
O atual confronto entre Israel e Hamas j� deixou cerca de 4 mil pessoas mortas - de 1,4 mil israelenses e mais de 3,3 mil palestinos.
Enquanto Israel prepara uma invas�o da Faixa de Gaza por terra, o mundo se pergunta se o conflito pode ultrapassar as fronteiras de Israel e dos territ�rios palestinos e se transformar em uma guerra de maiores propor��es.
Analistas consultados pela BBC News Brasil afirmam que � dif�cil fazer previs�es em um contexto t�o vol�til. Mas a maior parte disse acreditar que o envolvimento de outras na��es e grupos neste momento � improv�vel, apesar de temores em rela��o ao grupo isl�mico liban�s Hezbollah no L�bano que conta com apoio do Ir�. Por outro lado, com a��es como o envio de dois porta-avi�es para o Mediterr�neo, os Estados Unidos reiteram seu apoio militar a Israel.
Para a cientista pol�tica Leila Farsakh, da Universidade de Massachusetts Boston, os acontecimentos dos �ltimos dias est� "mudando profundamente" a vis�o do mundo sobre poss�veis solu��es para o conflito de d�cadas entre Israel e Palestina.
"Esse confronto definitivamente ter� grandes repercuss�es em Israel, bem como no resto da regi�o", diz a especialista palestina nascida na Jord�nia. "Mas isso n�o significa que haver� uma guerra regional."
"N�o creio que qualquer um dos pa�ses tenha apetite para mais uma guerra."
J� Daniel Rio Tinto, professor de Rela��es Internacionais da Funda��o Get�lio Vargas (FGV), afirma que qualquer conflito de grandes propor��es no Oriente M�dio pode acabar al�m das fronteiras das na��es diretamente envolvidas, ainda que o cen�rio atual n�o aponte para essa dire��o.
"No Oriente M�dio, que � uma regi�o que j� tem uma s�rie de din�micas pol�ticas e de seguran�a bastante complicadas, qualquer conflito que n�o seja suficientemente pontual ou contido pode acabar afetando outros pa�ses", diz o especialista em conflitos intraestatais.Para Ahron Bregman, ex-major do Ex�rcito israelense e professor do King's College de Londres, o pior cen�rio seria a entrada, no conflito, do poderoso Hezbollah.
"A preocupa��o � que o Hezbollah possa se juntar � guerra, seja intencionalmente - com o incentivo do seu protetor, o Ir� - ou devido a um erro de c�lculo", diz.
Segundo o especialista em seguran�a, que serviu na Guerra do L�bano de 1982, esse risco � real na regi�o. "Se o Hezbollah acreditar - com ou sem raz�o - que Israel est� prestes a atac�-lo, poder� tentar se antecipar, atacando primeiro."
'A pergunta de um milh�o de d�lares'
O envolvimento do Hezbollah se torna mais prov�vel � medida que os cresce o n�mero de mortos na Faixa de Gaza.
Para Bregman, "a pergunta de um milh�o de d�lares no momento � se haver� uma guerra entre Israel e Hezbollah".
Segundo o especialista, um confronto direto entre os dois inimigos poderia ser "devastador" para ambos os lados.
"O Hezbollah tem mais de 150 mil m�sseis e foguetes que alcan�am todo o territ�rio israelense e est�o armados at� os dentes. E Israel reagir� com muita for�a".
Rashmi Singh, professora de Rela��es Internacionais da PUC Minas com mais de 20 anos de experi�ncia em terrorismo e contra-terrorismo, afirma ainda que o grupo liban�s "tem uma capacidade muito maior do que Hamas, al�m de uma �rea de influ�ncia mais extensa".
A lideran�a do Hezbollah diz contar com 100 mil combatentes, embora estimativas independentes indiquem um n�mero menor, entre 20 mil e 50 mil pessoas. Muitos, no entanto, tiveram intensa experi�ncia de conflito na guerra civil da S�ria. Israel conta com um ex�rcito muito mais poderoso e numeroso, de 300 mil pessoas, mas um importante risco aqui vem da liga��o do Hezbollah com outros pa�ses.
"Se o Hezbollah se envolver, outros dois atores podem ser arrastados tamb�m: S�ria e Ir�", diz a especialista de origem indiana.
Al�m de ter la�os com o Hamas, o grupo tamb�m � aliado desses dois pa�ses, que em diversas ocasi�es apoiaram a causa palestina e se posicionaram contra Israel.
A alian�a entre S�ria, Ir�, Hamas e Hezbollah � apelidada de Eixo da Resist�ncia e constitui basicamente uma uni�o anti-Israel e anti-ocidental na regi�o.
O Hezbollah inclusive surgiu com apoio financeiro do Ir� no come�o dos anos 1980, e come�ou uma campanha para expulsar tropas israelenses do L�bano.
A hostilidade em rela��o a Israel continuou a ser a principal plataforma do grupo mesmo depois de maio de 2000, quando as �ltimas tropas israelenses deixaram o L�bano, devido, em parte, ao sucesso do bra�o armado do Hezbollah - a Resist�ncia Isl�mica.
O Hezbollah tamb�m tem seu bra�o pol�tico, um partido, e est� representado no Parlamento liban�s, onde � uma das principais for�as.
Desde que o conflito atual come�ou, o grupo tem trocado disparos de m�sseis e foguetes contra Israel, em um confronto que j� � classificado por alguns como o mais grave na fronteira em 17 anos.
A escalada nas hostilidades levou o governo israelense a evacuar 28 comunidades perto de sua fronteira norte.
Segundo Daniel Rio Tinto, da FGV, a proximidade geogr�fica e o hist�rico de confrontos com Israel tornam o L�bano "a �rea de maior preocupa��o nesse momento".

J� Vitelio Brustolin, professor de Rela��es Internacionais da Universidade Federal Fluminense (UFF), acredita que as hostilidades na fronteira do norte de Israel dos �ltimos dias n�o passam de "escaramu�as ou provoca��es".
"O Hezbollah n�o tem capacidade militar para enfrentar Israel no campo aberto e por isso � dif�cil acreditar que eles come�ariam um confronto agora, quando o Ex�rcito israelense j� est� com a guarda alta, deslocou for�as para o norte e convocou reservistas", diz.
"O que o grupo poderia fazer � atrair as for�as israelenses para um ambiente de guerrilha urbana que j� os favoreceu no passado e em que poderiam usar destro�os de pr�dios, snipers e t�neis a seu favor."
"Mas acho uma escalada nesse momento bastante improv�vel, ainda que n�o imposs�vel", avalia Brustolin.
Sobre o tema, o ministro da Defesa israelense, Yoav Gallant, afirmou que o pa�s “n�o tinha interesse” em uma guerra com o grupo.
"Se o Hezbollah escolher o caminho da guerra, pagar� um pre�o muito alto. Muito pesado. Mas se o grupo se contiver, respeitaremos isso e manteremos a situa��o como est�”, disse.
J� o governo do L�bano disse n�o apoiar os ataques - at� porque o pa�s, que enfrenta uma de suas piores crises econ�micas, n�o conseguiria arcar com os custos de uma nova guerra.
'Eixo da Resist�ncia'
Segundo os especialistas, n�o � poss�vel falar sobre um conflito envolvendo o Hamas e o Hezbollah sem levar em conta a participa��o do Ir�.
O pa�s apoia os dois grupos e fornece financiamento, armas e treinamento para a organiza��o que atua na Faixa de Gaza.
Uma reportagem do jornal The Wall Street Journal cita fontes an�nimas do Hamas e do Hezbollah que dizem que o Ir� deu sinal verde para o ataque do dia 7 de outubro contra Israel.
Mas embora os l�deres do Ir� tenham celebrado e elogiado os ataques, eles foram r�pidos a negar o envolvimento do pa�s.
"As acusa��es ligadas ao papel do Ir� se baseiam em raz�es pol�ticas", afirmou Hossein Amir-Abdollahian, ministro das Rela��es Exteriores do Ir�, logo ap�s a incurs�o.
J� Ghazi Hamad, porta-voz do Hamas, disse � BBC na ocasi�o que o grupo teve apoio direto do Ir� para o ataque.
Segundo ele, o pa�s se comprometeu a "apoiar os combatentes palestinos at� a liberta��o da Palestina e de Jerusal�m".
Os Estados Unidos tamb�m disseram n�o ter identificado provas da participa��o direta do Ir� na incurs�o em Israel.

Mais recentemente, por�m, o Ir� tem falado repetidamente sobre o risco de uma escalada na guerra.
Na ter�a-feira (17/10), o ministro de Rela��es Exteriores do pa�s, Hossein Amirabdollahian, disse que o Eixo da Resist�ncia poderia dar andamento a uma “a��o preventiva” se os “crimes de guerra de Israel contra os palestinos” em Gaza n�o parassem.
A autoridade n�o detalhou qual seria a a��o tomada, mas a declara��o aumentou os temores de que a guerra possa respingar em outros pa�ses.
Por�m, segundo analistas consultados pela BBC Brasil, um envolvimento direto do Ir� no confronto � bastante improv�vel.
"O Ir� est� interessado em se posicionar como defensor do povo palestino, mas n�o quer uma guerra", diz Leila Farsakh. "Principalmente porque um de seus maiores objetivos no momento � diminuir as san��es impostas contra ele e manter o di�logo com os EUA".
Os especialistas afirmam ainda que o pa�s tampouco possui capacidade militar para enfrentar um conflito como esse sozinho, sem o aux�lio de outras na��es como R�ssia e China - algo que ele classifica como muito improv�vel.
"O Ir� n�o vai entrar na guerra diretamente - mas os iranianos s�o muito bons em usar outros para lutar por eles e seus interesses", diz Ahron Bregman, em refer�ncia ao apoio fornecido pelo pa�s ao Hamas e o Hezbollah.
Tamb�m seria improv�vel que outros aliados ou membros do chamado Eixo da Resist�ncia se envolvessem militarmente no confronto, avalia Farsakh.
"A S�ria, em especial, n�o tem condi��es para entrar em um novo conflito, pois ainda est� se recuperando da sua pr�pria guerra", diz a especialista da Universidade de Massachusetts Boston.
"O regime s�rio provavelmente se aliar� com qualquer posi��o tomada pelo Hezbollah e pelo Ir�, mas confiar� neles para tomar as a��es."
O xadrez do Oriente M�dio
Al�m de Ir�, L�bano e S�ria, outros pa�ses do Oriente M�dio fazem parte do xadrez geopol�tico movimentado pelo confronto entre Hamas e Israel. Isso, por�m, n�o significa que tenham qualquer interesse em se envolver nos combates.
� o caso, por exemplo, da Ar�bia Saudita. Historicamente, o pa�s � um do maiores defensores da causa palestina, mas recentemente tem se aproximado de Israel.
Antes do conflito atual, a na��o �rabe estava prestes a assinar um acordo de paz e estabelecer rela��es diplom�ticas com Israel, em uma aproxima��o patrocinada pelo governo americano.
No contexto atual, por�m, especialistas afirmam que o pacto pode demorar mais - e que, inclusive, um dos objetivos do Hamas com seu ataque era prejudicar as negocia��es.
O governo da Ar�bia Saudita tem condenado as a��es israelenses das �ltimas semanas.
Vitelio Brustolin, por�m, afirma acreditar que as conversas para um acordo devem ser retomadas quando tudo se acalmar.
"A aproxima��o da Ar�bia Saudita com Israel interessa sobretudo � Ar�bia Saudita, porque ela colocou como condi��o para essa aproxima��o o apoio dos Estados Unidos a seu programa nuclear", diz.
O Egito, por sua vez, h� muito tempo desempenha um papel de mediador, n�o somente entre Israel e os palestinos, mas tamb�m entre as pr�prias principais fac��es palestinas.
Foi o primeiro Estado �rabe a fazer a paz com Israel em 1978 – depois de travar v�rias guerras com o vizinho.
Agora, o foco est� no controle do pa�s sobre uma das duas rotas terrestres que saem da Faixa de Gaza – a passagem de Rafah.
Milhares de palestinos aguardam no lado de Gaza da fronteira, enquanto centenas de caminh�es que transportam ajuda necess�ria est�o estacionados no lado eg�pcio. Muitos outros comboios de ajuda tamb�m se dirigem para a fronteira. Mas ainda n�o houve acordo sobre a abertura da passagem.
Muitos eg�pcios ainda preservam na mem�ria as imagens de 2008, quando habitantes de Gaza invadiram a passagem de Rafah em busca de alimentos e mantimentos ap�s um bloqueio de meses.
Nesse sentido, o presidente eg�pcio, Abdel Fattah al-Sisi, insiste que sua responsabilidade maior � com a seguran�a nacional, apelando aos habitantes de Gaza para que permane�am "firmes e em seu territ�rio".

Ao mesmo tempo, Cairo intensificou os esfor�os diplom�ticos para evitar uma nova escalada no conflito. Em telefonemas com hom�logos e autoridades regionais e europeias, Sisi alertou para os perigos da “aus�ncia de perspectivas pol�ticas” para resolver o conflito e para os riscos de desestabiliza��o da regi�o caso a viol�ncia continue.
Outro pa�s que vem contribuindo para os esfor�os de negocia��o � a Turquia. Vale lembrar que o Imp�rio Otomano, que � o ber�o da civiliza��o turca, ocupou parte da Faixa de Gaza e a Cisjord�nia at� 1917.
"O governo turco tem exercido um papel muito importante nos bastidores, tentando encontrar uma maneira de libertar todos os prisioneiros israelenses que o Hamas capturou", afirma Leila Farsakh.
Estima-se que cerca de 199 israelenses estejam nas m�os do Hamas atualmente, entre homens, mulheres, idosos e crian�as.
Com os ref�ns detidos em locais secretos em Gaza, o governo de Israel agora enfrenta uma situa��o delicada.
No s�bado (14/10), as For�as Armadas do pa�s anunciaram que se preparam para atacar Gaza por terra, ar e mar - e muitos temem pela seguran�a dos sequestrados.
Para al�m do Mediterr�neo
Os Estados Unidos tamb�m t�m desempenhado um papel importante no atual conflito - e segundo especialistas, podem ser cruciais para garantir que outras na��es n�o sejam atra�das para o confronto.
Aliado hist�rico de Israel, o pa�s tem pedido por um arrefecimento das tens�es. Mas segundo os analistas consultados pela BBC, a forma de atua��o mais eficiente dos EUA � por meio da dissuas�o estrat�gica. Isto �, sua capacidade de desaconselhar potenciais advers�rios de se envolver em um conflito no qual as for�as americanas certamente sairiam em defesa de Israel.
"Uma guerra do Ir� contra Israel, por exemplo, necessariamente envolveria os Estados Unidos. Ou seja, seria uma guerra contra a maior pot�ncia militar do mundo", explica Vitelio Brustolin, da UFF.
Desde que Israel foi atacado pelo Hamas, o Pent�gono enviou dois porta-avi�es para o leste do Mar Mediterr�neo.
O primeiro deles, USS Gerald R. Ford, chegou � costa israelense no in�cio desta semana. Agora, o grupo de ataque USS Dwight D. Eisenhower tamb�m se dirige para a regi�o.
O governo do presidente Joe Biden deixou claro que os navios e a for�a que os acompanha n�o est�o l� para se envolver em atividades de combate em nome de Israel, mas sim para dissuadir outros de entrar no conflito, incluindo o Hezbollah e o Ir�.
"Vou repetir: para qualquer pa�s, qualquer organiza��o, qualquer pessoa que pense em tirar vantagem desta situa��o, tenho uma palavra: n�o fa�a isso", alertou Biden em visita a Israel na quarta-feira (18/10).

Tamb�m por esse motivo, analistas n�o acreditam que outras pot�ncias mundiais, como R�ssia e China, se envolveriam no confronto apoiando seus aliados regionais.
Al�m disso, segundo Brustolin, os dois pa�ses tendem a priorizar seus pr�prios interesses acima dos de qualquer parceiro. "A China se beneficia muito de seu status econ�mico atual, n�o quer prejudicar sua estrat�gia de longo prazo nesse sentido", diz.
O analista aponta ainda que uma escalada no conflito poderia ser danosa para a economia mundial e o mercado de petr�leo.
"N�o interessa ao mundo uma guerra na regi�o porque por ali passa a maior parte do com�rcio global por via mar�tima, pelo Canal de Suez. E um conflito tamb�m tende a impactar o pre�o do petr�leo."
A R�ssia, por sua vez, est� profundamente vinculada no conflito Ucr�nia para abrir uma segunda frente de conflito. "Os russos est�o celebrando a distra��o da sua pr�pria guerra com a Ucr�nia", afirma Ahron Bregman, da King's College de Londres.