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Estado de Minas CORONAV�RUS NO BRASIL

Lockdown pode terminar em 'tiro e morte', diz prefeito de Manaus

Arthur Virg�lio Neto chora ao citar agress�es a coveiros e mortes, e recorre a Greta Thunberg: 'Terr�vel seria pirralho governando o pa�s'. Mortes na capital do Amazonas passaram da m�dia hist�rica de 20 a 30 por dia para o patamar de 120.


postado em 08/05/2020 14:21 / atualizado em 08/05/2020 18:58

Prefeito de Manaus diz que implementação de confinamento obrigatório pode levar a caos social na cidade(foto: BBC)
Prefeito de Manaus diz que implementa��o de confinamento obrigat�rio pode levar a caos social na cidade (foto: BBC)
O prefeito de Manaus, Arthur Virg�lio Neto (PSDB), foi �s l�grimas mais uma vez ao descrever a situa��o dram�tica enfrentada pela maior cidade da Amaz�nia em meio � pandemia do novo coronav�rus.

"Todo dia eu vejo mortes de pessoas que conhe�o", diz o tucano em entrevista � BBC News Brasil. "Isso s� n�o mexe com uma pessoa com o cora��o muito ruim: impot�ncia, falta de recursos, e morrendo gente, morrendo gente."

Ele prossegue, citando o epis�dio em que o filho de um homem que morreu pelo coronav�rus na capital amazonense atacou um dos profissionais respons�veis pelo enterro.

"O coveiro! O coveiro. Se tivesse que espancar, espancasse o governador, espancasse a mim. Mas o coveiro..."

Segundo ele, o n�mero de mortes na cidade passou da m�dia hist�rica de 20 a 30 enterros por dia para um pico de 140. "Agora estamos estabilizados em uma m�dia de 120, o que � muito."


O prefeito, no entanto, resiste � recomenda��o do Minist�rio P�blico do Estado de implementa��o de um lockdown (confinamento obrigat�rio), citando risco de caos social em Manaus.

"(Algu�m) joga uma pedra em algu�m, come�a um tiroteio com bala de borracha que pode cegar algu�m, come�a a rea��o das pessoas, que vivem uma situa��o de desespero. Algo que termina dando em tiro, dando em morte", avalia.

Na �ltima d�cada, as regi�es Norte e Nordeste se revezaram no topo entre as �reas mais violentas do Brasil. Segundo o Atlas da Viol�ncia do ano passado, feito com dados de 2017,
Manaus era a nona capital entre as l�deres em taxas de homic�dios no pa�s - no topo estava Fortaleza (CE), seguida de Rio Branco, Bel�m, Natal (RN), Salvador (BA), Macei� (AL), Recife (PE) e Aracaju (SE).

Por outro lado, cientistas em todo o mundo apontam o lockdown como medida eficaz e necess�ria para a conten��o da doen�a. Nesta semana, em meio ao processo de reabertura parcial em pa�ses como Alemanha e Espanha, a epidemiologista da Organiza��o Mundial da Sa�de Maria Van Kerkhove alertou para os riscos associados ao relaxamento. "Se as medidas de lockdown forem levantadas abruptamente, o v�rus pode decolar."

A entrevista acontece dias depois de Arthur Virg�lio enviar v�deos pedindo ajuda a personalidades internacionais - do presidente franc�s Emmanuel Macron ("se ele tem toda essa preocupa��o com a Amaz�nia, deveria ajudar") � ativista Greta Thunberg ("Pirralhos mentais a chamam de pirralha").

Segundo ele, que diz n�o se "preocupar nem um pouco" com a rea��o do presidente Jair Bolsonaro aos apelos, chegou a hora de perceber se as falas de l�deres internacionais sobre a regi�o amaz�nica "s�o da boca para fora ou s�rias".

Leia a seguir os principais trechos da entrevista.

BBC News Brasil - Uma das v�rias imagens que rodaram o mundo nesta crise � especificamente de Manaus: aquelas valas comuns abertas em cemit�rios da cidade, aqueles tratores abrindo longas fileiras que posteriormente receberiam v�timas do coronav�rus especialmente. Qual � a situa��o do sistema funer�rio da cidade neste momento?

Arthur Virg�lio Neto - Bem, agora est� controlada. N�s estamos preparando um projeto de memorial em nome de todas as pessoas ali enterradas. Estamos trabalhando a separa��o, para cada uma ser identificada.

Mas os hospitais t�m cenas que tamb�m correram o mundo e � obvio que as pessoas morreram e n�o tinha como enterr�-las. Porque n�s subimos de 20 a 30 enterros por dia para um pico de 140 e n�o sei quantos, e agora estamos estabilizados em uma m�dia de 120, o que � muito.

A gente sabe que guerra � guerra. N�s temos uma guerra. Eu encaro o corona como uma guerra. N�s tivemos que enterrar as pessoas. N�s n�o poder�amos simplesmente olhar um para o outro, indecisos, como aconteceu em alguns hospitais, doentes juntos com mortos. N�s n�o pod�amos fazer isso.

N�s t�nhamos que enterrar. E a ordem que dei para o secret�rio de Limpeza P�blica era que procurasse dar um m�ximo de dignidade, mas que enterrasse com presteza, para evitarmos que aquilo virasse algo muito pior.


'Todo dia eu vejo mortes de pessoas que conheço', diz Arthur Virgilio Neto em entrevista à BBC News Brasil(foto: Reuters)
'Todo dia eu vejo mortes de pessoas que conhe�o', diz Arthur Virgilio Neto em entrevista � BBC News Brasil (foto: Reuters)

BBC News Brasil - O senhor falou da m�dia normal de enterros na cidade, que variava entre 20 e 30. Na ter�a-feira, 111 pessoas foram sepultadas, portanto pelo menos 80 a mais que a m�dia hist�rica. Destas 111 sepultadas, s� 13 tiveram o diagn�stico de covid-19. Dezenas foram enterradas com insufici�ncia respirat�ria ou "causa desconhecida". Isso exp�e uma poss�vel subnotifica��o brutal na cidade.

Virg�lio Neto - Quando eu vejo insufici�ncia respirat�ria grave, eu leio covid. Quando vejo causas n�o identificadas, eu n�o rio porque n�o � hora de rir, mas…

Eu estou no hospital, a� eu morri e ningu�m sabe por que eu morri? � complicado. Eu leio covid. Quando eu leio pneumonia nos boletins dos hospitais, eu leio covid. � obvio que h� subnotifica��o aqui e no Brasil.

BBC News Brasil - O senhor gravou alguns v�deos com apelos para l�deres mundiais. O que o levou a pedir ajuda externa, uma vez que a gente espera que a ajuda venha de dentro do pr�prio pa�s. Por que apelar para fora?

Virg�lio Neto - Primeiro, porque n�o estava chegando nenhuma ajuda aqui. Come�ou agora, depois da conversa com o ministro da Sa�de, uma pessoa muito agrad�vel, mas veio uma coisa m�nima, �nfima.

� uma regi�o de interesse planet�rio. Tem obviamente soberania nacional, mas � uma regi�o de interesse planet�rio. � hora desse interesse planet�rio se manifestar de maneira concreta, n�o s� fazendo cobran�a.

N�o sou do tipo que vive de passado, n�o uso esses argumentos, que s�o muito parecidos com os do presidente, que acha que devastar n�o faz mal. Eu sou contra garimpo no Amazonas, contra agroneg�cio no Amazonas. Fa�a em outro lugar.

Sou a favor de aproveitar o nosso banco gen�tico, mant�-lo intacto, para trazer prosperidade para o nosso povo. Precisamos, neste campo, tamb�m de coopera��o nacional e internacional. E se n�s somos essa regi�o importante, e se o Amazonas � o cerne dessa regi�o, eu n�o entendo como que, em uma hora de afli��o, na �nica vez em que o Estado pode alguma coisa, ele n�o � atendido. Deve ser atendido. Ou o discurso dos l�deres mundiais � da boca para fora, � para fazer bonito perante a imprensa, ou esse discurso � s�rio.

Tudo o que acontece de ruim para o povo do Amazonas se reflete na floresta, se reflete nos rios, se reflete na conten��o do aquecimento global.

Eu acabei de falar com um jornal franc�s, uma das ajudas que eu espero claramente � a do presidente Emmanuel Macron. Porque o discurso dele indica isso. Eu gosto de juntar meu discurso e a minha pr�tica. Se ele tem toda essa solidariedade e preocupa��o inteligente com uma boa governan�a na Amaz�nia, deveria ajudar.


Em 19 de abril, manifestantes protestaram em Manaus contra medidas de isolamento social do governo estadual do Amazonas(foto: Reuters)
Em 19 de abril, manifestantes protestaram em Manaus contra medidas de isolamento social do governo estadual do Amazonas (foto: Reuters)


BBC News Brasil - O apelo ao presidente Macron especificamente, aquele que foi o mais enf�tico durante os inc�ndios, pode gerar desconforto com presidente brasileiro. Bolsonaro se colocou frontalmente contra Macron, inclusive na Assembleia-Geral da ONU. Como lida com esta tens�o?

Virg�lio Neto - Vou te dizer como lido com o Bolsonaro. Bolsonaro todos os dias me cria tens�o. Quando ele briga com fulano, com beltrano, com n�o sei quem. Ele tem um inimigo por dia. E eu crio de vez em quando problemas para ele quando respondo, quando falou ou dou uma entrevista.

Isso a� n�o me importa o m�nimo. Eu n�o concordo com a pol�tica externa dele, n�o concordo com o ministro de Rela��es Exteriores dele. N�o � uma escolha sequer madura, se tratava de um embaixador j�nior. Ent�o, n�o estou nem um pouco preocupado.

Ent�o, eu me dirigi ao G7, aos l�deres principais. Me dirigi a eles. Se ajudarem, ajudaram, se n�o ajudarem, � porque n�o compreendem a causa amaz�nica.

E por que a Greta? O pessoal do Bolsonaro cai em cima de mim. Quando vejo a chamarem de pirralha, eu j� sei de onde vem.

BBC News Brasil - De onde vem?

Virg�lio Neto - Bolsonaro. Do pessoal dele. Ser pirralho era t�o bom, eu tenho tanta saudade. Terr�vel � se eu fosse um pirralho governando o pa�s, n�?

E a Greta, a quem chamam irresponsavelmente de pirralha, alguns pirralhos mentais a chamam de pirralha, � quem est� conversando conosco para chegarmos a alguma coisa objetiva, alguma coisa pr�tica.

A ajuda que vier � bem-vinda. Precisamos de medicamentos, equipamentos de prote��o individual, tom�grafos.

BBC News Brasil - O senhor j� fez diversas cr�ticas � condu��o do presidente Bolsonaro nesta crise, disse que n�o pode esperar nada dele, e ao mesmo tempo se mostra otimista em rela��o ao apoio dos pa�ses do G7. O senhor tem mais esperan�a na ajuda vinda de fora do que na vinda de dentro?

Virg�lio Neto - � dif�cil mensurar o que representa uma declara��o de uma Greta. � dif�cil mensurar o que se passa na cabe�a de uma pessoa que n�o conhe�o, mas admiro � dist�ncia, que � o presidente Macron. � dif�cil mensurar o que se passa na cabe�a de um homem que poderia ter morrido de covid, o primeiro-ministro (brit�nico) Boris Johnson.

Dos l�deres do G20 e dos pa�ses que se pode considerar expressivos, n�s temos o �nico l�der que insiste em contradizer seu pr�prio Minist�rio da Sa�de. Eu tenho esperan�as no ministro da Sa�de, porque ele assumiu o compromisso comigo, acredito nele. E tamb�m tem uma coisa, eu n�o vejo o presidente Jair Bolsonaro sentar e despachar.

BBC News Brasil - O Minist�rio P�blico entrou com uma a��o civil p�blica pedindo que a Prefeitura de Manaus e o governo do Estado decretassem lockdown. E o senhor classificou a medida como extrema e arriscada. Mas o senhor j� disse que viu "cenas de terror" na capital, disse que defende medidas mais duras, chegou a chorar ao narrar o que acontece na cidade. Quando se sugere uma medida que vem sendo adotada em todo o mundo, nas principais capitais, o senhor diz que � extremo. N�o h� contradi��o a�?

Virg�lio Neto - N�o, voc� d� como �nica solu��o o lockdown. Mas eu penso, por exemplo, numa rebeldia popular grande. Daqui a pouco tem elei��o. Um oportunista joga uma pedra… Eu j� enfrentei uma ditadura. Apesar da minha idade, se tivesse outra, e n�o vai ter, eu enfrentaria de novo. Eu sei o que � a repress�o, ela nem sempre depende do comandante. Dizia-se que na ditadura, n�o se tinha tanto medo do general, tinha medo do guarda da esquina.

Ent�o, joga uma pedra em algu�m, come�a um tiroteio com bala de borracha, que pode cegar algu�m, come�a a rea��o das pessoas, que vivem uma situa��o de desespero. Algo que termina dando em tiro, dando em morte. Eu acho que � uma medida que deve ser tomada em ultim�ssimo grau, assim como n�s fazemos com a entuba��o. �ltimo grau…


Situação do Amazonas é uma das mais graves do país nesta pandemia(foto: AFP)
Situa��o do Amazonas � uma das mais graves do pa�s nesta pandemia (foto: AFP)


BBC News Brasil - Prefeito, qual � o �ltimo grau, se o senhor j� classificou a situa��o como colapso na sa�de p�blica, como filme de terror? O que mais precisa acontecer?

Virg�lio Neto - A situa��o de horror � amenizada, se Deus quiser, com a chegada, que foi uma interven��o benigna do ministro (Nelson) Teich e do general (Eduardo) Pazuello, chegou muita gente para o governo do Estado. Se essas pessoas v�o resolver ou n�o, a gente vai ver daqui a pouco, se vai melhorar... Acho que piorar n�o pode, dever� melhorar.

Nosso hospital de campanha vai crescendo a cada momento. Estamos com organiza��o nos sepultamentos. Acabou aquela algazarra, aquela confus�o. Aquela hist�ria de o filho de algu�m que morreu querer agredir o coveiro, que � o sujeito mais exposto ao coronav�rus.

BBC News Brasil - Ent�o o senhor enxerga no lockdown uma janela para uma poss�vel convuls�o social, � isso?

Virg�lio Neto - Eu queria ter certeza de que n�o, para poder apoiar o lockdown. Eu falei com todas as pessoas importantes nesse epis�dio do lockdown e n�o encontrei seguran�a nenhuma. Nenhuma. Ningu�m seguro que este � o melhor caminho.

Eu encontrei pessoas que dizem que n�s n�o temos instrumentos de repress�o para sequer reprimir de verdade uma rebeldia popular de grandes propor��es. Ent�o, eu olho com responsabilidade o lockdown. O MP sugeriu, sugeriu. Vamos analisar, fazer uma teleconfer�ncia e discutir. Mas, eu n�o posso declarar um lockdown sem ter absoluta seguran�a de que preciso dele como a gente usa um respirador. A gente usa o respirador mec�nico s� quando a gente acha que a pessoa vai morrer.

BBC News Brasil - Agora, prefeito, n�o est� um pouco em cima da hora, ou tarde para saber se o lockdown faz sentido ou n�o e qual seria a alternativa?

Virg�lio Neto - Eu acabei de falar que chegou um refor�o brutal para o governo do Estado. Dois Boeings (com insumos).

Mas, quando voc� se referiu ao epis�dio em que eu chorei na televis�o. Eu sou um cara muito sentimental. Muito sens�vel. E tamb�m n�o fui criado em uma fam�lia em que homem n�o chora. Chora homem e chora mulher. Na minha fam�lia, sai na porrada homem, sai na porrada mulher. Na minha fam�lia, a gente topa tudo. Tem de tudo l�.

Eu explodi sim porque voc� v� a prega��o do "vai para a rua", e eu dizendo "n�o vem para a rua", e o pessoal n�o me atende e vai para a rua. E as pessoas morrem.

Diferentemente do H1N1, que matou v�rias pessoas no mundo, eu n�o tenho de cabe�a o nome de nenhuma pessoa que tenha morrido de H1N1, uma pessoa pr�xima a mim. Eu n�o lembro de ningu�m. Hoje, todo dia eu vejo mortes de pessoas que conhe�o. Ou pessoas humildes dos bairros, cujos nomes eu identifico, ou pessoas ricas que eu conhe�o tamb�m, pessoas de classe m�dia que eu conhe�o.

Todo santo dia eu vejo isso. Isso s� n�o mexe com uma pessoa com o cora��o muito ruim. Um cora��o muito desonesto at�, voc� n�o sentir uma coisa dessa. E a impot�ncia, e a falta de recursos, os recursos n�o vinham, e n�o vieram ainda, n�s estamos lutando com nossas pr�prias for�as. E morrendo gente, morrendo gente.

Coveiro quase espancado por filho de uma pessoa que ia ser enterrada. O coveiro! O coveiro! Se tivesse que espancar, espancasse o governador, espancasse a mim, mas o coveiro. Quer dizer, algu�m n�o se condoer com isso, n�o se emocionar com isso… Me parece que pelo menos � algu�m diferente de mim.

Eu tenho uma m�xima: na minha vida, quando eu me emociono, eu choro. Na pol�tica, quem chora � quem me enfrenta.

BBC News Brasil - O senhor est� no segundo mandato como prefeito, foi deputado v�rias vezes, foi senador, foi ministro de Estado, representando tamb�m de alguma maneira a sua regi�o. Qual � sua autocr�tica neste momento de colapso?

Virg�lio Neto - Eu n�o sei como come�ou o primeiro caso. Teoricamente, tinha que ser detectado pela rede prim�ria. Mas pode ter sido algu�m que sentiu uma gripe, se automedicou, contagiou a fam�lia toda. Eu n�o sei te contar essa hist�ria.

Uma autocr�tica que fiz ontem com o secret�rio de Sa�de: n�s n�o fal�vamos em dengue aqui desde o final do primeiro ano do governo. Agora � �poca de dengue aqui e uma pessoa acusou dengue outro dia.

Eu acho que n�s demos uma certa relaxada, na obsess�o de enfrentar o corona, em rela��o a outras doen�as, endemias ou n�o. E a obsess�o nossa ficou durante esse tempo inteiro covid, covid, covid, e abrimos espa�o para termos um caso de dengue.



(foto: BBC)
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