Berenice, de 32 anos, e Victoria, de 30, n�o se conhecem, mas t�m muito em comum. Ambas sofreram viol�ncia de g�nero, uma praga neste pa�s, onde diariamente s�o mortas, em m�dia, dez mulheres.
Desafiando a entranhada cultura machista, elas tiveram que lutar para educar os filhos, fazendo trabalhos antes considerados masculinos: Berenice conserta encanamentos e Victoria fabrica m�veis.
No M�xico, as mulheres conquistam cada vez mais protagonismo, ao ponto de que, pela primeira vez na Hist�ria, duas delas v�o disputar a Presid�ncia nas elei��es de 2 de junho de 2024.
O partido governista de esquerda Morena nomeou candidata na �ltima quarta-feira a ex-prefeita da Cidade do M�xico Claudia Sheinbaum, uma f�sica de 61 anos, que venceu cinco consultas, por ampla margem, seus cinco oponentes homens.
Enquanto isso, a senadora de centro direita X�chitl G�lvez, uma empres�ria de 60 anos, foi escolhida no domingo passado a candidata de uma coaliz�o opositora, deixando pelo caminho outra mulher e dois homens.
Para Berenice Aparicio, m�e de um menino e de uma adolescente, o panorama � de esperan�a.
"Ainda h� machismo no M�xico, ent�o eu acho que talvez uma mulher presidente pensaria mais como mulher, ou (em) tudo o que uma mulher sofre e faria uma mudan�a", comenta, maquiada e com os cabelos pretos presos, enquanto troca um sanit�rio no centro da capital.
Ela viveu anos com um homem que a agredia fisicamente por ci�mes e a fazia acreditar que sozinha "n�o ia conseguir" sobreviver, at� que decidiu ser encanadora, um of�cio aprendido ainda adolescente com seus tios.
J� Victoria Gonz�lez, m�e de dois meninos e que prefere ser chamada de Mallory Knox, considera que os partidos est�o se aproveitando da for�a dos movimentos feministas para obter votos.
"Acho que � um pouquinho conveniente que justamente agora, com todo o auge do feminismo, haja uma mulher presidente", ironiza Mallory, enquanto lustra superf�cies de madeira no ateli� de seu pai no violento bairro de Chalco, periferia da capital. Mallory tamb�m ensina seu of�cio a outras mulheres para que elas tenham independ�ncia.
No gabinete do presidente Andr�s Manuel L�pez Obrador, dos 19 ministros nove s�o mulheres, entre elas Rosa Icela Rodr�guez e Luisa Mar�a Alcalde, titulares das secretarias de Seguran�a P�blica e Governo (Interior).
As mulheres s�o 39% do total de funcion�rios e diretores do setor p�blico e privado no M�xico, inclu�das a presidente da Suprema Corte de Justi�a, Norma Pi�a, e a do �rg�o eleitoral, Guadalupe Taddei.
Mas assim como a viol�ncia do narcotr�fico, os feminic�dios n�o cessam. De janeiro a junho, 1.516 mulheres foram assassinadas, e destes casos, cerca de 500 s�o investigados como feminic�dios, segundo o governo.
- Utopia -
Filha de uma empregada dom�stica e de um vendedor de tacos, que agora administra seu neg�cio de artigos de encanamento, Berenice faz parte do Plomeras en Acci�n (Encanadoras em A��o), uma organiza��o na qual, al�m de se atualizar sobre seu of�cio, aprende a lidar com os atos cotidianos de discrimina��o.
"Muitas pessoas pensam que � preciso fazer muita for�a e que, por isso, uma mulher n�o seria boa para este trabalho", comenta em sua casa pequena, onde ela dorme em uma beliche com os filhos.
Em cerca ocasi�o, um homem a desafiou pelas redes sociais a "uma luta de boxe", dizendo: "'Se voc� pode ser encanadora, tamb�m pode lutar'", relata esta mulher de voz suave.
Portanto, ela considera que uma mulher na Presid�ncia faria "o pa�s avan�ar".
No atelit� de carpintaria do pai, Mallory ouve uma m�sica do Tri, a renomada banda de rock que critica ferrenhamente a pol�tica mexicana.
"Vivi da viol�ncia sexual" � "viol�ncia econ�mica quando fui casada com um homem", conta.
"Agora, tenho vivido a viol�ncia j� me nomeando (identificando) como mulher l�sbica, sendo m�e" e "discrimina��o" por ser carpinteira h� quatro anos, relata.
Para ela, uma mudan�a social n�o depende "de que seja uma mulher ou um homem" quem governe.
"Seria como um sonho, algo muito ut�pico, que uma mulher pudesse mudar nossos passos (...) Somos talvez n�s que vamos mudando tudo em nossa passagem", refor�a.
M�XICO