est�o longe de ser novos. Esquemas Ponzi recebem esse nome devido a um trapaceiro dos anos 1920, mas outras variantes j� ocorriam desde meados do s�culo 19.

O meio que Gallagher usava para atrair suas v�timas - a rede de r�dio "Christian" (crist�) - tamb�m � popular h� d�cadas e continuou sendo mesmo diante da forte concorr�ncia de meios de comunica��o mais novos.

As quase 200 v�timas de Gallagher, no entanto, d�o destaque a uma tend�ncia diferente: fraude contra idosos, um crime que o FBI acredita estar crescendo, causando preju�zos de bilh�es de d�lares a cada ano.

Entre as pessoas que Gallagher explorava estavam uma mulher de mais de 70 anos, sofrendo de linfoma, que investiu mais de meio milh�o de d�lares; um operador comercial de jatos de areia; e policiais, tanto da ativa como aposentados. Muitas v�timas foram levadas a vender suas casas, tomar empr�stimos de seus filhos ou voltar a trabalhar depois de j� terem se aposentado.

'Pior caso'

Lori Varnell, chefe da equipe de Fraude Financeira contra Idosos da promotoria do distrito do condado de Tarrant, disse � BBC que foi o pior caso de fraude contra idosos que ela j� viu em sua carreira.

"Esses s�o indiv�duos que trabalharam suas vidas inteiras para economizar dinheiro. Era algo pessoal", disse Varnell. "Eles est�o arrasados. N�o foi apenas o dinheiro. Foi a trai��o."

Para alcan�ar suas v�timas, Gallagher promoveu os servi�os de sua empresa em igrejas e por meio da rede de r�dio Christian, um termo que engloba milhares de esta��es de r�dio pelos Estados Unidos que transmitem programas de tem�tica crist�, de serm�es a programas de entrevista, m�sica e not�cias.

Nascida em 1920 - ano em que a r�dio comercial foi lan�ada nos Estados Unidos -, a rede Christian continua imensamente popular no pa�s. Mais de 20 milh�es de ouvintes sintonizam toda semana, segundo o grupo Radio Advertising Bureau, representante do setor.

Varnell afirma que ela n�o ficou surpresa com o uso das r�dios Christian pelo Doutor Gallagher para atrair suas v�timas. "Dentro da comunidade crist�, existe um n�vel alto de confian�a. Especialmente aqui, no Cintur�o da B�blia", disse ela. "Assim que voc� come�a a usar a l�ngua crist�, usando suas palavras, sua frases, isso ser� um sinal para outros crist�os de que voc� � um crist�o."

Depois que Gallagher estabeleceu uma rela��o de confian�a com suas v�timas, elas ficaram menos inclinadas a "prestar aten��o aos detalhes" do que estava acontecendo, disse Varnell. A t�tica � um t�pico exemplo de "fraude por afinidade", afirmou David Fleck, um ex-promotor de Los Angeles. Nesses esquemas, os trapaceiros visam membros de um grupo identific�vel, que v�o de comunidades religiosas ou �tnicas a algumas profiss�es.


William Gallagher, o guru
Gallagher promovia seus servi;os financeiros por meio de uma rede de r�dios crist�s (foto: Ilustra��o de Angelica Casas)

Em muitos casos, eles usam integrantes do grupo para, sem perceber, ajudar a promover a trapa�a para outros e ajudar a convenc�-los de sua validade.

Fleck lembra de um incidente em que ele processou um homem que era integrante de seis igrejas diferentes. Depois de obter sua confian�a, o homem roubou as identidades de 25 pessoas diferentes que ele conhecera na igreja, comprou casas em seus nomes e depois recolheu dinheiro de inquilinos.

Em outro exemplo, um homem da Calif�rnia foi preso em 2017 por fraudar mais de 200 imigrantes arm�nios em US$ 19 milh�es, prometendo investir seu dinheiro em a��es de tecnologia lucrativas.

"Voc� v� entre todos os grupos culturais e estrangeiros de todo o tipo de pa�s", disse Flack. "Fraude por afinidade permeia todas as trapa�as. Facilita muito as coisas para o trapaceiro."

Idosos s�o vulner�veis

Oficiais afirmam que os idosos s�o um grupo de afinidade particularmente vulner�vel. Segundo o FBI, milh�es de americanos de idade avan�ada tornam-se v�timas de fraude todo ano, acumulando perdas de mais de US$ 3 bilh�es anualmente.

Jeffrey Cramer, ex-promotor federal, disse que os idosos s�o frequentemente alvos lucrativos para trapaceiros que acreditam que eles possuem economias substanciais.

"Em geral, eles t�m mais dinheiro, porque trabalharam por mais tempo. Sua casa provavelmente tem valor, e eles t�m um 401k [economias de aposentadoria]", Cramer explicou. "N�o faz sentido tentar enganar algu�m de 20 anos de idade. Algu�m acima de 60 ou 70 anos pode ter m�ltiplos investimentos e uma casa que vale cinco vezes o que eles pagaram por ela."

Varnell concorda com a avalia��o de Cramer. No caso de Gallagher, eles tamb�m se aproveitou das "diferen�as geracionais" entre suas v�timas, al�m de sua f� disse ela.

"Essas s�o pessoas que acreditam que, quando um homem apertou sua m�o e olhou em seus olhos, isso j� est� bom", afirmou. "Sua natureza � de acreditar nas pessoas, porque voc� n�o mente. Isso � contra os Dez Mandamentos."

Especialistas em fraude acreditam que apenas uma parcela de todos os casos sejam denunciadas. Quando eles acabam sendo julgados num tribunal, � pouco prov�vel que as v�timas recebam muito - ou mesmo uma parte - de seu dinheiro de volta. O criminoso geralmente gasta o dinheiro logo, usando os recursos para continuar a fazer pagamentos fraudulentos ou tentando escond�-los em contas localizadas em para�sos fiscais.

No caso de Gallagher, um receptor apontado pelo tribunal s� p�de receber aproximadamente 14 centavos para cada d�lar. Gallagher havia gastado boa parte do restante, enquanto o resto foi lavado e seu paradeiro continua desconhecido.


Livro de Gallagher
Gallagher publicou um livro, em que une a figura de Jesus Cristo a temas financeiros (foto: Ilustra��o de Angelica Casas)

Impacto emocional

Enquanto os custos financeiros podem ser devastadores para as v�timas e suas fam�lias, o verdadeiro impacto � mais profundo.

"H� um dano emocional e psicol�gico", disse Cramer. "H� um aspecto de constrangimento quando voc� trabalhou 20, 30, 40 anos e agora voc� n�o tem literalmente nada para mostrar como resultado disso."

No tribunal, muitas das v�timas de Gallagher falaram sobre o impacto psicol�gico. Entre elas, estava Susan Pippi, uma mulher de 74 anos que, com seu marido, perdeu centenas de milhares de d�lares no esquema.

"Eu n�o confio em ningu�m mais", disse ela em uma declara��o divulgada pelos promotores do condado de Tarrant. "Com exce��o de Deus e da minha fam�lia."

Mas � improv�vel que esse tipo de fraude desapare�a, disse Varnell. Uma "ofensiva organizada" de fraudadores - muitos deles baseados no exterior - est� roubando fundos de aposentadoria de americanos, numa taxa de "milh�es a cada dia", afirmou ela.

Os idosos e suas fam�lias precisam ficar atentos para sinais. "Se voc� se considera um crist�o, e algu�m o aborda no ambiente crist�o, voc� deveria ficar ainda mais desconfiado", afirmou ela. "O mesmo vale para se voc� for judeu, mu�ulmano, o que for. Se algu�m o est� abordando com uma base religiosa, voc� deveria ficar bastante desconfiado."

Cramer disse que fraudes por afinidade provavelmente ficar�o mais comuns, com o amadurecimento de gera��es mais jovens, mais familiarizadas com tecnologia, nas redes sociais. Um fraudador pode alcan�ar um p�blico muito maior - mas se esconder por tr�s de uma conta e desaparecer.

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