As quase 195 mil mortes por covid-19 oficialmente registradas no Brasil ao final de 2020 n�o s� escalonaram rapidamente neste ano hoje, essa cifra j� passa de 225 mil como fizeram do pa�s um dos mais mort�feros da pandemia em todo o mundo, se levadas em conta a composi��o demogr�fica e et�ria brasileira.
Na pr�tica, o risco de um morador do Brasil ter morrido de covid-19 em 2020 foi quase quatro vezes maior do que no resto do mundo, em m�dia.
As conclus�es s�o de um trabalho ainda em andamento do economista Marcos Hecksher, pesquisador do Ipea (Instituto de Pesquisa Econ�mica Aplicada).
Segundo seus c�lculos, cedidos � BBC News Brasil, 169 pa�ses de um total de 178 (ou seja, 95%) tiveram uma taxa menor do que a do Brasil em mortes por covid-19, quando comparam-se n�o s� os n�meros absolutos, mas o tamanho da popula��o e os �bitos em cada faixa et�ria.
Isso quer dizer que, caso em todos esses pa�ses os cidad�os tivessem morrido na mesma propor��o, por sexo e por idade, em que morreram no Brasil, s� nove deles estariam em uma situa��o pior do que a brasileira ou seja, nessa compara��o, registraram mais mortes do que teriam tido.
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H� meses o Brasil ocupa o segundo lugar do mundo em n�mero absoluto de mortes por covid-19, atr�s apenas dos Estados Unidos, que hoje contabilizam mais de 443 mil �bitos.
Quando a compara��o leva em conta o n�mero de mortes por 100 mil habitantes, por�m, diversos pa�ses europeus, como B�lgica, Reino Unido, Espanha e It�lia, passaram � frente do Brasil ainda em 2020. Afinal, t�m um n�mero proporcionalmente alto de mortes pelo novo coronav�rus em rela��o ao tamanho de sua popula��o.
Isso continua valendo em 2021. No levantamento mais recente da Universidade Johns Hopkins, o pa�s com mais mortes por 100 mil habitantes � o Reino Unido, seguido pela Rep�blica Tcheca e a It�lia. O Brasil aparece em 12� lugar.
Mas essa conta tampouco pinta um quadro completo.
Hecksher lembra que pa�ses europeus (e os EUA tamb�m) t�m uma popula��o com maior porcentagem de idosos do que a brasileira, portanto muito mais suscet�vel a adoecer gravemente quando infectada pelo coronav�rus.

"O n�mero de mortes de covid-19 por 100 mil habitantes indica o risco de uma pessoa qualquer em uma popula��o ter morrido por causa da doen�a. Essa taxa � influenciada pela demografia de cada pa�s. Como os idosos t�m risco muito maior de morrer de covid-19 do que os mais jovens, � esperado que pa�ses com popula��o mais envelhecida tenham mais mortes por 100 mil habitantes", explica o pesquisador.
Uma das formas de corrigir isso para fazer uma an�lise comparativa com o desempenho do Brasil na pandemia, diz Hecksher, � incorporando ao c�lculo a mortalidade por faixa et�ria e sexo.
Em seu trabalho, o pesquisador levantou portanto n�o s� a quantidade de mortes de cada pa�s por covid-19 e sua popula��o, mas tamb�m a composi��o da popula��o em cada pa�s analisado, a partir de dados da OMS, da ONU e do Minist�rio da Sa�de brasileiro.
� nessa conta que o Brasil aparece pior que 169 pa�ses.
Hecksher calculou que, se os demais pa�ses do mundo tivessem, com as suas respectivas pir�mides populacionais e divis�es por sexo, repetido o padr�o brasileiro de mortes em cada faixa et�ria e sexo, apenas nove deles teriam tido menos mortes do que de fato tiveram.
S�o eles: Peru, M�xico, Belize, Bol�via, Equador, Panam�, Col�mbia e os �nicos n�o latino-americanos da lista Maced�nia do Norte e Ir�.

"Entre os 179 pa�ses analisados, o Brasil fica na 10� pior posi��o do ranking. Isso significa que 95% dos pa�ses (analisados) tiveram resultado melhor que o Brasil no combate � covid-19 em 2020 quando se leva em conta a demografia de cada um", aponta Hecksher.
O Peru, que em junho e julho do ano passado come�ou a enfrentar uma crise semelhante � vivida agora por Manaus com colapso do sistema de sa�de e escassez de cilindros de oxig�nio , acabou se tornando um dos pa�ses com mais alta taxa de mortalidade por covid-19 em todo o planeta.
No outro extremo dessa compara��o est� o Vietn�, que at� esta semana contabilizava um total de apenas 35 mortes por covid-19, segundo a OMS.
"No Vietn�, morreram apenas 0,05% do que se esperaria se o pa�s replicasse o padr�o de mortalidade brasileiro. Em outras palavras, dados o sexo e a idade de uma pessoa, o risco m�dio de morrer em 2020 de covid-19 foi 2 mil vezes maior no Brasil do que no Vietn�", compara Hecksher.
Na pr�tica (veja gr�fico acima), a cada morte por covid-19 no Brasil em 2020, o Peru registrou 1,42 morte levando-se em conta o ajuste por faixa et�ria e sexo. Ou seja, cada cinco mortes no Brasil equivaleriam a cerca de sete no Peru.
O Vietn�, enquanto isso, registou apenas 0,0005 morte a cada pessoa que perdeu sua vida para o coronav�rus no Brasil. Ou seja, para 2 mil mortes brasileiras, o Vietn� contabilizou apenas uma.
� bom destacar que os c�lculos s�o feitos com base nos dados oficiais da pandemia em cada pa�s, sem levar em conta a subnotifica��o de mortes por covid-19 por exemplo, de pessoas que n�o foram testadas para covid-19 e cujo atestado de �bito consta apenas que ela morreu de problemas respirat�rios.
Aqui no Brasil, diferentes especialistas estimaram � BBC News Brasil em dezembro que a subnotifica��o foi t�o grande que o n�mero de mortes por covid-19 no ano passado pode ter sido 50% maior do que o registrado oficialmente. Isso faria o n�mero absoluto de mortes subir dos quase 195 mil oficiais em 2020 a mais de 290 mil.
'Pior gerenciamento' da pandemia

Os motivos por tr�s desse mau desempenho comparativo do Brasil tamb�m quando levada em conta sua composi��o et�ria exigiriam uma an�lise mais aprofundada, mas as conclus�es de Hecksher s�o refor�adas por outros estudos.
Na �ltima semana, o Instituto Lowy, da Austr�lia, listou o Brasil como o pior no gerenciamento da pandemia entre 98 pa�ses analisados, com base em seis crit�rios (n�mero de casos de covid-19, mortes, casos por 1 milh�o de pessoas, mortes por 1 milh�o de pessoas, casos confirmados em propor��o aos testes, e quantidade de testes por mil habitantes) analisados ao longo de 36 semanas. N�veis de desenvolvimento socioecon�mico e tamanho da popula��o tamb�m foram levados em conta.
Nas contas do Lowy, o melhor desempenho na pandemia coube � Nova Zel�ndia, que pontuou 94,4 em uma medi��o de zero a cem. Na lanterna do ranking, o Brasil pontuou meros 4,3.
De volta aos c�lculos de Hecksher, de modo geral, "o risco de uma pessoa qualquer no mundo ter morrido de covid-19 no ano passado, dados seu sexo e sua idade, foi 27,9% do risco enfrentado pelos brasileiros".
Ou seja, diz o pesquisador, "o risco de morrer de covid-19 � multiplicado por 3,6 vezes se a pessoa morar no Brasil".
O 'debate' entre economia e sa�de
Al�m dos dados de mortalidade, Hecksher tabulou tamb�m os dados de desemprego do Brasil e do resto do mundo durante a pandemia, usando os dados mais recentes dispon�veis (do terceiro trimestre de 2020).
E a conclus�o � de que, na suposta "briga" entre abrir a economia ou preservar a sa�de, alimentada nos meses iniciais do avan�o do coronav�rus, o Brasil perdeu nas duas pontas.

Calculando a propor��o de pessoas ocupadas em rela��o � popula��o com idade de trabalhar, o Brasil tinha menos da metade (47,1%) desse contingente empregado no terceiro trimestre de 2020.
Trata-se de uma queda de 7,7 pontos percentuais em rela��o ao mesmo per�odo de 2019, quando a rela��o entre pessoas ocupadas e popula��o em idade ativa era de 54,8%.
"O Brasil j� estava mal antes da pandemia, e tivemos uma queda ainda maior do que at� mesmo pa�ses como a Argentina", diz Hecksher.
Na compara��o com o resto do mundo em termos de popula��o ocupada, o Brasil do terceiro trimestre de 2020 s� se sai melhor do que a �frica do Sul (37,5%) e bem atr�s de pa�ses como a Su��a (79,8%).
Embora Hecksher reforce que n�o existe causalidade entre esses dois indicadores ruins brasileiros o de mortes e desemprego elevados , eles indicam que a ideia de que h� um dilema entre estimular a economia ou defender o isolamento social n�o faz sentido.
"A gente embarcou nesse falso dilema, n�o se protegeu direito e acabou sendo mais afetado do que a maioria dos pa�ses tanto pela covid-19 quanto pelo desemprego", aponta o economista.
Outro caso internacional destacado por Hecksher � o da Su�cia, apontado pelo presidente Jair Bolsonaro, no in�cio da pandemia, como exemplo de pa�s que manteve sua economia aberta e n�o promoveu lockdowns (fechamentos totais, em ingl�s).
Em compara��o com seus vizinhos n�rdicos (Noruega, Dinamarca e Finl�ndia, que t�m padr�o de vida e perfil populacional semelhante), a Su�cia teve a maior varia��o negativa no n�vel de emprego, na diferen�a entre os terceiros trimestres de 2019 e 2020.
Os suecos tamb�m perderam muito mais vidas para a covid-19 do que seus pares n�rdicos: foram 11,5 mil mortes confirmadas at� 2 de fevereiro, mais que o triplo das mortes registradas em Noruega, Dinamarca e Finl�ndia somadas.
"L�, assim como aqui, priorizar empregos na pandemia tamb�m n�o funcionou", diz Hecksher.
*Com pesquisa e infogr�ficos de Camilla Costa (@_camillacosta) e Cecilia Tombesi, da Equipe de Jornalismo Visual da BBC News Brasil em Londres
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