A covid-19 parou o mundo e derrubou a atividade industrial em dezenas de pa�ses, ricos, emergentes e pobres.
Os dados divulgados neste m�s pela Organiza��o das Na��es Unidas para o Desenvolvimento Industrial (Unido) mostram quedas de dois d�gitos em todas as regi�es.
Levando em considera��o o segundo trimestre deste ano, que concentrou a maior parte das perdas, o tombo foi de 12,9% na �sia, de 16,5% na Am�rica do Norte, de 19,3% na Europa e de expressivos 24,2% na Am�rica Latina, quando se compara ao mesmo per�odo do ano passado.
No ranking de pa�ses elaborado pelo Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi) com base dados da Unido e antecipado � BBC News Brasil, o Brasil aparece em 26� lugar entre 43 pa�ses, levando-se em considera��o o intervalo de janeiro a junho ou a julho, a depender do pa�s.
Nesse intervalo, a atividade industrial contraiu 9,7%, desempenho que coloca o pa�s no lado de baixo da lista, mas ainda � frente de pa�ses europeus que amargaram resultados ainda piores: Portugal (-12,1%), Alemanha (-14,5%), Espanha (-15,2%), Fran�a (-15,4%) e It�lia (-18,3%), que aparece em �ltimo lugar.
A magnitude menor pode dar a falsa sensa��o de que a posi��o do Brasil � mais confort�vel.
Mas, para o economista respons�vel pelo estudo, Rafael Cagnin, mesmo que o pa�s mantivesse os mecanismos que suavizaram os choques negativos da covid-19 e retomasse a agenda de reformas, como a tribut�ria, a situa��o do Brasil ainda seria "mais adversa".
Isso porque, avalia ele, a pandemia deve acelerar dois processos que j� vinham fazendo o pa�s perder espa�o na ind�stria global.
A ind�stria 4.0 e o 'reshoring'
Na �ltima d�cada, o avan�o tecnol�gico permitiu que ind�strias em todo o mundo passassem por profundas mudan�as.
Processos antes realizados por dezenas de trabalhadores foram automatizados, o armazenamento e processamento de dados em nuvem permitiu que as empresas minimizassem perdas e tornassem alguns processos mais eficientes (o que, em �ltima inst�ncia, ajuda a aumentar as margens de lucro).
O Brasil vem passando ao largo dessas transforma��es, que caracterizam a chamada ind�stria 4.0.
Mais que isso, o pa�s vem passando por um processo de desindustrializa��o, diz Cagnin. Isso � vis�vel n�o apenas pela perda de participa��o do setor no Produto interno Bruto (PIB), mas tamb�m na participa��o na ind�stria global e na fatia que os manufaturadores representam nas exporta��es, que � cada vez menor.
"A desindustrializa��o � multifacetada e aparece em todos os prismas", afirma o economista do Iedi.
"Isso pode ser agravado de forma muito profunda com esse salto que pode ser dado agora (pela ind�stria global)", ele completa.
Isso porque o uso cada vez mais intensivo de tecnologia na ind�stria e a transforma��o do setor devem ser acelerados no p�s-pandemia, j� que o mundo inteiro estar� em busca de recuperar o mais r�pido poss�vel as perdas amargas de 2020.

E n�o s� isso. O p�s-crise tamb�m deve intensificar, na avalia��o do economista, um processo que vinha se consolidando nos �ltimos anos, o chamado "reshoring" o contr�rio do "offshoring", o movimento de sa�da de muitas ind�strias de pa�ses ricos para emergentes que marcou as �ltimas d�cadas.
A l�gica do "reshoring" n�o � apenas trazer de volta empregos que foram "exportados", mas atender a uma exig�ncia cada vez mais forte dos consumidores para que o processo produtivo seja sustent�vel.
Aproximar a produ��o dos mercados consumidores reduz os custos de frete e permite que as empresas acompanhem de perto cada etapa da produ��o e adotem crit�rios r�gidos tanto em rela��o �s leis trabalhistas quanto ao meio ambiente.
"E o plano de recupera��o da Uni�o Europeia tem claramente um 'eixo de recupera��o verde', um 'green new deal'", destaca, referindo-se ao programa anunciado no �ltimo dia 21 de julho, que d� as diretrizes para o or�amento do bloco para os pr�ximos sete anos.
A tecnologia pode facilitar esse processo.
O custo de m�o de obra mais elevado em pa�ses europeus e nos Estados Unidos est� entre as principais raz�es que levaram � transfer�ncia de unidades produtivas para outras regi�es, especialmente para o Sudeste Asi�tico. Agora, a robotiza��o barateia a produ��o e abre espa�o no or�amento para que as empresas arquem com os sal�rios maiores dos trabalhadores localizados em seus pa�ses-sede. Em outras palavras, ela permitiria, do ponto de vista de custos, que uma f�brica que foi transferida para a China voltasse para a Alemanha, por exemplo.
De maneira geral, o processo reduz o volume de empregos gerados pela ind�stria (da� o grande debate sobre o desemprego potencial gerado pela automa��o e pelo desenvolvimento tecnol�gico), mas passa a criar vagas nos pa�ses de origem das empresas.
"Quando voc� precisa acelerar crescimento econ�mico, esses movimentos todos se tornam convergentes."
"E isso abre espa�o para uma disrup��o estrutural. Alguns pa�ses v�o conseguir dar saltos de produtividade muito grandes e avan�ar mais rapidamente", avalia.
Nesse cen�rio, o Brasil vai ficando para tr�s e sua ind�stria vai perdendo competitividade o que contribui para que ela veja diminuir ainda mais seu espa�o na estrutura produtiva global, aprofundando a desindustrializa��o.

O desafio de 'digerir' uma crise ap�s a outra
O desempenho da ind�stria brasileira em 2020 foi em parte poupado pelos programas criados para amortecer os efeitos da crise gerada pela pandemia.
De um lado, o aux�lio emergencial sustenta uma parte da demanda dos consumidores. De outro, os programas de cr�dito d�o algum f�lego para as empresas.
A Pesquisa Industrial Mensal (PIM-PF) do IBGE mostra, de certa forma, esses efeitos.
Entre os 25 segmentos acompanhados pela pesquisa, quatro chegaram a crescer no per�odo entre janeiro e julho, em compara��o ao mesmo intervalo do ano passado, sendo tr�s deles diretamente ligados a esses fatores: a ind�stria de produtos aliment�cios (4,9%), de produtos de limpeza (4,1%) e de produtos farmac�uticos (1,9%).
Os dados desagregados tamb�m exp�em a dimens�o do problema, especialmente de m�dio e longo prazo. Os segmentos de maior intensidade tecnol�gica, como de aparelhos el�tricos, produtos eletr�nicos e m�quinas, recuaram mais do que a m�dia (de 9,7%), assim como o ramo de bens de capital, que est� diretamente ligado ao investimento.
Isso se soma ao fato de que o setor ainda tentava digerir a recess�o de 2014-2016, cujos estragos ainda n�o haviam sido totalmente recuperados.
"A gente j� tem feridas n�o cicatrizadas da crise anterior, e essa vai trazer novos problemas que podem se arrastar daqui pra frente."
J� assistiu aos nossos novos v�deos no YouTube? Inscreva-se no nosso canal!