
Aviso: esta reportagem cont�m descri��es detalhadas de viol�ncia.
Nos seus momentos de reflex�o, depois das suas aulas di�rias, John Stone tem vis�es do passado.
O que o assusta n�o � o sangue, nem o som das armas. S�o as s�plicas. A forma como as pessoas imploram por miseric�rdia antes de morrer. Imploram para ele. Imploram para Deus.
"� muito doloroso", ele conta, estremecendo a cabe�a. "As fam�lias dos mortos amaldi�oam voc�. Uma maldi��o cai sobre a sua vida."
Stone � professor de ci�ncias pol�ticas da Universidade de Benin, no sul da Nig�ria. Mas, por d�cadas, ele foi um membro importante da Black Axe ("Machado Negro", em tradu��o livre), uma gangue mafiosa nigeriana ligada ao tr�fico de pessoas, fraudes na internet e assassinatos.
Localmente, a Black Axe � conhecida como "seita", em refer�ncia aos seus rituais secretos de inicia��o e � forte lealdade dos seus membros - ou Axemen, como s�o chamados. Eles tamb�m s�o conhecidos por praticarem viol�ncia extrema. Imagens das pessoas que cruzam seus caminhos - cad�veres mutilados ou com sinais de tortura - aparecem regularmente nas redes sociais nigerianas.Stone reconhece sua participa��o em atrocidades durante seus anos como Axeman. Houve um momento durante a entrevista em que ele, relembrando seu modo mais eficiente de matar, inclinou-se para frente, comprimiu seus dedos em forma de arma e "disparou" na testa do nosso produtor. Na cidade de Benin, na Nig�ria, ele era conhecido como "a�ougueiro".
O horror daqueles anos deixou marcas em Stone. Hoje ele se arrepende do seu passado e � um cr�tico feroz da gangue que um dia ele serviu.
Stone � um dentre mais de uma dezena de fontes da Black Axe que decidiram quebrar seus juramentos de sil�ncio e revelar seus segredos � BBC, falando pela primeira vez para a imprensa internacional.
Por dois anos, o programa de TV Africa Eye, da BBC News, investigou a Black Axe, estabelecendo uma rede de denunciantes e revelando milhares de documentos secretos, obtidos atrav�s das comunica��es privadas da gangue. As descobertas sugerem que, ao longo da �ltima d�cada, a Black Axe tornou-se um dos mais perigosos e abrangentes grupos de crime organizado do mundo.
Os Axemen est�o presentes na �frica, Europa, �sia e Am�rica do Norte.
Nossa investiga��o come�ou com uma amea�a de morte - uma carta escrita � m�o com letra tr�mula, entregue para um jornalista da BBC em 2018. Ela foi deixada por um motociclista sobre o para-brisa do carro do rep�rter.
Semanas antes, o mesmo jornalista havia investigado o com�rcio ilegal de opioides na Nig�ria e tinha conhecido pessoalmente diversos Axemen. Mais tarde, uma segunda carta foi entregue para a sua fam�lia. Algu�m o havia rastreado e encontrado sua casa.
A amea�a veio da Black Axe? Qual o poderio dessa rede criminosa e quem est� por tr�s dela?
Nossa busca por respostas nos levou a um homem que afirmou ter obtido dezenas de milhares de documentos secretos da Black Axe - um imenso conjunto de comunica��es privadas de centenas de supostos membros. As mensagens, que cobriam os anos de 2009 a 2019, incluem comunica��es sobre assassinatos e tr�fico de drogas.
E-mails detalham fraudes elaboradas e lucrativas na internet. Outras mensagens cont�m planos de expans�o global. Era um mosaico da atividade criminosa da Black Axe cobrindo quatro continentes.
Amea�as de morte
O homem que intermediou o acesso a esses documentos diz que sua vida corre risco. Ele n�o revelou seu nome verdadeiro, mas sim um pseud�nimo: Uche Tobias.
"Uma ca�ada cair� sobre voc�", diz uma amea�a de morte enviada para Tobias pela internet. "O machado [em refer�ncia ao nome do grupo em ingl�s] vai perfurar seu cr�nio... eu vou lamber seu sangue e mastigar seus olhos."

A BBC passou meses analisando os documentos de Tobias. Conseguimos verificar partes importantes dos dados - confirmando a exist�ncia de indiv�duos mencionados e que diversos crimes inclu�dos nos documentos realmente aconteceram. Muito do material hackeado � assustador demais para ser publicado.
Os Axemen usam f�runs secretos - websites protegidos por senha - para compartilhar fotos de assassinatos recentes em salas de bate-papo internas. Em uma postagem marcada como "Sucesso", um homem aparecia estirado no ch�o de uma pequena sala. Ele tinha quatro cortes na cabe�a. Sua camiseta branca est� rodeada por uma po�a de sangue. A marca de uma bota, manchada de vermelho, aparece nas suas costas.
Na Nig�ria, a Black Axe enfrenta uma luta por supremacia com "seitas" rivais - ou gangues criminosas similares, conhecidas como Eiye, os Bucaneiros (Buccaneers, em ingl�s), os Piratas e os Maphites. Mensagens no idioma pidgin - falado no oeste africano - traduzidas pela BBC mostram os Axemen contando quantos rivais foram assassinados e registrando os n�meros como um placar de futebol em cada regi�o.
"O placar da guerra em Benin agora � de 15x2", diz uma mensagem. "Sucesso no Estado de Anambra. O placar est� Aye [Axemen] 14 x 2 Buccaneers", diz outra.
Mas as fraudes via internet, e n�o os assassinatos, s�o a principal fonte de renda da gangue. Os documentos fornecidos para a BBC incluem recibos, transfer�ncias banc�rias e milhares de e-mails que demonstram que os membros da Black Axe participam de golpes online ("scams") em todo o mundo.
Seus membros compartilham entre si "modelos" de como realizar golpes. As op��es incluem golpes de romance, heran�a, im�veis e e-mails de neg�cios. Neles, os criminosos criam contas de e-mail que parecem ser dos advogados ou contadores das v�timas, para interceptar pagamentos.
Esses golpes n�o s�o conduzidos por um lobo solit�rio em um notebook, em pequena escala. Trata-se de opera��es colaborativas, organizadas e extremamente lucrativas, que �s vezes envolvem dezenas de indiv�duos trabalhando juntos em mais de um continente.
Entre os e-mails vazados, a BBC descobriu o caso de um homem na Calif�rnia, nos Estados Unidos, que foi alvo de um golpe de uma rede de supostos Axemen da Nig�ria e da It�lia, em 2010. A v�tima nos disse que a fraude somou US$ 3 milh�es (R$ 17 milh�es).
"Parece que o banco com quem estava trabalhando n�o existe???", exclamou a v�tima desesperada em um e-mail para um dos golpistas - foi o momento em que ele percebeu que o dinheiro havia desaparecido. "Pode me esclarecer isso??? O banco na Su��a parece ser uma fraude."
Os e-mails mostram supostos membros da Black Axe adotando nomes usados como "isca" - nomes e identidades falsas - para aplicar golpes nas pessoas, utilizando passaportes falsos ou roubados. Eles se referem �s v�timas como "mugu" ou "maye", g�rias regionais para "idiotas".
A rede cibercriminosa internacional da Black Axe provavelmente est� gerando bilh�es de d�lares em receita para seus membros. Em 2017, autoridades canadenses afirmaram ter desbaratado um esquema de lavagem de dinheiro relacionado � gangue, que envolvia valores de mais de US$ 5 bilh�es (R$ 28,4 bilh�es).
Ningu�m sabe quantos esquemas similares � Black Axe existem pelo mundo. Os documentos vazados mostram comunica��es entre membros da Nig�ria, Reino Unido, Mal�sia, pa�ses do Golfo P�rsico e mais de uma dezena de outros pa�ses.
"Eles est�o espalhados por todo o mundo", segundo a fonte do vazamento de dados. Ele afirma ser investigador antifraudes na vida privada e come�ou a perseguir a Black Axe depois de conhecer uma s�rie de v�timas dos seus golpes. "Eu estimaria que s�o mais de 30 mil membros", afirma ele.

A expans�o global da Black Axe foi cuidadosamente constru�da. A correspond�ncia mostra os Axemen dividindo �reas geogr�ficas em "zonas" e nomeando "chefes" locais. Esses chefes locais cobram "taxas" - algo como mensalidades - das pessoas das suas jurisdi��es e depois enviam o dinheiro para os l�deres na sua sede, na cidade de Benin.
"Eles se difundiram por toda a Europa, �sia e Am�rica do Norte e do Sul", afirma Tobias. "N�o � um clube pequeno, mas sim uma organiza��o criminosa incrivelmente grande."
Autoridades policiais internacionais confirmam a avalia��o de Tobias. Segundo o �ndice do Crime Organizado de 2021, baseado em an�lises de 120 especialistas africanos, a Nig�ria det�m os n�veis mais altos de crime organizado do continente - e essas redes est�o se expandindo para outros pa�ses.
Na It�lia, leis de combate � m�fia de d�cadas atr�s est�o sendo reutilizadas para combater a expans�o da Black Axe, que se afirma ser conduzida por poderosas redes criminosas locais. Em abril de 2021, 30 membros suspeitos foram presos naquele pa�s, acusados de tr�fico de pessoas, prostitui��o e fraudes na internet.
Os Estados Unidos adotaram uma abordagem mais agressiva. O FBI lan�ou opera��es contra a Black Axe em novembro de 2019 e setembro de 2021, que chegaram a acusar mais de 35 indiv�duos por fraudes multimilion�rias na internet. Entre setembro e dezembro deste ano, o Servi�o Secreto americano e a Interpol deram in�cio a uma opera��o internacional para prender outros nove supostos membros da Black Axe na �frica do Sul.
"O cibercrime � uma ind�stria multitrilion�ria, fora de controle", afirma Scott Augenbaum, ex-agente especial do FBI e especialista em ciberseguran�a.
Ele conta que atendeu centenas de v�timas da Black Axe ao longo dos seus 30 anos de carreira no departamento de cibercrime do FBI, investigando casos de fraude similares aos encontrados nos documentos vazados.
"Testemunhei vidas serem destru�das, companhias falirem, economias de toda uma vida serem perdidas", ele conta. "Isso prejudica a todos."
Ra�zes na Nig�ria
Por mais global que possa ser o imp�rio criminoso da Black Axe, suas ra�zes permanecem firmes na Nig�ria. O grupo foi fundado 40 anos atr�s na cidade de Benin, no Estado nigeriano de Edo. A maior parte dos Axemen � daquela regi�o e essa rela��o pode ter influenciado a expans�o internacional do grupo.

Segundo o Alto-Comissariado das Na��es Unidas para os Refugiados (ACNUR), 70% dos nigerianos que migram para o exterior s�o do Estado de Edo. A Black Axe � considerada uma das principais respons�veis pelo tr�fico das pessoas que viajam ilegalmente, transportando-os entre suas bases na cidade de Benin, no norte da �frica e no sul da It�lia.
Na Nig�ria, estudantes universit�rios do sexo masculino, com idades entre 16 e 23 anos, s�o os principais recrutas da Black Axe. O processo de inicia��o secreto da gangue, conhecido como "bamming" (que pode ser traduzido do ingl�s como "zombaria"), � incrivelmente violento.
"Eu n�o sabia que iria fazer minha inicia��o naquele dia", escreve um Axeman, detalhando sua experi�ncia em uma postagem em um f�rum secreto em 2016.
Ele conta que foi levado para longe do campus, achando que iria participar de uma festa restrita. Ele descreve como foi levado para uma floresta, onde um grupo de homens estava esperando por ele. Eles o despiram e o for�aram a colocar o rosto na lama. Depois, eles se revezaram para a�oit�-lo com bambus na sua pele nua, at� deix�-lo quase inconsciente. Algu�m gritou que eles iriam estuprar sua namorada e, quando terminassem, iriam estupr�-la de novo.
"Aquele seria o dia da minha morte", escreve ele.
Mas, em um dado momento, a agonia terminou. Seguiram-se diversos rituais, incluindo rastejar pelas pernas dos seus torturadores - uma tradi��o conhecida como "corredor do diabo" - antes de beber sangue de um corte no seu polegar e mastigar uma noz-de-cola - uma noz cafeinada nativa do oeste africano.
Ao som de c�nticos e can��es, ele foi ent�o abra�ado pelos homens que haviam acabado de tortur�-lo. Ele havia renascido como o que eles chamam de "Aye Axeman".
Existem muitas raz�es que levam as pessoas a entrar para a Black Axe. Alguns recrutas s�o for�ados, enquanto outros s�o volunt�rios. Em Makoko (uma enorme favela de palafitas de madeira sobre a Lagoa de Lagos, na Nig�ria), entrevistamos diversos Axemen, alguns dos quais afirmaram que haviam entrado para a Black Axe contra a pr�pria vontade - mas sua lealdade era forte, constru�da sobre a liga��o espiritual do processo de inicia��o.
"N�s adoramos Korofo, o Deus invis�vel que sempre nos guiou", afirma o l�der do grupo, sentado em uma pequena constru��o de madeira e rodeado por um grupo de Axemen. Ele disse estar "orgulhoso" de ser um membro da Black Axe, apesar de ter sido recrutado � for�a por um agente de pol�cia.
Outro membro afirmou que entrou para o grupo depois que seu pai foi morto por uma gangue rival.

Independentemente do motivo ou da forma em que os membros entram no grupo, muitos deles afirmam que existem benef�cios.
"[Existe] confidencialidade, disciplina e irmandade", segundo um membro da seita nos contou com orgulho durante outra entrevista em Lagos, em abril de 2021, quando perguntamos por que ele havia entrado para a Black Axe. Ele contou que ganhou um bom dinheiro com as empreitadas criminosas do grupo - mais do que teria recebido trabalhando em um banco, por exemplo.
"Ningu�m ser� capaz de encostar em voc�. Quando voc� pertence a uma seita, eles o protegem", afirma Curtis Ogbebor, ativista comunit�rio na cidade de Benin, que tenta impedir os jovens de entrar em grupos como a Black Axe.
John Stone afirma que muitos Axemen entram no grupo apenas para fazer contatos. A Nig�ria tem a segunda taxa de desemprego mais alta do mundo. Nesse ambiente desafiador, ele conta que entrar para a Black Axe pode fornecer prote��o e conex�es comerciais.
Stone defende que nem todos os membros s�o criminosos. "Temos membros no ex�rcito, na marinha e na for�a a�rea nigeriana. Temos membros nas universidades. Temos padres e pastores", segundo ele.
Fraternidade estudantil
Esse apoio m�tuo foi fundamental para o prop�sito original da Black Axe. O grupo cresceu a partir de uma fraternidade estudantil chamada Neo Movimento Negro da �frica (NBM, na sigla em ingl�s). Ela foi formada na Universidade de Benin na d�cada de 1970. O s�mbolo do NBM era um machado preto rompendo correntes e seus fundadores afirmavam que seu objetivo era lutar contra a opress�o.
O NBM foi inspirado pela luta antiapartheid na �frica do Sul, mas sua estrutura, sigilo e compromisso fraterno eram inspirados em sociedades como a ma�onaria, presente na Nig�ria durante a era colonial.
O NBM ainda existe hoje em dia e � uma sociedade legalmente registrada na junta comercial da Nig�ria. Ele afirma ter tr�s milh�es de membros em todo o mundo e publica regularmente sua atividade beneficente, que inclui doa��es para orfanatos, escolas e a pol�cia, na Nig�ria e no exterior. O NBM promove enormes confer�ncias anuais, algumas das quais recebem celebridades e pol�ticos importantes.

Segundo os l�deres do NBM, a Black Axe � um grupo dissidente n�o autorizado. Eles se dissociam completamente da Black Axe em p�blico e afirmam taxativamente que o NBM se op�e a qualquer atividade criminosa.
"O NBM n�o � a Black Axe. O NBM n�o tem nada a ver com a criminalidade. O NBM � uma organiza��o que pretende promover grandes coisas no mundo", afirmou Olorogun Ese Kakor, atual presidente da organiza��o, em entrevista � BBC em julho de 2021.
Segundo os advogados do NBM, qualquer pessoa da Black Axe que seja tamb�m membro do NBM "ser� imediatamente expulsa" do NBM, que tem toler�ncia zero ao crime.
Mas as autoridades policiais internacionais t�m opini�o diferente. Declara��es do Departamento de Justi�a dos Estados Unidos, durante a a��o penal contra membros da Black Axe em andamento desde 2018, afirmam que o NBM � uma "organiza��o criminosa" e "parte da Black Axe". Declara��es similares foram feitas por autoridades canadenses, que afirmaram que o NBM e a Black Axe s�o "a mesma coisa".
Os documentos analisados pela BBC aparentemente tamb�m exibem liga��es entre alguns membros da Black Axe e a organiza��o NBM.
Muitos dos documentos foram encontrados em uma conta de e-mail que pertenceu a Augustus Bemigho-Eyeoyibo, presidente do NBM entre 2012 e 2016. Esses arquivos sugerem que Bemigho, investidor bem-sucedido e dono de hot�is na Nig�ria, esteve envolvido em grandes fraudes na internet.
A BBC verificou dois casos importantes entre os dados, nos quais Bemigho parece haver se envolvido em golpes de heran�a dirigidos a cidad�os brit�nicos e norte-americanos. As v�timas disseram que foram fraudadas em mais de US$ 3,3 milh�es (R$ 18,7 milh�es).
"N�s retiramos dele cerca de US$ 1 milh�o" (R$ 5,67 milh�es), segundo uma mensagem referente a uma das v�timas, enviada por Bemigho a um suposto colaborador. O e-mail cont�m o nome completo, endere�o de e-mail e n�mero de telefone da v�tima, al�m de instru��es para dar continuidade ao golpe.
Os documentos sugerem que Bemigho enviou modelos de golpes para uma rede de colaboradores em pelo menos 50 ocasi�es. Uma das mensagens, discutindo a expans�o do NBM, sugere que ele pediu aos membros que formassem ONGs em todo o mundo para "arrecadar milh�es".
Em suas mensagens aos membros do NBM por e-mail, Bemigho os trata como "Aye Axemen". Em uma resposta, aparentemente enviada para Bemigho pelo Facebook Messenger, ele � tratado como "Black Axe anci�o nacional".

Em 2019, a cunhada de Bemigho foi acusada de lavagem de dinheiro no Reino Unido, envolvendo 1 milh�o de libras (R$ 7,5 milh�es). O Minist�rio P�blico brit�nico (CPS, ou Crown Prosecution Service, em ingl�s) referiu-se a Bemigho como "l�der da Black Axe", em um comunicado � imprensa amplamente publicado na �poca.
Quando a BBC apresentou essas evid�ncias aos l�deres do NBM, eles afirmaram que investigariam a quest�o e que qualquer pessoa que rompesse o c�digo de conduta da organiza��o seria expulsa. Bemigho n�o respondeu ao contato feito pela BBC sobre as alega��es.
John Stone afirma que a Black Axe e o NBM, no fundo, s�o a mesma organiza��o, segundo sua pr�pria experi�ncia. Ele n�o foi apenas membro da Black Axe, mas tamb�m l�der do NBM no seu local de origem, a cidade de Benin.
"Eles s�o uma coisa s�", afirma ele. "� apenas uma esp�cie de formalidade para encobrir as informalidades. S�o dois lados da mesma moeda."
Segundo Tobias, o NBM foi fundamental na expans�o secreta da Black Axe em todo o mundo. "O Movimento Neo Negro, enquanto organiza��o, � apenas uma fachada, uma cortina de fuma�a, o rosto p�blico da organiza��o", afirma ele. Ele conta que o objetivo do NBM � "subverter a opini�o p�blica" para esconder "o que eles realmente s�o - uma m�fia".
Existem organiza��es que operam com o nome do NBM registradas em todo o mundo, incluindo no Reino Unido e no Canad�. H� pelo menos 50 contas no Facebook, Instagram e YouTube que utilizam varia��es desse nome, al�m dos canais oficiais da organiza��o nas redes sociais.
Algumas dessas contas t�m mais de 100 mil seguidores. Outras incluem refer�ncias impl�citas � Black Axe - emojis de machados, fotos de pessoas carregando armas ou machados e, ocasionalmente, o slogan de assinatura "Aye Axemen!".
O NBM estabeleceu-se com sucesso como marca global em diversos pa�ses. Na Nig�ria, segundo Stone, a influ�ncia da rede estende-se at� a esfera pol�tica.
"Existem muitos membros no Legislativo e at� no Poder Executivo", segundo ele. "Esta � a Black Axe. � o que o NBM prega: penetre em qualquer lugar que seja humanamente poss�vel."
Augustus Bemigho, antigo chefe do NBM - descrito nos arquivos dos tribunais brit�nicos como antigo chefe da Black Axe -, concorreu � C�mara dos Representantes da Nig�ria em 2019, pelo partido governista Congresso de Todos os Progressistas (APC, na sigla em ingl�s).

O ativista Curtis Ogbebor afirma que a pol�tica do Estado de Edo est� repleta de membros da Black Axe. "A Nig�ria tem essa pol�tica mafiosa", segundo ele. "Nossos pol�ticos e o governo em todos os n�veis incentivam nossos jovens a entrar para a seita."
Segundo Ogbebor, importantes pol�ticos nigerianos contratam membros da Black Axe para intimidar os rivais, proteger urnas de vota��o e coagir as pessoas a votar. Depois de eleitos, afirma ele, os pol�ticos os recompensam com cargos no governo. "Eles os armam, d�o dinheiro durante as elei��es e prometem nomea��es pol�ticas", revela Ogbebor.
Dois documentos, aparentemente vazados das comunica��es internas do NBM, sugerem que 35 milh�es de nairas (mais de 64 mil libras, ou R$ 480 mil) foram canalizados para a organiza��o na cidade de Benin para "proteger votos" e garantir apoio para uma elei��o de governador em 2012.
Em troca do apoio, os arquivos indicam que "80 cargos [foram] alocados para o NBM da zona de Benin para emprego imediato pelo governo estadual". Esse dinheiro foi supostamente distribu�do diretamente "pelo ent�o chefe de gabinete Sam Iredia", j� falecido.
Durante entrevistas com integrantes de alto escal�o do NBM em Lagos, seu representante legal confirmou que "diversos pol�ticos" s�o membros. Ele citou como exemplo o nome do vice-governador do Estado de Edo, Philip Shaibu.
"Existem muitas pessoas que s�o membros da nossa organiza��o e n�o h� motivo para esconder isso", afirma Aliu Hope, um dos advogados da NBM.
Um antigo membro do governo do Estado de Edo, em entrevista pela primeira vez para a imprensa internacional, apresentou-se para denunciar a colabora��o do Estado de Edo ao crime organizado.
Tony Kabaka, membro confesso da seita e do NBM, passou anos trabalhando para o governo na cidade de Benin, at� 2019. Nesse per�odo, por meio da sua empresa Akugbe Ventures, ele empregou mais de 7 mil coletores de impostos, gerando bilh�es em receita para o Estado.

Desde que saiu da pol�tica, Kabaka vem sofrendo repetidas tentativas de assassinato. Sua mans�o - uma imensa constru��o branca com colunas romanas - est� repleta de buracos de balas.
"Se voc� chegar e perguntar 'voc� consegue identificar a Black Axe no governo?', eu identificarei", afirma ele. "A maior parte dos pol�ticos, quase todo mundo est� envolvido."
"Se o governo quiser se eleger, ele precisa deles", afirma Kabaka. "A seita s� existe porque o governo est� envolvido - essa � a verdade."
A equipe da BBC viajou para a cidade de Benin em julho de 2021 para entrevistar o vice-governador Philip Shaibu, mas ele n�o compareceu para a entrevista por duas vezes. Questionados por e-mail sobre as alega��es de elos com a Black Axe, o governo do Estado de Edo e o vice-governador n�o responderam.
John Stone acredita que os pol�ticos e as autoridades policiais da Nig�ria est�o muito infiltradas pela Black Axe para combat�-los com efici�ncia.
A solu��o para a viol�ncia, segundo ele, est� na pr�pria seita. Ele n�o � o �nico ex-membro que acredita que o grupo tornou-se perigoso demais.
"Alguns de n�s entraram para o NBM para participar da luta contra a opress�o", escreveu um membro de um f�rum secreto nos documentos examinados pela BBC. "Mas, agora, somos rotulados como organiza��o criminosa, com evid�ncias por toda parte."
As comunica��es internas da Black Axe s�o repletas de queixas similares de outros membros. "N�o me tornei um Axeman para tirar vidas. Tornei-me um Axeman como tentativa de fraterniza��o", diz outra postagem. "Por favor, parem com esses assassinatos."
Os l�deres do NBM afirmam que est�o empenhados em garantir que a organiza��o permane�a fiel aos princ�pios da sua funda��o e � promo��o da paz. O presidente atual do grupo, Olorogun Ese Kakor, afirmou � BBC que foi eleito para erradicar criminosos "infiltrados" e que essas pessoas v�m causando "grandes danos � organiza��o".
Em uma tentativa de explorar esse esfor�o de mudan�a, Stone formou o que ele chama de "Coaliz�o Arco-�ris" - um grupo de apoio composto de antigos membros da seita, cidad�os nigerianos influentes e professores. Seus membros tentam reduzir a escalada das tens�es quando gangues rivais entram em conflito, dirigindo a Black Axe rumo a um futuro mais pac�fico.
"A contribui��o da Coaliz�o para a sociedade � reduzir a criminalidade", afirma ele. "Reduzir a taxa de mortalidade entre os jovens. Reduzir a quantidade de vi�vas e �rf�os."
O cofundador da Coaliz�o, Chukwuka Omessah, quer que os membros da Black Axe reflitam sobre a sociedade que est�o criando.
"Todos n�s temos consci�ncia", afirma ele. "Voc� pode neg�-la para a imprensa, neg�-la para o p�blico, mas n�o pode neg�-la nos seus momentos de reflex�o - a sua consci�ncia vir� buscar voc�."
John Stone sabe que for�ar a reforma da Black Axe � uma tarefa perigosa. Ele sabe que seus antigos companheiros poder�o um dia vir busc�-lo. O professor tem uma espada de 90 cm escondida no seu carro e uma arma de fogo credenciada em sua casa.
"Para minha guarda pessoal, minha seguran�a pessoal", afirma ele. "Se eles vierem atr�s de mim, por que n�o posso tamb�m ir atr�s deles?"
Investiga��o conduzida por Charlie Northcott, Sam Judah e Peter Macjob
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