
Logo que o ensino remoto teve in�cio em meio � pandemia de covid-19, no ano passado, a universit�ria Maria da Penha, de 25 anos, passou a enfrentar diversos problemas para continuar no curso de servi�o social da Universidade de Bras�lia (UnB).
Em agosto de 2020, quando as aulas remotas da UnB come�aram, surgiram tamb�m as dificuldades, como a falta de um computador e uma conex�o de internet prec�ria. "J� fiquei dias sem conseguir assistir a uma aula", diz Penha � BBC News Brasil. Os problemas de conex�o, que costumam afetar at� mesmo estudantes que moram nos centros urbanos, s�o ainda maiores para quem mora em �reas rurais ou terras ind�genas.
Em meio �s dificuldades, a universit�ria tamb�m convive com o temor da covid-19, que tem afetado duramente os povos ind�genas do pa�s. "Dois tios idosos faleceram por causa do coronav�rus. Isso mexe muito com o nosso psicol�gico. J� passei alguns dias bem nervosa e preocupada", conta ela, que chegou a considerar a possibilidade de trancar o curso.
Problemas como os enfrentados por Penha t�m sido vivenciados por outros milhares de universit�rios ind�genas no pa�s. O estudo a dist�ncia improvisado em meio � pandemia encontra problemas como a falta de aparelhos eletr�nicos, internet ruim, falta de apoio pedag�gico e aus�ncia de local adequado para os alunos estudarem.
Especialistas consideram que a inclus�o de ind�genas no ensino remoto tem sido extremamente prec�ria. E a situa��o deve se estender por mais tempo, porque muitas institui��es de ensino vivem um per�odo de incerteza em rela��o ao retorno das aulas presenciais, em raz�o da piora do cen�rio da pandemia no Brasil nos �ltimos meses.
'Um per�odo estressante'

"Tem sido um per�odo complicado e muito estressante", desabafa Penha sobre o ensino remoto. Ela afirma que n�o abandonou as aulas durante a pandemia porque acredita que � fundamental ter um curso superior para ter uma profiss�o. "Tenho que continuar (estudando)", diz.
A internet na aldeia dela funciona por meio de sat�lite. "� bem fraca", diz a jovem. Em muitos momentos, n�o h� conex�o. "J� perdi muitas aulas por causa da internet. Cheguei a perder provas por causa disso", comenta.
No in�cio das aulas virtuais, ela n�o tinha computador. Por meio de um edital de inclus�o digital da UnB no ano passado, destinado a alunos de baixa renda, ela conseguiu R$ 1,5 mil. "Tive que me virar com meus pais para complementar mais R$ 1 mil e comprar um notebook, porque esse valor (do edital) n�o era suficiente", relata.
O aparelho logo se tornou um outro problema. Ela relata que cerca de 25 dias ap�s a compra, o notebook come�ou a desligar v�rias vezes. "Ele come�ou a apagar de repente. Muitas vezes tive que assistir aulas pelo celular, que n�o � l� essas coisas, porque tem pouca mem�ria", relata.
Quando n�o consegue assistir a uma aula, por problemas no notebook ou na internet, ela manda mensagens aos professores logo que consegue se reconectar. "Eu avisei que estou na aldeia e expliquei as dificuldades com o notebook e com a internet", relata. "Os professores entenderam a minha situa��o, me disseram para ficar tranquila", diz Penha.
Ela relata que concluiu tr�s disciplinas do seu segundo semestre no curso, entre agosto e dezembro de 2020. "Tive que trancar duas disciplinas. N�o consegui terminar as cinco do semestre porque era muita coisa. As dificuldades com o computador e com a internet tornaram tudo mais complicado", lamenta.
Na semana passada, Penha iniciou um novo semestre. Segundo ela, as dificuldades continuam. "Mandei o meu notebook para o conserto (durante as f�rias de janeiro), mas ainda t� complicado porque ele voltou muito lento", diz.
Na mesma aldeia dela h� outros universit�rios que enfrentam dificuldades semelhantes. Entre eles est� o primo de Penha, Leonel Alcides, de 30 anos, que cursa ci�ncias biol�gicas na UnB.
Ele tamb�m comprou um computador com o edital de R$ 1,5 mil da UnB — e, assim como a prima, relata que precisou de mais R$ 1 mil para adquirir o aparelho. "A situa��o est� dif�cil. Nem mesinha tenho para acompanhar as aulas. Coloco as coisas na cadeira para conseguir estudar", relata.
O estudante comenta que o n�mero de disciplinas que cursou no primeiro semestre de ensino remoto representou menos da metade das que ele fazia quando o curso era presencial. "Foi muito puxado e fiquei muito perdido. N�o consegui acompanhar tudo nesse primeiro per�odo (online)", diz ele, que est� no quinto per�odo do curso.
Em meio aos problemas de conex�o, Leonel relata que tamb�m sente dificuldades para aprender os conte�dos. "Nas aulas remotas, ficamos sem saber o que aprender. Presencialmente a gente aprende mais", relata. Ele afirma que sente falta do apoio dos professores em sala de aula e da companhia de outros ind�genas que tamb�m s�o universit�rios, por meio de coletivos criados por eles.
Materiais entregues com a ajuda de barco
Pelo pa�s, as institui��es de ensino criaram diferentes alternativas para tentar incluir os estudantes ind�genas na educa��o remota. Nem todos os casos se restringem ao estudo online.
Mesmo se definindo como pioneira no m�todo de ensino a dist�ncia no pa�s, a Faculdade Fael tamb�m precisou rever o acesso dos estudantes ind�genas �s disciplinas no atual per�odo.
Na cidade de Jacareacanga, no Par�, por exemplo, muitos ind�genas iam ao polo da Fael para acompanhar alguns conte�dos das aulas ou pegar materiais para estudar. Com a pandemia, por�m, muitas aldeias passaram a impedir que os moradores deixassem o local para evitar o risco de cont�gio; Em raz�o disso, a Fael distribuiu kits com material universit�rio aos estudantes. Segundo a empresa, o objetivo � fazer com que os alunos n�o interrompam os estudos por causa da pandemia.
Uma das respons�veis por auxiliar os estudantes nas aldeias da regi�o � Geizy Ribeiro, que trabalha na assist�ncia acad�mica da faculdade. Em uma embarca��o, ela leva os materiais necess�rios para os alunos, como livros, exerc�cios e avalia��es. Muitos alunos ind�genas da Fael t�m estudado somente por meio das apostilas entregues pela faculdade.
"S�o poucos alunos da regi�o que t�m acesso � internet, nem todos t�m computador. Os que t�m apenas celular preferem fazer no computador, porque acham melhor, por isso vinham at� o laborat�rio da faculdade. Muitos n�o conseguiram vir nos �ltimos meses, por causa da pandemia", diz Geizy � BBC News Brasil.
De acordo com Geizy, na faculdade h� cerca de 200 estudantes do povo munduruku, que tem uma popula��o de aproximadamente 14 mil pessoas na regi�o.
Os estudantes, segundo ela, pagam a mensalidade do curso com dinheiro do benef�cio do Bolsa Fam�lia ou do pr�prio sal�rio, principalmente aqueles que s�o servidores p�blicos. Durante a pandemia, cerca de 20 alunos tiveram de trancar seus cursos por falta de condi��es financeiras.
Para aqueles que continuam estudando, Geizy se tornou o principal apoio na regi�o. Ela, que conhece o idioma munduruku por ter sido professora em aldeias de Jacareacanga, � a respons�vel por orientar os alunos da faculdade. "Eu uso um r�dio amador para me comunicar com os estudantes que est�o nas aldeias", conta.
Um dos alunos da Fael na regi�o de Jacareacanga � o ind�gena Dion�sio Crixi, de 54 anos, do povo munduruku. Antes do avan�o do novo coronav�rus, ele costumava ir com frequ�ncia � cidade para usar o laborat�rio da faculdade. Por meio de um barco, levava cerca de uma hora at� chegar ao polo mais pr�ximo da �rea em que mora. Por�m, desde mar�o passado tem evitado sair da aldeia.
Dion�sio comenta que em julho passado perdeu o irm�o, que teve covid-19. Muitos outros parentes seus tamb�m foram infectados pelo novo coronav�rus. "Tem sido um per�odo bem dif�cil. At� a entrada de assist�ncia na aldeia foi proibida para n�o prejudicar ningu�m. Estamos isolados", relata ele, que trabalha na aldeia como professor da l�ngua materna do povo munduruku.
Dion�sio cursa pedagogia. Ele afirma que, apesar das dificuldades, n�o pensou em desistir da faculdade.
"Quero estudar mais porque n�o quero ficar para tr�s, quero avan�ar e ter mais conhecimento at� onde der", diz. Ele comenta que tamb�m quer aprender, cada vez mais, a ler e escrever em portugu�s para que possa ensinar os ind�genas. "Primeiro, a gente estuda a nossa l�ngua e depois faz a tradu��o para o portugu�s", diz Dion�sio, que deve se formar neste ano.
Desist�ncias

Muitos universit�rios ind�genas acabaram trancando o curso por causa das dificuldades do ensino remoto na pandemia.
Ertiel Amarilia, do povo Guarani Kaiow�, cursou somente um m�s de hist�ria no in�cio de 2020 na Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul (UEMS). O jovem de 20 anos, que mora em uma aldeia no munic�pio de Amamba�, no interior do Mato Grosso do Sul, decidiu trancar o curso logo no come�o do ensino remoto.
"Foi muito dif�cil fazer as atividades sozinho (no ensino remoto)", diz. Os estudantes ind�genas da UEMS recebem apostilas com os conte�dos das aulas para que possam estudar. As avalia��es s�o feitas por meio dos exerc�cios nas apostilas. O m�todo foi escolhido porque muitos universit�rios da regi�o n�o possuem nenhum acesso � internet.
"O mais dif�cil era n�o poder tirar as d�vidas na hora, como nas aulas presenciais. Como eu era iniciante (no curso), n�o fazia a m�nima ideia de como fazer as atividades sem ter um professor por perto", comenta o jovem. Ele relata que ficou ainda mais desestimulado porque n�o tinha internet em casa e n�o conseguia fazer pesquisas para se aprofundar nos assuntos abordados.
Sem estudar, o jovem viajou no m�s passado para o interior do Rio Grande do Sul para trabalhar na colheita de ma�� para uma empresa. "Na regi�o em que moro � dif�cil achar emprego. A situa��o piorou na pandemia e agora preciso trabalhar", relata. Ele deve retornar para a sua aldeia em mar�o. "A universidade era uma esperan�a para mim", diz o jovem, que n�o sabe se ir� retomar o curso em algum momento.
Desde o in�cio da pandemia, K�hu Patax�, que coordena a��es nacionais de estudantes ind�genas, acompanhou diversos relatos de universit�rios que abandonaram seus cursos. "N�o � uma situa��o nada f�cil. H� muitos casos de ind�genas que precisam se deslocar para outras comunidades para tentar acessar a internet para estudar. Outros precisam ir para a cidade em busca de sinal de telefone para ter acesso aos conte�dos", diz Patax�, que lidera o Movimento Unido dos Povos e Organiza��es Ind�genas da Bahia (Mupoiba).
"H�, por exemplo, casos de universit�rios que tinham que se deslocar por tr�s dias da aldeia � cidade para conseguir internet. Por causa dessa dificuldade, n�o conseguiram continuar estudando", comenta Patax�.
Ele relata que acompanhou diversos casos de universit�rios ind�genas que somente ir�o retornar ao curso superior quando a situa��o da pandemia melhorar e as aulas presenciais forem retomadas.
Em 2018, o Brasil tinha cerca de 57 mil ind�genas matriculados na educa��o superior, segundo o Censo da Educa��o Superior do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais An�sio Teixeira (Inep). � o levantamento mais recente sobre o tema. Esse n�mero corresponde a cerca de 0,7% do total de estudantes do ensino superior no Brasil.
N�o h�, ao menos por enquanto, dados sobre o impacto que o ensino remoto durante a pandemia causou na inclus�o dos ind�genas na educa��o superior.
A antrop�loga M�nica Nogueira avalia que o atual momento � o per�odo mais dif�cil desde o in�cio dos anos 2000, quando come�aram as pol�ticas p�blicas de acesso dos ind�genas ao ensino superior — por meio de a��es como o vestibular ind�gena e as cotas.
"Testemunhei desist�ncia entre ind�genas nesse per�odo de pandemia. N�o que n�o queiram estudar ou n�o tenham se empenhado, mas � porque realmente estamos vivendo condi��es muito adversas", lamenta Nogueira.
A antrop�loga afirma que a atual situa��o se torna ainda mais preocupante porque as dificuldades dos ind�genas no ensino superior j� haviam aumentado nos anos anteriores � pandemia.
"Aumentaram as oportunidades de ingresso, mas as condi��es para perman�ncia (nas universidades) se tornaram mais dif�ceis nos �ltimos anos", diz Nogueira.
"Muitas universidades aderiram � modalidade de vestibular ind�gena e investiram em processos preparat�rios para os ind�genas se candidatarem aos cursos de gradua��o e p�s-gradua��o. Mas as unidades de ensino t�m perdido or�amento ano a ano. Ent�o, mais ind�genas ingressam nas universidades, mas os recursos para a perman�ncia est�o diminuindo", acrescenta a antrop�loga, que � coordenadora do Mestrado em Sustentabilidade junto a Povos e Territ�rios Tradicionais (MESPT) da UnB.
Apoio aos estudantes

As dificuldades do ensino durante a pandemia evidenciam as falhas da inclus�o dos universit�rios mais vulner�veis, como ind�genas e quilombolas, aponta o professor Gersem Jos� dos Santos, membro da coordena��o do F�rum Nacional de Educa��o Escolar Ind�gena (FNEEI).
"N�s, ind�genas, sabemos que a tecnologia n�o � um agente salvacionista, mas � muito importante. Os povos ind�genas n�o s�o contra o uso das tecnologias, principalmente quando servem para atender direitos, como o acesso � Educa��o", declara Santos, que � professor da Faculdade de Educa��o da Universidade Federal do Amazonas.
"Ningu�m � contra o ensino remoto. Ele pode ser uma sa�da, principalmente no atual per�odo. Mas � preciso criar a base para isso. � preciso ter uma infraestrutura que passa pelo acesso a equipamentos de qualidade e inclus�o digital", acrescenta Santos.
Coordenador-executivo da Articula��o dos Povos Ind�genas do Brasil (Apib), Dinamam Afer Jurum afirma que o acesso dos ind�genas � internet nunca foi uma preocupa��o do poder p�blico. "Os governos anteriores lan�aram planos nacionais de banda larga, mas n�o contemplaram os ind�genas. Hoje, o reflexo disso est� nos problemas que os estudantes ind�genas t�m para acessar a plataforma digital de ensino remoto", declara.
"O desenvolvimento do ensino requer internet hoje em dia, mas isso se torna dif�cil com os problemas de conex�o nas aldeias. Quando h� internet nas aldeias, � de baixa qualidade. Sem d�vida isso est� prejudicando o ensino remoto e causando um dano irrepar�vel aos estudantes.", afirma Jurum � BBC News Brasil.
O Minist�rio da Educa��o (MEC) afirma que contratou 400 mil chips de internet banda larga para estudantes em situa��o de vulnerabilidade, entre eles os ind�genas. "Os chips oferecem internet 4G pr�-paga, as universidades e institutos federais informam quantos chips precisam e distribuem aos estudantes", informa a pasta, em nota � BBC News Brasil.
Mas a medida do MEC � criticada por ativistas das causas ind�genas. Isso porque apontam que muitos universit�rios n�o conseguiram ter acesso a um chip, pois o procedimento para obter o item foi feito de modo virtual. Outra dificuldade relacionada a essa a��o, segundo especialistas, � que muitas aldeias est�o em �reas sem nenhum tipo de sinal de internet e os estudantes teriam de se deslocar para outros locais para conseguir conex�o.
"O mais adequado seria o MEC colocar internet via sat�lite nas escolas ind�genas, para atender duas demandas: as pr�prias escolas que necessitam da internet para dar uma melhor assist�ncia aos alunos e os universit�rios ind�genas", opina K�hu Patax�.
O MEC n�o informou se far� novas a��es para auxiliar os ind�genas ou outras popula��es mais vulner�veis durante o per�odo de ensino remoto.
A pasta afirma ainda que manteve, desde o in�cio da pandemia, o repasse dos valores da Assist�ncia Estudantil, recurso destinado a alunos mais vulner�veis de institui��es p�blicas, como os ind�genas. Por meio da verba, cada institui��o de ensino avalia como executar� os recursos, em a��es como moradia estudantil, alimenta��o, transporte, inclus�o digital ou cultural e apoio pedag�gico.
A Assist�ncia Estudantil � considerada fundamental para manter os estudantes ind�genas nas universidades p�blicas. � por meio desses recursos que muitos conseguem pagar a internet e at� comprar alimentos. Mas o recurso deve sofrer cortes neste ano.
De acordo com o F�rum Nacional de Pr�-reitores de Assuntos Comunit�rios e Estudantis (Fonaprace), a previs�o, conforme o Projeto de Lei Or�ament�ria Anual, � de que o Plano Nacional de Assist�ncia Estudantil (Pnaes) sofra corte de 17,5% a 21% nas institui��es federais de ensino superior — os cortes variam conforme a verba de cada lugar.
"A previs�o para este ano � de que o Pnaes tenha um corte de recursos superior a R$ 200 milh�es. Essa redu��o representa menos estudantes atendidos e menos bolsas estudantis", diz a coordenadora nacional do Fonaprace, Ma�sa Miralva da Silva.
A BBC News Brasil questionou o MEC sobre os impactos que os cortes na verba repassada � Educa��o podem causar na Assist�ncia Estudantil. A pasta n�o respondeu at� a conclus�o desta reportagem.
Problemas hist�ricos e a pandemia

As dificuldades enfrentadas pelos universit�rios ind�genas no atual per�odo n�o se restringem �s quest�es diretamente relacionadas ao ensino superior.
O cen�rio da pandemia, com uma vacina��o lenta pelo pa�s e o aumento de casos de covid-19 nos �ltimos meses, preocupa. A situa��o, dizem especialistas, atinge diversos universit�rios ind�genas que tentam se dedicar ao ensino remoto enquanto convivem com o temor constante de que o novo coronav�rus afete duramente seu povo.
At� sexta-feira (19/02) j� haviam sido registrados 43,1 mil casos de coronav�rus entre ind�genas, sendo 571 mortes em todo o pa�s, segundo a Secretaria Especial de Sa�de Ind�gena (Sesai), do Minist�rio da Sa�de.
Mas conforme a Apib, tamb�m at� sexta, foram registrados 48,9 mil casos de covid-19 entre ind�genas no pa�s e 969 morreram. A diferen�a entre os dados ocorre porque a Sesai n�o contabiliza casos de ind�genas que n�o moram em aldeias ou que vivem em contexto urbano.
"Essas dificuldades do atual per�odo v�m de todas as dimens�es poss�veis, n�o � apenas em rela��o ao acesso �s aulas. Existe tamb�m o contexto psicol�gico, porque muitos ind�genas enfrentam mortes por conta da covid-19", aponta Gersem dos Santos.
Outro problema s�o as disputas territoriais. "A pandemia trouxe quest�es como a vulnerabilidade dos ind�genas. A falta de demarca��o de terras � um problema muito grande. Faltam pol�ticas p�blicas sobre o nosso territ�rio. Os agentes que cometem invas�es em terras ind�genas n�o est�o em home office", declara Dinamam Afer, da Apib.
"Essas dificuldades territoriais tamb�m influenciam o estudante que teve de sair da sua universidade e voltar para a sua terra. Ele tamb�m faz parte da comunidade e precisa ajudar nesse enfrentamento, muitas vezes", acrescenta o ind�gena.
Em raz�o dos diversos problemas trazidos no contexto da pandemia, especialistas apontam que seria fundamental haver apoio psicol�gico a esses estudantes. "Pouqu�ssimas institui��es de ensino oferecem esse tipo de atendimento (psicol�gico) aos universit�rios ind�genas. Alguns (que conseguem receber esse tipo de apoio), acabam recebendo esse atendimento por meio de projetos articulados pelos movimentos ind�genas", diz Gersem dos Santos.
A inclus�o dos ind�genas no ensino superior

As dificuldades atuais evidenciam tamb�m os problemas hist�ricos de inclus�o dos ind�genas no ensino superior.
Eles costumam estudar grande parte do ensino fundamental na aldeia, onde tem como principal l�ngua a que � falada pelo seu povo. Depois, por volta do ensino m�dio, costuma estudar na sede do munic�pio. E quando consegue uma vaga em uma universidade, em muitos casos precisa deixar a sua terra e viajar muitos quil�metros para que possa fazer uma gradua��o.
"O ensino recebido pelo ind�gena ao longo da vida varia muito. Eventualmente, eles trazem defici�ncia em rela��o � cultura acad�mica e a conte�dos espec�ficos", diz a antrop�loga M�nica Nogueira.
Especialistas defendem que � fundamental que os ind�genas recebam apoio pedag�gico, assim como outras popula��es mais vulner�veis como os quilombolas. "� uma obriga��o das universidades", diz K�hu Patax�. Ele aponta, por�m, que muitos ind�genas n�o t�m recebido nenhum tipo de apoio das universidades no atual per�odo, o que tamb�m tem colaborado para que muitos abandonem o curso superior.
Segundo o Minist�rio da Educa��o, cabe a cada universidade analisar o desempenho dos ind�genas e as medidas necess�rias para auxili�-los durante o ensino remoto.
Em meio � pandemia, os universit�rios ind�genas convivem com a incerteza da conclus�o do curso superior. Para muitos dos que continuaram estudando, o prazo para se formar deve ser ainda maior, porque tiveram de deixar algumas disciplinas para depois porque n�o conseguiram acompanhar toda a grade curricular.
"Perder alguns semestres significa estender um per�odo de sacrif�cios por parte deles e, frequentemente, de toda a fam�lia", comenta M�nica Nogueira.
Maria da Penha, por exemplo, ter� que ficar ao menos um semestre a mais para concluir o curso por n�o ter conseguido acompanhar todo o conte�do do primeiro per�odo de ensino remoto. Apesar disso, ela diz que continuar� estudando e mant�m o sonho de se tornar a primeira entre os oito irm�os — ela � a filha de n�mero seis — a ter um diploma do ensino superior.
Para ela, concluir o curso de Servi�o Social � tamb�m uma forma de ajudar o seu povo. "Na minha aldeia n�o tem assistente social e quando a gente precisa de um, � preciso chamar algu�m de fora. Ent�o, penso que se eu me formar, as coisas podem ficar mais f�ceis nesse sentido por aqui", diz Penha.
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