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Estado de Minas BOLSONARO

'Uma loucura', diz ex-presidente colombiano e Nobel da Paz sobre a��es de Bolsonaro na pandemia

O ex-presidente da Col�mbia Juan Manuel Santos disse � BBC News Brasil que governo brasileiro, "em vez de ajudar, est� contribuindo para piorar o problema" da COVID-19. Ele acha que os presidentes da regi�o deveriam chamar Bolsonaro "� sensatez"


postado em 04/07/2020 07:01 / atualizado em 05/07/2020 15:33

O ex-presidente da Col�mbia e receptor do Pr�mio Nobel da Paz, Juan Manuel Santos, disse que � "uma loucura" como o Brasil, governado pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido), est� conduzindo a pandemia do novo coronav�rus. "� uma loucura. � uma lideran�a que em vez de estar ajudando a resolver o problema, est� contribuindo para piorar o problema", disse durante entrevista exclusiva � BBC News Brasil.

Ele acha que os presidentes da regi�o deveriam chamar Bolsonaro "� sensatez".

Santos, visto como de centro-direita no espectro ideol�gico, afirmou que esse quadro brasileiro repercute no resto da regi�o. "Nessa situa��o, o Brasil � um p�ssimo exemplo na regi�o. Uma pol�tica que est� produzindo um fracasso total, uma verdadeira trag�dia para os brasileiros e para o mundo", disse, falando da Col�mbia.

Nesta entrevista � BBC News Brasil, Santos, que foi jornalista, militar e ex-ministro da Defesa, disse que a atitude do l�der brasileiro amea�a as comunidades ind�genas da Amaz�nia de extin��o. Leticia, do lado colombiano, na fronteira com o Brasil, � o lugar mais afetado pelo coronav�rus em seu pa�s.

Quando perguntado sobre a forte presen�a de militares no governo brasileiro, ele disse que n�o tende a dar bons resultados. Santos falou ainda sobre os avan�os e falhas do Acordo de Paz com as For�as Armadas Revolucion�rias da Col�mbia (Farc), assinado quando era presidente e que foi o motivo para receber o Pr�mio Nobel da Paz.

Leia os principais trechos da entrevista:

BBC News Brasil - A Am�rica Latina � a regi�o mais desigual do planeta e agora est� no foco da pandemia do novo coronav�rus. As economias da regi�o, como as do Brasil e da Argentina, j� mostram queda acentuada. O que fazer?

Juan Manuel Santos - A regi�o j� n�o vinha crescendo economicamente, j� tinha uma s�rie de problemas, antes da pandemia. A Am�rica Latina � a regi�o com um dos sistemas de sa�de mais fracos e popula��es muito vulner�veis, como as comunidades ind�genas, os presidi�rios e os pobres que vivem em condi��es muito prec�rias, al�m dos imigrantes, como os venezuelanos aqui na Col�mbia. S�o popula��es ainda mais vulner�veis � pandemia. Tudo isso se juntou. E piorou com as pol�ticas erradas dos l�deres da Am�rica Latina. D�i dizer isso, mas o Brasil n�o fez um trabalho positivo. E o M�xico tamb�m n�o.

N�o existe nenhum tipo de lideran�a regional para fazer valer a regi�o em nenhuma inst�ncia do mundo. Estamos um pouco � deriva. � como um barco que n�o tem capit�o, que est� no meio de uma tormenta e o que n�s precisamos nesse momento s�o lideran�as efetivas. Mas, infelizmente, ningu�m est� fazendo isso.

BBC News Brasil - O senhor citou o Brasil. O Brasil � o maior pa�s da Am�rica Latina em termos de popula��o e econ�micos e faz fronteira com a Col�mbia. O presidente Bolsonaro disse que o coronav�rus era uma gripezinha. Hoje, o Brasil j� tem mais de 50 mil mortos por COVID-19. O que o senhor opina sobre esta pol�tica do presidente Bolsonaro?

Santos - Vou ser um pouco duro. � uma loucura. � uma loucura o que est� acontecendo no Brasil. � uma lideran�a que em vez de estar ajudando a resolver o problema, est� contribuindo para piorar o problema. E isso repercute no resto da regi�o porque o Brasil � um pa�s muito grande. Ent�o, essa situa��o no Brasil � um p�ssimo exemplo da regi�o. � uma pol�tica que est� produzindo um fracasso total, uma verdadeira trag�dia para os brasileiros e para o mundo.

BBC News Brasil - Na Col�mbia, a cidade de Leticia, que faz fronteira com o Brasil, era at� poucos dias atr�s a mais afetada por coronav�rus no pa�s. O Brasil faz fronteira com dez pa�ses da regi�o. O Brasil virou uma amea�a nesta pandemia por n�o ter uma pol�tica contra a COVID-19?

Santos - Sem d�vida. N�s estamos muito preocupados porque essa regi�o amaz�nica (onde est� Leticia) n�o est� apenas sofrendo pela pandemia, mas as comunidades ind�genas, que devemos preservar, porque s�o os melhores guardi�es de um ecossistema que � fundamental para o mundo, podem desaparecer. Est�o totalmente desprotegidas.

Essa falta de pol�tica por parte do Brasil repercute imediatamente, como ocorre no caso colombiano. Como voc� acaba de mencionar, uma das regi�es com mais casos, e cont�gios mais r�pidos, e mais mortes � exatamente a regi�o que faz fronteira com o Brasil, na Amaz�nia. Por isso, a pol�tica do Brasil influencia o resto da Am�rica Latina e a influencia que est� tendo � muito negativa.

BBC News Brasil - Como Pr�mio Nobel da Paz, o senhor pensou ou pensa telefonar para o presidente Bolsonaro para uma conversa, para falar sobre essa amea�a � regi�o?

Santos - Olha, tomei como decis�o de vida n�o intervir em pol�tica, em assuntos internos de um pa�s. Espero que outros o fa�am. Quem dera meu presidente (Iv�n Duque) pudesse falar com Bolsonaro. Ou que outros presidentes da Am�rica Latina pudessem falar com Bolsonaro para que ele 'entre en raz�n' (tenha sensatez). Por isso, eu dizia que estamos vendo uma total falta de lideran�a na Am�rica Latina. Mas s�o os presidentes, os chefes de Estado atuais, e n�o os anteriores, aos quais corresponde realizar a��es concretas.


'Considerar uma pandemia como uma gripezinha. Dar sinal para que ninguém exerça nenhuma disciplina social, que ninguém acate as recomendações dos cientistas, dos médicos, isso só agrava o problema. E vemos os resultados.'(foto: EPA)
'Considerar uma pandemia como uma gripezinha. Dar sinal para que ningu�m exer�a nenhuma disciplina social, que ningu�m acate as recomenda��es dos cientistas, dos m�dicos, isso s� agrava o problema. E vemos os resultados.' (foto: EPA)

BBC News Brasil - Quando o senhor fala em total falta de lideran�a, o senhor fala em rela��o a cada pa�s ou uma lideran�a unificada na regi�o? Pode explicar melhor?

Santos - Vou lhe dar um exemplo. Um dos problemas mais graves que a Am�rica Latina tem e vai ter � o financiamento, porque n�s n�o temos a capacidade dos pa�ses desenvolvidos de fazer o que � necess�rio. Todos os pa�ses da Am�rica Latina t�m limita��es fiscais e estamos com necessidades cada vez maiores de financiamento. No entanto, em nenhuma inst�ncia, na arquitetura financeira mundial, a Am�rica Latina est� levando uma voz concreta. N�o est� fazendo nenhuma proposta. Pior ainda, est�o nos tirando, neste momento...

BBC News Brasil - A presid�ncia do BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento)...

Santos - A �nica representa��o importante, exato, que era a presid�ncia do BID. E isso com o apoio dos presidentes da Am�rica Latina. Isso n�o entra na minha cabe�a. Acho totalmente contraproducente. � a �nica inst�ncia que temos para pelo menos sermos ouvidos nas discuss�es internacionais sobre financiamento, sobre a economia.

BBC News Brasil - O Brasil tinha um pr�-candidato e a Argentina tamb�m. E o atual presidente do BID � o colombiano Luis Alberto Moreno. O Brasil (o chanceler Ernesto Ara�jo) disse que viu "positivamente" a indica��o feita pelos Estados Unidos. Outros pa�ses da regi�o tamb�m apoiaram o nome do indicado dos EUA.

Santos - Eu n�o sei o que podem ver de positivo que nos tirem algo que t�nhamos h� 60 anos. Houve um acordo t�cito, quando o BID foi criado, que o BID seria localizado em Washington, mas que a presid�ncia do BID sempre seria de um latino-americano. E o senhor Trump rompeu com essa tradi��o e quer impor um candidato que, al�m de tudo, tinha sido vetado pelo atual presidente do BID para a vice-presid�ncia. Ent�o, estamos, nesse sentido, numa situa��o muito ruim.

BBC News Brasil - Na sua opini�o existe um novo xadrez politico na regi�o? Por exemplo, a Unasul deu lugar ao Prosul, o Brasil saiu da Celac (Comunidade de Estados Latino-Americanos). S�o v�rios movimentos. O senhor acha que isso tamb�m est� ligado � postura do Brasil, que parece ser muito pr�ximo dos Estados Unidos, ou melhor, de Trump?

Santos - Existem v�rios fen�menos. O M�xico tem um presidente (L�pez Obrador) que n�o quer saber nada de assuntos internacionais. Do Brasil, j� sabemos a postura. S�o dois pa�ses que, tradicionalmente, deveriam exercer alguma forma de lideran�a na regi�o. A falta desses dois pa�ses complica. Existem outros pa�ses que n�o atuaram e n�o houve coordena��o.

O que est� acontecendo no BID � um dos v�rios exemplos. Est� se destruindo a pouca institucionalidade regional que existia. E isso � muito ruim. Espero que isso gere uma rea��o e que todos possamos entender que somente colaborando entre n�s, dialogando, cooperando entre n�s, vamos poder sair adiante nessa pandemia. Existe uma frase que diz que ningu�m est� salvo at� que todo o mundo esteja salvo. Se n�o entendemos isso, vamos ter problemas muito s�rios. E a Am�rica Latina unida � uma grande for�a. Mas precisamos que os atuais l�deres entendam isso e trabalhem para unir-se. N�o que cada um trabalhe para seus pr�prios interesses pol�ticos porque isso enfraquece a regi�o. E enfraquece cada pa�s.

BBC News Brasil - Na pr�tica, cada pa�s fechou suas pr�prias fronteiras, nessa pandemia, e aplicou medidas que foram as mesmas da China, como a quarentena. Mas n�o h� dialogo entre os presidentes para uma pol�tica comum. Essa semana haver� reuni�o virtual do Mercosul, mas Bolsonaro e o presidente da Argentina, Alberto Fernandez, n�o se falam. O que est� acontecendo?

Santos - O fen�meno Trump influenciou muito o resto do mundo. Trump buscou enfraquecer o multilateralismo, enfraquecer as organiza��es internacionais, as Na��es Unidas, a Organiza��o Mundial de Com�rcio, e isso repercute nas regi�es. E de certa forma o que aconteceu na Am�rica Latina, por problemas pol�ticos como divis�es em torno da Venezuela e outros problemas espec�ficos, foi que em vez de di�logo para encontrar um denominador comum, os pa�ses decidiram assumir uma posi��o de isolamento. E isso no longo prazo � muito negativo.

BBC News Brasil - No Brasil, s�o mais de 50 mil mortos por coronav�rus; na Col�mbia e na Argentina, relativamente, h� menos mortes; Uruguai, Paraguai est�o numa situa��o melhor, mas, apesar de estar melhorando, ela � grave no Peru. O que se pode fazer? Hoje (ter�a-feira, 30), por exemplo, o ministro interino da Sa�de do Brasil, Eduardo Pazuello, participou de uma cerim�nia no Pal�cio do Planalto sem m�scara. E o presidente Bolsonaro tamb�m aparece sem m�scara. Como o senhor v� essa situa��o?

Santos - Muito mal. Inclusive, meu pa�s, Col�mbia, que ainda tem alguns bons indicadores, tem tend�ncia muito ruim. No Chile e no Peru, que come�aram bem, com disciplina, a situa��o foi sendo deteriorada porque as medidas n�o foram complementadas com medidas necess�rias, como o distanciamento social e o uso de m�scaras. O isolamento n�o serve, se temos ferramentas e n�o as usamos.

Estamos vendo que a Am�rica Latina tem problemas s�rios. Talvez com algumas exce��es, como Uruguai e Costa Rica, mas o restante dos pa�ses est� com problemas. No caso colombiano, a tend�ncia � de alta (de casos). Por isso, a lideran�a e a coordena��o s�o importantes. E bons exemplos. O que voc� disse sobre o ministro da Sa�de do Brasil � um mau exemplo. Est� acontecendo tamb�m nos Estados Unidos, com Trump. E isso tamb�m � mau exemplo.


'Quando existe confiança (nos governantes) as pessoas têm maior disciplina. Quando a confiança não existe, impera a indisciplina e é o que estamos vendo aqui no meu país, no Brasil, no México, no Chile, no Peru.'(foto: Getty Images)
'Quando existe confian�a (nos governantes) as pessoas t�m maior disciplina. Quando a confian�a n�o existe, impera a indisciplina e � o que estamos vendo aqui no meu pa�s, no Brasil, no M�xico, no Chile, no Peru.' (foto: Getty Images)

BBC News Brasil - Mas Bolsonaro e outros presidentes defendem que a economia funcione. Na Col�mbia, por exemplo, o desemprego em maio foi acima de 20%. No Brasil, a recess�o foi agravada. Paralisar a economia n�o � pior?

Santos - Existe um dilema muito complicado. Qual � o equil�brio conveniente entre economia e sa�de? Ningu�m tem a f�rmula perfeita. Mas pelo menos � poss�vel tentar enviar mensagens que gerem confian�a na popula��o. � o que as autoridades deveriam fazer.

Acho que um dos motivos do sucesso no Uruguai � a confian�a que os uruguaios t�m em rela��o ao que seus governos, o nacional e os locais, est�o dizendo na pandemia. Quando existe confian�a (nos governantes) as pessoas t�m maior disciplina. Est�o mais inclinadas a fazer o correto. Quando a confian�a n�o existe, impera a indisciplina e � o que estamos vendo aqui no meu pa�s, no Brasil, no M�xico, no Chile, no Peru. Estamos vendo uma grande indisciplina e sem disciplina por parte da popula��o, vai ser dif�cil combater a pandemia.

BBC News Brasil - Existe um novo populismo na regi�o?

Santos - Isso j� existia. Bolsonaro � um populista de direita. O presidente do M�xico, de esquerda. E sem contar a Venezuela. Isso n�o � pela pandemia. Mas espero que a pandemia acabe levando a cidadania a valorizar cada vez mais a ci�ncia. E que o populismo perca for�a.

BBC News Brasil - O senhor com outros ex-presidentes, como Fernando Henrique Cardoso, do Brasil, Ricardo Lagos, do Chile, e Ernesto Zedillo, do M�xico, assinaram um documento p�blico dizendo que alguns l�deres atuam bem na pandemia e outros n�o. Defenderam a ci�ncia e que o FMI esteja mais presente, com mais recursos para a regi�o. Esse documento tem mais de um m�s. Mudou alguma coisa ap�s esse pedido?

Santos - A relev�ncia desse documento est� mantida. E voltaria a assin�-lo. O Fundo Monet�rio Internacional precisa dar mais recursos � regi�o. Precisamos ser criativos, de inova��es que geram mais recursos financeiros para enfrentar a cat�strofe econ�mica na regi�o.

BBC News Brasil - Como o senhor disse, a regi�o j� vinha mal em termos econ�micos e sociais quando surgiu a pandemia. Ent�o, o que esperar depois da pandemia?

Santos - As Na��es Unidas estimam que vamos retroceder 30 anos. O Banco Mundial diz que vamos retroceder 20 anos, que voltaremos a ter os �ndices de pobreza que t�nhamos no come�o do s�culo e que vamos ter um desemprego alto durante muito tempo.

Mas ao mesmo tempo a pandemia deu visibilidade aos problemas graves que temos de desigualdade, de falta de produtividade, de pobreza, de vulnerabilidades. Mas podemos aproveitar a pandemia para reconstruir nossos pa�ses com melhores pol�ticas, ou seja, pol�ticas sociais justas e verdes. Precisamos de mais justi�a social e precisamos ser muito mais conscientes de combater as mudan�as clim�ticas porque essa pandemia � uma pequena situa��o diante da trag�dia das mudan�as clim�ticas, se n�o atuamos com maior determina��o para deter as mudan�as clim�ticas.

BBC News Brasil - Como?

Santos - Por exemplo, em vez de retroceder ao uso de energia poluentes, f�sseis, como est� acontecendo, estimular a economia, poder aproveitar para estimular a cria��o de energias renov�veis. Pol�ticas que tenham como finalidade a sustentabilidade ambiental. Este � o momento para isso.

BBC News Brasil - Voltando � pol�tica brasileira, existe preocupa��o em alguns setores com os rumos da democracia desde que Bolsonaro participou de um ato com manifestantes que pediam a interven��o no Supremo Tribunal Federal. Na sua vis�o, a democracia brasileira corre riscos?

Santos - O que vejo � uma tend�ncia no mundo todo de usar a pandemia para que os governos saiam fortalecidos, mas com o custo de afetar a divis�o de poderes, enfraquecendo os Supremos e at� o Congresso. Isso � o contr�rio do que defende qualquer democrata. Acho que � preciso estar atento. E isso est� acontecendo n�o s� na Am�rica Latina, mas em v�rios lugares do mundo todo. Os governos gostam de ter todo o poder, ter controle de tudo e isso pode virar um costume. Claro que sabemos que existem situa��es excepcionais em fun��o da pandemia e o governo precisa de mecanismos para atuar. Mas isso n�o pode ser uma regra e sim uma exce��o.

BBC News Brasil - O governo brasileiro conta com forte participa��o de militares. Bolsonaro tem um discurso de que a ditadura militar n�o foi negativa para o pa�s. Qual a sua opini�o?

Santos - Como democrata, n�o gostei nunca que militares respondam pelos governos. Os militares - e eu fui militar - devem cumprir com seu mandato constitucional. E n�o virar um co-governo. O governo deve estar nas m�os dos civis. A ess�ncia da democracia exige que os militares cumpram seu dever e n�o interfiram na administra��o dos assuntos p�blicos porque essa f�rmula, geralmente, gera consequ�ncias negativas.


Santos continua a defender o processo de paz que ajudou a criar, mas se diz preocupado(foto: EPA)
Santos continua a defender o processo de paz que ajudou a criar, mas se diz preocupado (foto: EPA)

BBC News Brasil - O senhor assinou o acordo de paz com as Farc em 2016. Como v� o acordo hoje? Existem not�cias de que as c�lulas das Farc continuam atuando no interior da Col�mbia. N�o est� preocupado com essa situa��o?

Santos - Estou preocupado, mas ao mesmo tempo tranquilo. O Acordo de Paz foi blindado juridicamente pela Corte Constitucional. Nenhum governo, ou os pr�ximos tr�s governos, pode aprovar leis ou decretos que contrariem o cumprimento dos acordos. O que sim me preocupa � que esse governo (presidente Iv�n Duque) foi muito lento em organizar o cumprimento dos acordos. Tamb�m me preocupa que certos l�deres sociais estejam sendo assassinados em algumas regi�es como resultado do acordo. Camponeses que perderam a terra pela viol�ncia ou l�deres que est�o estimulando a substitui��o dos cultivos il�citos (folha de coca). Sei que ainda temos muitos problemas, mas vejo com satisfa��o e otimismo que a grande maioria dos integrantes das Farc, que se desmobilizou e se desarmou, continua atendendo ao processo de paz e se incorporando � vida civil. As Farc s�o hoje um partido pol�tico com representa��o no Congresso.

BBC News Brasil - Mas o senhor acha que chegar� o dia em que, al�m de representa��o no Congresso, os integrantes das Farc ter�o empregos dignos e ser�o mais bem aceitos pela sociedade colombiana?

Santos - Acho que est�o sendo cada vez mais aceitos. E existem ex-combatentes que est�o trabalhando em empresas normais. E as pessoas cada vez mais os aceitam como uma parte fundamental da nossa vida social e pol�tica.

BBC News Brasil - H� poucos dias, um brasileiro e seu namorado su��o foram sequestrados no interior da Col�mbia. Foi not�cia no Brasil. A Col�mbia ainda n�o � um pa�s seguro para o turismo?

Santos - � um pa�s muito mais seguro do que era. Antes, a metade do pa�s era 'zona vermelha' (perigoso). Mas ainda temos problemas. Existem lugares onde as quadrilhas de criminosos, estas dissid�ncias das Farc que est�o dedicadas ao narcotr�fico, operam. Ainda temos problemas. Mas somos um pa�s diferente daquele que t�nhamos h� alguns anos porque n�o podemos comparar o que era a Col�mbia h� seis ou sete anos com o que o pa�s � hoje. Mas n�o ignoramos que ainda temos problemas.

BBC News Brasil - O que mudou na sua vida ser Pr�mio Nobel da Paz? Mudou alguma coisa?

Santos - Sim. Me fez estar mais comprometido a continuar ajudando as causas importantes ligadas ao que tem a ver com viver em um mundo mais pac�fico. Para mim abriu uma janela, como disseram os ind�genas, para entender que a paz n�o se faz somente entre seres humanos, mas que a paz tamb�m deve ser com a natureza. E n�s v�nhamos, de certa forma, destruindo a natureza. E se queremos paz entre seres humanos, temos que ter paz com a natureza. E estou me dedicando a isso, a promover a paz entre seres humanos e a promover a paz com a natureza.

BBC News Brasil - Onde o senhor est� nesse momento? H� muito barulho de p�ssaros.

Santos - A Col�mbia � o pa�s com maior diversidade de p�ssaros do mundo. E estou em uma zona que est� a uns 70 quil�metros de Bogot�. � uma zona onde h� muitos e muitos p�ssaros.

BBC News Brasil - No final do ano passado foram realizados fortes protestos no Chile, na Col�mbia, no Equador e em outros lugares da Am�rica Latina. Sua percep��o � que eles est�o adormecidos pela pandemia, mas voltar�o? Ou n�o?

Santos - Voltar�o, com certeza. A desigualdade social ser� um denominador comum dos protestos. Vamos ver mais desigualdade, mais desemprego, mais pequenos empres�rios quebrados. E em pa�ses como o meu, at� os mais velhos, confinados na marra, tamb�m saem para protestar. Ent�o, acho que os protestos est�o congelados, mas quando a pandemia passar, ser�o retomados. Mas � quando os governantes teriam a oportunidade de ouvir a voz dos manifestantes, dos indignados e canalizar essa indigna��o para pol�ticas melhores, mais justas, mais verdes. Parte desses protestos s�o os ambientalistas que viram como os pa�ses n�o se comprometem de verdade com os compromissos como o Acordo de Paris. Eu sou otimista nato e acho que essa combina��o, se tivermos uma boa lideran�a, pode canalizar para a cria��o de nova economia e politicas que corrijam os problemas que existem h� 200 anos na Am�rica Latina.


'O fenômeno Trump influenciou muito o resto do mundo. Trump buscou enfraquecer o multilateralismo, enfraquecer as organizações internacionais, as Nações Unidas, a Organização Mundial de Comércio, e isso repercute nas regiões'(foto: Getty Images)
'O fen�meno Trump influenciou muito o resto do mundo. Trump buscou enfraquecer o multilateralismo, enfraquecer as organiza��es internacionais, as Na��es Unidas, a Organiza��o Mundial de Com�rcio, e isso repercute nas regi�es' (foto: Getty Images)

BBC News Brasil - Podem ocorrer mudan�as geopol�ticas se o presidente Trump ganhar ou perder a elei��o em novembro?

Santos - Essa elei��o � muito importante para a Am�rica Latina. Se o senhor Trump seguir na Presid�ncia, vamos continuar vendo uma pol�tica de total desconhecimento em rela��o � Am�rica Latina. Uma pol�tica improvisada que n�o nos deu nenhum benef�cio. Acho que o candidato democrata (Joe Biden) conhece a regi�o e trabalhou pela Am�rica Latina, gosta e admira a nossa regi�o. A rela��o entre Estados Unidos e Am�rica Latina melhoraria muito com uma mudan�a de governo nos Estados Unidos.

BBC News Brasil - Como o senhor v� a situa��o da Venezuela hoje? N�o h� previs�o de novas elei��es (presidenciais com maior participa��o da oposi��o) e o opositor Juan Guaido, que contou com apoio de v�rios pa�ses, parece ter perdido for�as.

Santos - Acho que nesse momento est� tudo parado. Continuo insistindo que a �nica solu��o e a mais favor�vel que temos na Am�rica Latina e, principalmente na Col�mbia que � o mais prejudicado com a situa��o venezuelana, e n�o por causa dos venezuelanos, �bvio, � uma solu��o negociada, pac�fica, onde devem estar presentes os jogadores determinantes. S�o eles R�ssia, China, Cuba, Estados Unidos e Am�rica Latina. Essa tem que ser a solu��o e nunca � tarde.

BBC News Brasil - O senhor disse no in�cio da entrevista que acha uma loucura como o presidente brasileiro est� lidando com a situa��o da pandemia. Por qu�?

Santos - Considerar uma pandemia como uma gripezinha. Dar sinal para que ningu�m exer�a nenhuma disciplina social, que ningu�m acate as recomenda��es dos cientistas, dos m�dicos e isso s� agrava o problema. E agora vemos os resultados.

BBC News Brasil - As pessoas tendem a seguir a seu l�der?

Santos - Sim, claro. Os l�deres devem dar exemplos. Os l�deres t�m responsabilidades com sua popula��o. O que vemos hoje no Brasil e nos Estados Unidos s�o l�deres que d�o maus exemplos.

BBC News Brasil - Como Pr�mio Nobel da Paz, se tivesse que mandar alguma mensagem ao Brasil, qual seria?

Santos - O Brasil � um pa�s maravilhoso, com grande futuro. A Am�rica Latina sempre foi a regi�o do futuro. Mas acontece que n�o permitimos que esse futuro chegue. Mas tomara que essa pandemia nos fa�a acordar. E nos mostre que podemos mudar certas pol�ticas para que este futuro vire o presente. O Brasil e a Am�rica Latina temos tudo o que o mundo precisa. Temos biodiversidade, temos �gua, temos energia, temos uma popula��o engajada e tamb�m os melhores jogadores de futebol.


'O fenômeno Trump influenciou muito o resto do mundo. Trump buscou enfraquecer o multilateralismo, enfraquecer as organizações internacionais, as Nações Unidas, a Organização Mundial de Comércio, e isso repercute nas regiões'(foto: Getty Images)
'O fen�meno Trump influenciou muito o resto do mundo. Trump buscou enfraquecer o multilateralismo, enfraquecer as organiza��es internacionais, as Na��es Unidas, a Organiza��o Mundial de Com�rcio, e isso repercute nas regi�es' (foto: Getty Images)

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