
Diante do abalo da guerra sobre as rela��es econ�micas entre Moscou e o Ocidente, o governo americano passou a sinalizar a Caracas sua disposi��o de estreitar rela��es e, com isso, usar o petr�leo venezuelano como substituto �s importa��es do produto da R�ssia. Mas ser� poss�vel superar rapidamente os anos de tens�o e desconfian�a entre os dois pa�ses? E ser� que a guerra na Ucr�nia � o �nico motivo por tr�s dessa reaproxima��o?
Na ter�a-feira (08/03) um executivo da Citgo, a subsidi�ria americana da petroleira estatal venezuelana PDVSA (Petr�leos de Venezuela), e um turista cubano-americano foram libertados pelas autoridades venezuelanas. O executivo Gustavo C�rdenas estava preso desde 2017, enquanto Jorge Alberto Fern�ndez fora detido em 2021, ao desembarcar no pa�s de posse de um drone. Eles haviam sido condenados por corrup��o e terrorismo, respectivamente.
O gesto ocorreu poucos dias depois que uma delega��o de altos representantes dos Estados Unidos reuniu-se com o presidente da Venezuela, Nicol�s Maduro, em Caracas - o primeiro encontrou dessa natureza desde que os dois pa�ses romperam rela��es em 2019. Tamb�m na ter�a-feira, o presidente americano, Joe Biden, anunciou um boicote americano �s importa��es de petr�leo e g�s da R�ssia.
Se a causa imediata dessa aproxima��o parece diretamente ligada ao conflito na Ucr�nia e o abalo que ele causou no mercado internacional de energia, ao menos em parte as novas negocia��es t�m rela��o com outro acontecimento recente de grande impacto: a mudan�a de comando em Washington.
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Uma nova Casa Branca
A chegada do democrata Joe Biden � Casa Branca, em substitui��o ao republicano Donald Trump, sinalizou mudan�as diversas no comportamento do governo dos Estados Unidos em suas rela��es com o resto do mundo. Do compromisso com os acordos de Paris para combater o aquecimento global � reaproxima��o com seus aliados europeus, a Casa Branca mudou significativamente o tom adotado anteriormente por Trump.
O governo de Nicol�s Maduro viu na mudan�a uma oportunidade. Os momentos de maior tens�o entre Washington e Caracas foram vividos no in�cio de 2019, quando Donald Trump n�o apenas reconheceu o oposicionista Juan Guaid� como o leg�timo presidente venezuelano como tamb�m conclamou as For�as Armadas do pa�s sul-americano a depor Maduro - e pareceu sugerir a possibilidade de interven��o armada.
"Buscamos uma transi��o de poder pac�fica, mas todas as op��es est�o abertas", afirmou Trump na �poca.
A transi��o n�o ocorreu, Maduro continuou no Pal�cio de Miraflores, sede do governo em Caracas, e quem perdeu o emprego foi Trump. Maduro, no entanto, seguiu presidindo um pa�s em grave crise econ�mica, com uma taxa de infla��o de 2.958,8% em 2020.
Segundo a ag�ncia da ONU para refugiados, Acnur, o n�mero de venezuelanos buscando o status de refugiados em outros pa�ses, ap�s escapar da viol�ncia e da pobreza na Venezuela, aumentou 8.000% desde 2014, chegando a 4 milh�es.
Diante de um novo presidente americano, Maduro passou a tentar retomar os la�os diplom�ticos com Washington, passo fundamental para reduzir a gravidade da crise na Venezuela. Em maio de 2021, apenas quatro meses ap�s a posse de Joe Biden, o l�der venezuelano j� enviava sinais � Casa Branca de que buscava uma melhora nas rela��es - e o al�vio das san��es econ�micas americanas.
Na �poca o governo em Caracas transferiu seis executivos da Citgo detidos, incluindo Gustavo C�rdenas, para pris�o domiciliar, o que foi apresentado como um gesto de boa vontade para atrair os americanos � mesa de negocia��es. Washington, no entanto, indicou que n�o aceitaria nenhum di�logo sem antes haver algum passo na dire��o de elei��es livres na Venezuela. Segundo noticiou na �poca a ag�ncia Reuters, um oficial do governo Biden disse: "Responderemos com base em a��es concretas".
Retorno da diplomacia
Um m�s depois, em entrevista � ag�ncia Bloomberg, Nicol�s Maduro voltou a fazer um apelo pela normaliza��o de rela��es entre Venezuela e Estados Unidos, pedindo o fim das san��es e do que chamou de "demoniza��o" de seu pa�s.
O governo americano, ainda segundo a Bloomberg, respondeu que qualquer mudan�a em sua pol�tica em rela��o a Caracas exigia que Maduro dialogasse com a oposi��o para resolver a divis�o pol�tica no pa�s. Os EUA de Biden reafirmavam continuar reconhecendo o oposicionista Guaid� como presidente interino da Venezuela.
Um ano depois, com a infla��o venezuelana desacelerando, mas ainda tendo fechado 2021 com a taxa anual de 686,4%, a guerra na Ucr�nia parece ter mudado os c�lculos de Washington sobre a Venezuela. O recente encontro realizado entre representantes americanos e Nicol�s Maduro foi descrito de forma positiva pelos dois lados.
Segundo a Casa Branca, foram discutidos "temas energ�ticos" no contexto da invas�o da Ucr�nia por tropas de Vladimir Putin. J� Maduro chamou a reuni�o de "respeitosa, cordial e muito diplom�tica".
"Concordamos em trabalhar em uma pauta a partir do respeito e da esperan�a do mundo, para assim poder avan�ar uma pauta que permita o bem-estar e a paz dos povos da regi�o", afirmou o l�der venezuelano. Maduro afirmou que as negocia��es continuariam.
O encontro causou surpresa e mal-estar entre os apoiadores de Juan Guaid�. Ap�s a conversa com Maduro, por�m, a delega��o americana tamb�m reuniu-se com Guaid� e outros representantes da oposi��o venezuelana. O l�der oposicionista n�o fez coment�rios diretos sobre a aproxima��o entre Washington e Maduro, mas se referiu a sua reuni�o como "trabalho de coordena��o com o governo dos EUA, atendendo a raz�es de interesse e seguran�a nacional do nosso aliado".

Entretanto, o embaixador de Guaid� nos EUA, Carlos Vecchio, publicou uma s�rie de mensagens na rede social Twitter criticando qualquer possibilidade de negocia��o com o governo de Maduro na �rea de energia. "Comprar petr�leo de Maduro ou de Putin d� no mesmo. S�o petr�leos de sangue", disse Vecchio.
Desde abril de 2019, os EUA n�o permitem que Caracas negocie seu petr�leo no mercado americano, um com�rcio que representava 96% do faturamento externo da Venezuela. No entanto, quando Washignton e seus aliados ocidentais come�aram a impor san��es econ�micas � R�ssia, v�rios influentes integrantes dos dois grandes partidos pol�ticos dos EUA apontaram a Venezuela como um potencial substituto para suprir a escassez gerada com as medidas.
Atualmente a Venezuela produz cerca de 800 mil barris de petr�leo por dia, apenas uma fra��o dos 3 milh�es de barris que produziu diariamente durante anos, antes de sua recente crise. Na ter�a-feira, dia 8, o chefe da C�mara Petroleira da Venezuela, Reinaldo Quintero, disse � BBC que seu pa�s poderia elevar a produ��o de petr�leo em 400 mil barris por dia para ajudar a substituir o petr�leo russo.

Quintero afirmou que o pa�s sul-americano conta com a infraestrutura para aumentar sua produ��o di�ria para 1,2 milh�o de barris. "Isso nos permitir� satisfazer algumas das necessidades no mercado americano."
Ele disse n�o esperar que as san��es sejam eliminadas, mas acredita que Biden provavelmente emita licen�as que permitam que empresas estrangeiras operem na Venezuela sem que sofram puni��es. Ainda segundo ele, isso permitiria a entrada de necess�rio investimento do exterior, al�m de aliviar a escassez de trabalhadores habilitados.
Mesmo que a suspens�o das san��es americanas e o restabelecimento de contatos diplom�ticas ainda estejam distantes, a mudan�a de governo em Washington e a guerra na Ucr�nia criaram condi��es para que um novo cap�tulo seja iniciado nas rela��es entre Estados Unidos e Venezuela. � mais um exemplo das muitas - e ainda desconhecidas - consequ�ncias dos desdobramentos recentes na pol�tica internacional.
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