Para alguns, um vision�rio, para outros, "criminoso de guerra", o "s�bio" com uma silhueta encurvada, mas ainda reconhec�vel por seus �culos de arma��o escura e aros grossos, continua ativo.
Na ter�a-feira, o ex-chefe da diplomacia americana participou de uma homenagem no seleto Clube Econ�mico de Nova York, onde soprou as velas de um bolo de chocolate por seu 100� anivers�rio.
Suas apari��es p�blicas se tornaram mais escassas ao longo dos anos, mas mais frequentes por videoconfer�ncia, como fez em Davos, em janeiro deste ano. Mas, para Kissinger, que deixou sua marca na pol�tica externa dos Estados Unidos na segunda metade do s�culo XX, sua longevidade � excepcional.
De seus escrit�rios em Nova York e de sua consultoria Kissinger Associates, ele conserva uma relativa aura entre a elite de Washington e do exterior, mesmo entre democratas, como a ex-secret�ria de Estado Hillary Clinton, que um dia disse "confiar nos conselhos" de seu "amigo".
- 'Realpolitik' -
Ator essencial da diplomacia mundial durante a Guerra Fria, este ganhador do Pr�mio Nobel da Paz iniciou as aproxima��es com Moscou e Pequim na d�cada de 1970, com uma vis�o pragm�tica do mundo, uma esp�cie de "Realpolitik" � americana.
Em um sinal de que sua vis�o do mundo quase n�o mudou, na ter�a-feira, diante de seus convidados, ele estimou que os Estados Unidos devem defender seus "interesses vitais".
"Temos que ser mais fortes para resistir a qualquer press�o", disse ele.
Isso vale, inclusive, para a guerra na Ucr�nia, tema no qual defende um cessar-fogo.
"Chegamos a um ponto em que alcan�amos nosso objetivo estrat�gico. A tentativa militar da R�ssia de absorver a Ucr�nia fracassou", afirmou.
Mas a imagem do homem de voz �spera e forte sotaque herdado de suas origens alem�s permanece manchada e ligada �s p�ginas obscuras da hist�ria dos Estados Unidos, como o apoio ao golpe de 1973 no Chile, ou a invas�o do Timor Leste em 1975, e, claro, o Vietn�.
"Para mim, n�o h� d�vida de que suas pol�ticas causaram centenas de milhares de mortes e destru�ram a democracia em v�rios pa�ses", destacou o advogado de direitos humanos Reed Kalman Brody.
"Me surpreende que tenha sa�do impune", completou.
- Bombardeios -
De fato, Kissinger nunca se preocupou com a Justi�a. Em 2004, por exemplo, um processo foi arquivado.
Uma investiga��o publicada na quarta-feira (24) no site do The Intercept afirma, com base em documentos de arquivo do Pent�gono e testemunhos de sobreviventes, que a campanha de bombardeio dos EUA no Camboja entre 1969 e 1973, pela qual Kissinger foi respons�vel, foi amplamente subestimada, tendo causado muito mais mortes de civis do que previamente admitido.
O historiador Muntassir Mamoon, da Universidade de Dacca, em Bangladesh, observou que Kissinger "apoiou ativamente o genoc�dio" naquele pa�s em 1971.
"N�o vejo qualquer raz�o para elogiar Kissinger", disse ele, acrescentando que seu ponto de vista � compartilhado em v�rios pa�ses, incluindo o Vietn�.
"A ironia � que se lembra que ele fez a paz, mas se esquece tudo o que fez para prolongar a guerra n�o apenas no Vietn�, mas tamb�m no Camboja e no Laos", acrescenta a historiadora Carolyn Eisenberg, da Universidade Hofstra, nos Estados Unidos.
- Distens�o -
Heinz Alfred Kissinger nasceu em 27 de maio de 1923 em F�rth, na Baviera, Alemanha. Aos 15 anos, refugiou-se nos Estados Unidos com sua fam�lia, antes de se naturalizar americano aos 20. Filho de um professor, ingressou na contraespionagem militar e no Ex�rcito dos Estados Unidos antes de iniciar uma carreira brilhante em Harvard, onde tamb�m foi professor.
Ele se imp�s como a face da diplomacia mundial, quando o republicano Richard Nixon chamou-o para a Casa Branca em 1969 para ser conselheiro de Seguran�a Nacional, e depois secret�rio de Estado - ambos os cargos entre 1973 e 1975. Continuou sendo o chefe da diplomacia na presid�ncia de Gerald Ford at� 1977.
� nesse momento que ele inicia a distens�o com a Uni�o Sovi�tica e o degelo das rela��es com a China de Mao e faz viagens secretas para organizar a hist�rica visita de Nixon a Pequim, em 1972.
Com o m�ximo sigilo, lan�a, ao mesmo tempo, o bombardeio sobre Han�i, as negocia��es com Le Duc Tho para p�r fim � Guerra do Vietn�.
A assinatura de um cessar-fogo com o Vietn� do Norte rendeu-lhe o Pr�mio Nobel da Paz em 1973, um das distin��es mais pol�micas da hist�ria.
WASHINGTON