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Estado de Minas F� EVANG�LICA

Igreja Universal abre templo na Ucr�nia para 'ganhar almas' durante guerra

Crise ucraniana mobiliza mission�rios brasileiros de v�rias denomina��es, que se organizam para acolher refugiados e veem o pa�s como estrat�gico para expans�o da f� evang�lica na Europa.


27/05/2022 07:19 - atualizado 27/05/2022 08:23


Pessoas recebendo a benção em igreja
Obreiros da Universal aben�oam ucranianos na inaugura��o de templo da igreja em Lviv, no oeste da Ucr�nia, em 24 de abril (foto: Reprodu��o/Universal)

"Onde todos est�o retrocedendo, n�s estamos avan�ando, porque o objetivo � ganhar almas, � salvar vidas, � levar � vida eterna."

Com essas palavras, Eduardo Bravo, bispo da Igreja Universal do Reino de Deus (Iurd), definiu a estrat�gia da igreja fundada por Edir Macedo na guerra da Ucr�nia.

A fala foi dita em 21 de fevereiro, momento da escalada de tens�o entre Ucr�nia e R�ssia e tr�s dias antes da invas�o dos russos, num programa televisivo da Universal que teve a participa��o de dois jovens mission�rios da igreja que haviam acabado de desembarcar na Ucr�nia.

Desde ent�o, enquanto milh�es de pessoas fugiam dos ataques russos, a denomina��o brasileira inaugurou seu oitavo templo na Ucr�nia e mobilizou suas unidades em outras na��es europeias para receber refugiados ucranianos.

Outras igrejas brasileiras tamb�m t�m se engajado na crise ucraniana, oferecendo abrigo e alimentos a refugiados ou at� mesmo custeando seu transporte at� o Brasil.

Para alguns grupos mission�rios, a crise humanit�ria na Europa oferece uma oportunidade para a evangeliza��o, e a Ucr�nia � um pa�s estrat�gico para a expans�o evang�lica no continente.

Por outro lado, a perspectiva de uma vit�ria da R�ssia no conflito gera temores entre grupos protestantes (leia mais abaixo).


Sacerdotes ucranianos cristãos ortodoxos em igreja
Maioria dos ucranianos � crist� ortodoxa, mas pa�s vive abertura religiosa desde a independ�ncia em rela��o � Uni�o Sovi�tica, em 1991 (foto: Reuters)

'Planta��o de igrejas'

A a��o de grupos evang�licos na crise ucraniana � atribu�da, em parte, � import�ncia do pa�s na difus�o da f� evang�lica no Leste Europeu e na �sia Central.

A Association of Baptists for World Evangelism (ABWE), uma das principais organiza��es mission�rias do mundo, e que atua no Brasil, diz em seu site que a independ�ncia da Ucr�nia em rela��o � Uni�o Sovi�tica, em 1991, ampliou a liberdade religiosa no pa�s e permitiu a "planta��o de igrejas (evang�licas)".

Como consequ�ncia, diz a organiza��o, a "Ucr�nia se tornou uma base para o envio de mission�rios para a Eur�sia e �sia Central, incluindo pa�ses como a R�ssia, o Cazaquist�o e o Uzbequist�o, onde h� pouca ou nenhuma liberdade religiosa".

Uma das vantagens de usar a Ucr�nia como base para o envio de mission�rios tem a ver com a l�ngua russa, amplamente falada na regi�o. Igrejas que formem sacerdotes ucranianos podem depois envi�-los a pa�ses vizinhos.

Outro fator que atrai mission�rios para a regi�o � a presen�a de "povos n�o alcan�ados", como esses grupos se referem a comunidades n�o cristianizadas. � o caso dos t�rtaros-crimeanos, minoria �tnica de religi�o mu�ulmana que habita a Crimeia, regi�o na fronteira entre R�ssia e Ucr�nia, hoje ocupada por for�as russas.

Outro chamariz � a grande popula��o local. S� a Ucr�nia tem 44 milh�es de habitantes. A R�ssia, 146 milh�es.


Homem idoso com chapéu com as mãos no rosto e mulher idosa com véu com a mão sobre um olho
O povo t�rtaro-crimeano, que habita a Crimeia e segue a f� isl�mica, � listado entre os "povos n�o alcan�ados" por grupos mission�rios evang�licos (foto: Getty Images)

'Grande mar de almas'

Em texto publicado em 2018, o bispo da Universal Eder Figueiredo se refere � Europa Oriental como "um grande mar de almas".

A denomina��o brasileira est� na Ucr�nia desde 2006 e tem 17 pastores no pa�s.

Em 24 de abril, a igreja inaugurou um templo em Lviv, cidade no oeste da Ucr�nia que tem recebido grande n�mero de refugiados.

H� outros sete templos da Iurd no pa�s, onde a ampla maioria da popula��o � crist� ortodoxa.

Segundo uma reportagem da TV Universal, a abertura da unidade em Lviv atraiu "centenas de pessoas". "Na contram�o do terror, o trabalho da Universal n�o parou", disse a emissora.

Naquele mesmo dia, segundo a TV Universal, "muitos ucranianos tomaram a decis�o de se batizar nas �guas" num culto da Iurd na capital do pa�s, Kiev.


Pastor fala em palco a centenas de fiéis sentados
Celebra��o do S�bado de Aleluia organizada pela Igreja Universal em Quixinau, capital da Mold�via, contou com a presen�a de 130 refugiados ucranianos (foto: Divulga��o/Universal)

Fuga para a Pol�nia

Mas a intensifica��o da opera��o da Universal na Ucr�nia tem ocorrido em meio a grandes dificuldades.

Em 28 de fevereiro, o pastor Tiago Casagrande, que chefia a opera��o da Universal na Ucr�nia, disse ter passado quatro noites sem dormir enquanto fugia de Kiev para a Pol�nia.

Na �poca, temia-se que a R�ssia pudesse atacar a capital ucraniana a qualquer instante.

Ao lado de sua esposa, Ana Cl�udia Casagrande, o pastor relatou os percal�os da viagem ao bispo da Universal Renato Cardoso.

Durante a conversa, publicada no canal de Cardoso no YouTube, Casagrande chorou copiosamente e chegou a abandonar a transmiss�o por alguns instantes.

Nesse momento, a esposa do pastor assumiu a palavra e disse ao bispo que o casal pretendia voltar � Ucr�nia o quanto antes.

"A gente sabe que vai ser uma oportunidade ainda maior para levar a palavra, para ganhar mais almas", afirmou.

Ap�s a fuga, o casal passou a trabalhar na entrega de donativos da Universal a refugiados ucranianos na Pol�nia. O pa�s � o principal destino das cerca de 14 milh�es de pessoas que deixaram a Ucr�nia desde o in�cio da guerra.


Pessoas com trajes típicos ucranianos sentadas em transmissão no YouTube
Pastor Tiago Casagrande (2� da dir. para a esq.) d� entrevista ao lado da esposa e de jovens mission�rios da Igreja Universal na Ucr�nia (foto: Reprodu��o)

Em nota � BBC, a Universal disse que j� destinou a refugiados ucranianos 205 toneladas de donativos, entre alimentos, roupas e produtos de higiene.

A igreja tem mobilizado suas estruturas em outros pa�ses europeus para atender os refugiados. Na Mold�via, por exemplo, um texto no site da Universal diz que as atividades do S�bado de Aleluia reuniram 500 pessoas, das quais 130 eram refugiadas ucranianas.

A igreja afirma que naquele dia 40 pessoas "se uniram � f�", ou seja, foram convertidas.

Feiti�aria e bruxaria

Uma das estrat�gias da Universal na Ucr�nia tem sido adaptar o discurso que ela usa no Brasil contra cren�as afrobrasileiras.

Em 2013, a igreja lan�ou na Ucr�nia uma tradu��o do livro "Orix�s, caboclos e guias - deuses ou dem�nios?", de Edir Macedo, o fundador da Universal.

Um v�deo divulgado pela Iurd naquela �poca diz que "macumbaria, feiti�aria, bruxaria... essas supersti��es t�m feito parte da cultura ucraniana".


Capa de livro
Livro de Edir Macedo sobre endidades afrobrasileiras foi traduzido para o russo e lan�ado na Ucr�nia (foto: Reprodu��o)

Em setembro de 2021, o pr�prio Edir Macedo esteve na Ucr�nia e pregou aos fi�is locais, num sinal da import�ncia do pa�s para a estrat�gia global da igreja.

Na ocasi�o, o fundador da Universal disse orar a Deus "por este pa�s, como temos orado para todos pa�ses, para que haja paz, prosperidade e sobretudo liberdade para que o povo possa conhecer Sua palavra".

Ucranianos em Portugal

Outras igrejas e grupos mission�rios brasileiros tamb�m t�m atuado junto a refugiados ucranianos.

Numa live em 29 de abril no canal Alian�a Miss�es na Europa, no YouTube, mission�rios citaram o caso da igreja brasileira Sara Nossa Terra em Portugal.

O pastor brasileiro Marcelo Ara�jo, membro da denomina��o, disse na ocasi�o ter viajado at� a fronteira com a Ucr�nia para buscar refugiados e lev�-los a Portugal. "Muitos ucranianos em Portugal est�o sendo evangelizados", disse o pastor.

"A maioria deles s�o ortodoxos e eles est�o mais abertos, ouvindo a palavra, cantando louvores em portugu�s, desejando estar nos cultos", afirmou Ara�jo.

O pastor diz que a igreja at� contratou um ucraniano para traduzir as cerim�nias religiosas.

"N�o sei se conseguimos retornar (� Ucr�nia) para trazer mais refugiados, mas queremos", disse o brasileiro.


Mulheres com crianças caminhando em fronteira
Milh�es de ucranianos deixaram o pa�s desde o in�cio dos ataques russos, em fevereiro; Pol�nia � o principal destino dos refugiados. (foto: Reuters)

H� ainda o caso de uma organiza��o evang�lica que tem custeado a vinda de refugiados ucranianos para o Brasil, a Global Kingdom Partnership Network (GKPN), fundada pelo pastor brasileiro Elias Dantas.

Em 20 de mar�o, um grupo de 29 refugiados que chegou ao Brasil por interm�dio da GKPN foi recebido em um culto na Primeira Igreja Batista de Curitiba (PIB).

A organiza��o j� disse a jornalistas ter planos de patrocinar a vinda e estadia de 300 refugiados ucranianos no Brasil.

'Mercado religioso global'

Para Marcos de Ara�jo Silva, doutor em Antropologia pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e pesquisador do CRIA (Centro em Rede de Investiga��o em Antropologia, em Portugal), a a��o das igrejas brasileiras na Ucr�nia ou entre refugiados ucranianos se explica pela import�ncia da Europa no "mercado religioso global".

Silva � autor de v�rios artigos acad�micos sobre a a��o da Universal e de outras igrejas evang�licas brasileiras na Europa.

O pesquisador diz � BBC que, por se tratar de um continente rico, ainda que desigual, a Europa oferece "vantagens econ�micas para quem promove trabalhos mission�rios".

Uma dessas vantagens, segundo Silva, � a possibilidade de atrair fi�is com maior poder aquisitivo. Outra, a de absorver imigrantes e refugiados, que comp�em parcela cada vez maior da popula��o europeia e tendem a ser mais abertos a novas religi�es.


Culto evangélico em igreja
O bispo Edir Macedo, fundador da Igreja Universal do Reino de Deus, visitou a Ucr�nia em setembro de 2021 e celebrou culto em Kiev (foto: Divulga��o/Universal)

Para o pesquisador, o trabalho de caridade dessas entidades junto a refugiados � uma forma de atra�-los para as igrejas.

"A partir do momento que essas pessoas s�o acolhidas, elas passam a perceber que uma igreja como a Iurd pode oferecer maiores possibilidades para ela: de conseguir emprego, aconselhamento jur�dico, psicol�gico e emocional", afirma.

"Num primeiro momento, esse apoio vai vir de forma gratuita", diz o pesquisador, "mas as pessoas percebem que, se n�o se converterem e abra�arem a doutrina, v�o ficar de fora dessa rede de apoio e prote��o".

A convers�o � facilitada, segundo ele, pela fragilidade emocional dos refugiados.

"O impacto psicol�gico, os traumas, a desumaniza��o que um conflito violento provoca nas pessoas gera maior abertura � possibilidade de convers�o e de contato com novas denomina��es religiosas", afirma.

O trabalho caritativo tamb�m tem a fun��o, segundo o pesquisador, de melhorar a imagem de igrejas evang�licas brasileiras entre os europeus.


Pessoas aglomeradas em barco de pesca
Refugiados do Oriente M�dio resgatados na costa da It�lia, em 2021; conflitos armados e pobreza for�aram muitos a migrar para a Europa nos �ltimos anos (foto: EPA)

'Oportunidade de miss�es'

Alguns grupos mission�rios dizem abertamente que a crise de refugiados na Europa � uma oportunidade para a evangeliza��o.

Em artigo publicado em 2017 no site do Movimento de Lausanne, que busca conectar mission�rios mundo afora, o te�logo indiano Sam George questiona: "Ser� que Deus est� renovando a Europa atrav�s dos refugiados?"

George descreve uma viagem recente � Gr�cia e � Alemanha, onde diz ter presenciado centenas de convers�es de pessoas que fugiram da guerra na S�ria.

"Somente Deus poderia ter transformado uma situa��o t�o desesperadora em tamanha oportunidade de miss�es", afirma.

J� o comando da Igreja Cat�lica, maior entidade crist� do mundo, tem buscado tra�ar uma linha entre sua assist�ncia a refugiados e a incorpora��o de novos fi�is.

Em discurso no Dia Mundial de Imigrantes e Refugiados, em 2016, o papa Francisco disse que "n�o � correto convencer algu�m sobre sua f�" e que o "proselitismo � o veneno mais forte no caminho do ecumenismo".


Homens diante de caminhão com mantimentos
Mantimentos arrecadados pela Igreja Universal em Portugal foram entregues a refugiados ucranianos (foto: Divulga��o)

Questionada pela BBC sobre sua a��o junto a refugiados ucranianos, a Universal disse em nota que "n�o trabalha para aumentar o n�mero de seguidores, membros, fi�is".

"Ela (Universal) prega o Evangelho da Salva��o, obedecendo � B�blia Sagrada, com o objetivo de salvar almas para o Reino dos C�us. O prop�sito n�o � aumentar o n�mero de templos. Muito menos buscar crescimento em determinado pa�s em tempo de guerra", afirmou a entidade.

A Universal disse ainda que, "apenas em 2021, os 17 programas sociais mantidos pela Igreja beneficiaram 12,6 milh�es de pessoas no Brasil e em mais 115 pa�ses, tais como detentos, refugiados, viciados, pessoas em situa��o de rua, jovens abrigados, idosos, menores em institui��es socioeducativas e adultos analfabetos".

E se a R�ssia ganhar?

Para algumas correntes mission�rias, o papel da Ucr�nia na expans�o do cristianismo evang�lico pela Europa seria amea�ado se o pa�s liderado por Vladimir Putin vencer o conflito.

Em entrevista ao jornal Gazeta do Povo em abril, o ucraniano Anatoliy Shmilikhovskyy, pastor da Igreja Batista Central em Lviv, diz que uma vit�ria russa faria a Ucr�nia mergulhar no "mundo russo", o que provocaria uma "limita��o das atividades mission�rias e evangel�sticas".

A legisla��o na R�ssia trata todas as religi�es como iguais e pro�be a interfer�ncia do governo no setor. Na pr�tica, no entanto, mission�rios afirmam que as regras r�gidas para o registro de igrejas na R�ssia dificultam a liberdade religiosa.

H� ainda igrejas que foram banidas da R�ssia por serem tratadas como "seitas" pelo governo.


Sacerdotes com indumentária cristã ortodoxa
O patriarca Kirill (� esq.), representante m�ximo da Igreja Ortodoxa Russa, disse apoiar a invas�o da Ucr�nia para frear o avan�o de bandeiras LGBTQIA+ no pa�s (foto: AFP)

Em debate recente no canal Alian�a Miss�es na Europa, pastores brasileiros citaram o caso das Testemunhas de Jeov�, grupo religioso que desde 2017 � considerado ilegal na R�ssia.

Mission�rios disseram ainda que o governo russo acompanha de perto as atividades das igrejas evang�licas que operam no pa�s. Leialdo Pulz, pastor brasileiro que atua na R�ssia, disse na transmiss�o que "existem pessoas dentro das igrejas que est�o l� (nos) observando, s�o espi�es".

Alguns mission�rios usam ainda argumentos religiosos para se contrapor � R�ssia no conflito.

Em v�deo no canal de m�sica gospel brasileira WillSong, que tem 776 mil seguidores no YouTube, o pastor ucraniano Anatoliy Shmilikhovskyy afirma que Putin "� cercado por pessoas demon�acas".

"Ao redor dele, h� pessoas xam�s, como chamamos aqui, e eles gostam muito de n�meros", diz o pastor, citando o fato de que a R�ssia iniciou a guerra da Ge�rgia em 08/08/08 e a da Ucr�nia, em 22/02/22.

Neutralidade na guerra

Por�m, diferentemente de outras igrejas evang�licas, e ainda que seja a maior denomina��o brasileira na Ucr�nia, a Universal n�o assumiu nenhum lado no conflito com a R�ssia.

O antrop�logo Marcos de Ara�jo Silva, que j� pesquisou a a��o da Universal na R�ssia, cita dois poss�veis motivos para a atitude. O primeiro seria o receio de prejudicar as opera��es da Iurd na R�ssia, onde a igreja tem uma licen�a do governo russo para atuar e gerencia quatro templos.

O segundo seria uma afinidade da Universal com a R�ssia num dos campos onde a guerra tem sido travada: o dos costumes.

Nessa frente, diz Silva, a posi��o da Igreja Ortodoxa Russa, que defende a invas�o da Ucr�nia, tem grande peso. O patriarca Kirill, representante m�ximo da igreja, disse que a guerra ajudaria a combater o avan�o na Ucr�nia de bandeiras que ele considera anti-religiosas, como os direitos LGBTQIA+.

Como a Universal tamb�m contesta essas bandeiras, e para n�o arriscar sua posi��o na R�ssia, a neutralidade se mostrou a melhor op��o para a igreja brasileira, diz o pesquisador.

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