A AFP entrevistou tr�s membros de comunidades ind�genas: uma artista, um l�der comunit�rio e um ex-aluno de um dos internatos onde as crian�as sofreram a pol�tica de assimila��o que os isolava de suas fam�lias, l�ngua e cultura.
A seguir, um resumo dessas conversas:
- "Sentimentos mistos" -
Cantora, compositora e ativista da comunidade Salluit Inuk, no extremo-norte, Elisapie Isaac se tornou uma voz para seu povo.
"Tenho sentimentos mistos sobre a chegada do papa", diz a cantora de 45 anos, que recentemente fez um apelo ao primeiro-ministro de Qu�bec, Fran�ois Legault, nas redes sociais para que reconhe�a o "racismo sist�mico" nessa prov�ncia canadense.
"Digo a mim mesma que deve ser bom para os sobreviventes sentir que h� a��o, saber que algo est� por vir. Mas tamb�m digo a mim mesma que os devotos provavelmente foram os piores para os nativos", afirmou, acrescentando que "� muito f�cil" se desculpar agora, d�cadas depois do ocorrido.
"Ainda sofremos muito pelos traumas, que passam de gera��o para gera��o", garantiu a artista, que hoje mora em Montreal e se mostra encantada ao ver que hoje as pessoas querem aprender e entender a hist�ria ind�gena.
Para Isaac, � o momento de institui��es como a Igreja Cat�lica fazerem sua parte, caso contr�rio "� muito dif�cil avan�ar como sociedade e conviver, sentir que h� equil�brio e harmonia".
- "Um longo caminho" -
Wilton 'Willie' Littlechild comemorou seu 78� anivers�rio em 1� de abril de 2022, no mesmo dia em que ele e uma delega��o ind�gena se encontraram com Francisco em Roma. Na reuni�o, o pont�fice se desculpou e prometeu repetir o pedido no Canad�.
"N�o poderia ter recebido um presente de anivers�rio melhor", diz Littlechild, que passou 14 anos em um dos internatos, desde os 6 anos.
Durante viagens ao Vaticano, convidaram o papa a ir ao Canad� e pedir desculpas, pessoalmente, � sua popula��o ind�gena de mais de 1,6 milh�o de pessoas. Deste total, quase um ter�o se identifica como cat�licos romanos.
"Para curar (...) precisamos de um pedido de desculpa", declarou � AFP.
Ao longo de sua vida, Littlechild trabalhou incansavelmente pelas comunidades nativas, inclusive nas Na��es Unidas, onde participou da elabora��o da Declara��o da ONU sobre os Direitos dos Povos Ind�genas.
O homem afirma que sobreviveu � sua educa��o no internato por meio dos estudos e esportes.
"O esporte salvou minha vida, o h�quei salvou minha vida", enfatiza, lembrando de sa�das noturnas para tentar esquecer o abuso.
E, por fim, "eu perdoei".
- "Definitivamente n�o � o fim" -
Billy Morin, l�der da Na��o Enoch Cree, uma comunidade ind�gena perto de Edmonton, de cerca de 2.700 habitantes, diz estar "esperan�oso" de que a visita de Francisco ajude a curar as feridas deixadas pela fracassada pol�tica governamental de assimila��o for�ada pela educa��o.
"Nem todos querem que o papa se desculpe. Eles n�o se importam", afirmou.
"Mas, para muitos idosos, � um momento de desfecho (...) um momento de cura, um momento de celebra��o, um momento de reflex�o".
Aos 35 anos, Morin se mostrou grato por ter evitado ser enviado para um internato, como fizeram com seus av�s.
Mas, assim como muitos povos ind�genas do Canad�, n�o escapou desse legado doloroso, que deixou um trauma intergeracional, muitas vezes manifestado em alcoolismo e distanciamento emocional, que continua afetando sua fam�lia e comunidade.
"Nossos av�s e meus pais tiveram que reaprender a ser bons pais", disse esse pai de quatro filhos, que somente agora est� aprendendo a l�ngua que acredita ser de seus antepassados.
Morin considera a visita de Francisco "uma coisa boa (...) porque, se n�o fizesse isso, este assunto estaria sempre pendente".
Este � apenas "um passo" em uma "jornada de cura", afirmou. "Definitivamente n�o � o fim".
MONTREAL