O corpo do parente nunca foi encontrado e as circunst�ncias precisas de sua morte continuam sendo um mist�rio. Mas Kim est� convencida: "o mataram apenas porque era coreano".
"D�i na alma que o Jap�o nunca tenha pedido desculpas oficialmente por este massacre, em grande parte escondido", declarou � AFP a mulher, filha de migrantes coreanos que chegaram ao Jap�o h� um s�culo. "Quero que o governo pe�a perd�o".
Em 1� de setembro de 1923, um terremoto de 7,9 graus de magnitude devastou a plan�cie de Kanto, onde fica a capital japonesa, naquela �poca densamente povoada e composta essencialmente por constru��es de madeira.
Inc�ndios gigantescos, ati�ados pelos fortes ventos, agravaram consideravelmente o n�mero de v�timas da cat�strofe (105.000 mortos). O p�nico dominou os moradores e as autoridades expressaram o temor de que a situa��o resultasse em dist�rbios.
Rapidamente foram propagados boatos de que os coreanos estavam tentando aproveitar o caos para roubar, incendiar, matar japoneses e, inclusive, dar um golpe de Estado. Estimuladas pelas autoridades, mil�cias de cidad�os armados com lan�as de bambu, sabres e barras de gelo foram criadas. A ca�a aos coreanos come�ava.
A Coreia era uma col�nia japonesa desde 1910. Os migrantes deste pa�s eram odiados pela classe oper�ria japonesa, que considerava o grupo uma m�o de obra "barata". E os estudantes coreanos em T�quio eram vistos pelo governo como independentistas "perigosos", explica Kenji Hasegawa, professor de Hist�ria Moderna Japonesa na Universidade nacional de Yokohama.
- "Papel central" do Estado -
O balan�o do massacre � impreciso, pois o Estado nip�nico nunca investigou seriamente os fatos.
Poucos meses ap�s a trag�dia, o governo anunciou centenas de mortos. "Mas os investigadores consideram amplamente uma estimativa de v�rios milhares", afirma � AFP Tessa Morris-Suzuki, professora em�rita de Hist�ria Japonesa na Universidade Nacional Australiana.
"Muitos depoimentos ouvidos pouco depois dos fatos mostram que a pol�cia e o ex�rcito participaram no massacre", conta.
"Muitos migrantes chineses tamb�m foram assassinados no epis�dio, que durou v�rios dias", destaca Hasegawa.
Masao Nishizaki, 61 anos, caminha �s margens do rio Arakawa, no bairro da zona leste de T�quio em que mora. De repente, ele para: "� aqui".
No local, em 1923, existia uma ponte na qual homens armados controlavam a presen�a dos moradores que desejavam atravessar para o outro lado do rio e fugir dos inc�ndios provocados pelo terremoto, explica Nishizaki.
Aqueles que eram identificados como coreanos eram assassinados no local, com os corpos sendo "amontoados como se fossem madeira", conta Nishizaki, diretor da associa��o Housenka, que tenta preservar a mem�ria do massacre.
Ningu�m sabe de onde partiram os primeiros boatos sobre os coreanos. Mas o "papel central" do Estado em sua divulga��o � "consenso" entre os historiadores h� d�cadas, ressalta Hasegawa.
Al�m da amea�a te�rica que alguns coreanos rebeldes representavam para o Estado, as autoridades buscavam, em particular, "controlar as multid�es" de afetados pelo terremoto e inc�ndios, mobilizando os japoneses contra um inimigo fantasma, afirma o pesquisador.
- Um revisionismo tenaz -
Depois do banho de sangue, o governo rejeito qualquer responsabilidade e organizou uma campanha para "dar a impress�o" de que os coreanos realmente cometeram crimes e, assim, legitimar os rumores e suas tr�gicas consequ�ncias, aponta Hasegawa.
Atualmente, a grande imprensa e os livros escolares limitam-se a indicar que alguns "boatos" desencadearam o massacre, sem questionar a atua��o do Estado.
Para agradar sua base eleitoral nacionalista, a governadora de T�quio, Yuriko Koike, considerou politicamente vantajoso afirmar que as circunst�ncias do massacre foram controversas e que a melhor decis�o era homenagear todas as v�timas das trag�dias de 1923, sem estabelecer qualquer tipo de diferen�a.
Uma forma de "apagar" a mem�ria do massacre e "gerar uma d�vida" sobre sua autenticidade, denuncia Hasegawa.
O Jap�o � acusado com frequ�ncia de revisar seu violento passado militarista na �sia na primeira metade do s�culo XX.
"O risco de que algum dia os mesmos erros sejam repetidos continuar� existindo se n�o aprendermos com as li��es da Hist�ria", alerta Nishizaki.
T�QUIO