Representantes ucranianos e russos marcam segunda rodada de negocia��es. EUA bloqueiam reservas e rublo cai 30%
01/03/2022 04:00
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Clientes do banco russo Sberbank correram �s ag�ncias ontem para
sacar dinheiro, temendo quebra ap�s institui��es serem exclu�das do Swift
(foto: Michal Cizek/AFP
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A reuni�o de representantes da Ucr�nia e da R�ssia na fronteira com a Bielorr�ssia ontem terminou sem acordo ap�s quatros horas, e nova rodada de negocia��es foi agendada para breve. Sem acordo no conflito, a R�ssia mostrou ontem ter sentido o “bombardeio” de san��es econ�micas, log�sticas e esportivas impostas pelos Estados Unidos e Europa ao pa�s ap�s a invas�o da Ucr�nia . O rublo, moeda russa, sofreu forte desvaloriza��o ontem e caiu 30% em rela��o ao d�lar, cotado a 101 por d�lar, depois de ter ca�do 28% na sexta-feira. Para estabilizar a moeda, o Banco Central da R�ssia elevou a taxa de juros de 9,5% para 20%. Com a exclus�o dos bancos russos do sistema internacional de compensa��es Swift, os russos formaram longas filas ontem nas ag�ncias banc�rias com o temor de que institui��es banc�rias como Sberbank e o VTB Bank quebrem.
O receio j� ultrapassou as fronteiras da R�ssia, e os clientes de outros pa�ses onde bancos russos t�m filiais tamb�m j� t�m resgatado suas economias. O Banco Central Europeu ligou o alerta para o Sberbank Europe AG, filial europeia do banco russo, revelando que a institui��o est� passando por uma sa�da significativa de dep�sitos, e que “no futuro pr�ximo, � prov�vel que o banco n�o possa pagar suas d�vidas ou outros passivos � medida que vencerem”. A presidente executiva do Sberbank Europe AG, Sonja Sark�zi, disse que est� “em contato estreito com as autoridades de regulamenta��o competentes” para encontrar uma sa�da para esta “situa��o sem precedentes, pensando no interesse dos clientes”.
O isolamento econ�mico de Moscou continuou ontem com os Estados Unidos proibndo todas as transa��es com o Banco Central da R�ssia, uma san��o de efeito imediato e tomada em coordena��o com v�rios aliados, em resposta � invas�o da Ucr�nia pela R�ssia, que tomou medidas para impedir a queda do rublo. A decis�o de Washington tem o efeito de imobilizar todos os ativos que o Banco Central da R�ssia tem nos Estados Unidos, ou que est�o nas m�os de cidad�os americanos", anunciou o Departamento do Tesouro. Washington emitiu a proibi��o antes da abertura dos mercados americanos e o Canad� seguiu seus passos.
Ligada a san��es similares adotadas por muitos aliados dos Estados Unidos, essa decis�o limitar�, severamente a capacidade de Moscou de usar suas abundantes reservas de divisas para comprar rublos. As opera��es para defender o rublo “n�o ser�o mais poss�veis e a 'fortaleza R�ssia' se encontra indefesa”, disse um funcion�rio de alto escal�o do governo americano. A mesma fonte considerou que essas san��es coordenadas v�o deflagrar um "c�rculo vicioso" para a economia russa e antecipou: “A infla��o certamente vai disparar, o poder aquisitivo entrar� em colapso, os investimentos entrar�o em colapso”.
“Nosso objetivo � garantir que a economia russa se contraia, enquanto o presidente Putin decidir seguir adiante com a invas�o da Ucr�nia”, acrescentou. A Uni�o Europeia tamb�m congelou os recursos do Banco Central da R�ssia. Os Estados Unidos tamb�m implementaram san��es contra o Fundo Russo de Investimento Direto, uma institui��o financeira p�blica usada para arrecadar fundos no exterior e liderada por Kirill Dmitriev, um colaborador pr�ximo do presidente Vladimir Putin. “Este fundo e sua gest�o s�o s�mbolos da profunda corrup��o na R�ssia e de seu tr�fico de influ�ncias” no exterior, completou.
Tamb�m foram anunciadas medidas de repres�lia comerciais, como o fechamento do espa�o a�reo a avi�es russos pela Europa e Estados Unidos. Ao todo, 30 pa�ses fecharam o espa�o a�reo para avi�es russos. Em represp�lia, Moscou anunciou ontem ter fechado seu territ�rio para aeronaves de 36 na��es.
Cerco
A Su��a anunciou que vai retomar de forma “integral” as san��es econ�micas adotadas pela Uni�o Europeia (UE) contra a R�ssia pela invas�o da Ucr�nia, segundo informou o presidente da Confedera��o Helv�tica, Ignazio Cassis. Essas medidas incluem san��es contra o presidente russo, Vladimir Putin, envolvendo o congelamento de fundos. “Trata-se de um grande passo para a Su��a”, um pa�s tradicionalmente neutro, disse ele � imprensa, acrescentando que o Conselho Federal tomou essa decis�o “com convic��o, de uma forma reflexiva e inequ�voca”. O ministro das Finan�as, Ueli Maurer, ressaltou que o bloqueio dos ativos de pessoas inclu�das na lista negativa da UE tem “efeito imediato”.
A ministra da Justi�a, Karin Keller-Sutter, informou ainda que cinco magnatas russos, ou ucranianos, "muito pr�ximos de Vladimir Putin" e com v�nculos muito importantes na Su��a, "est�o proibidos de entrar" no pa�s. Suas identidades n�o foram divulgadas. Essas pessoas n�o t�m visto de resid�ncia na Su��a, mas contam com importantes "v�nculos econ�micos, sobretudo nas finan�as e no neg�cio de mat�rias-primas", acrescentou.
A Uni�o Europeia (UE) acrescentou ontem v�rios oligarcas e o porta-voz do presidente russo � lista de personalidades sancionadas com o congelamento de seus bens e a proibi��o de entrada, como resultado da guerra contra a Ucr�nia. Seis oligarcas, v�rias personalidades pr�ximas do presidente Vladimir Putin e uma dezena de jornalistas figuram nessa lista de 26 nomes aprovada pelos Estados-membros e publicada ontem. Putin e o ministro das Rela��es Exteriores da R�ssia, Sergei Lavrov, j� haviam sido inclu�dos na sexta-feira.
Empresas
Tr�s gigantes do petr�leo – Shell, Equinor e BP – comunicaram que est�o deixando de atuar na R�ssia devido � invas�o da Ucr�nia. A anglo-holandesa Shell anunciou ontem que est� se separando de suas participa��es em v�rios projetos conjuntos com o grupo russo Gazprom. “Nossa decis�o de sair foi tomada com convic��o", disse o CEO da Shell, Ben van Beurden, em comunicado � Bolsa de Valores de Londres, que especifica que as partes envolvidas valiam US$ 3 bilh�es no final de 2021, especialmente no que diz respeito � participa��o da empresa no projeto de g�s Sakhaline-2, no extremo oriente russo.
A estatal norueguesa Equinor tamb�m anunciou ontem a suspens�o de novos investimentos na R�ssia, al�m de iniciar o processo de sa�da das joint-ventures que mant�m com companhias de energia russas. A brit�nica BP, a gigante do setor que tem a maior atua��o na R�ssia, anunciou que vai se desfazer de sua participa��o na Rosneft. Vale ressaltar que o Reino Unido, assim como a Noruega, integram a Organiza��o do Tratado do Atl�ntico Norte (Otan).
O presidente russo, Vladimir Putin
(foto: Alexander Zemlianichenko/Pool/AFP
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Putin adota medida dr�stica
O presidente russo, Vladimir Putin, arremeteu ontem contra as san��es impostas pelo que chamou de “imp�rio da mentira” ocidental em resposta � invas�o � Ucr�nia, e anunciou medidas dr�sticas para conter a queda do rublo. Segundo decreto publicado no site do Kremlin, os residentes na R�ssia ficar�o proibidos de transferir dinheiro para o exterior a partir de hoje. Al�m dessa primeira medida, os exportadores russos est�o obrigados, desde ontem, a converter em rublos 80% de sua receita em moeda estrangeira obtida desde 1º de janeiro.
O rublo caiu a m�nimas hist�ricas ontem. Para defender a economia e a moeda nacionais do impacto das san��es ocidentais, o Banco Central da R�ssia anunciou, em um comunicado divulgado ontem, que a taxa b�sica de juros ser� de 20%.
A TV russa exibiu imagens de uma reuni�o entre Putin, o primeiro-ministro Mikhail Mishustin, o ministro das Finan�as, Anton Siluanov, a presidente do Banco Central russo, Elvira Nabiullina, e o diretor-geral do maior banco do pa�s, Sberbank, para responder �s san��es. O porta-voz do Kremlin, Dmitri Peskov, reconheceu um pouco antes que as san��es das pot�ncias ocidentais eram “duras” e representavam um “problema”, mas que a R�ssia tinha “todo o potencial necess�rio para compensar os danos”. O Kremlin n�o anunciou nenhuma medida adicional em rea��o �s san��es.
Magnatas
“As medidas tomadas reduzem a volatilidade”, disse � AFP Alexei Vedev, analista do instituto econ�mico Ga�dar. “A incerteza � enorme e o Banco Central est� agindo com raz�o”, acrescentou. Em uma rea��o rara, magnatas russos expressaram publicamente seu descontentamento. “� uma crise verdadeira e s�o necess�rios especialistas verdadeiros em crises. Deve-se mudar absolutamente de pol�tica econ�mica e p�r fim a todo esse capitalismo de Estado”, publicou no aplicativo de mensagens Telegram Oleg Deripaska, multimilion�rio criador da gigante do alum�nio Rusal. Ele disse esperar do governo “esclarecimentos e coment�rios claros sobre a pol�tica econ�mica para os pr�ximos tr�s meses”.
Para Serguei Khestanov, assessor macroecon�mico da Open Broker, a R�ssia ainda tem espa�o. “Enquanto n�o houver san��es reais �s exporta��es russas, especialmente petr�leo e g�s, n�o haver� cat�strofe”, indicou, embora “as pessoas, � claro, v�o sentir” os efeitos. Preocupados, alguns russos preferiram retirar suas economias do banco. Esse foi o caso de Svetlana Paramonova, de 58 anos, que deseja sacar todo o seu dinheiro “para guard�-lo em casa. � mais seguro, uma vez que j� n�o entendemos mais o que acontece.”
Reservas
A R�ssia dispunha de US$ 643 bilh�es em reservas no fim da semana passada, de acordo com dados oficiais, um n�vel elevado atingido com o ac�mulo de receita com as vendas de petr�leo e g�s. N�o se sabe qual porcentagem dessas reservas � em d�lares americanos. “� uma san��o sem precedentes”, reagiu Eddie Fishman, especialista do “think tank” americano Atlantic Council, no Twitter, j� que o Banco Central russo n�o pode mais vender reservas. Fishman ressaltou que as grandes empresas estatais russas tamb�m t�m reservas. “Se for necess�rio intensificar as san��es, � um fator a ser observado”, acrescentou.
an�lise da not�cia
Impactos para Moscou e para todo o mundo
Marc�lio de Moraes
Os milhares de russos nas filas de bancos ontem, dia em que o rublo teve desvaloriza��o recorde de mais de 30%, o que levou o governo russo a elevar a taxa de juros de 9,5% para 20%, mostra o impacto das san��es impostas pelos pa�ses do Ocidente � R�ssia com o objetivo de sufocar a economia do pa�s. A exclus�o dos bancos do sistema de compensa��es Swift e o congelamento dos ativos em d�lar e euro do Banco Central da R�ssia impedem o governo Putin de usar recursos que est�o fora do pa�s para financiar a guerra contra a Ucr�nia de um lado, e de outro imp�em perdas para magnatas e a popula��o russa como um todo, que fica impedida de enviar e receber dinheiro com outras partes do mundo.
O pa�s tamb�m est� sendo isolado por empresas privadas, associa��es e entidades de v�rios setores. Petrol�feras desfizeram parcerias com a estatal russa Gasprom e Facebook, Youtube e outras redes sociais cancelaram a monetiza��o de canais russos, com impacto direto na popula��o. Com o rublo devalorizado, a R�ssia enfrentar� aumento da infla��o e para impedir o descontrole ter� de elevar ainda mais os juros. A R�ssia disp�e de uma reserva estimada em US$ 650 bilh�es, mas sem movimentar seus recursos no mundo e enfrentando a deteriora��o de indicadores econ�micos, os russos pressionaram o governo para cessar o conflito, minando o apoio ao presidente Vladimir Putin.
O Ocidente n�o sancionou totalmente as exporta��es de petr�leo, g�s, gr�os e fertilizantes da R�ssia, mas fechamento de espa�o a�reo na Europa e imponso san��es para navios de bandeira russa praticamente interromperam essas transa��es, o que elevar� a cota��o das commodities e espalhar� infla��o por praticamente todo o planeta. A cota��o do petr�leo passou de US$ 100 o barril do tipo brent ontem, recuando no fechamento. E analista j� falam em uma cota��o pr�xima a US$ 150.
A quest�o � quanto tempo a economia russa aguenta enfrentar o isolamento e as medidas que a sufocam. O prolongamento do conflito, ou mesmo a escalada da guerra, vai impactar mercados dependentes dos produtos russos, como os pa�ses europeus que compram o g�s e os que dependem do trigo e dos fertilizantes vendidos pelos russos e tamb�m por ucranianos.
A continuidade da guerra vai expor essa depend�ncia e a consequ�ncia ser� mais infla��o. Emobra seja preciso cessar o conflito para evitar perdas de vidas. Mas mesmo ap�s o fim dos combates – que podem durar ainda v�rios dias ou extrapolar a regi�o –, a economia russa ser� gravemente atingida, enquanto a mundial estar� ferida. E isso depois de ainda n�o ter se curado da pandemia de COVID-19.